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Considerações do capítulo

Ainda que não seja um campo recente, não existe uma teoria consolidada ou um consenso sobre o que vem a ser o empreendedorismo social, menos ainda no que diz respeito aos negócios de impacto. No entanto, diante das diversas abordagens, é possível identificar alguns aspectos convergentes. Por exemplo, pode-se considerar, a partir das investigações realizadas, que o empreendedorismo com finalidade social se preocupa em desenvolver propostas inovadoras, capazes de entender e superar problemas sociais que as alternativas existentes não foram suficientes para solucionar. O resultado que ele produz deve, portanto, refletir em uma mudança sistêmica com valor social agregado, o que pode ser avaliado a partir do estudo do impacto social causado.

Esse impacto pouco tem a ver com a quantidade de pessoas atingidas pela mudança, mas com a avaliação qualitativa da transformação que pode ser observada (ARIDA;

BRANDÃO; CRUZ, 2014; DEES, 2001). Por sua vez, valor social é aquele valor que é recolhido pela sociedade, não pelo empreendedor. As tentativas de tornar essa concepção de valor menos abstrata não tiveram muito sucesso, isso porque as visões sobre o valor social criado são subjetivas e, por isso, frequentemente conflitantes. Logo, é um conceito que necessita ainda de uma investigação mais aprofundada que contribua com a percepção dos empreendedores sobre o seu negócio.

A ausência de consenso nos termos que envolvem o empreendedorismo social e direcionam o planejamento e a administração desses negócios pode ser uma das causas do amadurecimento lento do setor. Além disso, pode-se identificar outras condições limitantes presentes no ambiente em que ele se desenvolve e que dificultam o desempenho e desencorajam o surgimento de iniciativas sociais inovadoras.

Um fator positivo e potencial para o empreendedorismo social no mundo todo, entretanto, é que cada vez mais as pessoas têm buscado aliar trabalho com propósito (LEITE, 2019). Mas, ainda que exista disposição para isso, ela precisa ser bem disciplinada e deve encontrar no ambiente incentivos que estimulem esses ideais e ideias.

No empreendedorismo, ambientes que combinam elementos favoráveis à atividade empreendedora são chamados de ecossistemas (ISENBERG, 2010; SPIEGEL, 2017; STAM, 2015). De acordo com Spiegel (2017), esses elementos podem ser distribuídos em três

categorias – sociais, culturais e materiais. Para estudar o empreendedorismo em um local é preciso entender como cada um desses atributos se apresenta.

Como ainda não existe um corpo teórico sobre ecossistemas em uma abordagem que contemple especificamente o empreendedorismo social, esta pesquisa utiliza os estudos de Spiegel (2017) para orientar a identificação dos elementos que atuam na atividade empreendedora social local, a partir da perspectiva do empreendedor, não se limitando todavia ao que está construído, mas estando aberta às descobertas que possam contribuir com investigações futuras.

3 CONTEXTO: ECOSSISTEMAS E TEORIA INSTITUCIONAL

Segundo as pesquisas desenvolvidas por Mulgan (2006), o sucesso no empreendedorismo social está condicionado tanto no que diz respeito ao desenvolvimento das capacidades internas, organizacionais, como ao contexto, mais especificamente suas oportunidades e limitações. Muitas delas foram levantadas no primeiro capítulo, mas pouco aprofundadas. Aqui, essa discussão será retomada, abordando as relações entre o empreendedorismo social, o ecossistema de inovação e as influências das instituições formais e informais.

Como explicado anteriormente, algumas condições limitantes do ambiente podem ser apreendidas pelo empreendedor social como oportunidades, enquanto outras se apresentam mais como barreiras à sua atividade. Por exemplo, uma falha de mercado pode ser vista como oportunidade, que nesse sentido indica a necessidade de ação e mudança (AUSTN;

STEVENSON; WEI-SKILLERN, 2006). A oferta escassa de investimento e confiança para que essa mudança possa ocorrer pelas vias da inovação e do empreendedorismo social, por outro lado, desponta como um fator desestimulante para o empreendedor.

Esse exemplo retrata um dos quesitos apontados nas pesquisas: o déficit no acesso à capital de investimento. Na investigação conduzida por Sharir e Lerner (2006), os dados indicaram que o empreendedorismo social “ainda carece de uma infraestrutura que forneça acesso ao capital durante a fase inicial do empreendimento” (SHARIR; LERNER, 2006, p.

16, tradução nossa).

Anos depois, Bignetti (2011) ao analisar o contexto brasileiro, afirma que, embora existam muitas iniciativas dirigidas à sociedade, seus resultados são limitados pela ausência de recursos suficientes. E assim como eles, outros também abordam essa dificuldade (AUSTIN; STEVENSON; WEI-SKILLERN, 2006; DEES, 1998; LETTICE; PAREKH, 2014; MULGAN, 2006).

É preciso, então, que a distribuição de recursos amplie sua consideração sobre os valores intangíveis do impacto social e comece a converter esse cenário. Por enquanto, ainda existe uma barreira que dificulta o acesso a recursos pelos empreendedores sociais e, de acordo com Moore, Westley e Nicholls (2012, p. 123), para superar essa barreira é preciso

"mudar as instituições legais e as crenças culturais básicas (legitimação e significação) que estão ligadas à estrutura atual de distribuição de recursos".

Esse fator, ainda, conduz a outro ponto amplamente abordado que está relacionado às oportunidades que o network pode possibilitar ao empreendedor social. De acordo com

Austin, Stevenson e Wei-Skillern, (2006, p. 14, tradução nossa), "para expandir a capacidade organizacional com recursos limitados, o empreendedor social deve se concentrar na construção de uma rica rede de contatos e recursos". Na mesma perspectiva, Phillips et al.

(2014, p. 22, tradução nossa) sustentam que a inovação social se atinge no compartilhamento de conhecimentos entre diversos atores e não de uma iniciativa isolada:

A inovação social não é realizada isoladamente por empreendedores solitários, mas é um processo interativo moldado pelo compartilhamento coletivo de conhecimentos entre uma ampla gama de organizações e instituições que influenciam o desenvolvimento em determinadas áreas para atender a uma necessidade social ou promover o desenvolvimento social. As interações não apenas promovem a geração de novos conhecimentos, mas também ajudam as empresas sociais a adquirir e desenvolver capacidades.

Assim sendo, considera-se de significativa importância que o empreendedor encontre no meio em que está inserido oportunidades de estabelecer essas conexões que, segundo Lettice e Parekh (2014), não só facilitam o acesso a fontes de financiamento, como também oferecem inspiração e auxiliam no amadurecimento de novas ideias.

Nesse aspecto, figura o papel das instituições intermediárias, como as incubadoras e aceleradoras. Além de conectar empreendedores sociais com outros atores do ecossistema, as incubadoras sociais também possuem o papel de orientá-los, desenvolver suas capacidades e habilidades (PETERS; RICE; SUNDARARAJAN, 2004).

Suas estratégias estão voltadas para atender as necessidades dos empreendedores, criando condições favoráveis e oferecendo o suporte adequado para que estes possam cumprir a sua missão, garantir a sustentabilidade do negócio e gerar impacto positivo. De acordo com Allen e McCluskey (1991, p. 62, tradução nossa), uma incubadora "é uma instalação que fornece espaço acessível, serviços compartilhados de escritório e assistência ao desenvolvimento de negócios em um ambiente propício à criação de novos empreendimentos, sobrevivência e crescimento inicial".

Por fim, outras duas condições apontadas nos estudos dizem respeito ao acesso limitado à profissionais capacitados e à escassez de pesquisas acadêmicas, também discutidas no primeiro capítulo. Muitas vezes, por não conseguir competir com os valores oferecidos no mercado, os empreendedores sociais têm dificuldade de atrair profissionais preparados e dispostos a contribuir no desenvolvimento de soluções inovadoras e, além disso, ainda dependem amplamente da dedicação de voluntários (AUSTIN; STEVENSON; WEI-SKILLERN, 2006; CERTO; MILLER, 2008; SHARIR; LERNER, 2006).

Quanto às pesquisas, Bignetti (2011) defende a necessidade de investigações acadêmicas que deem suporte no preenchimento das lacunas conceituais e metodológicas existentes (BIGNETTI, 2011). Que auxiliem, por exemplo, no desenvolvimento de métodos mais claros para diminuir as abstrações ao mensurar o impacto social e na divulgação de descobertas que potencializem a capacidade de se promover soluções inovadoras para problemas sociais.

Apesar do apontamento desses fatores, ainda são poucos os esforços, todavia, para o aprofundamento no que diz respeito ao ambiente que cerca o empreendedorismo social e atua sobre ele (URBANO; TOLEDANO; SORIANO, 2010), mas esses dados acima servem como indicadores dos atributos que podem ser identificados e merecem atenção durante a realização desta investigação.