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- De acordo com depoimentos de especialistas e médicas entrevistadas há uma série de falhas no programa de Planejamento Familiar de Campo Grande referentes à qualidade do atendimento médico, à manutenção do estoque de medicamentos e conseqüentemente da continuidade da oferta dos métodos contraceptivos. Além disso, a logística de distribuição dos insumos ainda é defi ciente difi cultando o acesso e aquisição de anticoncepcionais pelas mulheres. A situação afeta sobremaneira as mulheres provindas da zona rural e dos estratos mais pobres da população.

- Foi possível observar em alguns depoimentos dos profi ssionais uma ambigüidade nas falas no que se refere à gravidez não planejada e abortamentos, pois, de um lado, revelam a insufi ciência das campanhas educativas e de informação sobre métodos contraceptivos e prevenção; por outro, tendem a responsabilizar exclusivamente

as mulheres pela situação.

- Os depoimentos das mulheres que interromperam a gravidez retratam que a assistência ao abortamento humanizado no Mato Grosso do Sul, conforme prevê as Normas Técnicas do Ministério da Saúde, está longe de confi gurar uma realidade. Esta situação é agravante entre as mulheres negras e de classe social baixa.

- Embora, de certo modo, haja boa cobertura da atenção obstétrica no Mato Grosso do Sul, a qualidade da assistência à saúde reprodutiva é precária, como pode ser constatado pelo número alarmante de gravidez na adolescência e elevada prevalência da cesariana e laqueadura tubária no estado, especialmente nos municípios de Campo Grande e Corumbá.

- Também foi verifi cado que a intervenção mais utilizada nos serviços de saúde para assistir as mulheres em processo de abortamento ainda é a curetagem pós-parto, um dos procedimentos mais caros e arriscados se comparados ao uso da Aspiração Manual Intra-Uterina (AMIU).

- Outro dado constatado foi a insufi ciência dos registros de notifi cação nos sistemas de vigilância epidemiológica sobre morbi-mortalidade materna e abortamento, inexistindo dados ou contendo informações contraditórias. - Conforme os depoimentos, o medicamento Cytotec® é largamente utilizado e de fácil aquisição na região das fronteiras com o Paraguai e Bolívia, campanhas de informação sobre o melhor uso do Cytotec® poderiam ser pensadas como medidas de redução de danos para as mulheres que, não tendo escolha diante da criminalização do aborto, recorrem a sua utilização.

- As mulheres da zona rural ainda sofrem com a distância, escassez de informação e precariedade dos serviços de

saúde disponíveis em decorrência do isolamento e da falta de capacitação dos profi ssionais para compreenderem as especifi cidades da vida no campo.

- É preciso investir em educação em saúde e campanhas de informação sobre métodos contraceptivos e prevenção às DSTs/Aids nas zonas de expansão da fronteira agrícola e de instalação das usinas no estado, região que apresenta intenso deslocamento sazonal com grande parcela de população migrante em busca de empregos. - A ausência dos indicadores desmembrados por raça/cor na quase totalidade dos sistemas de informação em saúde disponíveis difi culta análises mais abrangentes sobre a saúde das mulheres negras, japonesas e indígenas no que se refere à mortalidade materna e abortamento.

- Considerando que Mato Grosso do Sul possui a segunda maior colônia de japoneses do Brasil, pouco se sabe a respeito da vivência das mulheres desse grupo no que diz respeito ao exercício dos direitos sexuais e reprodutivos e à atenção à saúde reprodutiva.

- Considerando que o estado de Mato Grosso do Sul possui contingente grande de parcela da população negra, que a anemia falciforme é uma doença que tende a ser mais prevalente nesse grupo e que pode contribuir para complicações no parto e risco de abortamento, juntamente com o fato de essas mulheres fazerem parte da camada mais empobrecida da população, faltam estudos aprofundados que investiguem as relações entre as

características citadas e a morbi-mortalidade materna e abortamento.

- Considerando que Mato Grosso do Sul possui a segunda maior população indígena do país, é espantosa a quase completa ausência de dados epidemiológicos sobre óbitos maternos e abortamento nesse grupo. Além disso, depoimentos de pesquisadores destacam a precariedade da atenção à saúde das mulheres nas diversas etnias do estado, decorrentes do pouco preparo dos profi ssionais para lidarem com as particularidades culturais de cada povo indígena vivendo no campo ou na cidade, o que possivelmente coloca as mulheres indígenas no grupo de maior vulnerabilidade.

8. Recomendações

• Difundir a Norma Técnica de Atenção Humanizada ao Abortamento do Ministério da Saúde e monitorar e avaliar sua implantação nos serviços;

• Ampliar a utilização do método de Aspiração Manual Intra-Uterina (AMIU) nos serviços que já o utilizam e implantar o procedimento como rotina nos hospitais e maternidades do estado, principalmente nas áreas rurais, tendo em vista a constatação do seu benefício para as usuárias e para o serviço;

• Criar mecanismos e rotinas que visem diminuir o tempo de espera das mulheres em processo de abortamento; • Priorizar a melhoria da assistência ao planejamento reprodutivo em todo o estado, garantindo o acesso aos

métodos e à informação, incluindo os serviços de ligadura tubária e vasectomia;

• Garantir o atendimento ao planejamento reprodutivo pós-abortamento nas maternidades, referenciando as usuárias para a atenção básica;

• Garantir o atendimento psicossocial às mulheres em situação de abortamento nas maternidades públicas; • Desenvolver processo de educação permanente com profi ssionais de saúde, na perspectiva de gênero, dos

direitos sexuais e direitos reprodutivos, que tenha como foco a relação profi ssional de saúde-usuária, as questões relativas ao abortamento inseguro e ao aborto previsto em lei, visando à humanização da assistência; • Estimular a realização de pesquisas que possam dimensionar a questão da saúde sexual e reprodutiva a

partir do próprio ponto de vista das mulheres em interface com o meio em que vivem e suas especifi cidades culturais.

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