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2 ESTADO, SOCIEDADE CIVIL E CONTROLE SOCIAL

2.5 Conselhos de acompanhamento da execução de políticas públicas:

Os princípios constitucionais de participação popular, as legislações regulamentadoras das políticas sociais e o processo de descentralização estimularam a implantação de diversos conselhos setoriais nos Estados e municípios. Sucintamente, os conselhos são “canais de participação que articulam representantes da população e membros do poder público estatal em práticas que dizem respeito à gestão de bens públicos” (GOHN, 2007, p. 7).

Mas, essa forma de organização, em que pese a existência de profundas variações, não é nova na história. Particularmente no Brasil, a forma “conselhos” se insere na agenda política dos anos de 1970 e de 1980, adaptando-se aos modelos de participação vigentes. Assim, são criados pelo poder público, conselhos comunitários para negociar demandas dos movimentos populares e, pelo lado dos próprios movimentos, conselhos populares não institucionalizados, autônomos e reivindicativos.

Essas experiências e os embates em torno da definição de sua natureza, cuja discussão central referia-se “a ser ou não o conselho um órgão embrionário de um novo poder, de uma forma de democracia direta, com autonomia em relação ao Estado”, tornaram-se referências importantes para a Assembleia Constituinte. Nessa, prevaleceu a visão do conselho como “uma das formas de participação visando a mudanças na gestão pública e na elaboração de políticas, tendo em vista sua democratização e transparência”. Portanto, como “canal de relação entre Estado e sociedade, espaço de administração de conflitos uma forma distinta dos dois modelos, comunitário e popular, até então experimentados” (TEIXEIRA, 1996, p. 8).

Assim, conforme Gohn (2000), como canais de participação que propiciam um novo padrão de relações entre o Estado e a sociedade ao viabilizarem a participação dos diferentes segmentos sociais na formulação das políticas sociais,

os conselhos possibilitam à população o acesso aos espaços onde se tomam decisões políticas e criam condições para um sistema de vigilância sobre as gestões públicas, implicando em maior cobrança de prestação de contas do executivo.

Os conselhos constituem-se normalmente em órgãos públicos de composição paritária entre a sociedade e o governo, criados por lei, regidos por regulamento aprovado por seu plenário, tendo caráter obrigatório, uma vez que os repasses de recursos ficam condicionados à sua existência e que assumem atribuições consultivas, deliberativas e/ou de controle.

Seus formatos variam conforme estejam vinculados à implementação de ações focalizadas, por meio de conselhos de acompanhamento da execução de programas governamentais (merenda ou alimentação escolar, educação básica, financiamento), ou à elaboração, implantação e controle de políticas públicas, por meio de conselhos de políticas setoriais, definidos por leis federais para concretizarem direitos de caráter universal (saúde, educação, cultura). Há também conselhos envolvidos com temas transversais que permeiam os direitos e comportamentos dos indivíduos na sociedade (direitos humanos, violência contra a mulher, etc.) (TEIXEIRA, 2000, p.102).

Apoiando-se na concepção de Gomes (2003), de acordo com as motivações políticas, sociais e econômicas que estimulam a abertura de novos canais de participação da sociedade na gestão da coisa pública, aos conselhos de acompanhamento do Fundeb está colocado o desafio de constituírem espaço democrático, destinado ao exercício e à construção da cidadania e à educação política.

Esses espaços também se destinam à identificação e à captação constante das preferências quanto aos fins sociais e quanto às políticas para alcançá-los, incluindo a consideração das intensidades destas preferências, e a sua transformação em políticas públicas compatíveis. Destinados, por fim, ao controle social sobre as políticas públicas, incluindo o atendimento às demandas da sociedade e a responsabilização dos governantes.

Para verificar, a partir de uma perspectiva teórica, o arcabouço institucional que cerca o Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb, impõe-se uma definição mínima dos conselhos, objeto deste estudo.

Com base em Gomes (2003), define-se o conselho de acompanhamento e controle social do Fundeb como um colegiado institucionalizado, composto de um pequeno número de representantes do governo e da sociedade civil, designados democraticamente e responsável pelo controle da execução da política pública voltada ao atendimento da educação básica municipal, por meio do Fundeb.

Ressalta-se que por gestão entende-se desde a formulação e o planejamento da política pública, ao acompanhamento de sua implantação, a avaliação dos seus resultados e a retroalimentação do sistema de gestão, incluindo o estabelecimento de ações corretivas e preventivas aos comportamentos e/ou eventos desviantes (GOMES, 2003, p. 79).

A partir dessa definição de gestão defendida pelo autor, é possível identificar, relativos à questão democrática, dois pontos distintos de análise: o Conselho encerra tanto aspectos relacionados à democracia representativa, uma vez que os conselheiros são representantes, quanto à democracia deliberativa, dado o caráter plural e colegiado da gestão.

Gohn (2007, p 91) apresenta algumas considerações acerca da implantação e da implementação dos conselhos gestores de políticas públicas que podem ser relevantes para a análise dos conselhos de acompanhamento e controle social do Fundeb. Quanto à representatividade qualitativa dos diferentes segmentos sociais, territoriais e de forças políticas organizadas na composição do Conselho, a autora defende a necessidade de um percentual quantitativo, em termos de paridade entre os membros do governo e da sociedade civil organizada que compõe o Conselho.

Outras questões relevantes, ainda segundo a autora, dizem respeito à capacitação dos conselheiros – mormente advindos da sociedade civil; ao acesso às informações (e à sua decodificação), tornando públicas as ações dos conselhos; à fiscalização e ao controle sobre os próprios atos dos conselheiros; e ao poder e mecanismos de aplicabilidade das decisões do conselho pelo Poder Executivo e outros agentes.

Ainda conforme a autora, outro ponto relevante quanto à representatividade é o de que o representante que atua em um conselho deve ter vínculo permanente com a comunidade que o elegeu.

A autora assevera ainda que os conselhos geram condições para um sistema de vigilância sobre a gestão pública e implicam maior cobrança de prestação de contas do Poder Executivo, principalmente no nível municipal.

Em se constituindo em espaço democrático e exercendo tais funções, os conselhos tenderiam a alcançar os fins últimos de maior democracia e maior eficiência econômica e social na alocação dos recursos públicos. O intuito deste estudo é precisamente discutir a possibilidade de os conselhos alcançarem com sucesso esses objetivos, especialmente o controle social à luz das questões democráticas apontadas neste capítulo.

Raichelis (2000) defende o controle social como um dos elementos constitutivos da esfera pública que

implica a acesso aos processos que informam decisões da sociedade política, que devem viabilizar a participação da sociedade civil organizada na formulação e na revisão das regras que conduzem as negociações e arbitragens sobre os interesses em jogo, além da fiscalização daquelas decisões, segundo critérios pactuados (RAICHELIS, 2000, p. 64).

Para a autora existe a possibilidade de construção da esfera pública (entendida como espaço de explicitação de interesses em conflito, de confronto de projetos sociais e de luta pela hegemonia) no âmbito das políticas sociais, envolvendo a participação ativa da sociedade civil na sua definição, implementação e controle. Nessa perspectiva, os conselhos gestores de políticas públicas, assim como o conselho do Fundeb, são mecanismos que dinamizam a participação social, que abordam “as relações entre democratização e representação dos interesses populares na esfera das decisões políticas” (RAICHELIS, 2000, p. 17).