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II. REVISÃO DA LITERATURA

3. A QUISIÇÃO DA L INGUAGEM E SCRITA ANTES DA A PRENDIZAGEM F ORMAL

3.2. Consciência Fonológica

Nos últimos anos a consciência fonológica tem sido uma das dimensões linguísticas mais estudadas na relação com a aprendizagem da linguagem escrita. Na língua portuguesa, os trabalhos de Sim-Sim (1998), Silva, (2003) e Veloso (2007) refletem o interesse pelo impacto desta competência na apropriação do código escrito. A consciência fonológica é uma competência metalinguísticas que reenvia para a capacidade das crianças refletirem sobre os sons da fala.

elementos fonológicos, ou fonemas, correspondem então, a unidades distintivas (Mateus, et al., 1990).

De acordo com Cunha e Cintra (2000), «toda a distinção significativa entre duas palavras de uma língua estabelecida pela oposição ou contraste entre dois sons revela que cada um desses sons representa uma unidade mental sonora diferente. Essa unidade de que o som é a representação (ou realização) física recebe o nome de FONEMA» (p.28).

Mas tal como foi referido anteriormente, as letras do alfabeto não correspondem aos fonemas, verificando-se, em muitos sistemas de escrita como o Português, um número maior de fonemas do que de letras do alfabeto. Desta forma, a transcrição dos sons do Português, representados através do Alfabeto Fonético Internacional – notação linguística desenvolvida para tentar representar os sons das diferentes línguas – é apresentada de seguida (Freitas & Santos, 2001):

Vogais e semi-vogais

[a] pá [e] cedo [i] vi [ ] pó [u] tu [ ] cola, [ ] pé [j] pai, põe [o] avô [w] pau, mão

[ ] de [ö] pouco

Consoantes

[p] pano [f] fato [m] mão [l] lado [b] bola [v] vela [n] não [ ] mal

[t] tudo [s] sol [ ] venho [ ] velha [d] dado [z] zelo

[k] copo [ ] já [ ] caro

[g] gato [ ] chave [R] roda

Além das nove vogais orais ([a], [ ], [e], [ ], [ ], [ i ], [o], [ ], [u]) e das três semi- vogais ([j], [ö], [w]) em cima representadas, Defior, Martos e Cary (2002) referem ainda cinco vogais nasais ([ ], [ ], [ ], [õ], [ ]). As vogais orais [ ], [e], [ ], [o] são consideradas

elementos fonológicos, ou fonemas, correspondem então, a unidades distintivas (Mateus, et al., 1990).

De acordo com Cunha e Cintra (2000), «toda a distinção significativa entre duas palavras de uma língua estabelecida pela oposição ou contraste entre dois sons revela que cada um desses sons representa uma unidade mental sonora diferente. Essa unidade de que o som é a representação (ou realização) física recebe o nome de FONEMA» (p.28).

Mas tal como foi referido anteriormente, as letras do alfabeto não correspondem aos fonemas, verificando-se, em muitos sistemas de escrita como o Português, um número maior de fonemas do que de letras do alfabeto. Desta forma, a transcrição dos sons do Português, representados através do Alfabeto Fonético Internacional – notação linguística desenvolvida para tentar representar os sons das diferentes línguas – é apresentada de seguida (Freitas & Santos, 2001):

Vogais e semi-vogais

[a] pá [e] cedo [i] vi [ ] pó [u] tu [ ] cola, [ ] pé [j] pai, põe [o] avô [w] pau, mão

[ ] de [ö] pouco

Consoantes

[p] pano [f] fato [m] mão [l] lado [b] bola [v] vela [n] não [ ] mal

[t] tudo [s] sol [ ] venho [ ] velha [d] dado [z] zelo

[k] copo [ ] já [ ] caro

[g] gato [ ] chave [R] roda

Além das nove vogais orais ([a], [ ], [e], [ ], [ ], [ i ], [o], [ ], [u]) e das três semi- vogais ([j], [ö], [w]) em cima representadas, Defior, Martos e Cary (2002) referem ainda cinco vogais nasais ([ ], [ ], [ ], [õ], [ ]). As vogais orais [ ], [e], [ ], [o] são consideradas

Freitas e Santos (2001) define a consciência fonológica como a capacidade para manipular explicitamente (mover, combinar ou suprimir) os componentes sonoras das palavras. Acrescente-se que, no caso das línguas alfabéticas, se encontram três estruturas sonoras (unidades fonológicas) distintas nas palavras: a) as sílabas, b) os fonemas e, c) as unidades intrassilábicas (Goswami, 1998; Goswami & Bryant, 1990; Silva & Alves Martins, 2002; Silva, 2003; McBride-Chang & Ho, 2005).

As sílabas são as unidades sonoras mais salientes decorrentes da análise das palavras. Esta saliência perceptiva decorre, em grande medida, pela natureza coarticulada da consoante e da vogal, ou seja, a articulação é realizada ao mesmo tempo (Silva, 2003). A consciência destas unidades (por exemplo, /ga/ e /to/ de gato) pode ser definida como consciência silábica (Freitas & Santos, 2001).

Silva (2003) acrescenta que as sílabas são constituídas por unidades intrassilábicas do tipo ataque e rima. O ataque diz respeito à consoante inicial, ou grupo de consoantes iniciais da sílaba (por exemplo, /d/ em dar ou /fl/ em flor), a rima é constituída pela subsequente série de fonemas (ou seja, /ar/ de dar e /or/ de flor). A capacidade de identificar e manipular estas unidades (por exemplo /fl/ e /or/ de flor) é definida como a consciência intrassilábica (Freitas & Silva, 2001).

Relativamente aos fonemas, Silva (2003) define-os como sendo os segmentos fonológicos de menor dimensão. São a unidade sonora mais pequena que não pode ser analisada em unidades mais pequenas e sucessivas. Como já referimos, são a unidade que permite diferenciar uma palavra da outra. A identificação e manipulação dos fonemas (por exemplo, /v/, /e/ e /r/ de ver) denomina-se de consciência fonética (Tunner & Rohl, 1991).

Donde, se pode definir a consciência fonológica como a habilidade para reconhecer, distinguir e manipular componentes sonoros de tamanho diferenciado das palavras (sílabas e fonemas) de uma determinada língua (Gombert, 1990). Assim, a consciência fonológica é a consciência das diferentes unidades em que se podem segmentar as palavras e implica capacidades de manipulação, análise e reflexão sobre os diversos componentes fonológicos das palavras (Pufpaff, 2009). Todas estas competências de manipulação e reconhecimento dos componentes sonoros das palavras são considerados processos metalinguísticos. De acordo com Stanovich (1992) estes processos metalinguísticos “ should be viewed as a continuum ranging from ‘deep’ sensitivity to ‘shallow’ sensitivity. Tasks indicating deeper levels of sensitivity require more explicit reports of smaller sized units” (p. 317). O autor (1992) refere ainda que as capacidades das crianças em controlar e manipular essas capacidades fonológicas têm um carácter evolutivo (Pufpaff, 2009).

Fundamentando a concepção de continuum na consciência fonológica, Treiman e Zukowski (1991) realizaram um estudo onde pediram aos participantes (idade pré-escolar) que identificassem pares de palavras que partilhavam o mesmo som. Para avaliar se as palavras partilhavam sons, as crianças recorriam a uma boneca que ficava contente quando os pares de palavras tinham sons comuns ou triste quando os pares não partilhavam sons. Nas palavras que deixavam a boneca contente, as crianças tinham de identificar uma de três hipóteses: a) as palavras partilhavam uma sílaba, b) as palavras partilhavam consoantes de ataque, c) as palavras partilhavam uma consoante inicial ou final. Os resultados obtidos sugerem que a identificação dos pares semelhantes na unidade fonológica sílaba é mais fácil do que nas restantes. Verificaram ainda que a identificação de pares de palavras que partilham unidades intrassilábicas é mais difícil do que a identificação de sílabas, mas mais fácil do que a identificação de fonemas. Estes resultados sugerem que as unidades intrassilábicas constituem um nível intermédio entre a consciência de sílaba e a consciência de fonema. Desta forma, poder-se-á definir a consciência fonológica como uma competência multidimensional com tarefas menos (rimas) ou mais exigentes (segmentação ou análise fonética) na análise das unidades fonológicas (Treiman & Zukowski, 1991). Sim- Sim (1998) e Silva (2003) obtiveram resultados semelhantes na análise das competências fonológicas de crianças portuguesas de idade pré-escolar e escolar.

Para Gombert (1990) o desenvolvimento e evolução da consciência fonológica dá-se quando a criança consegue refletir sobre a linguagem oral e sobre a estrutura das palavras escritas, ou seja, quando mobiliza os processos metalinguísticos necessários para a apreensão da estrutura da linguagem escrita. Note-se que Gombert (1990) refere que as capacidades metalinguísticas constituem um subdomínio da metacognição. De acordo com Ouellette e Sénéchal (2008b) os processos metalinguísticos envolvidos na consciência fonológica podem ter maior ou menor sobrecarga sobre as estruturas cognitivas mobilizadas (por exemplo, sobre a memória de trabalho) em função da natureza da tarefa realizada (por exemplo, se são tarefas de segmentação, de manipulação ou classificação) e da unidade fonológica a analisar (sílaba ou fonema). As autoras (2008b) sugerem que as tarefas de segmentação são mais fáceis do que as tarefas de reconstrução e que estas são mais fáceis quando se trata de analisar unidades silábica do que quando se analisam fonemas.

Sintetizando, a consciência fonológica é uma competência multidimensional com diferentes níveis de dificuldade em função da natureza das tarefas metalinguísticas exigidas para o reconhecimento e análise dos segmentos orais (Gombert, 1990; Silva, 2003; Ouellette & Sénéchal, 2008b).

3.2.1. Consciência fonológica em crianças de idade pré-escolar.

Esta evolução dos processos metalinguísticos justifica, em parte, que as crianças desenvolvam em primeiro lugar, a consciência de sílaba, seguindo-se a consciência intrassilábica e, finalmente, a consciência fonémica (Treiman & Zukowski, 1991). Os resultados obtidos por Sim-Sim (1998) e Silva (2003) nos seus trabalhos realizados com crianças portuguesas sugerem que a consciência silábica surge precocemente e, muitas vezes espontaneamente, por volta dos 4/5 anos de idade. Posteriormente, e em consonância com os resultados de Treiman e Zukowski (1991), as crianças portuguesas parecem adquirir a consciência de elementos intrassilábicas (ataque – constituído por uma ou mais consoantes que aparecem antes do núcleo e da sílaba – e, rima – constituída pelo núcleo e as consoantes que se lhe segue). Treiman e Zukowski (1991) verificaram que do ponto de vista metalinguístico, a identificação e manipulação dos constituintes silábicos das palavras é uma aquisição natural e mais fácil para a maioria das crianças de idade pré- escolar, enquanto a consciência das unidades intrassilábicas e dos fonemas implica um nível de abstração superior e por isso mais complexo e exigente.

Seymour e Evans (1994) também avaliaram a capacidade de segmentar palavras em crianças de idade pré-escolar e no início da escolarização. Os autores (op. cit.) propuseram tarefas de produção de rimas e aliterações e tarefas de segmentação de monossílabos ou de não-palavras de estrutura simples (por exemplo, CV-CV) ou complexa (CCV-CV). Face aos resultados obtidos Seymour e Evans (1994) relacionaram o desempenho das crianças com um modelo hierárquico da sílaba. Assim, os autores (1994) distinguem um nível bidimensional - que corresponde à segmentação do ataque-rima -, um nível tridimensional - que corresponde à segmentação da consoante inicial, da vogal e da consoante final - e, por fim, um terceiro nível multidimensional - que corresponde à segmentação dos fonemas.

Treiman e Boron (1981) sugerem que a estrutura da sílaba é determinante para o sucesso das crianças nas tarefas de segmentação. Assim, de acordo com as autoras (1981) as sílabas com estrutura vogal-consoante são segmentadas mais facilmente do que as sílabas com estrutura consoante-vogal. A justificação para esta diferença resume-se, de acordo com as autoras (1981), no facto das sílabas com estrutura vogal-consoante terem um ataque que corresponde a um fonema inicial que se pode pronunciar isoladamente.

Relativamente ao português europeu, Sim-Sim (1998) e Silva (2003) sugerem que a consciência das unidades silábicas e intrassilábicas se desenvolve antes da aprendizagem formal, enquanto a consciência fonémica tenderá a desenvolver-se depois de iniciada a aprendizagem formal da linguagem escrita. Caravolas e Lander (2010) ressalvam que o reconhecimento dos fonemas é uma tarefa difícil, exigente e complexa, por se tratar duma

unidade muito abstrata que obriga a elevados níveis de reflexão metalinguística no processo de aprendizagem da linguagem escrita.

Num estudo de Sim-Sim (1998), com o objetivo de avaliar a linguagem oral de crianças de idade pré-escolar da população portuguesa, verificou-se que as crianças revelam mais capacidades nas tarefas de segmentação e reconstrução silábica do que nas tarefas de segmentação e reconstrução fonémica. Nas tarefas de reconstrução fonémica, 45% das crianças com idades entre os 5 anos e 8 meses e os 6 anos e 3 meses apresentavam uma taxa de insucesso total. Relativamente à segmentação fonémica, 60% das crianças na mesma faixa etária, apresentavam uma taxa de insucesso total.

De acordo com estes resultados Sim-Sim (1998), sugere que por a sílaba ser uma unidade “natural” e significativa no processo de análise dos componentes sonoros das palavras, as crianças portuguesas em idade pré-escolar têm resultados bastante superiores nas tarefas de segmentação e reconstrução silábica comparativamente com as tarefas de segmentação e reconstrução fonémica.

Alves Martins e Silva (2006) referem que o facto de algumas das competências fonológicas se desenvolverem mais ou menos espontaneamente, com exceção da consciência fonémica, sugere que só depois de aprendida a linguagem escrita se desenvolvem competências fonológicas mais sofisticadas de reflexão sobre a oralidade. Há por isso um vasto conjunto de trabalhos que relacionam as competências fonológicas das crianças de idade pré-escolar com a aprendizagem da linguagem escrita.

3.2.2. Consciência fonológica e a aprendizagem da linguagem escrita.

A relação entre a consciência fonológica e a aquisição da linguagem escrita tem sido objeto de diversos estudos (e.g. Silva & Alves Martins, 2002; Silva, 2003; McBride-Chang & Ho, 2005; Oullette & Senéchal, 2008a) realizados no âmbito da aquisição do princípio alfabético. Silva (2004) refere que “está demonstrado que as crianças chegam à escola com graus diversos de consciência fonológica em função da estimulação [a] que tiveram acesso” (p. 189). Também Ouellette e Sénéchal (2008a) sugerem que diferentes níveis de estimulação, especificamente na salas de atividades onde as crianças estão inseridas no pré-escolar e nos contextos familiares, conduzem a heterogeneidades assinaláveis nas competências fonológicas (e não só) demonstradas pelas crianças no início da aprendizagem formal (Lervag & Hulme, 2010).

Efetivamente, quase todos os trabalhos realizados (Silva & Alves Martins, 2002; Silva, 2003; McBride-Chang & Ho, 2005, Oullette & Senéchal, 2008a) têm evidenciado uma

relação entre a consciência fonológica e aprendizagem da linguagem escrita. Durante muito tempo existiu uma discussão sobre qual o sentido desta relação, ou seja, se a competência na consciência fonológica melhora com a aprendizagem da linguagem escrita ou, pelo contrário, será a consciência fonológica um elemento facilitador da aprendizagem da linguagem escrita (Caravolas & Landerl, 2010; Lervag & Hulme, 2010; Read & Treiman, 2013). Isto é, será a consciência fonológica uma competência prévia que condiciona a aprendizagem da linguagem escrita, ou, se pelo contrário, é desenvolvida a partir da apropriação do código escrito. Os diversos trabalhos realizados neste domínio têm baseados as suas investigações em três eixos (Silva, 2003):

1. a consciência fonológica, principalmente a consciência fonémica, desenvolve-se através da aprendizagem da leitura;

A posição dos autores (Morais, Alegria & Content, 1987; Morais, 1991a, 1991b) que defendem que a consciência fonológica é desenvolvida através da aprendizagem da leitura é sustentada com base nos argumentos de que a consciência segmental não se desenvolve espontaneamente e que é importante distinguir as diferentes modalidades de consciência fonológica (rimas, sílabas e fonemas). Acrescente-se ainda que a consciência das rimas e sílabas não são percursores da consciência fonémica, já que não constituem elementos críticos para a aquisição da leitura. Note-se que de acordo com Morais (1991b) é a aquisição da leitura que conduz ao desenvolvimento da consciência fonémica, através do desenvolvimento da consciência explícita das unidades fonéticas. Esta consciência explicita das unidades fonéticas só se desenvolve mediante algum tipo de instrução que é dada no momento da aprendizagem da leitura e da escrita (Alegria, Morais & Content, 1987).

Os estudos que suportam esta posição foram realizados com diferentes procedimento metodológicos: a) estudos comparativos entre população analfabeta e com sujeitos letrados em sistemas não alfabéticos (Morais, Cary, Alegria & Bertelson, 1979; Lukatela, Carello, Shankweiller & Liberman, 1995), b) estudos transculturais (Mann, 1986), e c) estudos sobre o desempenho das crianças em tarefas fonológicas quando iniciam a escolaridade e no final do primeiro ano de escolaridade. Estes estudos são relativamente antigos, refletido uma área de estudos de grande relevância nas décadas de 80 e 90 do século passado.

Morais, Cary, Alegria, e Bertelson (1979) compararam o desempenho de 30 adultos analfabetos com 30 adultos alfabetizados em idade adulta em duas provas fonéticas, uma de adição e outra de subtração de fonemas. Os resultados obtidos sugerem que os adultos não alfabetizados (taxa de sucesso de 19%) têm mais dificuldades em manipular as unidades fonéticas do que os adultos alfabetizados (taxa de sucesso de 72%).

Lukatela et. al (1995) testaram sujeitos servo-croatas que nunca frequentaram a escola em várias provas fonológicas. Embora nunca tenham frequentado a escola, o conhecimento dos participantes sobre o alfabeto cirílico diferia (desde menos de 50% das letras até à totalidade das letras). Os resultados obtidos pelos autores (1995) indica que os sujeitos que conheciam menos de 50% do alfabeto tiveram mais dificuldades na contagem e supressão de fonemas (taxa nula), revelando taxas de sucesso moderadas nas provas silábicas. Já os participantes que conheciam todas as letras tiveram taxas de sucesso significativamente superiores (perto dos 90%).

O estudo de Mann (1986) comparou o desempenho em tarefas de contagem e supressão silábica e fonética de crianças de idade escolar instruídas em diferentes sistemas de escrita. O primeiro grupo de crianças era instruído num sistema de escrita ideográfico japonês, o segundo num sistema de escrita silábico (Kana) e o terceiro num sistema de escrita alfabético americano. Tanto o primeiro como o segundo grupo tiveram resultados significativamente inferiores nas tarefas fonéticas do que o terceiro grupo, embora tenham tido resultados similares nas tarefas silábicas.

Os resultados obtidos nestes estudos (Morais, Cary, Alegria & Bertelson, 1979; Lukatela, Carello, Shankweiller & Liberman, 1995; Mann, 1986) sugerem que a aprendizagem da leitura, num sistema de escrita alfabético, contribui para o desenvolvimento da consciência fonética, evidenciando que é necessário dominar o código alfabético (alfabeto) para manipular corretamente as unidades fonéticas da fala. Mais, estes estudos indicam que as crianças demonstram uma clara progressão na capacidade de identificar e representar segmentos fonéticos à medida que dominam a leitura (Silva, 2003).

2. A consciência fonológica é um pré-requisito para a aprendizagem da leitura; Esta posição é suportada por vários autores (Wagner & Torgesen, 1987; Blachman, 1991; Bryant & Bradley, 1987) que consideram que existe uma relação entre as habilidades fonológicas que as crianças adquirem ao longo do período pré-escolar e a aprendizagem da linguagem escrita. Assim, as avaliações que se fazem das crianças antes do inicio da aprendizagem escolar assumem um carácter preditivo e podem funcionar como uma ferramenta para identificar crianças em risco (Silva, 2003).

Os estudos que suportam esta posição foram realizados em diferentes eixos: a) estudos correlacionais entre as habilidades fonológicas das crianças e a aprendizagem da leitura e da escrita (Tunmer & Nesdale, 1985), b) estudos correlacionais longitudinais sobre o sentido da relação causal entre as habilidades fonológicas e a aprendizagem da leitura (Bryant & Bradley, 1987; Bryant, Maclean, Bradley & Crossland, 1990; Caravolas & Landerl, 2010), e c) estudos com programas de treino (Bus, Marinus & Ijzendoorn, 1999).

No seu estudo, Tunmer e Nesdale (1985) controlaram o nível intelectual das crianças e estudaram a correlação entre a competência em segmentar palavras em fonemas e as habilidades das crianças na leitura. Os autores identificaram uma correlação positiva entre estas duas variáveis, ou seja, quanto maior a competência nas provas de segmentação fonética melhores os resultados na leitura.

Bryant e Bradley (1987) acompanharam 400 crianças de 4 e 5 anos num estudo longitudinal em que propunham aos participantes provas de rima e aliteração. Nestas tarefas, as crianças tinham de identificar, num conjunto de 4 palavras ditadas, aquela que não partilhava sons com as restantes. Três anos depois as crianças foram submetidas a testes de leitura, ortografia e aritmética e os autores verificaram uma correlação significativa entre o desempenho das crianças nas tarefas de rima e aliteração e o desempenho nas provas de leitura e ortografia.

Também num estudo longitudinal, Bryant, Maclean, Bradley e Crossland (1990) acompanharam 64 crianças desde os 3 anos e meio até aos 6 anos. Na fase inicial do estudo, os autores avaliaram as crianças em tarefas de rima e aliteração (semelhantes às tarefas realizadas por Bryant e Bradley (1987)). Aos 5 anos as crianças efetuaram provas de contagem e supressão de fonemas e aos 6 anos e meio as crianças foram avaliadas em provas de leitura, ortografia e aritmética. Tal como no estudo anterior, os resultados evidenciaram uma correlação entre o desempenho nas provas iniciais e o desempenho nas provas de leitura e ortografia. O controlo realizado aos 5 anos também permitiu que os autores antecipassem o desempenho das crianças nas provas de leitura e ortografia, embora sem os níveis de correlação evidenciados pelo desempenho nas provas de rima. No entanto, para o caso do português, Cardoso-Martins (1995) verificou que, entre as várias medidas fonológicas avaliadas à entrada para a escola, a segmentação fonética e a categorização de palavras em função das sílabas, constituíram preditores independentes no sucesso das crianças em provas de leitura e escrita um ano depois.

Caravolas e Landerl (2010) verificaram, num estudo longitudinal, o efeito da estrutura silábica e das habilidades de leitura sobre o desenvolvimento da consciência fonética. Analisaram a consciência dos fonemas no ataque e coda das sílabas em crianças checas (n=45) e alemãs no inicio do primeiro ano (n = 33). As crianças checas apresentaram maior consciência fonética nos ataques das sílabas do que nas codas, ao passo que as alemãs apresentavam resultados inversos. Os resultados indicam que os efeitos que estavam presentes entre os pré-leitores persistiu até ao final do 1º ano. Os autores (2010), sugerem que a experiência das crianças com a estrutura silábica da sua língua nativa desempenha um papel importante na formação da consciência fonética, no início do seu desenvolvimento, e desempenha um papel relevante nas futuras habilidades de leitura.

Bus, Marinus e Ijzerdoorn (1999) analisaram o impacto de vários programas de treino fonológico em 36 estudos experimentais. De acordo com a análise dos autores (1999) verifica-se que os programas de intervenção fonológica têm um impacto significativo na promoção da consciência fonológica e também nas competências de leitura.

Os vários trabalhos apresentados (Caravola & Landerl, 2010; Tunmer & Nesdale, 1985; Bryant & Bradley, 1987; Bryant, Maclean, Bradley & Crossland, 1990; Bus, Marinus & Ijzendoorn, 1999) sugerem duas grandes ideias: a) que as habilidades das crianças de idade pré-escolar em tarefas de consciência fonológica são um preditor do seu sucesso na aprendizagem da linguagem escrita, e b) que os programas de treino fazem evoluir a consciência fonológica em crianças de idade pré-escolar, nomeadamente a consciência fonética e, paralelamente, a aprendizagem da leitura.

3. A consciência fonológica é, simultaneamente, uma causa e consequência da aprendizagem da linguagem escrita.

Embora durante muito tempo a discussão em torno da relação entre a consciência fonológica e a aprendizagem da linguagem escrita se tenha centrado nas duas posições

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