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CAPÍTULO 9 DISCUSSÕES

9.3.9 Consequências da violência

Nesta subcategoria pode-se verificar que os danos causados por um tempo prolongado pela violência são muito amplos, pois atingem todos os domínios da vida das mulheres. A maioria das conseqüências explanadas foi de ordem negativa, como: danos físicos, psicológicos e sociais; entretanto, emergiu o relato do surgimento da resiliência, emergindo como uma estratégia de superação da situação vivida.

Nos relatos a seguir verificam-se, a partir das evocações das mulheres vítimas, os relatos dos danos psicológicos instaurados como conseqüência da violência, que podem ser de ordem emocional ou de ordem cognitiva:

Verifica-se que apesar de algumas mulheres terem sofrido violência física e até de ordem sexual, as maiores evocações dizem respeito às conseqüências psicológicas, estas de ordem emocional e cognitiva.

Através das falas das entrevistadas observa-se que a maior parte das queixas foi de tornarem-se “nervosa”, uma palavra do senso comum que significa traumas emocionais, os quais fragilizam as vítimas mentalmente, abrindo um campo propício ao surgimento das mais variadas formas de doenças mentais.

Verificaram-se ainda nesta subcategoria os danos de ordem cognitivos, pois algumas das respondentes mostraram-se completamente desorientadas durante às entrevistas, muitas vezes desconhecendo a própria idade ou mesmo a dos filhos.

As unidades temáticas acima corroboram estudos de Adeodato et al (2005), que confirmam que a violência doméstica está associada a uma percepção negativa da saúde

Ficou um trauma muita grande na minha vida (7)/ fiquei nervosa (10)/eu to muito perturbada (2)/por dentro, deixou muitas marcas/fico triste num canto/todo dia/sem vontade de comer nada/mas e um sentimento muito ruim que a gente fica/ aquela magoa/quando vem a noite/ o pensamento (5)/ Ela só trouxe pontos negativos/ Pro meu psicológico principalmente/ a gente fica abatido/ agente fica sem se dá valor/ fica tanto sofrimento/ perdi minha auto-estima/ sinto que eu to enlouquecendo.

mental da mulher. Muitas vezes estas mulheres peregrinam nos serviços de saúde na busca de uma cura, principalmente no que tange à dor física; entretanto suas dores se associam também a sofrimentos emocionais (Almeida et al, 2008).

Emergiram também unidades temáticas relacionadas com as conseqüências físicas, devido às violências cruéis e covardes, conforme verifica-se a seguir:

Fiquei com cicatrizes (15)/tenho dor direto (2)/tenho que sentar/ se sai na rua eu caio/ 11 cicatrizes pelo corpo/ na orelha/ na face/ no pescoço/ bracos/ pernas/dessa vez eu já fui bater no hospital (2)/ e da próxima vez eu vou bater aonde no cemitério?/ Fiz o exame de corpo de delito/dedo ele quebrou/ Fiquei toda inchada/ eu não via mais nada/ tampou tudo os olhos/ Meu olho ficou preto/ Ficou tudo preto/ Eu fiquei doente/ eu num tenho saúde não/

São depoimentos fortes, nos quais as mulheres vítimas relatam terem contraído dores e cicatrizes em todo o corpo, demonstrando a desproporção de forças, de quem bate e de quem apanha. Os serviços públicos de saúde superlotam e aumenta o número de casos de mulheres com problemas físicos decorrentes da violência. Dentre os principais encontram-se: lesões, obesidade, síndrome de dor crônica, distúrbios gastrintestinais, fibromialgia, invalidez, distúrbios ginecológicos, infecção urinária, doenças sexualmente transmissíveis, aborto espontâneo até a morte (Silva et al, 2005; Almeida et al, 2008).

Segundo Almeida et al (2008), dificilmente estas mulheres relatam aos profissionais de saúde sua condição de vítima, ou nem ao mesmo se percebem como tal, fato observado nas figuras 05 e 06 desta tese. Estes dados apontam que a não percepção da mulher como vítima de violência doméstica dificulta ainda mais a criação de estratégias no setor saúde de combate a este tipo de violência que deixa de ser um fenômeno privado para tornar-se um caso de saúde pública.

Entretanto, diante de tantos danos causados, emerge a capacidade de superação deste fenômeno adverso que é a violência, conceito adotado ao construto da resiliência (Luther, 2000):

Conseqüências é lição de vida (4)/me trouxe mais experiência/ para passar pras minhas amigas/outras mulheres/a situação/que passei/não desejo pra ninguém/não

quero passar nunca mais na minha vida//fiquei mais corajosa/ mais quando eu olho/ que eu tenho meus 3 filho também/ que eu tenho que defende eles sou eu/ eu acho que corresponderia/ a minha coragem/ so Deus e quem sabe/ uma pessoa capaz/ Tenho que aprender pra nunca mais acontecer.

As mulheres vítimas de violência doméstica relataram que todo este processo vivido trouxe algumas lições de vida e experiência. Apontaram que aprenderam a lidar e superar esta situação, alegando que serviu de base para que esta situação não se repita mais. Mostraram também suas disponibilidades em ajudar outras mulheres que passam pelo mesmo contexto violento. Disseram que encontraram essa força em si mesmas, nos filhos e em Deus. Apontando que é possível sair deste ciclo e ir em busca de uma vida melhor. Estes exemplos convergem claramente com a conceituação da resiliência (Luther, 2000; Grotberg, 2005; Mellilo & Ojeda, 2005).

Nos relatos a seguir verificam-se os danos causados na vida das mulheres vítimas que apontam para os danos de ordem social:

Não tenho como trabalhar/tem que fica em casa/perto deles/Vontade de procurar emprego/saio não/tem que te dinheiro/num posso sai não/fica o receio/o medo de me envolver com outra pessoa (12)/eu digo sempre a elas/se puder viver sozinha/ e melhor do que se envolver com esse tipo de homem/ que ta hoje em dia/que não presta.

Ao observar estes recortes, verificam-se as dificuldades que as mulheres vítimas encontram em trabalhar ou mesmo conseguir novo emprego justificando a dependência financeira. Além disso, sabe-se que a desigualdade de gênero também contribui para esta realidade, principalmente para a população de baixa renda, como é o caso da maioria das participantes desta tese que possuem até 01 salário mínimo como renda familiar, conforme tabela 03 deste estudo. Estudos da Rede Saúde (2001) apontam que para cada R$ 100,00 de salário de um homem de baixa renda, uma mulher vai receber R$ 76,00.

violento, doente mental e de má índole se generalizem a todos os outros da sociedade; assim, não conseguem elaborar RS de homens objetivadas no companheirismo e amor, ingredientes necessários à construção de um novo relacionamento, mais saudável.

A seguir, nos relatos das mulheres vítimas, ainda se verifica como conseqüência da violência conjugal a desestrutura de toda a família, envolvendo principalmente os filhos:

Nesta subcategoria verifica-se a violência contra a criança e o adolescente, seja física ou psicológica. Estes relatos confirmam um dos fatores desencadeantes da violência, que é o histórico familiar. A maioria destes agressores ou mesmo as vítimas, vieram de lares violentos, e sem perceberem replicam este mesmo padrão de comportamento às suas famílias atuais, gerando intenso sofrimento também aos filhos, conforme verificado na subcategoria “violência doméstica contra os filhos” desta tese.

Partindo do achado da desestrutura familiar, recorre-se a Osório (2002). Para este, a família é considerada como um sistema dinâmico que vive em um processo de estabelecimento de regras e busca de acordos, em que estes acordos podem manter o equilíbrio familiar.

Porém, quando a família é invadida pela violência, fica difícil manter este equilíbrio, mesmo pelo silêncio e passividade observada em algumas mulheres. Provavelmente o silêncio pode ser uma das estratégias utilizadas pela mulher para manter a “ordem” familiar, todavia, este “equilíbrio” pode esconder a doença que atinge a todos. Concebendo então a família como um sistema aberto no qual influencia-se mutuamente

Meu filho presenciava quando ele batia em mim (4)/ eu e meu menino, ele fica do mesmo jeito que eu nervoso/ Minhas filhas ficaram com esse pouco de trauma também (4)/ as menina ficava tudo assombrada, com medo (4)/ minha família ficou toda contra mim/ Eu não tenho mais família/ ninguém por mim/ ela tem medo dele também/

com outros sistemas sociais, afirma-se que a violência doméstica pode trazer o desequilíbrio de toda a sociedade.

Percebeu-se, através da categoria “Conseqüências da Violência”, que este fenômeno traz conseqüência de ordem negativa para a mulher vítima em todas as esferas de suas vidas. Neste sentido, é de mister importância investigar os escores de qualidade de vida destas mulheres.

A seguir, observa-se a última categoria emergida no conhecimento gerado pelas mulheres, os seus projetos de vida.