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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A rápida urbanização da população mundial, em busca de novas oportunidades e empregos, tem aumentado o consumo de bens industriais e serviços que fazem uso intensivo da energia. “Por volta do ano 2005 metade da população do mundo viverá em áreas urbanas, por volta do ano 2025, esse número será de duas pessoas em três”. (HENDERSON, 1996, p.31)

Esse crescimento acelerado da urbanização, observado por diversos estudiosos, tem causado enormes pressões sobre os países em desenvolvimento levando-os a proporcionarem infra-estrutura para a população.

As políticas econômicas adotadas, ao longo dos anos, pelo Brasil, privilegiaram os setores em que dominavam a elite empresarial, concedendo-lhes benesses da produção ao preço. Estradas, ferrovias, usinas de energia elétrica eram construídos para manter o desenvolvimento industrial, ou para ocupação do território nacional. O modelo de desenvolvimento nacional era focado para o macro, sem respeitar as diferenças e peculiaridades regionais.

O processo de descentralização do desenvolvimento proposto pelos governos militares, na década de 1970, visava dirigir parte desse contingente populacional que se deslocava para as metrópoles, para as cidades médias e que apresentavam um tamanho populacional entre 100 e 500 mil habitantes. Transformadas, por força de planos governamentais, em diques que buscavam estancar esse fluxo populacional, as cidades médias passaram a ofertar incentivos fiscais e qualidade de vida para atrair os investimentos das indústrias, principalmente para as de grande porte. Como no caso de Poços de caldas, que por volta da década de 1970, começa a receber indústrias de grande porte e de capital estrangeiro, como a Alcoa, Fertilizantes Mitsui, etc.

Pressionadas entre o foco do crescimento local e das políticas do governo, as cidades médias acabam fazendo o inverso, isto é, primeiro buscam atrair as empresas, para depois começar a preparar-se tanto no aspecto da infra-estrutura (energia, água, saneamento), como na preparação de mão-de-obra qualificada. Dowbor (1999, p. 30) demonstra que esse modelo perverso de descentralização das atividades produtivas carregou consigo outro problema: a concentração de renda que só será amenizada através de um novo conceito de desenvolvimento.

Franco (2004, p.104) distingue a diferença entre os conceitos de desenvolvimento humano e desenvolvimento social. O desenvolvimento humano permite distinguir o aumento da renda, o atendimento aos cidadãos quanto a saúde e educação e até a sua capacidade nutricional, mas ainda considera-o insuficiente. Há a necessidade de desenvolver relações de convivência social, isto é, “relações cooperativas entre os indivíduos – que geram padrões replicáveis de convivencialidade - que produzem capital social” e, portanto desenvolvimento social.

Esse modelo que alia o desenvolvimento humano com o desenvolvimento social, desperta uma participação democrática, por meio das redes sociais compostas por parcerias entre Estado, mercado e sociedade civil.

Não é um modelo novo, mas diferente, pois propõe criar não um modelo único, mas milhões de projetos de desenvolvimentos que respeitem o local e sua conectividade e façam com que as pessoas possam participar, conviver e atuar.

“Em outras palavras, a comunidade decide, e o técnico reencontra a sua função real, que é a de se colocar a serviço de uma instância política ajudando a encontrar soluções adequadas, e não impondo um “planejamento” técnico a uma população passiva”. (DOWBOR, 1999, p.25).

A garantia do direito do cidadão, quanto aos serviços públicos, estabelecida na Constituição Federal, de universabilidade, acessibilidade e tarifas módicas, pressupõem instâncias locais de discussão, por parte da sociedade, de como e de que forma pretende, recebê-los e pagá-los. Envolve um novo pensar dos governantes e da própria comunidade, uma cultura de desenvolvimento social local e global.

A municipalização dos serviços de energia elétrica em Poços de Caldas (MG) suscita uma série de questionamentos quanto as suas vantagens e desvantagens. Afinal, é um serviço público prestado por concessionária municipal sob regulação de uma agência federal (Aneel).

Dentre os aspectos positivos do modelo municipalizado de energia elétrica destacam- se as questões técnicas e políticas . A escolha do sistema energético aproveitando os pequenos cursos d’água para instalação das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), como forma de complementar o fornecimento realizado pelas grandes usinas, demonstra a racionalidade na utilização dos recursos hídricos, como a preocupação ambiental. A força da classe política torna-se fundamental para o modelo de gestão municipalizada evitando por muitos anos, o encampamento pela concessionária estadual (CEMIG). A criação de uma empresa nova, DME Energética Ltda, permitiu o avanço para novos investimentos do setor fora das bases territoriais do município, na busca da auto-suficiência no atendimento para os habitantes da área urbana e rural .

O reconhecimento da população pelos serviços prestados pelo DME é acompanhado periodicamente por pesquisas de opinião, que afirmam a qualidade dos serviços e o pronto atendimento às necessidades do consumidor.

Os levantamentos realizados pelo DME apontam que as tarifas praticadas no município são mais baratas do que as cobradas pelas concessionárias, estaduais e nacionais. Isso devido a utilização racional dos recursos hídricos, tecnológicos e financeiros.

A continuidade administrativa do Departamento, demonstrada pelos longos períodos no cargo por um mesmo diretor, é também um fator que ultrapassa os mandatos dos prefeitos e vereadores, reconhecendo sua atuação técnica, em vez da utilização do cargo para fins eleitoreiros.

O interesse de prefeituras da região, em aproveitar o modelo energético do Departamento, para aumentar a eficiência energética de seus municípios, confirma os avanços do sistema. A atuação do DME em outros Estados, como participante de consórcios formados por empresas privadas, reafirma o conhecimento técnico do setor de energia elétrica, como na construção de usinas e de pequenas centrais hidrelétricas.

A tecnologia e a capacidade política do Departamento de Eletricidade de Poços de Caldas (MG), foram pontos cruciais para que ele se tornasse a primeira autarquia municipal do Brasil, autorizada pela Agência Nacional de Energia Elétrica-Aneel.

Entretanto, os aspectos negativos do modelo são discutidos e reconhecidos, mas colocados como inevitáveis pelos políticos e técnicos, como por exemplo, a questão ambiental para a formação de grandes represas para a construção de usinas hidrelétricas. Existe a preocupação da direção do DME em atender a legislação ambiental. São utilizados recursos técnicos para amenizar os danos ambientais, como o estudo prévio dos tipos de mata quando se faz necessário a inundação do local, como a transposição dos animais ali existentes. Mesmo assim, é inegável a transformação paisagística e ambiental das áreas onde são construídas as usinas e as PCHs, mesmo que estas, representem um menor impacto

Estudos realizados pelo próprio DME demonstram a preocupação com a poluição dos rios. Foram feitas algumas tentativas para mobilizar representantes de outros municípios que usufruem dos mesmos recursos hídricos , mas até agora não se consolidaram.

É ainda impossível para o Departamento fornecer energia para 03(três) grandes empresas instaladas no município, que apesar de se encontrarem na área de concessão do

Departamento, são supridas pela CEMIG em caráter precário. São elas, Alcoa (produtora de lingotes de alumínio), Fertilizantes Mitsui (produtora de fertilizantes) e Rhodia-Ster (Indústria química); o fornecimento pode ser requerido pelo DME, mas ainda não há capacidade técnica de oferta de energia, nem interesse, no que diz respeito a negociação das tarifas praticadas. Assim a auto-suficiência de energia para o município exclui essas empresas

Outro aspecto seria quanto a participação da sociedade no Conselho de Consumidores, órgão obrigatório pela legislação da Aneel. Mesmo formado por representantes das diversas associações comunitárias, ainda exerce papel mais informativo do que opinativo. A participação dos conselheiros se restringe em solicitar e reclamar sobre a prestação dos serviços, do que propriamente na gestão da autarquia. Dowbor (1999) reafirma a dificuldade de se formar uma cultura de planejamento e de participação social nas questões locais.

A dificuldade de compreender a tecnologia do setor de energia elétrica é o fator mais destacado pelos conselheiros, que encontram na engenharia do processo uma barreira intransponível para compreensão dos leigos, firmando-se na respeitabilidade do corpo diretor o encaminhamento de planos e novos investimentos .

A participação do cidadão, referida por diversos autores como a única possibilidade de democratizar as políticas públicas, apresenta-se incipiente nos setores de infra-estrutura cujo arcabouço, jurídico e técnico, dificultam sua compreensão, mas essa “aprendizagem social” somente se consolidará quando os demais atores envolvidos compreenderem importância de se viver no local.

Diante das dimensões global e local, a “Carta da Terra”, documento aprovado pela UNESCO em março de 2000, aponta uma ecumene planetária: a Terra, casa de todos que deve, portanto, ser cuidada por todos como um ser vivo. É preciso que cada comunidade escreva sua carta da terra, respeitando suas diferenças, mantendo os quatro princípios norteadores:

• Integridade ecológica;

• Justiça social e econômica; e • Democracia, não violência e paz.

O projeto global realiza-se no local, não se trata de construir uma aldeia global, senão milhares de aldeias globais (FRANCO, 2004).

Esse trabalho pretende incentivar os novos modelos de gestão pública municipalizados, diversos mecanismos de avaliação e garantir a “participação e a compreensão dos cidadãos” para construir o local onde se possa viver em paz.

A eficiência produtiva era um dos principais objetivos e também a justificativa primeira da reforma do sistema elétrico. Mas questões fundamentais não foram embutidas, e respostas para elas podem ser o início de uma nova forma de interação entre Estado, empresas e cidadãos. Universalizar o consumo em um contexto de altas carências regionais; a importância da eficiência distributiva, principalmente em um país como o Brasil, onde a distribuição de renda e riqueza é uma das piores do mundo; a questão ambiental; a transparência de informações; e a consolidação de um órgão regulador independente de pressões políticas e empresariais, são premissas básicas para essa discussão. (SZKLO e OLIVEIRA, 2000)

Ainda que as soluções sejam relativamente complexas, é necessário ampliar a discussão sobre as formas mais eficiente de prestação de serviços públicos à sociedade, para oferecer um padrão de vida digno.

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