• Nenhum resultado encontrado

Pesquisar não é reproduzir a realidade, mas construir interpretações inteligentes. Por não refletirem estas diretamente a realidade, pois são interpretações subjetivas, ainda que metodicamente reguladas, as explicações são apenas aproximações possíveis e sempre frágeis, cuja finalidade não é encerrar, mas animar a discussão infinda (Pedro Demo, 2005: 77).

Para lançar um novo olhar sobre o turismo social, através do levantamento, estudo e análise de registros, procurei preencher brechas, esclarecer dúvidas e contribuir com a reconstituição da história do Sesc relacionada às práticas turísticas, ainda pouco analisada criticamente e conhecida entre os pesquisadores brasileiros (Rodrigues, 2010: 182). Um passo decisivo no desenvolvimento da pesquisa histórica foi a escolha da documentação. Ainda assim, uma indagação continua persistindo: será que as

176

fontes a que tive acesso e selecionei me possibilitaram refletir sobre o fenômeno em questão, resguardando-me dos riscos de incorrer em anacronismos e superficialidades?

Uma reclamação recorrente entre as pessoas que buscam o registro de memória em órgãos da área do turismo – considerando-se as empresas públicas, privadas e mistas do setor, de diversas matizes - é a falta de consciência dos profissionais e das instituições em arquivar e conservar documentos de todos os tipos e naturezas. No Sesc não foi diferente. Luiz Pina deixa isto evidente durante a entrevista, ao mencionar também a importância da tese aqui exposta:

Então, a importância histórica do Sesc infelizmente ainda não foi devidamente reconhecida, devidamente avaliada e devidamente registrada, nesse sentido esse trabalho é muito importante porque ele vai, sem dúvida, levantar alguns aspectos que foram esquecidos ao longo do tempo. A própria instituição não se preocupou em registrar a sua história de uma forma organizada. Ela tem documentos, tem registros, mas isso não está sistematizado e organizado como poderia.

O entrevistado Evandro Cenevira (ex-gerente do Sesc-Paraíso) corrobora com o que foi colocado por Pina, afirmando ser este um dos pontos fracos da instituição: “Nós escrevemos pouco, nós documentamos pouco, e o documento faz a trilha, a pegada, o caminho pra que outros se apropriem”.

Mesmo na academia, ou mais especificamente no campo da História, percebe-se que a temática que envolve a investigação aqui descrita é

177

relativamente nova. Melo, ao citar Burke, considera que, na esfera da pesquisa histórica “a possibilidade de considerar os momentos de diversão como objeto de estudo começa a se delinear melhor [...] no âmbito das propostas da Nova História Cultural e de seu intuito de considerar as práticas culturais como assuntos de primeira grandeza” (2010: 5). Há um denotado desenvolvimento dos estudos históricos no campo de pesquisas do lazer nas últimas décadas, onde a busca de novas fontes e o rigor metodológico têm se destacado entre as preocupações centrais (Melo, 1998). A despeito do relativo avanço ainda existem muitas instituições, práticas e personalidades a serem estudadas, o que sem dúvida poderia contribuir para tornar mais múltipla a compreensão acerca do percurso histórico do lazer e seus mais diferentes temas e facetas, incluindo sua configuração enquanto direito social (Melo, 1998).

Valéria Guimarães traz reflexões pertinentes para o turismo enquanto objeto das pesquisas historiográficas:

[...] a história do turismo fora sempre vista como um tema menor e desimportante e não atraía o interesse dos historiadores nem dos turismólogos e profissionais de áreas afins. [...]. Esse movimento de escrita de uma história do turismo, com as

ferramentas próprias do historiador, resulta numa história problematizadora e crítica, com uso apurado das fontes, atenta às especificidades locais, às tensões e contradições do fenômeno turístico. Não há mais lugar para a reprodução do discurso turístico oficial ou dos folhetos comerciais como verdades históricas. Também está superado o pensamento linear acerca de uma harmoniosa evolução do turismo desde tempos remotos (2011: 434).

178

Mais recentemente percebe-se uma mudança em relação ao cuidado com a memória do Sesc-SP. Ajuízo como o lugar concretamente mais importante para a pesquisa de documentos o setor relativamente recente nomeado de Sesc-Memórias, que catalogou documentos escritos, fotográficos e audiovisuais que ainda persistiam nas unidades e na administração central, recebendo também a doação de (ex) funcionários da instituição oriundos de várias áreas. Flávia Costa, gerente adjunta da Gepse, explana sobre isso:

[...] era uma outra visão das coisas né, e o Sesc é uma instituição muito do fazer mesmo; pensar também, mas a gente tem muito essa coisa de fazer atividade, de ter o público e tal, então, isso antigamente não era uma coisa muito relevante, você ter registro; há pouco tempo, assim, a gente começou a dar um valor institucionalmente né, um valor maior pra isso: o Centro de Memória é bem recente, deve ter talvez uns quatro anos, se tanto assim, acho que por aí. (entrevista concedida no dia 05 de setembro de 2012).

Quando a entrevistada fala que o Sesc é uma instituição mais “do fazer”, apreendo uma tentativa de justificar a ausência na trajetória da instituição de preocupação com a memória. Além disso, observo que Costa, de certa forma, enxerga uma divisão entre o fazer e a pesquisa, ou entre prática e teoria - mesmo levando-se em conta que talvez o regional de São Paulo seja um dos departamentos que historicamente mais se aproxima do saber138. Acho que

138 Na sua história, o Sesc-SP ocasionalmente fez pesquisas de demanda, buscando saber as

preferências dos comerciários e usuários. Não foi possível saber o quanto estas (poucas) investigações efetivamente influenciaram nas suas estratégias e ações. Estes tipos de pesquisa às vezes trazem resultados pífios (óbvios e superficiais), sem muita relevância e densidade, incapazes de manobrar plenamente planos e programas. Me parece que o primeiro

179

esta concepção é fruto do cotidiano de trabalho dos profissionais do Sesc, inseridos em demandas e compromissos que muitas vezes afastam a possibilidade de problematização – a qual considero uma ação. Apoiando-se nas palavras do sociólogo Marcellino (2010: 2), exponho, o que na opinião dele, seria a superação da dicotomia entre teoria e prática:

Se entendermos “teoria” como um conjunto de conhecimentos não ingênuos, com graus diversos de sistematização e credibilidade e que se propõem explicar, elucidar, interpretar e unificar um dado domínio de problemas que se oferecem à atividade prática, e “prática” como saber provindo da experiência e, ao mesmo tempo, aplicação da teoria, poderíamos, ao invés de sua dicotomia, compreender o que Saviani (1980) denomina “dialética estabelecida entre ação, reflexão, ação”. Dessa forma chegaríamos não a uma dicotomia teoria e prática, mas a um conceito que não lhes esgotasse a extensão, ou seja, a uma unidade que não pode e não deve ser entendida como unificação, no que se chama de “práxis”.

O Sesc poderia ser ainda mais competente nas suas iniciativas se existissem mais chances de refletir sobre suas ações, se pudesse mesclar intensamente o fazer com o pensar e o aprender, se se enxergasse efetivamente no seu papel cardial de mediador cultural das regiões e localidades em que atua139. Mobilizo para esta reflexão a pesquisadora Mary R.

e último grande e denso estudo de demanda turística realizado no Sesc-SP data de 1978, intentando implantar o programa de turismo social no ano seguinte. (tive acesso aos resultados deste estudo no Sesc-Memórias, num livro de capa vermelha – não-paginado – de mais ou menos 200 folhas, frente e verso).

139 Mesmo que continue a ser uma instituição setorista (formada a partir/para um específico

segmento de classe), a entidade apresenta enorme facilidade financeira e de recursos, tendo capacidade para investir mais em pesquisa, conhecimento e para ampliar seu campo de atuação e inserção na sociedade. Resta saber se isto faz parte do seu escopo institucional.

180

Power: “refletir sobre experiências do presente e do passado faz com que o conhecimento questione e reorganize as categorias sob as quais colocamos nosso conhecimento, fazendo com que estejamos abertos e possamos nos adaptar como mediadores” (1999: 379).

Uma autocrítica apontada pela entrevistada Silvia Hirao, atual coordenadora de turismo social da Gepse/Sesc-SP, diz respeito à dinâmica de trabalho da instituição, impeditiva muitas vezes da criatividade e da inovação por parte dos seus profissionais-mediadores:

Acho que a gente tem um mérito muito grande de conseguir diversificar nossos roteiros, de conseguir apresentar uma variedade de programações dentro do mesmo destino. [...] a gente consegue ter essa dedicação pra pesquisa e pra formatação desses roteiros. O nosso sonho é que a gente consiga fazer isso muito mais do que a gente faz. Atualmente a gente acaba se perdendo muito nas questões administrativas, operacionais, que no turismo são questões muito trabalhosas e que acabam emperrando o trabalho [...]. Então tem uma pessoa lá de artes visuais que consegue criar um roteiro de artes que uma outra pessoa não conseguiria, com outra formação, então a gente consegue ter uma..., dessa forma. Porém, muitas vezes essa pessoa de artes visuais tá tão atolada de trabalho administrativo que ela acaba só replicando o que já existe ou então fazendo roteiros que são... que não tem nada de novo. Então a gente gostaria que fosse muito melhor. (Grifos meus).

Um traço desta passagem pode ser ilustrado na afirmação de Schnitman e Littlejohn, retiradas da coletânea que compuseram, intitulada “Novos paradigmas em mediação”:

181

Um mediador com treinamento metacognitivo não fica limitado pela experiência anterior, trabalha com base no princípio, e não na regra, e evita modelos de prática estritamente lineares. Esses mediadores veem seu trabalho como uma experiência orgânica de aprendizagem, à medida que constantemente planejam, iniciam, avaliam e modificam suas práticas [...]. A mediação incorpora, assim, uma ecologia da virtualidade, do que não existe ainda, e pode considerar-se então como um empreendimento que, a partir da diversidade e da diferença, constrói uma gama de práticas e significados entre o que é e o que poderia ser. Mediante o traçado de itinerários singulares, o processo de mediação projeta trajetórias possíveis num futuro, explora as bifurcações, as múltiplas alternativas e utiliza as variações e a aleatoriedade para criar novidade (1999: 104).

Manobrando esta questão trazida pelos autores para o ato de pesquisar, mais especificamente para o meu processo na pesquisa, exprimo nos parágrafos seguintes as metamorfoses que aconteceram no bojo da investigação.

No início, a ideia era pesquisar, além do turismo social no Sesc-SP, a administração regional do Sesc-RJ, uma vez que já tinha realizado minha dissertação de mestrado acerca de um projeto deste departamento e, logicamente, pela minha proximidade geográfica140. Contudo o Sesc-RJ na época passava por uma situação político-administrativa complicada, deixando alguns profissionais fragilizados e por conseguinte, limitando a chance de entrevistar os servidores que pudessem colaborar com a tese.

140 Moro e trabalho na cidade de Niterói (região metropolitana do Rio) e o doutorado em

História, Política e bens Culturais do Cpdoc realiza-se na Sede da FGV em Botafogo, bairro carioca.

182

Após sugestão de Aline Corrêa141 -– visitei em 2012 o departamento nacional do Sesc e fui muito bem recebido pela equipe técnica de turismo social da instituição. Na ocasião, tive uma frutífera conversa sobre a visão do Sesc-DN a respeito do turismo social e do papel da entidade, além do acesso a alguns documentos e bibliografia relevantes para a tese. Neste mesmo ano começara minha pesquisa de campo no Sesc-SP142, instituição que também já reconhecia, por ter trabalhado no Sesc-Bertioga durante uma temporada e por ter feito uma pós-graduação Lato sensu no Senac-SP durante os anos de 2004 e 2005, como importante para tentar compreender o turismo social. Na medida em que fui entrevistando (ex)profissionais e visitando o Sesc-Memórias, descobri que, pelo Know how, expertise e complexidade, esse regional realmente tinha muita “história para contar” e, além disso, as pessoas estavam dispostas a contribuir com a tese, reconhecendo o valor e o propósito da pesquisa.

Enquanto revisitava as entrevistas por meio das transcrições e desenvolvia a escrita da tese, a opção pelo Sesc-SP definitivamente parecia ser a mais acertada. Justifico a escolha do Sesc-SP pelo pioneirismo mostrado deste ao longo da história, numa trajetória que apresenta transformações interessantes. Durante o processo, me questionei constantemente, buscando

141 Aline fizera a pesquisa de campo da sua dissertação na biblioteca do Sesc-DN, sediado na

Barra da Tijuca (bairro do Rio de Janeiro); suas pesquisas são mencionadas nesta tese na Introdução e no capítulo 2 – referenciadas como Corrêa (2008) e (2010).

142 Este início de pesquisa de campo foi facilitado pelo meu deslocamento prévio à capital

paulista, agendado em função de três congressos da área que lá aconteceram e que participei como apresentador de trabalho: o Seminário da Associação de Pesquisa e Pós-graduação em Turismo, o Congresso Latino-Americano de Investigação Turística e o Encontro Nacional de Turismo de Base Local.

183

novos contatos e conhecimentos por conta destes questionamentos. Pelo que pude observar e ouvir, em outros regionais o turismo social foi e é enxergado como algo menos complexo, pois não precisou ser encarado como um “problema”; para estes departamentos, o turismo social é simplesmente “levar pessoas para conhecer lugares por um preço mais acessível, experiência possível por ser o ‘Sesc’”.

Após o exame do desenvolvimento, da provisão e dos valores subjacentes ao turismo social em momentos inerentemente distintos do Sesc- SP entre 1979 e 2013 (Sesc-Roosevelt/Paraíso/Paulista & Gepse), observei semelhadas e diferentes ideologias/visões na organização e execução do turismo social durante este percurso. A pesquisadora Lynn Minnaert143 afirma que há no imaginário do trade, dos acadêmicos e de outros profissionais da área turística a ideia de que o turismo social é “atrasado”, no sentido de pouco inovador, ou de algo que não é moderno. Ao articular este debate com a opinião de alguns dos profissionais contemporâneos do Sesc-SP, percebe-se que a Gepse é vista como sinônimo do moderno, com seus roteiros “criativos” e “edificantes”, e o período anterior (especialmente o que antecede 1979) como o antigo, reproduzindo as mesmas práticas e pacotes ou somente levando os comerciários para o Sesc-Bertioga, sem uma preocupação educacional - pelo menos na visão pedagógica dos servidores do Sesc entrevistados coevos à época da pesquisa.

143 Minnaert dedica-se a investigar o turismo social no mundo há mais de uma década – a

afirmação no corpo do texto foi expressa pela pesquisadora em uma das reuniões que tivemos durante o estágio de pesquisa realizado na Universidade de Surrey. Fui autorizado por Minnaert a mencionar a ideia exposta.

184

Além da já debatida necessidade de ter que se ajustar, a facilidade de recursos proporcionada pela natureza financeira da instituição promoveu na Gepse e parcialmente na unidade Roosevelt/Paraíso a liberdade para criar, seguindo a opção pelos roteiros que, na opinião deles, seriam diferenciados, podendo até arriscar programações e experiências “inovadoras” e “inéditas”. Diante disto, surgem algumas interrogações: a trajetória do Sesc-SP efetivamente levou-o a um cunho mais educativo nas suas ações turísticas do que outros regionais? Conforme sentenciado por quase todos os profissionais entrevistados, será que existe tanta distinção entre pacotes turísticos considerados “clássicos”144 & excursões/passeios ditos “pedagógico- culturais”145? Por que a experiência dos segundos seria mais notável, na opinião dos profissionais do Sesc-SP? E por que a necessidade premente de expor esta opinião como se fosse um axioma?

Como todas as experiências humanas, a turística é ambígua, complexa, inclassificável e plural. Na ânsia de elevar o lazer e suas práticas, ao quererem mostrar que ele é respeitável, vários profissionais e acadêmicos irão enxertar nas experiências turísticas valores como “transformação social”, “fortalecimento

144 Como por exemplo, os pacotes turísticos para Porto Seguro e Ilhéus, já exemplificados no

capítulo anterior.

145 Determinados entrevistados nitidamente regozijam-se em contar suas ideias “criativas”; o

discurso apresenta também ingredientes de valorização do trabalho realizado, independente da época em que operaram. Alguns exemplos podem ser vistos na transcrição da entrevista conjunta realizada com Scaranci e Barbosa, em que eles ilustram o “Roteiro do cemitério da Consolação” e a “caminhada pela Avenida Paulista e sua história”. O “Roteiro do lixo” claramente envolve a perspectiva da educação pelo turismo; os participantes aprendem todos os processos relativos à origem e ao encaminhamento dos despejos, detritos e resíduos na capital paulista (informação retirada da entrevista com Kieling – Gepse). Observa-se nestas ações e tantos outros projetos que o lazer é enxergado exclusivamente como ferramenta para algum outro conteúdo. Alguns destes roteiros aqui descritos podem ser vistos nos anexos 77, 78 e 79.

185

de consciências” e “enriquecimento cultural”, que contingentemente não cabem nelas e/ou não precisam linearmente caber146. Por mais enaltecedor que possa parecer este enfoque, o lazer continua a ser vislumbrado somente quando apresenta um papel definido e específico. Será que ele não pode ser considerado um tempo/espaço para manifestações “livres” em que a primordial “função” seja a simples busca pelo prazer?

Várias produções acadêmicas apresentam uma visão moralista ou binária a respeito do lazer e de suas manifestações. Alguns autores trazem uma dicotomia revestida na “batalha” entre lazer-espontâneo X lazer- institucionalizado, notada na citação de Débora Silva:

Além da notável difusão do lazer via Sesc, a partir de 1969 foi cada vez mais frequente o uso do termo ‘lazer’ nos discursos políticos, destacando-se principalmente as práticas consideradas saudáveis como forma de combate ao ócio, considerado um perigo social. O lazer se constitui, aos poucos, como um instrumento de disciplina e organização da sociedade, voltado ao ajustamento e à educação social, fato que pode ser observado por meio da análise das formas de controle dos usos diversificados do “tempo livre”, que na época passaram a ser substituídas por formas de lazer institucionalizadas (2008: 101).

146 Não acho que, por ser um campo científico relativamente jovem e que por isso, recebe

pouca visibilidade e apoio acadêmico, deve-se postular o lazer como o fenômeno mais importante do mundo, o direito mais relevante de todos ou uma necessidade vital a todo ser humano, conforme ilustrado na fala de Gastal e Moesch, a respeito do turismo enquanto atividade de lazer: “[...] mais do que uma atividade econômica, o se deslocar para fora de suas rotinas espaço-temporais é uma necessidade humana” (2007: 43; grifo meu). Especialmente no campo de estudos turísticos, vê-se a tentativa consciente ou não de alguns pesquisadores de contrabalançar, mostrando o quanto um fenômeno relegado a 2º plano nas ciências sociais seria “ultra proeminente”. Mais do que uma necessidade ou obrigação, enxergo a experiência turística como uma interessante possibilidade de lazer.

186

Uma parte da academia reforça esta dicotomia entre lazer espontâneo e institucionalizado (apresentado com o sentido de controlado), como se não existisse a possibilidade de ser “espontâneo” em experiências organizadas por instituições diversas, como se negasse o fato de que na modernidade quase todas as experiências individuais/coletivas são de certa forma agenciadas, institucionalizadas, capitalizadas e organizadas - total ou parcialmente - por terceiros. Para mim, este fato não retira dos sujeitos e grupos a possibilidade de resistir, subverter, se adaptar, ressignificar e mesmo se alienar diante de possíveis tentativas de controle institucional sobre “o que fazer” e “como se portar”.

187

Figura 29: Encarte “Ética do viajante”.

188

Dessa maneira, deve-se sim relativizar a possível generalização acerca do turismo social, “personificando” as peculiaridades de cada caso/exemplo. Mesmo que haja ingredientes civilizatórios no Sesc-SP, propagando a mensagem “viajando com a gente, você consegue cultura e educação”, ao me aproximar, não vejo unilateralmente intencionalidades “diabólicas” de uma instituição que quer controlar as pessoas para exercer mais poder. Enxergo antes de tudo que a propaganda acontece por uma questão de posicionamento de mercado, atrelada a uma imagem institucional: o Sesc, por possuir muito dinheiro, e apresentar um caráter misto - quase público - taticamente precisa justificar sua relevância social, oferecendo em suas programações conteúdos ditos “diferentes”, “novos”, “enriquecedores”, ou seja, o acesso a uma “outra cultura” que o indivíduo, no discurso da instituição, provavelmente não conseguiria sem ela – conforme a homilia dos profissionais de turismo social, “não conseguiria com a CVC ou com a TV”.

De maneira mais direta do que todas aquelas conjugações conceituais arroladas no capítulo 3, analisemos o entendimento de turismo social no discurso de Silvia Hirao, uma das coordenadoras da área no Sesc-SP:

São três questões: é o acesso, é o formato, a forma de operacionalização e a responsabilidade, está em todas essas. Porque está no acesso, é você promover que se chegue às pessoas que não tem acesso. No formato, quando você pensa em todos os atores da cadeia, o formato quando ele, pra ele ter