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ARTIGO 2 E NTRINCHEIRAMENTO ORGANIZACIONAL E COMPROMETIMENTO DE

3.4. Considerações finais

Os estudos de perfis e padrões, embora presentes em menor número na agenda de pesquisa sobre vínculos, são geralmente capazes de proporcionar maior compreensão da complexidade e multiplicidade de relações estabelecidas pelo indivíduo no contexto de trabalho. Dessa forma, promovem maior aproximação das configurações existentes na realidade e reduzem, por consequência, as limitações que acompanham as pesquisas que isolam as atitudes, cognições e comportamentos, em nome da possibilidade de entender a relação direta entre essas variáveis.

A presente pesquisa, além de contribuir para a identificação e a descrição de padrões de comprometimento e entrincheiramento, tem como principal destaque o fato de reunir novas evidências de discriminação desses vínculos. As funções extraídas das análises discriminantes possuem potencial relevante de distinção dos grupos, que apresentam diferenças qualitativas resultantes dos níveis de comprometimento e entrincheiramento.

A validade dessas funções é respaldada pelas taxas de classificação corretas dos indivíduos nos agrupamentos identificados, que ultrapassam os valores de referência gerados pelos cálculos de probabilidade. Portanto, o fato de haver áreas de intersecção entre os

clusters não afeta a significância estatística das diferenças verificadas. Ao contrário, as

intersecções são resultado da complexidade originada pelos múltiplos vínculos no trabalho, que não se combinam em configurações estáticas e predeterminadas, mas estão continuamente se alterando em função dos variados fatores do contexto de trabalho e de vida. Portanto, tais cruzamentos não invalidam a conclusão de que os padrões encontrados são qualitativamente distintos.

Por outro lado, a natureza dinâmica dessas configurações, que não pôde ser apreendida no presente estudo, traz como limitação a impossibilidade de generalizar os padrões para toda a população. Os clusters identificados são tentativas exploratórias de descrever disposições mais complexas dos vínculos do trabalhador com sua organização. É possível que haja, todavia, outros padrões possíveis não identificados, em razão das características da amostra investigada.

Por esse motivo, recomenda-se que esse tipo de estudo seja replicado com outras amostras, que preferencialmente abranjam trabalhadores mais velhos e com maior tempo de empresa, bem como um maior número de trabalhadores do setor público. Outros estudos de padrões podem considerar, além do foco organizacional, vínculos com outras instâncias do contexto de trabalho, ampliando o alcance da complexidade do fenômeno.

Em vista disso, recomenda-se, também, que estudos qualitativos sejam conduzidos a fim de complementar os achados já encontrados. Investigações com indivíduos que apresentem esses diferentes perfis permitirão explorar suas expectativas, intenções e comportamentos relacionados à organização, favorecendo maior entendimento dos seus vínculos. O Artigo 4, apresentado a seguir, foi concebido buscando atender a essa recomendação.

TRAJETÓRIAS PROFISSIONAIS

4.1. Introdução

Os vínculos com a organização tem sido objeto de interesse de pesquisadores e gestores há pelo menos cinquenta anos, quando os primeiros estudos mais sistematizados sobre comprometimento foram publicados. Desde então, pesquisas ocuparam-se em definir os vínculos, em sua maioria atribuídos ao conceito de comprometimento, e em estudar seus antecedentes e consequentes. A compreensão dos consequentes do comprometimento tinha como finalidade legitimar o construto e convencer estudiosos e organizações da relevância do tema. Já o estudo de antecedentes teve, desde o início, o objetivo de identificar os principais fatores que geram os vínculos, tanto para o entendimento de seu quadro teórico, como para o desenvolvimento de práticas de gestão.

Apesar dessa preocupação, a agenda de pesquisa da área vem sendo afetada pela mesma limitação presente na maior parte dos estudos sobre comportamento organizacional: a ausência de compreensão do contexto. Embora tenham o importante papel de investigar a relação entre variáveis, especialmente quando amostras representativas da população são alcançadas, os estudos quantitativos e de corte transversal não são suficientes para o entendimento completo de um fenômeno. Em se tratando da forma como os indivíduos se relacionam com as organizações, os estudos fortemente indicam que o tempo de empresa impacta no vínculo existente, o que permite inferir haver uma dinâmica de transformação dos vínculos do trabalhador em sua história com a organização. Ainda assim, os delineamentos metodológicos observados na área, especialmente nas produções internacionais, continuam apresentando dificuldades em capturar essa dinâmica.

No estágio atual da pesquisa sobre comprometimento e, mais especificamente, neste ponto da tese, evidências foram reunidas para embasar um conjunto de argumentos reestruturadores da agenda de pesquisa na área: 1) o comprometimento possui uma essência central que deve ser o foco das pesquisas (Klein et al., 2009; Meyer & Herscovicht, 2001) e que, certamente, reside na base afetiva (Rodrigues & Bastos, 2010, Solinger et al., 2008); 2) a base de continuação não deve ser considerada parte do construto de comprometimento, mas sim do entrincheiramento (Artigo 2, Rodrigues & Bastos, 2011); 3) embora sejam

positivamente relacionados, o comprometimento afetivo e o entrincheiramento organizacional são vínculos distintos, que geram perfis de vínculo também diferenciados (Artigo 3, Scheible, 2011).

Diante desse quadro, o interesse deste estudo é avançar na compreensão do comprometimento e do entrincheiramento com a organização por meio da análise da dinâmica de formação desses vínculos: primeiramente, dissecar casos representativos que revelem o percurso de construção e desenvolvimento de vínculo para, em seguida, confrontá-los, destacando as especificidades de cada trajetória que levaram ao padrão atual de comprometimento e entrincheiramento.

O comprometimento com a organização, que por muito tempo foi estudado a partir de uma perspectiva tridimensional, é aqui abordado em sua essência unidimensional: um elo entre o indivíduo e a organização baseado no compartilhamento de valores, identificação e afeto. O entrincheiramento organizacional engloba o tipo de vínculo instrumental que, até então, era atribuído ao comprometimento por meio da base de continuação. É definido por Rodrigues e Bastos (2011) como a tendência do indivíduo a permanecer na organização devido a: possíveis perdas de investimentos no processo de adaptação (ajustamentos individuais a posições sociais), custos associados a sua saída, como perda de benefícios, recompensas financeiras e estabilidade (arranjos burocráticos impessoais) e devido à percepção de poucas alternativas fora daquela organização (limitação de alternativas).

Depois de concluir que comprometimento e entrincheiramento possuem validade discriminante (Artigo 2), o presente artigo avança ao revelar como cada um desses vínculos se desenvolve diante de diferentes eventos na história do indivíduo com sua organização de trabalho (narrativas profissionais). Portanto, este estudo apresenta relevância teórica, em vista do restrito número de pesquisas com delineamentos que permitam a investigação da dinâmica dos vínculos. Apresenta também relevância prática, por contribuir para estudos voltados para a gestão dos vínculos nas organizações.