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No que diz respeito a políticas públicas de turismo, há, na esfera governamental federal, uma incompatibilidade histórica entre a teoria e a prática, razão explicada, em parte, pelo fato de o turismo ter sido, por muito tempo, visto como um setor periférico da economia. Segundo Sansolo & Cruz (2003), “...em termos de planejamento governamental, ainda não vivenciamos um processo completo em que a política pública federal e o plano nacional de turismo fossem objetivamente organizados, devidamente congruentes e necessariamente publicizados.”

Ainda no campo das negligências, é fato reconhecer que a participação da sociedade civil na elaboração de políticas públicas no país, e de políticas de turismo, especialmente, é historicamente efêmera quando não simplesmente nula. No caso do Jalapão, no que tange à participação da coletividade na formulação de políticas ambientais e de turismo, as comunidades tradicionais locais foram excluídas do processo de criação do Parque Estadual do Jalapão, e foram, ainda, “classificadas” como atrativo cultural para o turismo. A regularização das terras ocupadas historicamente pelas mesmas tem sido ignorada e sua cultura, social e historicamente construída, tratada como mercadoria.

Quanto aos programas federais analisados, o PROECOTUR resumiu-se à elaboração de diagnósticos de potenciais turísticos, sensibilização e capacitação de mão-de-obra, aquisição de alguns equipamentos e modernização de algumas vias de circulação, como vias urbanas e terminais fluviais. Já o Programa de Regionalização do Turismo, que é um programa de gestão da atividade do turismo, consolida o Jalapão como “região turística”, ao menos no plano das intenções.

No Tocantins, destacam-se, ainda, “no plano das intenções, uma política estadual e um plano estadual de turismo. Segundo os organismos estaduais

oficiais, tanto a política estadual de turismo quanto o Plano de Desenvolvimento Turístico Estadual deveriam ser apresentados no fim de 2006, fato que não ocorreu. Enquanto isso, a prática do turismo no Estado está atrelada aos programas federais que incidem sobre seu território e por ações privadas isoladas, caracterizando uma desorganização das ações do setor.

O Tocantins, por ter baixos indicadores sócio-econômicos, carece de investimentos em diversos setores. Questões relacionadas à energia, circulação e regularização fundiária são prementes. Além disso, pelo fato de os destinos turísticos eleitos pelo governo estadual incidirem sobre áreas que são unidades de conservação, faz-se imprescindível associar ações de cunho ambiental às ações do setor turístico.

Apesar da criação de políticas federais para o desenvolvimento do turismo e o claro interesse também do poder público estadual pelo turismo no Jalapão, a atividade não parece ser uma prioridade entre as prefeituras locais, evidenciando certo descompasso entre ações políticas federal e estadual e ações políticas locais. Deficiências estruturais na área de saúde, educação, saneamento e transportes dificultam a transformação, de fato, dos municípios contemplados pelo “Pólo Ecoturístico do Jalapão”, em territórios do turismo. Trata-se de municípios pouco urbanizados, com poucas ruas pavimentadas e com iluminação pública parcial, muitas residências sem rede de esgoto, enfim, uma região economicamente bastante atrasada, se comparada, por exemplo, aos chamados “espaços luminosos” (Santos, 2004) do país, espalhados pelo território brasileiro na forma de manchas mais ou menos descontínuas. De outro lado, faz-se necessário colocar: tem de ser o turismo o destino do Jalapão?

No que se refere à infra-estrutura turística propriamente dita, muito pouco foi modificado ou construído para atender à demanda de turistas que aflui para a região durante a alta temporada (maio a setembro), caracterizando certa rusticidade do espaço (o que se caracteriza como um atrativo para certo perfil de

turistas). Não há hotéis de qualidade, os restaurantes são bastante simples, há uma agência bancária em cada cidade, a produção de artesanato é incipiente e há pouca circulação de veículos e ônibus pelas condições das estradas77 (a única

estrada pavimentada é a que liga Palmas a Ponte Alta do Tocantins)78, etc.

O “destino ecoturístico do Jalapão” está muito mais pautado na psicoesfera, ou seja, no discurso que se construiu sobre ele, que na tecnoesfera, quer dizer,na materialidade requerida por um uso turístico do território.

Por fim, vale dizer que não se pode superestimar metas propostas nas políticas federais de turismo. Não é o turismo, isoladamente, que gerará mais empregos, diminuirá a pobreza, protegerá o meio ambiente, gerará mais divisas, amenizará as discrepâncias regionais existentes no país, etc. A mudança deve ser estrutural e não setorial. As ações de desenvolvimento horizontal devem superar as de origem vertical, evidenciando a participação de atores locais na execução das políticas e de descentralização na gestão do setor.

Enfim, o Jalapão é apenas mais um destino eleito como de grande potencial turístico na Amazônia e, por conseguinte, no país, mas que sofre do mesmo mal que muitos outros também sofreram: o uso político e indiscriminado de suas qualidades (ambientais, paisagísticas, culturais etc.) para a composição de um discurso que pouco ou nada contribui para a transformação da região em benefício do desenvolvimento regional, compreendido como desenvolvimento econômico e social.

77 Se por um lado a inexistência de vias de circulação de qualidade prejudica a circulação de

turistas pela região, por outro lado contribui para manter a natureza preservada de alguma forma.

78 Praticamente todo o agenciamento e os sistemas de informações centram-se nas grandes

capitais e em Palmas, onde já existe um ônibus turístico que liga a capital à cidade de Ponte Alta. Nesse município e em Mateiros há alguns moradores que organizam pacotes de visitação aos atrativos turísticos da região.