• Nenhum resultado encontrado

Considerações Finais

No documento O Estado fiscal e a cidadania fiscal (páginas 118-127)

CAPÍTULO V CONCLUSÕES

1. Considerações Finais

1. Considerações Finais

Ao modelo de Estado Social vem associado a utilização do imposto como instrumento de política quer social quer económica.

Como princípio do Estado Fiscal surge a forma jurídica de constituir, organizar e limitar o poder de tributar, pelo que o Estado Fiscal torna-se, assim, o aspeto financeiro do Estado, isto é, a condição necessária ao seu funcionamento, não só como forma de obter recursos para o seu financiamento, como também num modo de atuação pública.

Na realidade, no Estado contemporâneo, todos os fins públicos são suportados por meios financeiros públicos, ou seja, todos os direitos têm por suporte essencialmente a figura dos impostos. Pelo que, dever-se-á olhar para a tributação, não como mero instrumento de manter a máquina fiscal, mas antes, como um instrumento fundamental da concretização dos direitos fundamentais, e, por conseguinte, um contributo para o princípio da dignidade da pessoa humana.

É à AT que compete «administrar os impostos, direitos aduaneiros e demais tributos que lhe sejam atribuídos, bem como exercer o controlo da fronteira externa da União Europeia e do território aduaneiro nacional, para fins fiscais, económicos e de proteção da sociedade, de acordo com as políticas definidas pelo Governo e o

Direito da União Europeia.».58

É comum perspetivar a AT, como uma entidade odiosa que se intromete e viola, no

desempenho das suas funções, os direitos do cidadão.59

Não obstante, esta visão odiosa, que entende a AT como mera cobradora de impostos, é extremamente redutora, para além de juridicamente insustentável, pois que toda a atividade da AT deve obediência à Constituição e à lei.

58 Art. 2.º do Decreto-Lei 118/2011, de 15 dezembro.

59 Com efeito, é usual afirmar-se que muitos procedimentos que enformam a actividade da AT e

também alguns atos (administrativos e materiais) configuram-se como atos impositivos, o que provoca uma intrusão na esfera jurídica dos cidadãos.

Alcançar e sedimentar de um modo efetivo a ideia de que a AT não deve ser considerada como uma mera recetora de dinheiros provenientes dos impostos a que os cidadãos estão sujeitos, não é, no entanto, uma tarefa fácil.

Tal desiderato, implica, sobretudo, um forte empenho, na tarefa de educação tributária, que constitui uma das componentes específicas da denominada educação para a cidadania.

Pretende-se por esta via, prover que se interiorize, solida e gradualmente, a consciência coletiva da importância do Estado e dos seus meios de financiamento com vista à realização dos fins públicos, em benefício de todos os cidadãos.

Contudo, por outro lado importa acentuar ab initio, que no outro lado da relação jurídico tributária está o contribuinte, que não prossegue como objetivo fundamental o interesse público, mas antes o seu próprio interesse, portanto, o interesse individual que se materializa no direito à planificação em matéria tributária (planeamento fiscal). Por conseguinte, os contribuintes atuam de acordo com as suas convicções de gestão, tendo em vista, por meios lícitos, tornar menos onerosa a sua prestação.

O cidadão constitui um elemento fulcral da relação tributária, pois que, sem sujeitos não faz sentido falar em direitos.

De facto, o sujeito passivo, como elemento em relação ao qual se verificou algum dos factos, previstos na lei, quer de consumo, quer de detenção de riqueza ou atos reveladores de rendimento, é visto como o centro de interesse de imputação económica.

Do ponto de vista dos destinatários do imposto, impõem-se-lhes mais do que uma mera resignação ou aceitação do pagamento do imposto. Espera-se, igualmente, que estes assumam e interiorizem a consciência coletiva dos fins comuns e da comunidade.

E, é esta consciencialização que vai traduzir um maior grau de acatamento e respeito pelas leis tributárias, num reforço de legitimação da ação do Estado.

Existe, assim, uma intima ligação entre a interiorização psicológica do dever de pagar impostos, a satisfação das necessidades coletivas e o poder de atuação do Estado.

Cada cidadão possui uma consciência moral que influência o seu comportamento. Com efeito, o individuo é condicionado por valores morais que o levam a decidir

como atuar, qual a sua atitude em face das normas vigentes.60

Assim, tendo em consideração a diversidade de comportamentos que os contribuintes possam ter perante as obrigações fiscais, em função dos constrangimentos morais dos cidadãos, que influenciam esse comportamento, a administração tributária deve pugnar por um sistema fiscal eficiente e justo, pois que a perceção, por parte dos contribuintes, da existência de injustiça leva a um aumento do incentivo para agir em desobediência à lei fiscal e furtar-se aos seus deveres fiscais.

Acresce que, para além das motivações de natureza pessoal, comportamental e psicológica que influenciam, significativamente, o comportamento dos contribuintes, Também a conduta da própria administração tributária e o Estado, bem como as normas fiscais e atitudes dos outros contribuintes, os influenciam nas suas atitudes. Pelo que, a atuação dos contribuintes, face ao cumprimento das suas obrigações fiscais, não é desprovida de sentimentos nem de considerações morais, mas antes ponderadas pelo seu contexto institucional e social.

De facto, na sua qualidade de contribuintes, as ideias, sentimentos e perceções dos cidadãos, afetam a sua moralidade tributária, na medida em que o nível de satisfação destes com o governo, a confiança no Estado, a eficácia do sistema e um nível de cumprimento fiscal elevado, são igualmente, fatores que têm um impacto elevado para cultivar a motivação dos contribuintes e, em consequência, no cumprimento das suas obrigações fiscais.

Destarte, a confiança é um valor importante para cultivar a motivação do contribuinte.

E, a criação e manutenção dessa confiança depende do compromisso do Estado para agir em conformidade com as necessidades dos seus cidadãos, cujo desenvolvimento do sistema fiscal está em estreita proximidade com o poder.

60 Relativamente, ao cumprimento das obrigações fiscais importa, igualmente, referir que o

cumprimento fiscal é uma ato mais abrangente do que o mero pagamento do imposto devido, pois há que considerar ainda o conjunto de todas as obrigações acessórias, essenciais à liquidação do imposto.

Outra das estratégias para incentivar os contribuintes a cumprirem, voluntariamente, as suas obrigações fiscais consiste em melhorar a informação prestada pela AT, bem como, pela criação de programas de educação fiscal.

Com efeito, defende a investigadora Cidália Maria da Mota Lopes in “Fiscalidade –

Outros Olhares” 61 é necessário apostar na “educação do contribuinte” e , ao mesmo

tempo, aumentar e qualificar os recursos humanos da autoridade tributária no combate à evasão fiscal e à economia paralela.

A educação fiscal tem, assim, uma importância primordial, como uma política do Estado, para através de ações pedagógicas se incutirem princípios sociais e culturais, que tenham como objetivo estimular o cumprimento voluntário e consciente dos deveres fiscais do cidadão, enquanto membro de uma sociedade.

Nesse sentido, a administração tributária, através dessas ações pedagógicas, deverá transmitir os conhecimentos básicos, que expliquem a finalidade dos impostos e quais os requisitos elementares do sistema fiscal, na medida que essa informação ajudará os cidadãos a perceber e a compreender a realidade fiscal, nomeadamente quanto à função social dos impostos.

Com efeito, a educação fiscal constitui um instrumento de divulgação de informação com o objetivo de transmitir ao cidadão uma consciência social e da importância da necessidade de financiamento do Estado através da obtenção de impostos, para a realização dos seus fins, sendo, neste contexto, que a educação fiscal surge como processo educativo para a construção e exercício da cidadania.

É pois, essencial que nos conteúdos da educação fiscal sejam abordadas questões relacionadas com a responsabilidade cívica, nomeadamente, como a solidariedade, o papel do cidadão no Estado, o respeito pelos outros, a honestidade, a cooperação para o financiamento das necessidades públicas, a responsabilidade social do Estado, dar a conhecer o sistema fiscal português - origem e finalidade das normas tributárias, qual a natureza e missão da AT, a relação entre os impostos e a capacidade contributiva dos distintos agentes económicos, bem como da relevância do cumprimento das obrigações fiscais.

61 Cidália Maria da Mota Lopes, “Fiscalidade – Outros olhares”- “A psicologia fiscal e os custos

A educação fiscal tem como objetivo transmitir valores e atitudes favoráveis à responsabilidade fiscal dos contribuintes no sentido de o afastar da prática de condutas contrárias à lei e fraudulentas.

A educação fiscal é, assim, uma prática de extrema importância para todos os cidadãos contribuintes, na medida que os ajudará a perceber e a compreender a realidade fiscal, nomeadamente quanto à função social dos impostos.

Muito embora, a educação se revele, de facto, uma prática essencial, em Portugal ainda está muito pouco desenvolvida.

Num passado, recente, por exemplo, foi divulgado um incentivo da AT, que consiste no sorteio da “Fatura da Sorte”, no âmbito do qual são atribuídos prémios, às pessoas singulares que efetuaram aquisições de bens ou serviços em território nacional e que tenham solicitado a fatura da aquisição de bens e/ou serviços com o seu número de identificação fiscal.

Trata-se, sem dúvida, de uma medida que teve o mérito de ter chamado a atenção mediática do público em geral, contudo gerou, também, alguma controvérsia, pois que foi igualmente afirmado que mais importante que a atribuição de prémios, é uma estratégia punitiva para os contribuintes não cumpridores, bem como o aumento de recursos qualificados da AT.

De facto, o sorteiro da “Fatura da Sorte” pode ser visto como uma recompensa positiva para o comportamento honesto do contribuinte e, em consequência, constituir um incentivo para o cumprimento fiscal e para a consciência fiscal.

Não obstante, esta medida tem, também, efeitos perversos, na medida em que se verifica o aumento dos custos administrativos e de contexto dos contribuintes.

Com efeito, o Estado, deve desenvolver medidas cujo objetivo seja captar mais contribuintes para dentro do sistema e não, como acontece com o sorteiro da “Fatura da Sorte”, onerar os contribuintes, que já estão no sistema, com mais custos de cumprimento, uma vez que têm agora a missão de inspecionar os sectores de risco, pedindo fatura.

Acresce que, a atribuição de prémios em detrimento da educação do contribuinte pode ser uma forma rápida e popular da obrigação do dever de cidadania de pedir fatura, contudo, é duvidoso, que se aumente a consciência fiscal dos cidadãos.

Em conclusão, no atual contexto do Estado Social, os impostos deixaram de ser mera fonte de receita para o Estado, para passarem a ser utilizados como instrumento de realização de justiça. Pelo que, é fundamental a implementação de um programa de educação fiscal para que se se reforce a confiança na relação entre os contribuintes e o Estado.

Pelo que, é necessário, por um lado, sensibilizar os contribuintes para a importância da cultura física e tributária, no sentido de lhe transmitir valore e atitudes favoráveis à responsabilidade fiscal e, por outro, dar-lhe a conhecer o valor económico e a repercussão social dos bens e serviços públicos.

A par do programa de educação fiscal, é necessário, igualmente, uma administração forte e qualificada, no sentido apostar, na prática, com medidas certas dirigidas às pessoas certas para o combate á fraude e evasão fiscal, bem como, existirem recursos, humanos e materiais, qualificados e com formação adequada e contínua, pois que a complexidade do sistema fiscal e sucessivas alterações legislativas assim o exigem.

Bibliografia

BARROSO, Nuno & FALCÃO, Pedro Marinho, “Desafios Tributários”, Vida

Económica, Porto 2015

CAMPOS, Diogo Leite; RODRIGUES, Benjamim Silva & SOUSA, Jorge Lopes de,

“Lei Geral Tributária, comentada e anotada”, Editora Encontro da Escrita, 4.ª Edição,

2012,

CANOTILHO, J. J. Gomes & VITAL MOREIRA, “Constituição da Republica

Portuguesa, Anotada”, 4.ª Edição Revista, Volume I, Coimbra: Coimbra Editora,

2007

CARLOS, Américo Fernando Brás, “Impostos – Teoria Geral”, 2,ª Edição Actualizada

e Aumentada, Almedina, 2008

CATARINO, João Ricardo, “Para uma teoria Politica do Tributo”, Cadernos de

Ciência Técnica Fiscal , n.º 184, Centro de Estudos Fiscais, Lisboa 2009 , 2.ª edição

CATARINO, João Ricardo, “Redistribuição tributária – estado Social e escolha

Individual”, teses, Almedina, Coimbra 2008

COSTA, Joaquim Pedro Formigal Cardoso da, “A evasão e fraude fiscais face à

teoria da interpretação da lei fiscal” — Fisco n.º 74/75, Ano VIII, Lisboa, Janeiro-

Fevereiro 1996

DOURADO, Ana Paula, “Caracterização e Fundamento da Substituição e da

Responsabilidade Tributárias”, Ciência e Técnica Fiscal n.º 391, Centro de Estudos

FERREIRA, Eduardo Paz, in Entrevista, Revista TOC, n.º 105, Lisboa, Dezembro 2008

EUSÉBIO, Domingos Martins, “A declaração tributária de rendimentos”, Cadernos de

Ciência e Técnica Fiscal, N.º 75, Centro de Estudos Fiscais, 1968

FAVEIRO, Vítor, “O Estatuto do Contribuinte — A Pessoa do Contribuinte no Estado

Social de Direito”, Coimbra Editora, Coimbra, 2002

GUERREIRO, António Lima, “Lei Geral Tributária — Anotada”, Editora Rei dos

Livros, Lisboa, 2001

MARQUES, Paulo, “O Elogio do Imposto”, Wolters Kluwer Portugal sob a marca

Coimbra Editora, 1.ª Edição, 2010

NABAIS, José Casalta, “O Dever Fundamental de Pagar Impostos”, Colecção Teses,

Almedina, Coimbra 1998

NABAIS, José Casalta, “Por um Estado Fiscal Suportável – Estudos de Direito

Fiscal”, Almedina 2005

NABAIS, José Casalta & TAVARES DA SILVA, Suzana, “Sustentabilidade Fiscal em

Tempos de Crise”, Almedina, Coimbra 2011

PEREIRA, Paula Rosado, “Lições de Fiscalidade – Volume II – gestão e

Planeamento Fiscal Internacional”, no Capitulo 6 “Em Torno dos Princípios do Direito

Fiscal Internacional”, Almedina, 2015

RAWLS, John, “Uma Teoria da Justiça”, Lisboa, Editorial Presença”, 1993, 1.ª

ROCHA, Joaquim Freitas da, “Lições de Procedimento e Processo tributário”, Coimbra Editora, 2.ª Edição, 2008

SANCHES, José Luís Saldanha, “A Quantificação da Obrigação Tributária – Deveres

de Cooperação, Autoavaliação e Avaliação Administrativa”, Cadernos de Ciência e

Técnica Fiscal, N.º 173, Lisboa: Centro de Estudos Fiscais, 1995

SANCHES, José Luís Saldanha, “Manual de Direito Fiscal”, Coimbra Editora, 2007,

3.ª edição

SANCHES, José Luís Saldanha, “Justiça Fiscal”, Fundação Francisco Manuel dos

Santos, setembro 2010

SANTOS, António Carlos dos & LOPES, Cidália Maria da Mota, “Fiscalidade –

Outros olhares”, Vida Económica, 2013

TEIXEIRA, António Braz, “A Relação Jurídica Fiscal”, Cadernos de Ciência e

Técnica Fiscal, N.º 4, Centro de Estudos Fiscais, 1962

VASQUES, Sérgio, “Globalização e Igualdade Tributária, Colóquio: Os efeitos da

globalização na tributação do rendimento e da despesa”, Ciência e Técnica Fiscal,

n.º 188, Centro de Estudos e Apoio às Políticas Tributárias, Administração Geral Tributária, Lisboa, 2000

XAVIER, Alberto, “Manual de Direito Fiscal I”, Manuais da faculdade de Direito de

No documento O Estado fiscal e a cidadania fiscal (páginas 118-127)

Documentos relacionados