• Nenhum resultado encontrado

O sistema de autoatendimento nos transportes públicos do Município de Fortaleza, conforme debatido ao longo da pesquisa, encontra-se eivado de afronta aos direitos do consumidor, tendo em vista contrariar princípios tutelares na proteção desses sujeitos, especialmente, no tocante a sua vulnerabilidade econômica, técnica e jurídica.

Avanços tecnológicos são importantes para alcançar o bem-estar da coletividade, contudo não podem apenas beneficiar um lado da relação jurídica. No caso em apreço, usuários dos transportes coletivos e os permissionários do serviço público devem harmonizar seus interesses por meio da corresponsabilidade.

Infelizmente, o autoatendimento demonstrou, mais uma vez, a força das empresas de ônibus ao impor o ônus para os passageiros de se adequarem à forma de pagamento exclusivo com “passecard”, carteira de estudante e bilhete único já com crédito, restringindo a utilização da moeda nacional, ou seja, o usuário sem nenhuma dessas formas de pagamento não pode exercer seus direitos de ir e vir nos transportes públicos do Município de Fortaleza. O Poder Público Municipal desconsidera as particularidades da proteção ao consumidor e, simplesmente, acata a determinação das empresas de ônibus em estabelecer uma única forma na cobrança da referida tarifa.

O transporte público é considerado serviço essencial para a população, devendo ser organizado, planejado e gerenciado pelo Poder Público para satisfazer o cidadão-usuário. Entretanto, no caso do Município de Fortaleza, o usuário é constrangido no seu direito de ir e vir por meio da imposição de uma única forma de pagamento nos transportes públicos.

As políticas públicas de mobilidade urbana apresentam a participação do usuário do serviço de transporte público como imprescindível para a construção de um serviço de padrão de qualidade. Não é à toa que a voz do usuário é preceito para toda e qualquer alteração no transporte público.

A Lei nº. 12.587/2012 no seu inciso II do art. 14 assegura como direito do usuário a participação no planejamento, na fiscalização e na avaliação da

Política Local de Mobilidade Urbana. Corrobora nesse viés a criação do Conselho Municipal de Usuários do Transporte Coletivo Urbano da Cidade de Fortaleza, em que a presença dos usuários deveria ser constante no processo de planejamento, implantação e fiscalização dos serviços prestados.

Apesar das disposições nas referidas Leis, constata-se a reduzida participação da sociedade nesse processo de construção da Política Pública de Mobilidade Urbana. No caso do município de Fortaleza, o sistema de autoatendimento foi implantado de forma bilateral entre Poder Público e empresas de ônibus, excluindo a participação do usuário, ensejando insatisfação e total desrespeito à legislação consumerista.

Como a lei municipal exige a participação do usuário nas alterações do serviço, pode-se questionar se o sistema de autoatendimento deve ser revisto para que opinião do usuário e a Lei sejam realmente respeitadas.

Audiências Públicas na Câmara Municipal de Fortaleza, ao longo do ano de 2019, buscaram justamente debater o sistema de autoatendimento e a afronta aos direitos dos consumidores, e até mesmo a prática de contravenção penal pelo fato das empresas de ônibus recusarem moeda corrente, punido com multa conforme previsão do inciso II do art. 43 da Lei de Contravenção Penal.

Não se pretende descartar o sistema de autoatendimento, mas que os direitos do consumidor sejam respeitados, principalmente, os já consagrados na Constituição Federal de 1988 em seu inciso XV do art. 15, “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”. Sem respeito ao consumidor há flagrante enfraquecimento da segurança jurídica, preceito do Estado Democrático de Direito e da Dignidade da Pessoa Humana. Portanto, o sistema de autoatendimento nos transportes públicos deve ser repensado para beneficiar o usuário e não o excluir do sistema, deve garantir o seu direito de se deslocar para suas mais variadas atividades, à luz da necessária salvaguarda dos direitos dos consumidores – usuários, impossibilitados de viver a plenitude do seu direito fundamental de ir e vir.

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALCARÁ, Marcos. A evolução do Direito do consumidor. 2013. Disponível em: https://periodicosonline.uems.br/index.php/RJDSJ/article/view/655. Acesso em: 18 out.2019.

AMARAL, Luiz Otavio de Oliveira. Teoria Geral do direito do consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.

BRAZ, Evilson. PB NEWS. Transporte coletivo urbano de passageiros – um

direito do consumidor a qualidade, eficiência e segurança. João Pessoa,

21abr.2016. Disponível em:https://pbnews.com.br/colunas/2016/04/transporte- coletivo-urbano-de-passageiros-um-direito-do-consumidor-a-qualidade-

eficiencia-e-seguranca.html. Acesso em: 12 out. 2019.

BRASIL. Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988.

Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 12 out. 2019.

BRASIL. LEI No 10.257, DE 10 DE JULHO DE 2001. Estatuto da cidade.

Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LEIS_2001/L10257.htm. Acesso em: 12 out. 2019.

BRASIL. Lei nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012. Institui as diretrizes da

Política Nacional de mobilidade urbana. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12587.htm. Acesso em: 12 out. 2019.

BRASIL. Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990. Código de Defesa do

Consumidor. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm. Acesso em 28/10/2019.

BRASIL. STJ. Revista Eletrônica. 2014. Disponível em https://ww2.stj.jus.br/docs_internet/revista/eletronica/stj-revista-eletronica-

2014_236_capTerceiraTurma.pdf Acesso em: 12 out. 2019.

BRASIL. 1ª Conferência Nacional das Cidades. Resoluções. ONLINE. 2003.

Disponível em:

http://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/conferencias/Cidades/delibera coes_1_conferencia_cidades.pdf

CARVALHO, Diógenes Faria. Teoria geral do direito do consumidor

do consumidor. Disponível em: http://www.esmeg.org.br/pdfMural/direito_consumidor_-_dr._diogenes_01-12- 2011.pdf. Acesso em: 26 out.2019.

CARVALHO, Sania Nahas de. Estatuto da cidade: aspectos políticos e

técnicas do plano diretor. Disponível em:

http://www.scielo.br/pdf/spp/v15n4/10379.pdf. p.130-135 Acesso em: 20 out.2019.

CLARK, Sarah Fernanda Pereira; SOUZA, Priscilla Ribeiro Moraes. O

transporte público de qualidade como um direito previsto no código de Defesa do Consumidor. In: Jornada Nacional de Políticas Públicas (III).

Universidade Federal do Maranhão. 22 a 25 de agosto de 2017. Disponível em http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2017/pdfs/eixo11/otransportepublicop ublicodequalidadecomoumdireitoprevistonocodigodedefesadoconsumidor.pdf. Acesso em: 12 out. 2019.

Fortaleza. Lei nº 10.231, de 07 de julho de 2014. Dispõe sobre o conselho

municipal de usuários do transporte coletivo urbano, e dá outras providências. Disponível em: https://leismunicipais.com.br/a/ce/f/fortaleza/lei-

ordinaria/2014/1023/10231/lei-ordinaria-n-10231-2014-dispoe-sobre-o- conselho-municipal-de-usuarios-do-transporte-coletivo-urbano-e-da-outras- providencias. Acesso em: 18 out.2019.

FORTALEZA. Jornal Diário do Nordeste, versão online. 2019. https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/editorias/metro/60-da-frota-de- onibus-usa-autoatendimento-em-fortaleza-1.2151737

FORTALEZA. SÍTIO DA CÂMARA MUNICIPAL DE FORTALEZA. 2019. http://www.cmfor.ce.gov.br/sistema-de-autoatendimento-implantado-no-

transporte-coletivo-de-fortaleza-foi-o-tema-debatido-em-audiencia-na-cmfor/ INDI, Adilson Fernandes; MAHA, Yvonne Beleinda; TACO, Pastor Willy Gonzales. Participação Popular no planejamento de transporte público de

passageiros no Brasil. Disponível

em: http://redpgv.coppe.ufrj.br/index.php/pt-BR/producao-da-rede/artigos- cientificos/2014-1/808-participacao-popular-no-planejamento-de-transporte- publico-de-passageiros-no-brasil/file

MAIA, Ana Cecília Lima. Avaliação na qualidade dos transportes públicos

sob a ótica da mobilidade urbana sustentável - o caso de fortaleza. 131f.

2013. São CARLOS. Dissertação (mestre em Engenharia de transporte). Universidade de São Paulo. 2013.

MARQUES, Cláudia Lima. A responsabilidade do transportador aéreo pelo

fato do serviço e o Código de Defesa do Consumidor. R. Fac. Direito

UFRGS, Porto Alegre, 9{1): 133-158, nov. 1993. Disponível em https://seer.ufrgs.br/revfacdir/article/view/68819/38919

MARQUES JÚNIOR, William Paiva. O reconhecimento da hipervulnerabilidade como mecanismo de equilíbrio negocial no Direito do Consumidor. In: Everton das Neves Gonçalves; Maria Claudia da S. Antunes de Souza; Mariana Ribeiro Santiago; Claudia Lima Marques. (Org.). Direito, globalização e responsabilidade nas relações de consumo. 01ed.Florianópolis: CONPEDI,

2018, v. 01, p. 297-314.

MORAES, Paulo Valerio Dal Pai. Princípios constitucionais fundamentais

prevalentemente aplicáveis ao Código de Defesa do Consumidor. Revista

do Ministério Público do Rio Grande do Sul. p. 147-172, Disponível em: https://www.amprs.com.br/public/arquivos/revista_artigo/arquivo_1275675140.p df. Acesso em: 21 out.2019.

PALUTO, Daniele Maria. Princípios adotados pelo Código de Defesa do

Consumidor. 2005. Disponível em:

https://www.univates.br/media/graduacao/direito/PRINCIPIOS_ADOTADOS_P ELO_CODIGO_DO_CONSUMIDOR.pdf. Acesso em: 20 out.2019

SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho. Cláusulas abusivas no Código

de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004.

SILVA, Michael César; Santos, Wellington Fonseca dos. O Direito do

consumidor nas relações de consumo virtual. Revista de Informação

Legislativa. Brasília a. 49 n. 194 abr./jun. 2012. p. 261-281. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/496589/000952705.pdf?se quence=1. Acesso em: 18 out.2019.

SPRÉA, Daniel Mascoloti. Evolução Histórica do Direito do Consumidor. 2015. p.18. Prudente Centro Universitário. Disponível em: http://intertemas.toledoprudente.edu.br/index.php/ETIC/article/view/4962

Documentos relacionados