• Nenhum resultado encontrado

O presente trabalho de conclusão de curso partiu da premissa de que as perdas drásticas que acontecem ao longo da vida geram dor e sofrimento psíquico que repercutem de maneira singular para cada sujeito. Isso se deve ao fato de que os recursos psíquicos são singulares, pois, enquanto algumas pessoas elaboram a perda através de um trabalho de luto, outras acabam se deparando com saídas patológicas.

Mediante isso, no decorrer deste trabalho, buscou-se fazer uma correlação entre a perda da mãe (como representante do primeiro objeto de amor do bebê) com as possíveis perdas drásticas do futuro, como, por exemplo, a morte de um ente querido, a separação amorosa radical, e a perda de um ideal, ou status social.

Vimos que o sofrimento sentido nas perdas futuras é uma atualização da perda do objeto primordial, isso porque, diante da perda do objeto de amor, o eu sente a repetição da perda originária, ou seja, a perda do seu narcisismo. Entendemos que a perda primordial acontece na vida do bebê, sendo direcionada a sua mãe, e se trata de um processo natural, que, por sua vez, impulsiona o sujeito a procurar preencher a falta que a ausência do Outro materno lhe causou.

Destacamos que essa busca vai permanecer constante na vida da pessoa que, de alguma forma, vai tentar preencher a falta a partir da escolha de novos objetos de amor. Todavia, devido ao caráter de finitude das coisas, esses novos objetos de amor que foram eleitos no decorrer da existência

também poderão sair de cena, gerando sofrimento compatível com um trabalho de luto.

Por isso nos remetemos aos eventos constitutivos referentes a magnitude das primeiras perdas vividas na infância para, assim, se entender o grau de intensidade das posteriores perdas alusivas ao destino de cada um, pois, no decorrer desse trabalho, concluímos que as perdas futuras atualizam o sofrimento psíquico decorrente das perdas do começo da vida, que foram necessárias para a constituição do sujeito psíquico em uma posição desejante.

Sendo assim, após um lapso de tempo, algumas pessoas elaboram a perda a partir de um trabalho de luto, estando novamente aptas a investir sua libido em um outro objeto de amor. Já outras, mesmo com o passar dos anos, não conseguem ressignificar esses momentos. Dessa forma, a não elaboração do luto das perdas da infância leva o sujeito a uma condição patológica, marcada pela dificuldade ou pela impossibilidade de ressignificação das perdas futuras, o que resultaria em uma inviabilidade de estruturação do desejo.

Dessa forma, a procura por um trabalho psicanalítico poderia contribuir para que o processo do luto fosse instaurado na pessoa abalada, a fim de que, após certo lapso de tempo, ela pudesse novamente sentir desejo de amar, podendo eleger um novo objeto de amor. Assim, obtivemos bom resultado ao procurar entender qual seria a função do luto diante de uma perda drástica, cuja resposta para Freud seria a de que, após um trabalho de luto, o eu ficaria desimpedido para amar novamente, e, para Lacan, a função do luto seria a de estruturar a constituição do desejo.

A partir da leitura de Nasio, Peres, e Allouch, percebemos que Lacan disse algo novo no que tange ao objeto do luto, o que contrapõe em parte a teoria freudiana, para a qual o objeto no luto seria da ordem narcísica i(a) e passível de substituição, enquanto que para a teoria lacaniana, seria também o objeto narcísico i(a), porem diante da dimensão da perda, esse objeto não seria passível de substituição, representado então pelo objeto pequeno a. O luto para Freud é do nível consciente, por isso a pessoa sabe o que perdeu ao perder alguém, enquanto que, para Lacan, além da pessoa saber que perdeu alguém, ela não sabe o que perdeu ao perder esse alguém, dando a perda um

aspecto inconsciente, sem que o enlutado esteja preso há um estado patológico, ou a uma estrutura melancólica.

Dado o exposto, o trabalho de luto requer tempo para que seja elaborado. Algumas pessoas passarão por ele mais rápido, outras de maneira mais lenta, mas, o que importa é que nenhuma estará livre dos sentimentos de pesar, pois não há trabalho de luto que não tenha dor. Basta ver que nem a criança pequena é poupada do sofrimento que a perda da mãe lhe causou. Por esse motivo, diante de uma perda drástica, perdemos muito mais do que um objeto de amor, perdemos um pedaço de nós mesmos, dado que o afeto sentido com a perda sempre é resultado de uma repetição, pois atualizarmos o sentimento gerado pela perda do narcisismo infantil, que rememora o tempo da ilusão de plenitude que o bebê sentia de ser fusionado com o Outro materno.

REFERÊNCIAS

ALLOUCH, Jean. Erótica do luto: No tempo da morte seca. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 2004. 410 p.

BASTOS, Angélica; CASTILHO, Glória. A função constitutiva do luto na estruturação do desejo. In: Estilos da Clínica. V.18, n.1: 89-106, jan./abr. 2013.

CHEMAMA, Roland. (Org.). Dicionário de psicanálise Larousse. Trad. Francisco Franke Settineri. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1995.

DARRIBA, Vinicius. A falta conceituada por Lacan: da coisa ao objeto a. Ágora (Rio J.) [online]. 2005, vol.8, n.1, pp. 63-76. ISSN 1809-4414. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/agora/v8n1/v8n1a05.pdf> Acesso em: 13 nov. 2015.

DOR, Joël. Introdução à leitura de Lacan: O inconsciente estruturado como linguagem. Trad. Carlos Eduardo Reis. Porto Alegre: Artmed, 1989. 203 p.

FERREIRA, Ellen de Paula. A separação amorosa: uma abordagem psicanalítica. In: Psicanálise & Barroco. v.8, n.1: 56-97, jul.2010 Disponível em: <http://www.psicanaliseebarroco.pro.br/revista/revistas/15/p&brev15ferreira.pdf > Acesso em: 07 jan. 2015.

FERREIRA, Nádia. A teoria do amor na psicanálise. Coleção Passo-a-passo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004, 71 p.

FREUD, Sigmund. A dissolução do complexo de Édipo (1924). In: Edição

standart brasileira das obras completas de Sigmund Freud. Trad. José

Octavio de Aguiar Abreu, v. XIX (1923-1925). Rio de Janeiro: Imago, 2006.

______________. Além do princípio do prazer (1920). In: Edição standart brasileira das obras completas de Sigmund Freud. Trad. Christiano Monteiro Oiticica, v. XVIII (1920-1922). Rio de Janeiro: Imago, 2006.

______________. Luto e melancolia (1917). In: Edição standart brasileira das obras completas de Sigmund Freud. Trad. Christiano Monteiro Oiticica, v. XIV (1914-1917). Rio de Janeiro: Imago, 2006.

______________. Sobre o narcisismo: uma introdução (1914). In: Edição

standart brasileira das obras completas de Sigmund Freud. Trad.

Christiano Monteiro Oiticica, v. XIV (1914-1917). Rio de Janeiro: Imago, 2006.

______________. Os instintos e suas vicissitudes (1915). In: Edição standart brasileira das obras completas de Sigmund Freud. Trad. Christiano Monteiro Oiticica, v. XIV (1914-1917). Rio de Janeiro: Imago, 2006.

______________. Psicologia de grupo e análise do ego (1921). In: Edição

standart brasileira das obras completas de Sigmund Freud. Trad. James

Strachey, v. XIV (1914-1917). Rio de Janeiro: Imago, 2006.

______________. Esboço de psicanálise (1940 [1938]). In: Edição standart brasileira das obras completas de Sigmund Freud. Trad. James Strachey, v. XXIII (1937-1939). Rio de Janeiro: Imago, 2006.

GARCIA-ROZA, Luiz Alfredo. Freud e o inconsciente. 24. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009. 236 p.

LACAN, Jacques. O estádio do espelho como formador do eu tal como nos é revelada na experiência psicanalítica. In: Escritos. (1949). Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

______________. A lógica da castração. In: O seminário, livro 5: As formações do inconsciente (1957-1958). Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999.

______________. A angústia (1962-1963). O seminário, livro 10. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006.

LEVY, Lídia; GOMES, Isabel Cristina. Relações amorosas: rupturas e elaborações. In: Tempo psicanalítico, Rio de Janeiro , v. 43, n. 1, jun. 2011 .

Disponível em

<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101- 48382011000100003&lng=pt&nrm=iso> Acesso em: 18 jun. 2015.

MOLINA, Silvia Eugênia. O bebê na estrutura especular: o corpo e a linguagem. In: Escritos da criança. Porto Alegre: Centro Lydia Coriat, 1996.

NASIO, J.D. O livro da dor e do amor. Trad. Lucy Magalhães. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1997. 220 p.

PERES, Urânia. Depressão e melancolia. Coleção Passo-à-passo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.,2003, 64 p.

VIOLA, Sandra Maria Costa; VIEIRA, Marcus André. Trabalho de luto e experiência analítica: transitoriedade e contingência. Rio de Janeiro, 2008. 72p. Dissertação de Mestrado – Departamento de Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

Documentos relacionados