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O tema e as questões discutidas neste trabalho foram levantadas a partir de elementos encontrados no percurso universitário e profissional aos quais tive a oportunidade de ter acesso. As questões referentes ao narcisismo, conceito desenvolvido por Freud e abordado exaustivamente em sua obra e nos textos pós- freudianos e freudolacanianos foram de suma importância para o desenvolvimento da hipótese apresentada neste trabalho. Nesse sentido, as características sociais contemporâneas das quais fiz uso para exemplificar e tipificar o que apresentei tiveram igual importância.

As mudanças na forma como são construídos os laços sociais passaram a ser percebidas a partir das décadas de 70 e 80, como pudemos observar através das teses desenvolvidas por Lasch e Freire Costa, atentando ao fato de que essas mudanças somente são observáveis a posteriori, através de um processo que ocorre de forma lenta, porém contínua. Progressivamente, passamos de uma cultura fundada na culpa e no regramento moral para outra onde prevalece a liberdade do sujeito, das formas de expressão e de afetos, e das compulsões. De uma configuração vertical, onde prevalecia a hierarquia e a autoridade paterna, passamos a relações horizontais, onde as questões são discutidas de forma modular, onde cada sujeito tem direito de ter suas ideias expostas, respeitadas e efetivadas no plano social.

Onde isso acontece, podemos perceber um aumento dos casos de agressão e violência, tendo em vista o fato da invasão de um espaço subjetivo pelo outro, onde o direito à liberdade é amplamente difundido, mas a liberdade do outro incomoda, já que seria cômodo para o sujeito que o outro fosse semelhante ou senão igual à sua própria imagem, que este se mostrasse suscetível às mesmas regras e gostasse ou desgostasse das mesmas coisas. A tal liberdade então aparece como empecilho no que o sujeito deseja do outro, não restando mais espaço para discussão, onde “a violência aparece a partir do momento em que as palavras não tem mais eficácia. A partir do momento em que aquele que fala não é mais reconhecido” (MELMAN, 2003, p. 69).

Nesse espaço social que se apresenta cada vez menor e mais sufocante devido à presença constante do outro, os sujeitos têm apresentado meios de integração ou de defesa diversos dos estudados por Freud no século passado. Com

isso temos o narcisismo, onde o sujeito para evitar o desprazer causado pelo sofrimento dessas relações e demandas excessivas, se retira e investe em si e em seu corpo a libido com a qual deveria fazer laço social com o outro.

Através de um discurso imperativo de felicidade e de bem-estar socioeconômico, os sujeitos se veem deslocados e desagregados de seus pares. Dessa forma, vimos como o sujeito desconhece sua própria realidade e seu próprio sofrimento, alienados à produção política das formas de sofrer e à nomeação de seu sofrimento pelo outro da medicina. Com isso, pudemos observar como o recuo do sujeito do convívio social é causador de sintomas, que, por sua vez, são produtores de sofrimento quantitativamente e qualitativamente excedentes, levando os sujeitos à passagem ao ato em forma de suicídio, como resposta a algo de que não conseguira dar conta, por causa da fragilização simbólica que se pode observar atualmente.

Após a leitura do referencial teórico utilizado na produção deste trabalho, creio que o narcisismo seja um conceito central na teoria psicanalítica contemporânea, pertinente a toda forma de acolhimento, desenvolvimento e trabalho com os sujeitos, visto que engloba conceitos como pulsão, sublimação, o conceito de libido, de transferência e as configurações tópicas do aparelho psíquico.

Dito isso, penso agora sobre a falta que faz o aprofundamento de alguns conceitos devido ao pouco tempo que resta de uma jornada de trabalho e estudo universitário ao longo do Curso, conciliando isso com o lazer e o cuidado de si, atenção à família e amigos. Esse trabalho final só reforça o que foi percebido e transmitido pelos Mestres ao longo do curso, de que enquanto profissionais temos a responsabilidade ética de constantemente nos aperfeiçoarmos através dos estudos e de estar atentos aos fatos que ocorrem nos níveis social, econômico, subjetivo e em tudo o que diz respeito ao sujeito.

Portanto, sem eximir o sujeito de sua responsabilidade frente às exigências do social, e sem denegar a ele seu desejo, pelo contrário, cabe a nós profissionais instigá-lo e auxiliá-lo na compreensão de tal desejo de forma que possa retomar as rédeas de sua própria subjetividade e modo de ser, para recuperar sua posição e seu pertencimento à cultura e sociedade nas quais esteja inserido, bem como aprofundarmos nossas noções acerca dos momentos socio culturais pelos quais passamos para sermos efetivos nesse auxílio.

Também, diante das teorias e a partir das leituras que compuseram esse trabalho, o tema escolhido, no que tange à questão relacionada ao suicídio poderia ter sido desenvolvido de forma mais abrangente, o que foi limitado pela extensão do trabalho. Isso de que falo diz respeito a ideias discutidas com professores e que têm ligação com as leituras e teorias às quais tenho tido acesso, bem como ao clima político social e a forma como os laços sociais estão se estabelecendo atualmente. Através da reflexão sobre os números alarmantes e crescentes dos casos de tentativa e de suicídio efetivo na população global, penso se não existiria ou estaria emergindo um novo discurso – como os discursos do alcoolista/toxicômano – que amarra os sujeitos, conduzindo-os a tal ato mortífero, derradeiro. Assim, é possível lançar um dentre muitos questionamentos sobre o suicídio. Seria um ato individual do sujeito, ou teríamos algo que emerge enquanto reposta ao sofrimento psíquico causado pelas formas de laço social que se constituem atualmente? E ainda: é possível o suicídio compreendido enquanto ato que encerra as demandas excessivas do discurso social para que o sujeito se veja livre de tais amarras?

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