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conhecer as piores dores devido principalmente â sodomia e à

sua

insaciabilidade»

Pedro vai

crucificâ-la,

explorando-a e

maltratando-a,

sem que ela consiga evitá-lo»

Por

isso diz,

metaforicamente,

que ele sai de seu quarto

"ainda

lambendo o

sangue",

como uma fera a se limpar após o banquete sangrento»

A

Em seus encontros no apartamento de programa, a P o l a q u i n h a usa urn vestido vermelho, o que sugeres que ela se porta corno uma posta de? carne sangrenta e que se veste tal como o macho a concebe. Um dos fregueses diz, por telefone, que ê a "fera que lambe a primeira gota de sangue" (p.147). Outro ê mais explicito e afirma ao penetrá-las "tiro sangue» Quero beber o teu sangue" (p. 153). A sua função ê ser repasto destes homens embrutecidos que a buscam para saciar uma fome animal. E todos sâfo movidos pelo desejo de fazê-la sangrar (tal como João) para provar viri 1 i d a d e .

Do começo ao fim da sua trajetória ela se mostra como um 'carnaval de sangue' (p.26), como vitima que vai ser v a m p i r i z a d a

Por isso, Pedro vai ser apresentado com traços vampirescos. Ele desespenha este papel porque é a síntese de todos os homens que exploraram a protagonista e é a antecipação dos que apa r ec e m depois que ela se torna meretriz. A caracterização v ampiresca é uma das constantes na obra de Trevisan. Na d e s c r i ç S o de Pedro a narradora salienta o seu dentes CD "brilho do canino de ouro" - o que reflete o desejo s á dico de d e v o r á -l a e também a i m possibilidade de conseguir alguma recompensa econômica, pois toda ax riqueza de Pedro é? o ouro que e 1 e t ra z n o d en te .

Assim, o fato do romance começar com a primeira m e n struação é s i g n ificativo para ax história, pois é a partir d aq u e l e momento que a mulher fica pronta para o homem que, agindo como um vampiro, começa a sugá-la. Através da vampirizaçSío, o

macho m a ntém o seu domínio, tentando destruir a mulher por neta a aceitar (enquanto 'outro') com os mesmos valores e direitos do eu» Berta Waldman, que desenvolveu sua tese sobre a imagem do vampiro, e s t e n d e n d o - a ao nível da linguagem, nota que "sugar o

outro remete (...) á impossibilidade do convívio com a diferença,

à existência confinada a um cerco em que sò é admitido o eu (1 1 2 , p. 11). NSto obs t a n t e tudo isso, o comportamento dos machos ê tido como normal - porque de acordo com a sociedade falocrática. Nota R . A . Franconi, c: o m muito a c e r t o , que P e d r o r e p r e s e n t a o supermacho, o campeSo s e x u a l , cuja virilidade n3o tem limites. E isso não è algo destoante. Ele está sintonizado com os códigos da s o c .1 e d a d e m a c h i s t a s

"0 calvário da Polaqu i n h a ê submeter-se; ao poder desse homem que catalisa os poderes de um sociedade que o enaltece. E e 1 a q u e m p e r g u. n t a s

-Ouviu falar em priapismo?

Ele, claro, ignorante como é, nâo sabe o que isso s i g n i f i c a , nun ca ou v i u a p a1av ras com provand o q ue, em seu mun d o , o seu desemp e n h o sexual é normal. Logo, n'à'o catalogâvel por palavra desconhecidas o universo em que circula mitifica a sua atuação sexual" (132, p.é>0).

Como disse Hélio Pólvora, Dalton fez do vermelho a cor- mestre de suas ficçfoes„ "0 vermelho terá de ser a cor das suas

paixões e desditas, no amor quanto no casamento. 0 escritor

precisa ser vampiro a fim de revelar todo esse sangue

subterrâneo, vertido no anonimato mais cruel" (82, p.40). A

o b s e s s ã o por esta cor e x p ressaria que a mulher ê uma sorte de a l i m e n t o para os homens» Sem direito a prazer, poder e saber, ela é levada a se anular em proveito do outro, concluindo, no final das contas, que eu é você,

De P o l onesa a Polaca

Talvez seja importante a análise das implicações s e m â n t i c a s do nome que a protagonista recebe» Em seu livro Os P r a z e r e s da Noite, liargareth Rago d ei xa escrito que "é preciso l e m br ar que a e x p r e s s d O 'polaca', bastante difusa, não recobria a s m e s m a s s i g n i f i c a <; Üe s n o p a í s c::o m o u m t. o d o » Se, de u m a m a n e i r a geral, des i g n a v a as polonesas, nem s e m p r e era s i n ôn i m o de prostituta, como nos estados onde a imigração eslava havia sido maior; Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul" (145, p„292)» Como o r omance se passa em Cu r i t i ba , q ua 1 se r i a o sen t .i.d o

implícito no nome da protagonista?

0 ideal é começar a ver como esta palavra foi u t i l i z a d a pelo autor em suas obras anteriores e quais são os

d esv i o s s e m â n t i c o s que ela poderia ter dentro de um painel municipal» Já sabemos que?, de? acordo com o dicionário, a palavra ‘polaca' significa "meretriz e s t r a n g e i r a " » E, segundo M» Rago, esta acepção não seriai válida para Curitiba»

nSío tem sido levado em consideração pelos críticos que têm se d edicado ao estudo da obra do autor paranaenses o seu vínc u l o com a cidade. Diz eles "criador de um estilo literário, ele è também 0 homem com uma v isão particular de sua cidade? seria indispensável conhecer Curitiba para perceber toda a intensidade de sua arte e d es cobrir c o m o , afinal, nas páginas de Dalton Trevisan, C u ritiba acabou por ser uma cidade transformada em

1 i t e r a t. u r a " (6 7 ) „

T o r n a —se imprescindível conhecer a situação do polo nê s em C u ritiba para que se possa entender os sentidos do nome que a heroína recebe.

A figura da polaca pode ser encontrada ao longo da pro d u ç ã o de Trevisan, pois o polonês é um dos grupos étnicos de impor t â n c ia n u mérica em Curitiba. Polaca ê a colona que?, nos t e m p o s p r é .i n d u s t r i a i s , s a i n d o d a s c o 1Ô n i a s d o P i 1 a r z i n h o e d a B a r r e i rinha (hoje bairros urbanos), percorriam o centro da cidade v e n d e n d o p r o d u t. o s h o r t i g r a n j e i r o s . S u a a t. i v i d a de era, basicamente, a g r á r i a e por isso estavam relacionadas com uma C u ritiba mais primitiva (a da infância de Dalton),,

Num dos textos de Misté r i o s de Curitiba, o autor f a z u m c o n t r a p o n t o e n t. r e d o i s t e m p o s ( q u e p o d e r .1a m s e r c h a m a d o s de colonial e industrial ou de primitivo e moderno), e x p l i citando a sua p r e ferência por aquele. Pode-se dizer que ele n'So procura só a Curitiba perdida, mas sim a sua infância. Nesse sentido, buscar a cidade de o u t rora é buscar a si mesmo, perdido junto com a urbe. As polacas, neste texto, sâo peças de um mundo apagado e

idílico que o autor procuras "Curitiba cedo chegam as carrocinhas com as polacas de lenços coloridos na cabeça . g a l i i i .nha-òóò-vos

nâfo é a p rotofonia do Guarani?" (6, p.84). A polaca colona representa, de uma certa forma, a própria cidade com seus hábitos p r o v incianos e primitivos. Penderíamos nos perguntar; sêto as c a r r o ç a s que chegam cedo ou é a cidade que estava em seu período mat i n a l ? As duas possibi l i d a d e s sstefo corretas,, Esta cidade nova que amanhece (suas ruas ainda eram de barro) é teto colorida (para os olhos do autor) como os lenços das polacas»

N u in m o m e n t. o d e n o s t a 1 q i a , e 1 e , r e c u s a n d o v i. ver n a c i dade 'moderna' ,, d i z : "Eu sou da outra,, do relógio da praça O s ó r i o que marca implacável seis horas em ponto? dos sinos da igreja dos Polacos, lá, vem o crepútsculo nas asas de um m o r c e g o5 do bebedouro na pracinha da Ordem, onde os cavalos de sonhos dos

piás vâ'o beber água" (6, p.8é>). A referência aos polacos marca,, uma ves mais, a sua adesãfo a um mundo colonial (a suas igreja ficava "lá", isto é, na colônia) que se contrapõe ao outro em que ele está, mas ao qual n'ào pertence. Este sentido ê corroborado pela r eferência ao bebedouro do Largo da Ordem,, cejnt.ro histórico da urbe, onde os cavalos de sonhos dos piás vão beber água. Veremos mais adiante que esta nostalgia, se dá devido a um processo de i n d u s t r i a1izaçâo que em pouco mais de uma década t r a n s f o r m o u a c i d a d e p a c a t a nu m a p e q u e n a m e t. r ó p o 1 e „

P o d e r s e .ia dizer que, neste t e to de Trevisan , o polaco está integrai d o à província de feições rurais. As polacas

f u n c i o n a m como media d or a s entre campo e cidade,, De uma certa forma n ão seria errado pensar que; o polaco tinha conseguido a l guma autonomia no painel social tão e s tratificado de Curitiba, cidade que é composta por uma grande número de e t n i a s . Mas, diga- se uma vez mais, esta v i s ã o está distanciada no tempo»

As polacas também aparecerão — através da r e m i n s c é n c i a do narrador relacionadas ao momento da a d o l e s c ê n c i a do autor» No conto 'Que Fim Levou o Vampiro Louco de Curitiba?' (publicado em O P á ssaro de Cinco Asas), Dalton se refere ás polaquinhas: "Que fim levaram as doces polaquinhas do S o b rad i n h o , P e ti t Palais. Quinta C o 1un a , P o m ha 1 e 111, n as camisolas de cetim coloridas como túmulos festivos de Araucária e que por um copo de cerveja preta, nos iniciaram a mim e a você? no alegre mis t é r i o da carne?" (9, p. 8 8) „ Aqui as polacas já estSto sem os seus lenços coloridos, mas com camisolas -• que se a sseme l h a m a túmulos» Esta analogia, somada à muda n ç a da peça do v e s t u á r i o (lembremo-nos que o lenço é usado por quem trabalha no campo - devido ao sol e a camisola é uma peça intima) mostra que as polacas já se encontram em uma outra situação. Elas d e i x a r a m de ser colonas e tornaram-se prostitutas m a l — remuneradas •■■■ pois iniciam aos homens por um copo de cerveja» Estas mudanças e s t ã o r e 1 a c i o n a d a s c o m as a 1 1e r a çcí e s s ò c i o - e c o n tt m icas d a c i d a d e e se dão num curto período de tempo» No outro texto que citei, as p olacas-colonas pertenciam à Curitiba da infância do narrador (o que pode ser depre e n d i d o da referência aos 'cavalos de sonhos dos piás'), enquanto que nesse último as polaquinhas pertencem à urbe da adol e s c ê n c i a do narrador (e por extensão do autor) -• elas que

o iniciaram nos m i s t é r i o s da carne. Nao podemos nos esquecer, porém, que este período é visto com nostalgia - pois é o tempo de uma vida boêmia e n'à'o uma fase degradante»

Mas, por outro lado, é indiscutível que esta última refer ê n c i a ao papel social desempenhado pelas polacas marca o inicio de uma nova época» Elas, nâo mais integradas à suai colônia e à suai vidat semi — rural, j és fazem parte de uma subclasse urbana.

Num outro momento, Dalton usa a palavra polaquinha tal como a define, em seu sentido pejorativo, o dicionário!

Bem que eu soube, João. — O que, meu bem?

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