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Panafricanismo, e educação: experiências em Cabo de e no Brasil

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ - UFC FACULDADE DE EDUCAÇÃO - FACED

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

PAN-AFRICANISMO, HISTORIOGRAFIA E EDUCAÇÃO: EXPERIÊNCIAS EM CABO VERDE E NO BRASIL

FÁBIO FLORENÇO GOMES

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FÁBIO FLORENÇO GOMES

PAN-AFRICANISMO, HISTORIOGRAFIA E EDUCAÇÃO: EXPERIÊNCIAS EM CABO VERDE E NO BRASIL

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Ceará, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação. Área de Concentração: Movimentos Sociais, Educação Popular e Escola. Eixo: Sociopoética, Cultura e Relações Étnico-raciais.

Orientador: Prof. Dr. Henrique Antunes Cunha Jr.

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca de Ciências Humanas

G614p Gomes, Fábio Florenço.

Pan-africanismo, historiografia e educação : experiências em Cabo Verde e no Brasil / Fábio Florenço Gomes. – 2014.

268 f. : il. color., enc. ; 30 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira, Fortaleza, 2014.

Área de Concentração: Movimentos sociais, educação popular e escola. Orientação: Prof. Dr. Henrique Antunes Cunha Junior.

1.África – Antiguidades. 2.África – História – Até 1884. 3.Pan-africanismo. 4.África – História –

Estudo e ensino – Fortaleza(CE). 5.África – História – Estudo e ensino – São Tiago,Ilha de(Cabo Verde). 6.Ensino médio – Fortaleza(CE). 7.Ensino secundário – São Tiago,Ilha de(Cabo Verde). 8.Livros didáticos – Fortaleza(CE). 9.Livros didáticos – São Tiago,Ilha de(Cabo Verde). I. Título.

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FÁBIO FLORENÇO GOMES

PAN-AFRICANISMO, HISTORIOGRAFIA E EDUCAÇÃO: EXPERIÊNCIAS EM CABO VERDE E NO BRASIL

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Ceará, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação. Área de Concentração: Movimentos Sociais, Educação Popular e Escola. Eixo: Sociopoética, Cultura e Relações Étnico-raciais.

Orientador: Prof. Dr. Henrique Antunes Cunha Jr.

Aprovada em __________________

BANCA EXAMINADORA

________________________________________________ Prof. Dr. Henrique Antunes Cunha Jr.(Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

________________________________________________ Profª. Dra. Sandra H. Petit

Universidade Federal do Ceará (UFC)

___________________________________________________ Profª. Dra. Rosa Ribeiro

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AGRADECIMENTOS

À Majestade Imperial Haile Selassie

Aos guias: Povo de Ta Neter, de Kush, do Kemet e de Palmares. Gente como Blyden, Menelike II, Gama, Garvey e Nascimento.

Aos ancestrais: Teóphilo, Zenita e Claudemir .

À família: todos e todas no Brasil e na África

Aos anciãos e anciãs que me orientaram no Brasil, Cabo Verde, Guiné Bissau e Senegal.

Aos financiadores da Pesquisa: CNPQ

Ao professor dos professores: Henrique Cunha Jr.

À companheira do cotidiano da inspiração e do trabalho Inisabel (Abeba Makeda) pela motivação total.

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RESUMO

A pesquisa transcrita nesta dissertação está inserida na linha de Movimentos Sociais, Educação Popular e Escola, e no Eixo Sociopoética, Cultura e Relações Étnico-raciais do Programa de Pós Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará. A problemática da investigação é confronto entre propostas teóricas e conceituais da História Geral da África (UNESCO), e a localização das civilizações africanas da Antiguidade em programas e livros didáticos de História no Ensino Médio (Brasil) e no Ensino Secundário (Cabo Verde). O objetivo geral é investigar a relação entre metodologia e antiguidade africana propostas pelos Livros 1 e 2 da História Geral da África (UNESCO) e o que se é ensinado nas salas de aula sobre a África na História Antiga da Humanidade. Os objetivos específicos são: 1) construir uma abordagem histórica e social sobre a História Geral da África a partir do Pan-africanismo e de seus referenciais intelectuais, políticos e institucionais das décadas de 1950 e 1970; 2) Identificar a localização de civilizações da antiguidade africana em programas e livros didáticos de história utilizados em escolas públicas da cidade de Fortaleza (Brasil) e da Ilha de Santiago (Cabo Verde); 3) Propor elementos para superação de problemas e valorização das potencialidades comuns ao Brasil e Cabo Verde. Nossa base teórica concentra-se em autores como ZERBO (1972-2010), DIOP (1954-2010), RODNEY (1975-1980), CABRAL (1978), CUNHA (2006), MONIZ (2009), ASANTE (1989), ANJOS (2002), NASCIMENTO (2001), UNESCO (2009-2011) entre outros pesquisadores que possuem como principais campos de estudo a História da África, metodologia, movimentos sociais, Pan-africanismo, antiguidade africana e educação. Trata-se de um estudo de caso efetivado através de uma abordagem qualitativa, tendo como análise livros didáticos, programas de história e o diálogo com professores. Os instrumentos utilizados para a coleta de dados resumem-se a pesquisa bibliográfica, análise documental e entrevista semiestruturada com professores. Para registrar dados da pesquisa utilizamos caderno de campo e gravação em áudio. Neste momento apresentamos conclusões preliminares da pesquisa, uma vez que o achado durante o trabalho de campo encontra-se em processo de sistematização. Entretanto, é possível asseverar que: 1) atualmente a localização geográfica, o povoamento e o legado das civilizações africanas na Antiguidade estão sob os mesmos princípios eurocêntricos em materiais didáticos e programas de história no Ensino Médio (Brasil) e Ensino Secundário (Cabo Verde); 2) há falta de materiais nos acervos das instituições visitadas, a História Geral da África (UNESCO) e 3) o Uso Pedagógico da História Geral da África (UNESCO) são pouco conhecidos e utilizados em programas e livros didáticos em Cabo Verde e no Brasil; Este conjunto de fatores aponta para: o desconhecimento, a falta de interesse e o conflito de estudantes com a história da África, sua cultura e identidade; o ensino de história da África e a elaboração de livros didáticos devem ter como bases mínimas a conscientização, a educação patrimonial e a integração regional entre países africanos e da diáspora.

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ABSTRACT

This research intends to confront the theoretical and the conceptual proposals of the textbook General History of Africa, published by UNESCO, as well as the locations of the ancient Classic African civilizations in the syllabi of the textbooks adopted in History classes of mediumschools in Brazil and secondary schools in Cape Verde. The general objective is to investigate the relationship between the methodology and African antiquity in the textbooks General History of Africa I and II, published by UNESCO It also analyses what is taught about Africa in Ancient Human History. The specific objectives are 1) to build a historical and social approach to teach about África General History based on Pan-Africanism and Historical Knowledge; 2) to identify the location of Ancient Africa in History in the curriculums and textbooks adopted in public schools in Fortaleza (Brazil) and in Santiago Island (Cape Verde); The theoretical background of this research is based on authors such as ZERBO (1972-2010), DIOP (1954-2010), RODNEY (1975-1980), CABRAL (1978), CUNHA (2006), MONIZ (2009), ASANTE (1989), ANJOS (2002), NASCIMENTO (2001), UNESCO (2009-2011), among other scholars devoted to the study of Ancient Africa and its methodology, social movements, Pan-Africanism, Ancient Africa and Education. The methodology adopted is a case study conducted through quantitative analysis of textbooks and syllabi, as well as interviews with teachers. The instruments employed for data collection are a bibliographical research, analysis of documents, and semi-structured interviews with teachers. In order to record the research data, a field journal and audio recordings have been used. After that, preliminary conclusions of the research are presented, even though the findings during the field work are still being systematized. However, by then it is already possible to affirm that the geographical locations, the settlements, and the legacy of the ancient classic African civilizations are dealt with under the same Eurocentric principles present in other textbooks and syllabi adopted in fundamental schools in Brazil and in secondary schools in Cape Verde. The political and ideological apology of the mixture of races exerts influence in the formation of identity, educational background and professional attitude of History teachers in Brazil and in Cape Verde. There is also a shortage of materials in the libraries of the institutions visited. Moreover, the textbooks General History of Africa I and II and The Pedagogical Use of General History of Africa (both published by UNESCO) are neither well-known nor widely adopted in Cape Verde or in Brazil. These factors point at 1) the lack of knowledge and interest, as well as at the conflict of students with African History, its culture and identity; 2) the need to teach and to write textbooks which are minimally based on the awareness, on the heritage and on the African regional integration.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 Capa de O Quilombismo -1980………... 09

Figura 2 Núcleo de Consciência Negra Lélia Gonzales com Abdias Nascimento…. 11 Figura 3 Fábio Gomes e André Costa 2008………... 11

Figura 4 Atelier do Musik Fabrik………... 12

Figura 5 Oficina de Construção de Instrumentos 2010……….. 14

Figura 6 Exposição da Construção de Instrumentos……….. 14

Figura 7 Centro Escola do Pensamento africano ………... 16

Figura 8 Visita Guiada –Tarrafal……… 16

Figura 9 AJOPAR –Guiné Bissau……….. 17

Figura 10 Visita ao PAIGC………. 17

Figura 11 Antenor Firmin………. 44

Figura 12 Menelik II………. 48

Figura 13 Edward Wilmot Blyden……… 50

Figura 14 Marcus Garvey e Web Du Bois………... 60

Figura 15 Jornal Negro World……….. 61

Figura 16 Jornal The Crisis……….. 61

Figura 17 Haile Selassie e Imperatriz Menen………... 63

Figura 18 Kwame N’krumah……… 80

Figura 19 Amílcar Cabral………. 81

Figura 20 Cheikh Anta Diop……..……….. 112

Figura 21 Quadro Vale dos Reis………... 120

Figura 22 Anu -Tera Neter………... 123

Figura 23 Narmer……….. 123

Figura 24 1ª Face Palheta de Narmer………... 124

Figura 25 2ª Face Palheta de Narmer………... 124

Figura 26 Joseph Ki-Zerbo………... 129

Figura 27 Walter Rodney………. 133

Figura 28 Diagrama da Organização da Unidade africana……….. 144

Figura 29 Relatório do Congresso do Cairo 1974…...………. 150

Figura 30 Entrevista semiestruturada…………...………... 199

Figura 31 Encontro Escola 2013……….. 209

Figura 32 Palestra para Professores –Lei 10639\3………... 211

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Utilização da História Geral da África ……… 210

Tabela 2 Elaboração de Manuais ……… 212

Tabela 3 Produção de Manuais ……… 212

Tabela 4 Disponibilidade de Manuais ……… 214

Tabela 5 Programa de História do 9 º ano - Cabo Verde ……… 219

Tabela 6 Manuais de História do Secundário - Cabo Verde ……… 223

Tabela 7 Programa de História do 1º Ano Ensino Médio - Fortaleza 228 Tabela 8 Manual História do 1º Ano Ensino Médio – Brasil ………… 230

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SUMÁRIO

Nota do autor ……… 01

Apresentação: sete razões para esta pesquisa ……….………… 04

INTRODUÇÃO ……… 20

i. Interesse pela Consciência Histórica ……… 21

ii. Delimitações do Campo de Pesquisa ………..……… 22

iii. Marco Teórico Conceitual ……… 25

iv. Questões da Pesquisa ………..………… 36

v. Objetivos .……….……… 36

vi. Metodologia ...………..……… 36

vii. Estrutura da Dissertação ……… 38

PARTE I PAN-AFRICANISMO Capítulo 1: PAN-AFRICANISMO: AÇÃO, CONCEITO E AUTO-DESENVOLVIMENTO 40 1.1 Pan-africanismo redefinido ………...……… 41

1.2 Uma era de grandes combates ………..……… 41

1.3 Organização, Integração e Resistência ………..……… 46

1.4 No Limiar Colonial ………...……… 51

1.5 Ambientes ………..……… 52

1.6 A lâmina afiada de WEB Du Bois ………...……… 54

1.7 O Martelo pesado de Marcus Garvey ……….……… 55

1.8 Etiópia de Marcus Garvey ………...……… 58

1.9 Das Convergências ………...……… 60

1.10 Etiópia: signo do nacionalismo africano ………...……… 62

1.11 Congressos Pan-africanos ……….……… 64

Conclusões ……….……… 68

Capítulo 2: LUTAS DE LIBERTAÇÃO AFRICANA E HISTÓRIA DA ÁFRICA …………1.1 Educação e Conhecimento Histórico ……… 69 70 1.2 Pan-africanismo e movimentação anti-colonial ……… 74

1.3 Grupos Motores das Independências africanas ……… 75

1.4 O fator Unidade da África ……… 78

1.5 Unidade e Resistência: Kwame N’krumah e Amílcar Cabral……… 81

1.6 Entre as Independências africanas ……… 82

1.7 Similaridades ……… 85

1.8 Elites e Neocolonialismo ……… 86

1.9 O Neocolonial e a Resistência Nacional ……… 87

1.10 Resistência e conhecimento histórico ……… 94

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PARTE II HISTORIOGRAFIA

Capítulo 3: ESCOLAS E CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO ……… 99

1.1 Escolas e pensamento Histórico ……… 99

1.2 Descolonização da História ……… 106

1.3 Dr. Cheikh Anta Diop ……… 112

1.4 Dr. Joseph Ki-Zerbo ……… 129

1.5 Dr. Walter Rodney ……… 133

1.6 Educação e manuais de História ……… 135

Conclusões ……… 137

Capítulo 4: ORGANIZAÇÃO DA UNIDADE AFRICANA E HISTÓRIA GERAL DA ÁFRICA 138 1.1 Unificar para Renascer ……… 138

1.2 Educação e Organização da Unidade africana ……… 142

1.3 História Geral da África (UNESCO) ……… 145

1.4 Cairo’74- História africana ……… 150

1.5 História Geral da África (UNESCO) ……… 158

1.6 História Geral da África (UNESCO) no Brasil ……… 163

1.7 Atribulações do Momento ……… 165

Conclusões ……… 167

PARTE III EDUCAÇÃO Capítulo 5: ANTIGUIDADE AFRICANA E ENSINO DE HISTÓRIA ……… 169

1.1 Mestiçagem, racismo e educação: lógica curricular brasileira ……… 169

1.2 Mestiçagem, neocolonialismo e educação: lógica curricular caboverdiana ……… 176

1.3 Brasil e Cabo Verde: civilização e sabotagem a Cheikh Anta Diop ……… 186

1.4 Década de 2000: História da África ……… 191

1.5 Pesquisa Militante ……… 196

Conclusões ……… 200

PARTE VI Capítulo 6: UM ESTUDO DE CAMPO INTEGRADO PELA HISTÓRIA ……… 201

1.1 Conexões Metodológicas e Categorias ……… 202

1.2 Uso Pedagógico da História Geral da África (UNESCO) ……… 204

1.3 Programas e manuais de História – Cabo Verde ……… 218

1.4 Programas e manuais de História – Brasil ……… 226

1.5 Reflexões e recomendações ……… 232

1.6 Pedagogia da Unidade ……… 236

Conclusões ……… 240

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NOTA DO AUTOR____________________________________________________

Professores de História entrevistados no Brasil e em Cabo Verde foram sujeitos colaboradores desta pesquisa. Todos estes profissionais contatados disponibilizaram seu tempo, espaço, relatos e materiais para esta pesquisa. Manteremos em sigilo os seus nomes, professores e professoras, cujas falas foram registradas em nosso diário de campo e gravador de áudio, e suas respectivas Unidades Escolares. Para a substituição dos nomes verdadeiros, utilizamos nomes fictícios: Biko; Titina, Djassy, Abdulay, Améli, Ramos, Malan, Telli, Djau.

Tais nomes são fictícios apenas como sujeitos desta pesquisa, todos são nomes de combatentes da libertação africana de Cabo Verde, Guiné Bissau e África do Sul entre as décadas de 1950 e 1970. Dupla consideração e gratidão! Aos ancestrais e aos encarnados.

Em nosso trabalho, assim como em nossas vidas, os termos são de grande importância no sentido que expressam nossos pensamentos, memória coletiva, identidade, cultura, existência e ancestralidade. Por isso, cabem agora algumas considerações sobre termos utilizados nesta dissertação.

Negro\ africano -Brasileiro: termos que considero os mais adequados para designar a população no Brasil que carrega consigo identidade, fenótipo, memória e cultura africana. O termo negro possui um histórico de afirmação dentro dos movimentos sociais no Brasil. africano -brasileiro não é comum, mas seu potencial é muito grande por localizar cultural e historicamente a origem africana da população e sua condição geográfica fora do continente.

Preto: termo que tem ganhado força atualmente no Brasil, muito por influência política e artística de países de língua inglesa (Black). Há uma tendência entre jovens adeptos do Hip Hop no Brasil na defesa de uma substituição do termo negro pelo termo preto.

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indicam uma ideologia de branqueamento, apologia à miscigenação e desintegração entre população negra no Brasil.

Afro-brasileiro e Afrodescendente: termos ambíguos que podem conotar de forma afirmativa a origem, cultura e história africana no Brasil e integrar a população negra, mas ao mesmo tempo, possibilitam que oportunistas assumam este termo como forma de obter alguma vantagem social, política e financeira, principalmente a partir da década de 2000 com a política de ações afirmativas no Brasil (cotas raciais em universidades e nos serviços públicos, e bolsas de estudo em mestrado e doutorado).

Branco: uma forma de designar a população europeia e seus descendentes no Brasil e em outras partes do mudo, neste sentido, branco não é apenas uma designação fenotípica, mas também uma designação cultural, ou seja, uma atribuição ao sistema de dominação global europeu no continente africano e na diáspora. O racismo, o eurocentrismo, o capitalismo e o comunismo (por exemplo) integram a estrutura de um sistema “branco” de opressão e dominação política, econômica, tecnológica e cultural.

Neocolonial: denominação das sequência de transformações ocorridas no sistema colonial europeu instalado oficialmente no continente africano no final do século XIX. Na perspectiva de lideranças africanas nacionalistas como Kwame Nkrumah do Gana e Amílcar Cabral de Guiné Bissau e Cabo Verde, é entre as décadas de 1940 e 1960 que se conflagram as independências nacionais que o neocolonialismo começa de forma efetiva a modificar as formas de exploração do continente africano, evidenciadas nas relações econômicas e cooperações de todos os tipos, como a educacional por exemplo. O Pós-colonial dentro da nossa proposta é uma forma de negar ou negligenciar as novas gerações de dominação, corretamente denominadas de neocoloniais.

Mundo africano : termo adequado para indicar a expansão forçada de africanos a partir do século XV, sequenciada pela oficialização do colonialismo no século XIX, e que tem sua continuidade no contexto neocolonial da segunda metade do século XX às primeiras décadas do presente século XXI.

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pelo tráfico europeu de africanos escravizados e guerra deslocada para as Américas entre os séculos XV e XIX.

Escravizado: O termo escravo não e sinônimo de negro ou africano. Estranha às sociedades africanas, a escravidão foi uma condição imposta pelo sistema europeu de trafico de seres humanos no continente africano, a escravização teve como princípios a desumanização e desagregação de homens, mulheres e famílias africanas.

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APRESENTAÇÃO: SETE RAZÕES PARA ESTA PESQUISA_______________

Sete razões determinaram o meu interesse em pesquisar sobre o ensino de história das civilizações da antiguidade clássica africana (centralmente o antigo Egito) no Brasil e no Cabo Verde, são elas: Consciência, Militância, História colonizada, África-Brasil-África, A (outra) realidade, Meios de trabalho e Circunstância: Ntu

Consciência

Nasci no subúrbio do Rio de Janeiro, e cresci no bairro do Lins. Recebi em casa orientações para respeitar as folhas, as raízes, os ancestrais e a potência divina, Deus. Naquela época, minha família era de religião de terreiro, denominadas hoje como religiões de matriz africana, a exemplo do candomblé, umbanda entre outras. Uma vez por semana as mulheres da minha família cultuavam em casa entidades espirituais denominadas Pretos Velhos, espíritos de africanos que vieram para o Brasil durante a Maafa, grandes conhecedores de medicina tradicional africana, aconselhadores espirituais, detentores de uma escrita própria (ponto riscado) e em que sua grande maioria se autodenominava de origem angolana. As participantes consultavam-se com os Pretos Velhos em um dos quartos da casa de minha avó, onde passei a maior parte da infância.

Neste ambiente familiar apreendi algumas lições práticas sobre ajudarmo-nos uns aos outros a viver, e de que é fundamental sabermos nossa própria história, pois sem ela nada faz sentido na vida. Cresci vendo meus próprios familiares reagindo e debatendo questões sobre o racismo no Brasil, uma patologia social impregnada em todos os lugares, desde os supermercados às escolas, aos campos de futebol e aos museus, não havia (e nem há) lugar onde o racismo não se manifestasse na sociedade brasileira.

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integrante de uma história e legado maior no tempo e no espaço, e aquela percepção seriam o sentido, ou direção, para a construção do meu próprio futuro.

O debate aberto sobre o racismo me fez perceber que por um lado havia uma grande injustiça criminosa conosco na sociedade brasileira, e por outro lado, perceber que a nossa História não começou no Brasil, mas no continente africano, tendo sua continuidade nos quilombos, nos combates contra o racismo e na solidariedade do dia-a-dia. Estas percepções, anos mais tarde, influenciaram diretamente a minha militância e a opção por ser professor de história. Mas para um menino, muitos caminhos ainda deveriam ser trilhados, um caminho de erros, acertos, reflexões e acima de tudo aprendizado.

Militância

Eu estudei no Colégio Pedro II, qualificado entre as maiores escolas da América do Sul, no bairro do Engenho Novo, também no subúrbio do Rio de Janeiro, perto do Lins. Como qualquer adolescente negro em uma escola pública, mas das altas elites do país, fui hostilizado por colegas, funcionários e professores, no entanto, tenho também as minhas boas recordações. O que agora posso ressaltar é que a minha tragetória escolar foi inicialmente de excelente rendimento e boas amizades, entretanto a absorção da violência racial, muitas vezes simbólica e não física, me reduziram a condição de aluno marginalizado, indisciplinado e de baixo rendimento escolar.

Olhando para traz, vejo que não somente eu, como a maioria (que eram poucos!) dos alunos negros da minha geração no Colégio Pedro II, não completou seus estudos do primeiro e do segundo grau (atuais ensino fundamental e médio). Abandonei a escola e me dediquei ao trabalho braçal em uma destas lanchonetes multinacionais, que exploram uma mão de obra barata e produtiva, condenando uma geração inteira ao subemprego.

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Todavia, no ritmo do subemprego perguntei-me diversas vezes se o estudo e a ciência, se os centros de conhecimento enfim, eram realmente locais para mim, ou se o meu lugar não era ali, onde eu estava preso a uma cozinha de lanchonete. Não escapei destas oscilações e lembro-me bem que durante os anos fora da escola, os negros que conheci da minha idade trabalhando em subempregos tinham o mesmo discurso: “o estudo não é para mim”. Creio que este é um dos efeitos mais nefastos do racismo, e que pode ser colocado lado a lado com a descaracterização física (alisamento de cabelo\clareador de pele). A frustração profissional planejada para a juventude negra encaminha-nos para o mundo do crime, da droga, das doenças psíquicas e de diversos outros tipos de violência social.

Com o apoio, ou insistência, familiar voltei a estudar para terminar o ensino médio, mas depois dei mais um intervalo nos estudos, pois meu horário de trabalho era irregular. Após dois anos de trabalho na rede de lanchonetes fui promovido a Treinador, cuja função era orientar novos funcionários e coordenar equipes de trabalho em setores como balcão, cozinha, limpeza de banheiros e etc. Mesmo com fortes chances de conseguir mais uma promoção de cargo, alguns choques raciais e um acidente grave que sofri desgastaram muito minha presença naquele ambiente de trabalho. Se por um lado eu não estava disposto a aceitar o racismo de superiores hierárquicos, e mesmo de clientes, por outro, eu não tive a mínima assistência no momento do acidente de trabalho que me levou a ficar semanas sem andar. Nesta ocasião, entendi que eu era apenas uma peça negra descartável dentro do jogo de um sistema branco, então resolvi me demitir e buscar melhores caminhos, mesmo sem saber para onde.

Após uma série de entradas e saídas de empregos temporários tomei a iniciativa de continuar os estudos, na verdade redescobri o gosto pelos estudos através de alguns acontecimentos marcantes, dentre os quais, um pequeno curso sobre as independências africanas no ano de 1999 promovido pelo departamento de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e leituras sobre revoltas de africanos escravizados no Brasil, Martin Luther King e revolução cubana. Entretanto, a motivação maior nasceu do meu contato com a militância negra organizada, em outras palavras, o contato com membros, militantes, do movimento negro. Paulatinamente, eu mesmo busquei a militância e militantes para conseguir enfrentar o racismo e adquirir mais conhecimento.

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Yedo Ferreira, emblemático combatente pelas Reparações, e Ras Romeu, artesão, militante, poeta e musico Rastafari, ambos os detentores de grande conhecimento sobre história africana. Busquei livros que militantes do movimento negro me indicavam, e os li. Pelas mãos de um vendedor de livros e estudante de História na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Jorge Damião, conheci a EDUCAFRO, um projeto social de pré-vestibulares comunitários coordenado no Rio de Janeiro pelo Senhor Frei Davi, religioso franciscano e militante do movimento negro.

A EDUCAFRO tinha as suas próprias ações sociais, cursos pré-vestibulares comunitários, jornal, manifestações\marchas contra discriminação racial e reuniões públicas, para a comunidade jovem interessada nos estudos. A EDUCAFRO era parceira de outros projetos semelhantes como o Pré-vestibular para Negros e Carentes (PVNC). No início de 2000 eu fui estudar em um PVNC localizado na Cidade de Deus, comunidade favelada na Zona Oeste do Rio de Janeiro. As aulas deste pré-vestibular ocorriam nas dependências da Escola Estadual João Batista aos sábados, domingos e durante o dia inteiro, uma vez por semana à noite.

No pré-vestibular da Cidade de Deus eu tive a oportunidade de vivenciar formas mais amplas de militância social, pois aquele ambiente era marcado pela brutalidade policial, pela falta de infraestruturas (água, luz e sistema de esgoto) e por profundas lições de solidariedade. Havia sérias frentes de resistência na Cidade de Deus e a família de uma das coordenadoras do PVNC dirigia uma companhia teatral comunitária especializada em temas sobre negritude, religião de matriz afro e militância negra, isso me marcou muito.

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De início, por minha própria inexperiência, eu subestimei o nível de opressão e alienação cultural da Pontifícia Universidade Católica, mas a realidade é que esta é uma instituição Jesuíta, logo, seus conteúdos curriculares de ciências humanas, principalmente, estão impregnados de racismo, eurocentrismo e um conservadorismo mesquinho. No final de 2002, juntei-me aos estudantes de graduação em história, Janaina Portella e Carlos Menezes, de pedagogia, Wilian Barbosa, de ciências sociais, Lincoln Oliveira e Alexandre Nascimento, e de literatura, André Costa (com mais alguns outros de direito e psicologia) para organizarmos no campus daquela universidade o Núcleo de Consciência Negra Lélia González, em homenagem a professora e diretora do departamento de sociologia da PUC-Rio no início da década de 1990, historiadora e socióloga, que faleceu prematuramente em 1994, deixando um legado de resistência e militância.

Foi importante homenagear a Prof.ª Lélia Gonzales pela relevância dos seus estudos sobre a população afro-brasileira, e por que sua obra era completamente ignorada pela própria universidade que a recebeu como professora, assim como o caso de Sebastião Rodrigues Alves, militante do movimento negro da década de 1930 e aluno de Serviço Social desta mesma universidade. A nossa sensação enquanto estudante era de que havia um complô silencioso entre professores e funcionários para o apagamento da memória desta inteletual na história da instituição. O objetivo do Núcleo de Consciência Negra Lélia Gonzales foi então criar uma trincheira do conhecimento e um abrigo da cultura, de forma a conhecermos nossa própria história e a nós mesmos, entendermos nossas próprias experiências políticas enquanto um povo, além de nos solidarizarmos naquele ambiente de dissimulação racista. Nesta época, interessávamos e procurávamos pelos clássicos da historiografia, da política, da filosofia e da literatura africana.

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Figura 1: O Quilombismo

Fonte:http://biblioafrogriot.blogspot.com No segundo semestre de 2005 enquanto membro Núcleo de Consciência Negra Lélia Gonzales, formulei o projeto de pesquisa “Eugenia Lexical da Patologia Social – O negro objeto em instituições de pesquisa no Estado do Rio de Janeiro entre 2002 e 2004”, cujo objetivo foi denunciar a manipulação ideológica e historiográfica do negro usado como objeto de estudos em instituições de pesquisa. No ano seguinre, 2006, eu e André Costa apresentamos os resultados parciais da pesquisa no VI Congresso Brasileiro de Pesquisadores Negros, organizado pela Associação Brasileira de Pesquisadores Negros (ABPN), realizado na Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Mas infelizmente, a nossa falta de percepção política e a militância imatura contribuíram para que esta fosse à última atividade do nosso Núcleo.

História Colonizada

Ao começar os estudos de História na Puc-Rio tive a amarga constatação de que todo o curso era uma afirmativa da supremacia branca no Brasil e no mundo. A história da África e do Afro-brasileiro eram ignoradas, ou simplesmente desqualificadas, pelos professores, em sua maioria teóricos egocêntricos frustrados por não terem nascido na Europa. Neste contexto, criticas historiográficas como A Injustiça de Clio, escrita pelo jornalista e pesquisador Clóvis Moura, foram de grande utilidade para mim, através deste livro comecei a descobrir as farsas criadas pela historiografia brasileira sobre a história do negro no Brasil, principalmente em relacão a resistência ao sistema escravista protagonizada pelos quilombos, uma tradição guerreira africana espalhada por todas as regiões das Américas, e que receberam africanos deportados do continente.

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Abdias Nascimento transcritas naquele documento. Abdias Nascimento trouxe-nos através do seu livro uma orientação científica e um sentido político libertário global para nossas profissões.

O Quilombismo nos apresentou um conjunto de clássicos da historiografia e referências excluídas dos programas de história que conhecíamos, como Cheikh Anta Diop, Joseph Bem Jochoman, Ivan Van Sertima e John Henrike Clarck. No sentido político, Abdias nos ofereceu o conceito de Quilombismo não como mais um slogan, mas como um sentido de luta pan-africana a partir das nossas experiências no Brasil, em conexão com o continente africano e com sua diáspora. O Quilombismo foi um alerta de que não precisávamos nos sujeitar a aderir às ideologias de uma historiografia europeia para pensar a nossa própria história. Este livro despertou em mim a compreensão de que o estudo das civilizações africanas da antiguidade serviu de base fundamental para historiadores do século XX. Perante o direcionamento eurocêntrico que reveste as civilizações africanas da antiguidade, este tema é tão ou mais relevante agora no século XXI.

Pois, a originalidade e legado de civilizações da antiguidade clássica africana como o antigo Egito e Etiópia interferem diretamente nas bases dos conteúdos ensinados em todas as disciplinas, assim como no próprio propósito da educação. Quaisquer mudanças e transformações positivas na percepção política, histórica, filosófica, geopolítica e econômica que africanos e africanos de origem possuem de si mesmos, devem passar por uma reavaliação total das primeiras civilizações criadas no continente africano. Estudar as civilizações do passado africano, e perceber seu legado no presente como uma herança para a construção do futuro, essa mensagem é muito marcante em O Quilombismo.

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Figura 2: Encontro de integrantes do Núcleo de Consciência Negra Lélia Gonzales com

Abdias Nascimento em 2004

Fonte: Arquivo Pessoal -Foto de Lincoln Oliveira (2004)

Figura 3: Fábio Gomes e André Costa, comunidade Céu Azul, em 2008.

Fonte:www.ebukhosinisolutions.co.za Foto de Baba Buntu (2008)

África seria ensinada, a colonial ou da libertação? Quem iria lecionar e coordenar pesquisas e cursos?

O nosso Núcleo de Consciência Negra funcionou entre os anos de 2003 e 2006, neste período mantivemos semanalmente um grupo de estudos. Os principais livros que estudamos foram Steve Biko (Eu escrevo o que Eu quero), Abdias Nascimento (O Quilombismo, uma nova versão ampliada e lançada em 2002), Malcom X (Autobiografia), Maria Beatriz Nascimento (textos diversos), Lélia Gonzales (Lugar de Negro), Guerreiro Ramos (A Redução Sociológica), Maria Aparecida Bento (Psicologia Social do Racismo), Clovis Moura (Sociologia do Negro Brasileiro e Rebeliões da Senzala) e capítulos dos Volumes I e II da História Geral da África (UNESCO).

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Figura 4: MusikFabrik atelier Os professores Renato Emerson e Antônio Espirito Santo foram bases muito importantes para a minha formação na época, tenho grande gratidão pelas oportunidades que ambos me proporcionaram. A experiência com geógrafo Renato Emerson em investigação sobre Políticas de Ação afirmativa e Pré-vestibulares para Negros e Carentes, levou-me ao campo de pesquisa pela primeira vez. Durante o ano de 2002 percorremos dezenas de cursos pré-vestibulares em todo o Estado do Rio de Janeiro. Os principais aprendizados que tive foram sobre o valor do trabalho de campo, os relatos orais e seu registro. O professor Renato Emerson assumiu uma postura em que não havia relacão sujeito-objeto, mas uma relacão entre sujeitos de pesquisa.

Com Antônio Espirito Santo (Spirito Santo) conheci a música e a musicologia, integrei como aluno-monitor as oficinas de construção de instrumentos musicais do seu projeto MusikFabrik, instalado na década de 1990 na UERJ. No Musik Fabrik renovei meu olhar para a história africana através da musicologia, e tive acesso às informações sobre as lutas africanas de independência, principalmente do regime colonial português

em Angola, Moçambique, Guiné Bissau e Cabo Verde. Entre tantos, os principais exemplos que tive de Spirito Santo foram à dedicação ao trabalho de pesquisa independente, o holismo em tratar da cultura e de tudo mais que se refere ao negro e a África, e a fundamental importância da pedagogia, onde o holismo e a pesquisa independente devem ser aplicados com muita atenção. Outro elemento muito valorizado por Spirito foi a influencia Bantu na história, cultura, língua, religiosidade e tecnologia africana trazida para o Brasil.

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Ao retornar para Cabo Verde em 2006, esta cabo-verdiana trabalhou como assistente internacional em conferências da Unidade africana (UA), participou de atividades em associações de mulheres africanas e publicou artigos através da revista YOWLI, um projeto da organização senegalesa pan-africana de mulheres Áfrican Women Milleniunm Initiative on Poverty and Human Rights ( AWOMI). Makeda participou da criação de uma associação comunitária voltada a trabalhos com jovens caboverdianos denominada Waaldé. Desde então passamos a manter contato via internet.

África-Brasil-África

Após encerrar a graduação em História continuei os trabalhos de militância através de projetos de educação alternativa em escolas, em comunidades e universidades, organizados pelo MusikFabrik e do pré-vestibular do Céu Azul, o único trabalho que o Núcleo de Consciência Negra Lélia Gonzales manteve. Em busca de uma continuidade dos estudos, consegui uma bolsa de 50% para uma pós-graduação em História da África e do Negro no Brasil pelo Centro de Estudos Afro-brasileiros da Universidade Candido Mendes - Rio de Janeiro. Esta oportunidade foi conseguida graças a uma indicação da livraria Kitabu (Rio de Janeiro) e do comprometimento do prof. Edson Borges, iniciei o curso em 2009.

O programa do curso alertava indiretamente os discentes que temáticas relacionadas ao africanismo estavam fora da proposta de ensino de História da África. O Pan-africanismo é, em síntese, um amplo movimento organizado por africanos e seus descendentes na diáspora para combater o racismo e o colonialismo, e reorganizar as estruturas politicas e econômicas africanas devastadas pela exploração sistemática europeia nos últimos séculos que antecederam o XXI.

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Figura 5: Oficina de Construção de instrumentos musicais realizada na Fundação Amílcar Cabral,

2010.

Fonte: arquivo pessoal (2010)

Figura 6 : Oficina de Construção de instrumentos musicais realizada na Fundação

Amílcar Cabral 2010

Fonte: Arquivo Pessoal (2010)

Geral da África e de uma série de ações para modificação de currículos. Então, por que a exclusão, no curso de pós-graduação, de um tema tão pertinente para a História da África?

O ensino de História no Brasil é estruturalmente eurocêntrico, comunga com valores neoliberais racistas, e que acabam por marginalizar grandes movimentos e nomes da historiografia africana como o senegalês Cheikh Anta Diop, Joseph Ki Zerbo do Burkina Faso e Walter Rodney da Guiana, todos três militantes de movimentos sociais nacionalistas Pan-africanos. A própria metodologia Geral de pesquisa para a confeccão da História Geral da África, formulada por Joseph Ki Zerbo, tem no Pan-africanismo um de seus princípios fundamentais.

Entre os anos de 2008 e 2009 mantive contato via internet com organizações internacionais de caráter pan-africano, comecei a elaborar um projeto sobre história da África e Diáspora e construção de marimbas (xilofones). Com o projeto pronto, em Dezembro de 2010 iniciamos um intercâmbio em Cabo Verde custeado de forma independente pelas organizações e pessoas envolvidas, dentre as quais a Associação Comunitária Waaldé, a Fundação Amílcar Cabral, o programa Ritmos Afrocentricos – RA, e eu mesmo, com as poucas economias que tinha.

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pesquisa, arquivos e bibliotecas da capital do país. Foi a partir destas vivências que percebi que os programas, bibliografias e livros didáticos de história (manuais ) utilizados em Cabo Verde estavam submersos em teorias coloniais racistas, muito parecidas com as do Brasil. Mas meu visto de três meses já estava por terminar, retornei ao Brasil com a perspectiva de voltar a Cabo Verde, me instalar de forma definitiva, trabalhar como professor de história e interferir de forma cnstrutiva neste problema educacional.

No final do ano de 2010 retornei ao Cabo Verde com o apoio de Abeba Makeda e no inicio de 2011 trabalhei com a Associação Comunitária Waaldé na criação de um programa educacional denominado Grupo de Trabalho Amílcar Cabral 1956 (GTAC’56), em menção a Amílcar Cabral e a criação do Partido africano para a Independência de Guiné Bissau e Cabo Verde (PAIGC) em 1956. O objetivo do GTAC’56 foi realizar atividades de conscientização política e identidade africana voltadas para um público jovem.

O programa GTAC´56 foi apoiado pela Fundação Amílcar Cabral, Associação de Combatentes da Liberdade, Ministério da Juventude e pela senhora Ana Maria Cabral, viúva de Amílcar Cabral e testemunha do seu assassinato no ano de 1973 em Guiné Conacri. A Fundação Amílcar Cabral nos cedeu espaço para atividades do programa, sua biblioteca e uma credencial tornando oficial o apoio. O ministério da juventude nos disponibilizou transporte para atividades externas com os jovens, e a Sra. Ana Maria Cabral deu-me orientações praticas para a condução do programa.

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Figura 7: Primeiro encontro organizados pelo CEPAFRO, 2011, na Fundação Amílcar Cabral.

Fonte: Arquivo pessoal. Foto: Abeba Makeda

Figura 8: Visita guiada organizada pelo CEPAFRO ao campo de concentração do Tarrafal, presídio

colonial desativado.

Fonte: Arquivo pessoal (2012)

Em meio às atividades do CEPAFRO consegui uma bolsa de estudos para participar de um atelier sobre metodologia de pesquisa organizada na Universidade de Cabo Verde pelo CODESRIA (Conselho para o Desenvolvimento das Ciências Sociais em África). Preparei um projeto voltado ao estudo qualitativo sobre o ensino de civilizações da antiguidade africana em Cabo Verde cuja ideia foi inicialmente criticada por caboverdianos e portugueses nascidos em Angola, participantes do atelier. Os críticos argumentaram que o tema não era relevante, mas ao mesmo tempo angolanos (professores Nzinga e Coda) e dois dos representantes do CODESRIA (professores Carlos Cardoso e Elísio Makamo), deram-me total apoio, pois viram que o tema envolvia questões chave sobre educação, política, relações internacionais e historiografia.

Somada a minha convicção de que a proposta era pertinente, precisando ser aperfeiçoada, as criticas e tentativas de desqualificação reforçaram minha intenção de pesquisar sobre o ensino de história da África em Cabo Verde. Eu acharia estranho se portugueses e pesquisadores caboverdianos concordassem com uma abordagem sobre as bases do ensino de história, francamente eurocêntrica. Os caboverdianos sabiam que a minha presença os denunciava como cumplices de um ensino de história eurocêntrico.

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Figura 9: Encontro com integrantes da AJOPAR no INEP em Guiné Bissau

Fonte : Aquivo pessoal

Figura 10: Encontro com secretário administrativo do PAIGC em Guiné Bissau

Fonte : Aquivo pessoal

Educação e Pesquisa (INEP), em Guiné Bissau, pesquisas bibliográficas, e com o apoio dos professores Mamadu Jau, Imani na Umoja e Augusto Bock fizemos uma pequena palestra sobre o legado de Abdias Nascimento, falecido no início daquele mesmo ano.

Para os guineenses foi uma surpresa o meu interesse por Amílcar Cabral, pelas lutas de libertação e pelo ensino de história da África. Segundo Imani na Umoja, idealizador e líder do AJOPAR, a grande maioria das pessoas do Brasil chega à Guiné Bissau interessadas na disseminação de credos religiosos, trabalhos acadêmicos e atividades que possam gerar status ou recursos financeiros para fins individualistas.

Com muitas informações na bagagem, saímos de Guiné Bissau em direção ao Senegal pelas estradas e rios que cruzam a Gâmbia. No Senegal nosso trabalho foi buscar informações sobre a vida e obra do historiador Cheikh Anta Diopág. Neste sentido, visitamos o Instituto Fundamental da África Negra (IFAN), localizado em Dakar-Senegal, e onde Cheikh Anta Diop trabalhou entre as décadas de 1960 e 1980. Tivemos a oportunidade de fazer levantamentos bibliográficos na sede do CODESRIA em Dakar. Retornamos a Cabo Verde renovados e fortalecidos com as experiências vividas.

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A (outra) realidade

Diante de toda esta rica experiência em território africano e do conhecimento havia uma preocupação: Eu estava sem um emprego, sem uma renda regular. Até então, eu vivia em um dos quartos da casa onde fiquei desde minha chegada em 2010, que pertencia à mãe de Abeba Makeda e com um donativo simbólico pelas atividades para a Waaldé.

Procurava emprego em Cabo Verde como professor e pesquisador, mas não consegui absolutamente nenhum sinal positivo, muitas promessas de abertura, e todas as portas do magistério fechadas. No começo parecia que o problema era não ter títulos acadêmicos, mas dado o contexto em que graduados de varias partes do mundo darem aula em universidades os motivos começaram a vira a tona. Sinto que vivi em Cabo Verde uma tripla discriminação, tudo muito parecido com a realidade brasileira, onde roupas de dilla (tecidos africanos), cabelos e barba longos e a militância pan-africana, são utilizadas por artistas como adereços em festas a fantasia em eventos de caráter cultural. Não abri mão do que eu sou e da minha consciência, e paguei um preço por isso.

Em Cabo Verde eu poderia dedicar-me a arte educação e até trabalhar com músicos que conheci, mas isso exigia minha total dedicação, e a minha inquietação no campo da história não permitiu dividir-me, decidi-me pela história. O sistema de contratação que eu encontrei no país era feito por inscrição de vagas ou indicação, em nenhuma das duas formas tive sucesso. Eu teria que construir um caminho com toda a criatividade, produção e perseverança possíveis.

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Meios de trabalho

Aperfeiçoei o projeto de pesquisa apresentado em 2011 no CODESRIA, ampliando-o a uma investigação sobre o lugar das civilizações da Antiguidade Clássica africana em programas e livros didáticos no Cabo Verde e no Brasil. A Antiguidade Clássica africana é uma classificação empregada por Cheikh Anta Diop (1989, pág. 43), para designar as primeiras grandes civilizações do Vale do Nilo, como Antigo Egito e Etiópia.

Resolvi trabalhar Brasil-Cabo Verde como estudo comparado porque, em primeiro lugar, percebi que havia um problema educacional com a mesma origem dentro das duas sociedades. Em segundo, porque ter nascido no Brasil me facilitava à candidatura regular para uma bolsa de mestrado em alguma uma universidade brasileira, que convertida na moeda de Cabo Verde significava um modesto salário de professor, e no Brasil eu poderia contar com a casa de minha família.

Circunstância: Ntu

Aguardando a abertura de algum mestrado em Cabo Verde pelo qual pudesse financiar e orientar esse projeto, li um artigo sobre filosofia Bantu intitulado NTU, escrito pelo engenheiro, historiador e filósofo Henrique Cunha Jr., professor da Universidade Federal do Ceará. O professor Henrique Cunha Jr. tinha um vasto histórico nacional de militância no movimento negro, ao mesmo tempo em que uma carreira de caráter internacional em ciências humanas e exatas. Identifiquei-me pelo tema inserido na filosofia africana, e por suas referências bibliográficas e pelo diálogo com George G. James, Theóphile Obenga, Ivan Sertima, Martin Bernal e Cheikh Anta Diop. Uma abordagem completamente diferente do que eu estava acostumado a ver no Brasil, tanto pelos escritores racistas quanto pelos creditados como conscientes.

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INTRODUÇÃO ________________________________________________

A história situa-se no centro da sistematização da gestão científica e cultural da existência dos povos negros.

Penda Mbow

Importante, nossa pesquisa foi de ordem qualitativa e nosso estudo de caráter preliminar. Por isso, não tivemos a pretensão de atingir altos índices de quantidade de materiais analisados ou de pessoas entrevistadas. Terminamos o nosso trabalho cientes de que apenas uma primeira fase se encerrava, ousamos testar na teoria e na prática um estilo de trabalho cientifico pan-africano, proposto pelas gerações anteriores de historiadores da África.

Podemos dizer que nosso trabalho de investigação é militante em diferentes sentidos: 1) a qualidade do ensino de história africana foi preocupação comum às primeiras gerações de historiadores da África, lideranças de movimentos nacionalistas; 2) a Metodologia de Pesquisa Geral proposta por Joseph Ki-Zerbo estrutura-se sob duas colunas fundamentais: o Pan-africanismo e a Unidade Federal do Continente africano ; 3) durante todo o nosso trabalho dialogamos com clássicos da história e historiografia africana; 4) realizamos um estudo comparado entre o ensino de história em dois países, Cabo Verde (África) e Brasil (América do Sul); 5) não trabalhamos sob a sentença eurocêntrica sujeito-objeto de pesquisa, mas entre sujeitos da pesquisa; 6) propusemos e colocamos em prática no final do nosso trabalho alternativas para colaborar com a resolução dos problemas que identificamos no percurso da pesquisa.

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Esta Introdução Geral foi baseada no meu projeto de mestrado, as alterações sobre o documento original resultam das leituras, orientação, criticas, trabalho de campo e da defesa do mestrado. As alterações que não decorrem dos motivos acima citados são consequência dos avanços da minha própria consciência histórica enquanto investigador, professor e militante pan-africanista.

i. Interesse pela consciência histórica

A investigação apresentada é sobre o ensino de História da África no qual nosso campo de análise abrange manuais e programas de história utilizados por escolas em Cabo Verde e no Brasil cujo foco de atenção são as civilizações africanas da antiguidade clássica, neste caso o antigo Egito, situado no leste do continente africano. Nossa investigação teve como parâmetro instrumental, ou referencial, textos clássicos da historiografia africana sobre metodologia e antiguidade, alguns deles inseridos na História Geral da África (UNESCO).

Em nosso trabalho tratamos por clássicos da historiografia africana documentos científicos dotados de propósitos libertários reconhecidos por organizações, movimentos sociais e militantes. Neste sentido, Cheikh Anta Diop, Walter Rodney e Joseph Ki Zerbo são referências principais para esta pesquisa, pois produziram intensamente, do período agitado das lutas de libertação nacional africanas, durante a década de 1950, às problemáticas neocoloniais da globalização do final do século XX. Para estes historiadores, não houve dicotomia entre o trabalho científico e a militância política nacionalista\anticolonial.

Destacamos algumas convergências entre os teóricos supracitados enquanto elementos que serviram como base para nossa pesquisa: a militância em movimentos sociais, o apelo à integração africana, o combate ao racismo, o reconhecimento do legado para África das civilizações da antiguidade africana, a preocupação com a qualidade de manuais de história, a valorização da oralidade, a compreensão das consequências do sistema colonial para o continente africano, a consciência histórica e a identidade africana.

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nacionalista anticolonial os fatores em questão eram o sentido de construção das sociedades libertadas, a coesão nacional, a integração de territórios, a identidade e a restauração da consciência histórica.

A coleção História Geral da África produzida pela Organização das Nações Unidades para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO, entre as décadas de 1960 e 1980 é uma obra pensada dentro deste propósito de descolonização, nela existem variados e controversos posicionamentos sobre a história da África, mas mesmo assim, este documento reúne clássicos da historiografia africana. Dividida em oito volumes, os Livros I e II, sobre metodologia de pesquisa e história antiga, foram bases importantes para a nossa pesquisa, pois contaram com a participação decisiva dos historiadores Joseph Ki Zerbo e Cheikh Anta Diopág. O objetivo desta Introdução é delimitar o conjunto de elementos teóricos, conceituais, metodológicos que estruturam o nosso trabalho.

ii. Delimitações do campo de pesquisa

O projeto da História Geral da África nasceu durante as décadas de 1950 e 1960, sob um contexto de forte movimentação de luta anticolonial no continente africano. Kwame N’krumah do Gana, Amílcar Cabral de Cabo Verde e Guiné Bissau, Julius Neyrere da Tanzânia, Sekou Turé de Guiné Conacri, Jomo Kenyatta do Quênia e muitas outras lideranças de movimentos nacionalistas anticoloniais advogaram a criação de escolas capazes de popularizar a educação e de construir conteúdos programáticos voltados à conscientização e identidade africana.

Entre o final da década de 1950 e o início dos anos de 1960, a preservação, o ensino e a pesquisa de História da África foram temas de congressos de historiadores africanos realizados no Gana e na Tanzânia. A Organização da Unidade africana (O.U.A.) criada no ano de 1963, em Adis Abeba (capital da Etiópia), por Estados africanos independentes, influenciou um projeto para confecção de uma obra sobre a história do continente africano que fosse formulado e financiado, cuja proposta foi à reformulação do sistema de ensino e a unificação curricular continental, enquanto etapas do processo de descolonização da história da África.

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da obra durou mais de vinte cinco anos, contando com a participação de aproximadamente 350 especialistas africanos e não africanos. Entre os cientistas selecionados para formar o Comitê de redação da História Geral da África estavam Joseph Ki Zerbo do Burkina Faso, Cheikh Anta Diop do Senegal e Walter Rodney da Guiana, autores de obras importantes para a historiografia africana, críticos da qualidade dos manuais (livros didáticos) utilizados por escolas e militantes de movimentos políticos anticoloniais.

A História Geral da África teve seu primeiro lançamento parcial na França, no final da década de 1970 e foi publicada posteriormente em inglês, francês e árabe, e tiveram edições resumidas em inglês, francês, árabe, Suahili, peule, haussa, em português, chinês, espanhol, japonês, italiano e fulani. Os Livros I, II, IV e VI foram lançados no Brasil em português pela Editora Ática enttre 1981 e 1982.

Durante as décadas de 1970 e 1980 historiadores negros no Brasil criticavam a tradição historiográfica colonial no país, conduzida pelo que o escritor Clóvis Moura denominou de intelectuais do sistema escravista. No final da década de 1980, com o apoio do Ministério da Cultura, um projeto para confecção de uma História Geral do Negro no Brasil começou a ser confeccionado sob a direção de Clóvis Moura, Décio Freitas e Joel Rufino, mas o mesmo não foi adiante. No final da década de 1980, com o apoio do Ministério da Cultura, um projeto para confecção de uma História Geral do Negro no Brasil começou a ser confeccionado sob a direção de Clovis Moura, Décio Freitas e Joel Rufino, mas o mesmo não foi adiante.

Esta tradicão historiográfica escravista brasileira (e de intelectuais do sistema escravista no Brasil) possui uma correspondência com a historiografia colonial, muito presente no continente africano do século XX e está ligada a distribuição diminuta das edições da História Geral da África no país, ou a forma de ignorar a existência da obra. Por sua vez, estes fatores influenciaram o desconhecimento dos autores, instituições e ideias que fundamentaram a metodologia e as teorias presentes na História Geral da África.

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que objetivou ampliar a difusão e a utilização pedagógica dos conhecimentos inseridos na obra.

A participação das organizações do movimento social afro-brasileiro, ou organizações do movimento negro, na III Conferência Mundial Contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada na cidade Sul-africana de Durban, entre 30 de Agosto e sete de Setembro de 2001, serviu de base para criação de politicas públicas de Ação Afirmativa, direcionadas a população negra no Brasil. A finalidade teórica destas politicas de ações afirmativas foi compensar as injustiças e discrepâncias sociais vividas pela população negra em diferentes setores sociais, a começar pelo acesso a educação de qualidade.

A partir de 2002, políticas de ação afirmativa começaram a ser implementadas no país sendo a primeira delas reserva de vagas para estudantes negros em universidades públicas. No ano de 2003, o governo brasileiro sancionou a Lei Federal 10639\3 que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394\96, e o parecer CNE-CP 003-004, tornando obrigatório o ensino de História e Cultura da África e do Afro-brasileiro em escolas e universidades de todo o país. Complementar a lei 10639\3, em 2004 foi publicado as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e africana. Este documento indica a pertinência da vida e obra de Cheikh Anta Diop e das contribuições da ciência e das filosofias ocidentais do Antigo Egito para o ensino de História da África no Brasil.

A União africana - U.A. (antiga Organização da Unidade africana) realizou um pedido formal à UNESCO em 2007 para organização definitiva do uso pedagógico da História Geral da África, objetivando com isto a adoção da História Geral da África como base de um currículo comum dentro do continente africano. Por conseguinte, a partir de 2009 a UNESCO e a União africana iniciaram efetivamente a confecção do Uso Pedagógico da História Geral da África, com a realização de um diagnóstico quantitativo-qualitativo sobre o ensino de História da África e a utilização da História Geral da África em países africanos. Segundo o profº. ISSIFOU (2010, pág. 5), um dos coordenadores do diagnóstico e relator do documento “Estado atual da História Geral da África”), a disponibilidade de exemplares da coleção em países africanos ainda é mínima.

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organizada pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), e pelo Ministério da Educação do Brasil (MEC). Desde então, toda a obra pode ser consultada em acervos digitais da UNESCO ou adquirida em livrarias. Este relançamento da História Geral da África sinalizou uma oportunidade de diálogo com autores de difícil acesso em língua portuguesa, como Cheikh Anta Diop, Walter Rodney, Teophile Obenga, Alexis Kagame, G.Mokhtar, B. A. Ogot, S.K.B. Asante, B.O.Oloruntimehin e dezenas de outros.

Contudo, o próprio relançamento da coleção e as leis que tornam obrigatório o ensino da História da África, não são suficientes para enfrentar as tradições eurocêntricas da história nas perspectivas escravistas e coloniais. Para além do enfrentamento necessário, nossa ambição é continuar o trabalho dos clássicos da historiografia no campo educacional e de pesquisa, foi por isso que estabelecemos como marco teórico conceitual as contribuições de Cheikh Anta Diop e Joseph Ki-Zerbo.

iii. Marco Teórico Conceitual

A afirmativa de que o continente africano é o berço da humanidade é assinalada com os avanços das pesquisas científicas no campo da antropologia, paleontologia, geologia, botânica, genética e arqueologia realizada nos últimos oitenta anos. A posição do Planeta Terra em relacão ao sol permitiu que a intensidade energética dos raios solares fosse absorvida e ativasse processos de transformação macro e micro biológicos na região meridional, leste e sul, do continente africano, o mesmo não foi possível na Europa devido à baixa intensidade de raios solares, uma região dominada por geleiras.

Por motivos geoclimáticos a vida humana no planeta terra iniciou-se na região dos grandes Lagos, próximo ao atual país Uganda, no Leste africano. Até a década de 1950, os achados arqueológicos mais antigos da raça humana (Australopitecos africanos), taxado entre 6 e 1 milhão de anos, haviam sido realizados na África do Sul por pesquisadores como Raymond Dart. A partir destes achados arqueológicos, as regiões da África Austral, Sul e Meridional, tornaram-se focos de pesquisa de arqueologia e paleontologia.

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de 1970, pesquisas realizadas na Etiópia descobriram hominídeos com cerca de três milhões de anos. Todavia, duas tendências dividiam as opiniões de cientistas, uma foi a monocêntrica, baseada na ideia de que em 70 milhões de anos ocorreram em solo africano todas as transições entre primatas (australopitecos) e os humanos modernos (homo sapiens–sapiens). Neste sentido, as diferenciações fenotípicas estão associadas a fatores geoclimáticos (Eras Glaciais) do planeta Terra. Outra tendência foi a policêntrica, em que seus teóricos não discordavam das evidencias arqueológicas no continente africano, mas defendiam que migrações fizeram com que o homo erectus habitasse o continente africano, europeu e asiático, proporcionando que este homo (erectus\ australoptecus) evoluísse de maneira distinta.

Considero que fica difícil sustentar a poligênese diante o fato de que os mais antigos fósseis de homo sapiens encontrados na Europa possuem cerca de 40 mil anos, e que em regiões do Quênia e Etiópia os fosseis mais antigos de homo sapiens-sapiens datam com mais de 130 mil anos. O homo sapiens europeu também denominado homem de Grimaldi não possui mais de 40 mil anos e migrou do continente africano para a Europa durante a era glacial através do istmo de Gibraltar, atual estreito de Gibraltar, a cerca de 50 mil anos. Estes africanos passaram por um processo de despigmentação e adaptação às condições geofísicas da Europa durante a Era do Gelo, sob o contexto dos estratos médios do período quaternário. No final do século XX, escavacões em Hadar, Etiópia, revelaram um fóssil de 52 ossos de esqueleto de homo sapiens com mais de 4 milhões de anos, nomeado Birkimesh, que significa você é uma pessoa de valor em amárico.

No último quarto do século XX foi iniciado nos Estados Unidos o Projeto Genoma Humano, voltado ao estudo da constituição genética total do indivíduo. No ano de 2001 ocorreu o Congresso da Organização do Genoma Humano, que revelou – entre outras questões, que os europeus modernos descendem de africanos migrados para o norte do mediterrâneo entre 20 e 25 mil anos. A tese politeísta foi abalada pelos resultados do Projeto Genoma Humana, e neste sentido, sua fundamentação ideológica racista ficou mais evidenciada.

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Por isto, consideramos que no contexto da década de 2010, a frase “África berço da

humanidade” é um mero slogan, vazio da força transformadora que emana do conhecimento

verdadeiro, um berço somente não nos satisfaz. Um berço, é uma condição infantil que não capacita o sujeito histórico africano de ter sido o emérito edificador das primeiras civilizações complexas como Núbia e o antigo Egito. O sedentarismo e as migrações inter-africanas são dois aspectos importantes para a compreensão da origem das civilizações a partir da região dos Grandes Lagos, estas primeiras civilizações constituíram-se como impérios, centros de peregrinação e conexão entre as cinco regiões do continente africano na antiguidade clássica. Superamos a condição berço, avançamos sobre o autodesenvolvimento intelectual, a técnica, a ciência, a sociedade, o Estado e os sistemas jurídicos e econômicos que o compõem.

E é deste ponto fundamental de reorganização do sentido histórico que optamos por uma teoria da história que respeite as especificidades do tempo e do espaço africano, uma teoria da história fora do controle ideológico racialista e condicionada a experiência prática, em hipótese alguma fora dela. Nosso marco teórico conceitual divide-se entre a Metodologia Geral de pesquisa em História da África, proposta por Joseph Ki-Zerbo, e as teorizações de Cheikh Anta Diop sobre as civilizações da antiguidade africana clássica (Antigo Egito\Nubia). Neste trabalho, o continente africano é considerado em sua unidade, a partir de sua totalidade física, geográfica e cultural. A unidade, neste sentido de totalidade, é a base nuclear da Metodologia Geral de Joseph Ki-Zerbo.

O historiador Gamal Mokhtar ilustra-nos a importância da metodologia de Ki-Zerbo dentro do contexto em que foi criada entre as décadas de 1960 e 1970:

Até aqui, costumava-se situar o início da história da África subsaariana no século XV da Era Cristã, e isso por duas razões principais: a penúria de documentos escritos e a clivagem dogmática que os historiadores costumam estabelecer mentalmente entre essa região do continente, de um lado, e o Egito antigo e a África do Norte, de outro. A despeito das lacunas e insuficiências das pesquisas efetuadas, este volume contribui para mostrar a possibilidade da existência de uma unidade cultural do conjunto do continente nos mais variados domínios. (MOKHTAR, 2010, pág. 862)

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europeia no continente africano no século XIX. O general e estadista de Cartago naquela época era Annibal (247-183 a.C).

As civilizações da antiguidade clássica africana do Vale do Nilo1, como o antigo Egito e a Núbia, detiveram um grau elevado de auto-desenvolvimento educacional, jurídico, político, econômico e tecnológico, que as permitiu estabelecer rotas de migração intercontinental. Estas migrações serviram de base para formação de grandes Estados e Impérios, como Gana e Nok na costa oeste africana. Podemos citar grandes complexos civilizacionais africanos na antiguidade e suas correspondências contemporâneas de acordo com as pesquisas de Cheikh Anta Diop (1987, pág. 213): Núbia-Egito; Uganda-Ruanda-Burundi; Tanzânia-Quenia-Zaire; Zimbábue-Moçambique; Botswana; Madagascar-Comores; Namíbia-Zâmbia; Congo-Angola; Nigéria-Camarões; Gana-Burkina-Costa do Marfim; Senegal-Guiné-Mali; Mauritânia; Marrocos-Tunísia-Argélia; Chade-Líbia. Nossas atenções estão direcionadas ás civilizações da Núbia e do Egito.

Na antiguidade africana, o Egito localizava-se ao norte do mar mediterrâneo, Sul e Sudeste entre Núbia e Etiópia, e a Oeste pelo deserto da Líbia. Kemet é o nome vernáculo do antigo Egito, que e significa “terra de pretos” ou “terra de negros”. As primeiras culturas da região datam de cerca de 10.000 a.C. e foram elas que configuraram parte significativa do que veio a ser a civilização do Kemet ( antigo Egito ) no quarto milênio a.C.

De acordo com o pesquisador Asante (1992), a partir da unificação das regiões ao sul e ao norte do rio Nilo, por volta de 3500 a.C., o império do Egito foi fundado e perdurou até 50 a.C. A periodização do Kemet é composta por 26 dinastias reais subdivididas em períodos de grande prosperidade (as Três Eras de Ouro) e os Três Períodos de Instabilidade.

Conforme o Dicionário da Antiguidade africana (2004), a Núbia foi conhecida pelos habitantes do antigo Egito como Ta Seti - Terra do Arco, estava localizada ao redor do Rio Nilo, no atual Sudão e dividiu-se em: Baixa Núbia - entre as primeira e segunda cataratas do Rio Nilo; Dongola, após a terceira catarata; Cush, entre a quarta e quinta cataratas, finalizada por Uauat mais ao Sul do Nilo. Cush foi o primeiro grande Estado da região, e base para a criação das civilizações de Napata e Meroé. De acordo com Cheikh Anta Diop (1954, pág.73), a região da Núbia foi o ponto de partida para a construção do antigo Egito e de outras

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Figura 1: O Quilombismo
Figura 2: Encontro de integrantes do Núcleo   de Consciência Negra Lélia Gonzales com
Figura 4: MusikFabrik atelier  Os  professores  Renato  Emerson  e  Antônio  Espirito  Santo  foram  bases  muito importantes para a minha formação na época, tenho grande gratidão pelas oportunidades que  ambos  me  proporcionaram
Figura 5: Oficina de Construção de instrumentos  musicais realizada na Fundação Amílcar Cabral,
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