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3 CONTROLE SOCIAL: DO FUNDEF AO FUNDEB

3.1 Conselho do Fundef – limitações na atuação

A legislação do Fundeb, em especial na seção acerca dos conselhos de acompanhamento e controle social, sofreu fortes influências de análises, realizadas por pesquisadores da área educacional, quanto à atuação destes conselhos no âmbito do Fundef. Nesse sentido, antes de se analisar os normativos que regem o funcionamento dos CACS-Fundeb, impende realizar uma revisão da literatura acerca da atuação destes conselhos quando em vigor o Fundef.

Conforme expôs Sousa Júnior (2006, p. 14-15), que realizou estudos sobre a atuação dos conselhos do Fundef em municípios paraibanos, estes conselhos tiverem muitas dificuldades no exercício da ação fiscalizatória. Para o autor, estas dificuldades “decorrem, em primeiro lugar, do desinteresse do Poder Executivo em tornar transparentes os gastos públicos”.

Acrescentou o autor que a ausência de transparência na gestão decorre de uma “cultura de apropriação privada dos recursos públicos” que demonstra ainda “estar bastante arraigada no país, sobretudo nas regiões mais pobres”, em que a grande maioria dos municípios pequenos convive com formas conservadoras e autoritárias de poder local, com um controle das elites locais sobre a população ainda fortemente sendo praticado.

Outro limite apontado por Sousa Junior (idem) quanto aos desafios da participação popular e do controle social no âmbito do Fundef diz respeito ao “caráter oficialista” dos Conselhos, que expressa a existência de uma cultura avessa à participação social. Acrescentou o autor que a composição dos Conselhos do Fundef exemplifica a “pouca vontade de democratizar a gestão dos recursos da educação”, com os secretários de educação ou os seus adjuntos possuindo assento nos Conselhos, em sua maioria na condição de presidentes.

O pesquisador paraibano também argumentou que as informações prestadas acerca da execução dos recursos do Fundef, em geral, eram “insuficientes para a formação de juízo sobre as despesas efetivadas”. As secretarias de finanças dos municípios demonstravam não se sentir à vontade com a fiscalização e agiam “com morosidade no fornecimento dessas informações”. Os próprios conselheiros, conforme revelou a pesquisa, não dispunham “de preparo técnico para acompanhar os demonstrativos mensais e balancetes das contas governamentais”.

Como forma de ampliar a participação popular no controle dos recursos destinados à educação, Sousa Junior (idem) sugeriu em seu texto alterações normativas na legislação, como a redefinição da composição dos Conselhos, “com presença majoritária e autônoma da sociedade civil”. Também sugeriu uma ampliação no campo de atuação da fiscalização dos CACS, que deveria ser ampliado “para atingir toda a educação básica”, e que deveriam ser estabelecidas punições mais severas para o descumprimento das decisões dos Conselhos, por parte dos órgãos responsáveis pelas informações. Acrescentou ainda que “a preparação dos conselheiros para o domínio de técnicas de contabilidade e orçamento público deveria, obrigatoriamente, fazer parte do plano de ação” governamental.

Aragão (2003, p. 126), em estudo sobre a atuação dos Conselhos do Fundef no Estado da Bahia, revelou que sérias limitações na atuação destas instâncias de controle, revelando que “[...] não foi observada uma ação contínua e plena desses conselhos, pautada nos objetivos propostos”

O autor, em sua pesquisa, identificou alguns elementos que foram considerados inibidores ou que funcionavam como barreiras às ações desses órgãos de fiscalização, destacando-se:

[...] a presença do secretário de educação como membro e/ou presidente desses conselhos; a falta de motivação e de interesse do presidente em convocar reuniões; a deficiência e a insuficiência de informações; a morosidade no fluxo de informações; o despreparo dos conselheiros para analisar registros contábeis e demonstrativos gerenciais, bem como para elaborar relatórios e pareceres avaliativos; a dificuldade dos conselheiros para conciliar o tempo de suas atividades profissionais com o exercício das atividades nos conselhos; a escolha de conselheiros politicamente comprometidos com os gestores; a falta de infraestrutura material para o pleno

funcionamento de um conselho de fiscalização e controle; a falta de canais de comunicação e de divulgação; a falta de organização de alguns segmentos da sociedade que têm participação nesses conselhos. (ARAGÃO, 2003, p. 126).

Para o autor, “[...] os conselheiros não têm conseguido fiscalizar a ação dos gestores, no que diz respeito à repartição, à transferência e à aplicação dos recursos do Fundo”. E arremata que havia

[...] uma distância entre os resultados alcançados e os esperados no que diz respeito à atuação dos conselhos de acompanhamento e controle social [do Fundef], o que mostra a falta de efetividade do desempenho desses órgãos de fiscalização, bem como sua pouca eficácia no que se refere ao alcance de objetivos mais gerais, tais como os de controle social, de representação, de participação e de democratização. (ARAGÃO, 2003, p. 126).

Davies (2005), em análises sobre os conselhos do Fundef, em vários estados brasileiros, apontou diversas limitações acerca da atuação destes conselhos. Neste sentido, em Sergipe, destacou o autor, com base em atuação do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Básica da Rede Estadual, que "figuram como exceções os municípios onde funcionam regularmente os conselhos do FUNDEF [...]”.

O autor, no mesmo texto, acrescenta:

A composição desses Conselhos, em sua esmagadora maioria, é uma verdadeira farsa, pois os seus titulares são indicados pelas administrações municipais, o princípio eletivo para a escolha dos conselheiros não é respeitado e uma parcela significativa dos membros é composta por cargos comissionados. [...]. Além do mais, não existe um programa contínuo de capacitação desses Conselheiros, para que os mesmos possam plenamente exercer os seus papéis". (DAVIES, 2005, p. 13).

Concluiu que os Conselhos do Fundef foram “bastante inócuos, apesar de formalmente apresentarem um potencial para o controle social sobre o Estado”. E argumentou que embora fossem chamados de Conselhos de Acompanhamento e Controle Social, a sua composição privilegiava representantes dos governos e, em consequência, a participação dos conselheiros que não eram formalmente integrantes do governo (professores, pais de alunos, servidores) tendia a ser limitada por diversos fatores como

[...] a disponibilidade de tempo para um acompanhamento eficiente, a falta de acesso à documentação detalhada e pertinente, e a falta de capacitação ou assessoria técnica para análise da documentação contábil. [...] Tudo isso explica porque o funcionamento real (e não formal) de tais Conselhos deixou e deixa bastante a desejar. (DAVIES, 2005, p. 14).

Ao discutir o papel dos conselhos do Fundef, Oliveira (2003, p. 103-104) ressaltou que “[...] os Conselhos do Fundef [...] não são conselhos investidos de poder de gestão, mas de acompanhamento e/ou fiscalização”. Nessa perspectiva, o autor acrescenta que estes conselhos “não se destinam, desde sua concepção, a ampliar o poder da população sobre o funcionamento do Estado”. Entretanto, destaca o autor que se os conselhos do Fundef cumprissem “adequadamente com suas funções”, poderiam “garantir a adequação dos procedimentos adotados pelo Poder Público ao estabelecido em lei”.

O autor também destacou que os Conselhos do Fundef atuavam de modo marcadamente burocrático, legitimando decisões tomadas pelo Poder Executivo.

Mesmo levando-se em conta esse escopo limitado, no que diz respeito aos seus objetivos e funções, os estudos destinados a analisar sua ação têm evidenciado seus limites, sendo suas atividades, na maioria dos casos, marcadamente burocráticas e legitimadoras de decisões já tomadas na esfera do executivo. (OLIVEIRA, 2003, p. 104)

Arelaro (2007) também apontou um conjunto de limitações na atuação dos conselheiros de acompanhamento e controle social do Fundef ao afirmar que

[...] os Conselheiros do FUNDEF, por várias razões, mas principalmente pelo desconhecimento da sistemática orçamentária e de prestação de contas, se vêm impedidos, na sua maioria, de exercer suas funções, que exige, de fato, conhecimento específico sobre as normas financeiro-contábeis que regem a Administração Pública. Além disso, a indicação dos Conselheiros, frequentemente, é motivada por interesses políticos, não se adotando a eleição direta como critério para o preenchimento dessas funções (ARELARO, 2007, p. 13-14).

Outras pesquisas também apontaram limitação na atuação dos conselhos do Fundef, nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. A título de exemplo, têm-se as pesquisas desenvolvidas por Pinto (2008) - no município de Ribeirão Preto/SP; Bassi e Camargo (2007) – no município de Suzano/SP; Souza (2006) e Silveira

(2006) - em municípios do Estado do Rio de Janeiro; Gouveia e Souza (2006) – em municípios do Estado do Paraná; e por Andrade (2002) – em municípios do Estado de Goiás. Como se observa, trata-se de limitações na atuação dos Conselhos do Fundef em todas as regiões geográficas do Brasil, e não apenas no Norte e Nordeste.

Todas estas limitações provocaram mudanças nos dispositivos legais que regulamentam o controle social do Fundeb (substituto do Fundef), como será destacado no subitem seguinte.

3.2 Alterações legislativas para a atuação dos conselhos do Fundeb: