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As indagações sobre a prática de leitura dos alunos do Ensino Médio da Escola Estadual Dom Silvério, em Mariana (MG), permearam este trabalho durante todo o processo de elaboração e pesquisa. O que se pretendeu desde o princípio foi desvencilhar das respostas que beiravam o senso comum, mas, sem dar-me conta, estive muitas vezes presa a elas.

O desafio para o professor pesquisador é perceber que suas práticas precisam ser sempre revistas de forma reflexiva e que os resultados dos alunos demonstram, em muitos casos, os efeitos da maneira como algo lhes foi ensinado.

Associada à questão do ensino, deparamo-nos com a falta de incentivo e fomento à educação brasileira e à formação continuada de professores. Faltam propostas que busquem atingir melhores níveis na educação com o respaldo necessário para que os estudos feitos por especialistas saiam do papel. Faltam políticas que associem educação, esporte e cultura e deem condições para que o estudante tenha possibilidade de se dedicar ao estudo. A nossa preocupação em elevar os índices da educação não se baseia nos números, mas na qualidade do ensino a ser ofertado e o modo como isso impacta a vida dos alunos.

Dessa forma, quando obtivemos dos alunos os dados para descrever as práticas de leitura realizadas por eles, vimos que as afirmações correntes no senso comum de que os alunos não leem não foram confirmadas. Os dados mostram que os alunos do Ensino Médio realizam suas leituras das mais variadas formas. Aqui, não estamos restringindo à leitura do texto escrito, mas ampliando à toda manifestação que permite interação, aprendizado e comunicação. Podemos dizer que a resistência à leitura se dá pela negação do texto que não produz sentido para o leitor quando a proposta feita pelo professor não deixam claros os objetivos de leitura.

O percurso do trabalho coincide com a apropriação do objeto de pesquisa pelo professor pesquisador no sentido de estabelecer um olhar para a prática de leitura na sala de aula voltado para a atuação dos dois sujeitos que

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se colocam em lados opostos. Embora o foco da pesquisa seja a prática de leitura dos alunos, a atuação do professor não pode ser desprezada, já que é ele quem direciona as atividades dos alunos. Assim, o estudo do objeto de trabalho do professor torna-se um dos caminhos para compreender a melhor maneira de conduzir o processo.

A fundamentação teórica deste trabalho esclarece que a chamada “crise da leitura” não é algo recente na história da educação e vem se perpetuando desde o período colonial do Brasil. Isso se explica pelo fato de, no país, a relação de poder limitar o acesso à escolarização. Essa força determinada na relação de poder reflete nas notas das avaliações do PISA, por exemplo. No quadro 1, Médias e medidas de erro padrão dos países selecionados por edição, leitura – PISA 2000-2015, se acompanharmos a trajetória do Brasil, percebe-se que houve poucos avanços durante os quinze anos de realização da avaliação. Analisando o quadro na vertical, vê-se que os países que ocupam o topo do ranking de melhores notas nas avaliações são os países com maiores PIB e IDH, o que confirma que a qualidade da educação está associada a essa relação de poder. Os países mais ricos obtêm maiores notas, os países pobres continuam na base, no lugar mais baixo da tabela.

A observação de que as relações de poder determinam a ordem social e, consequentemente, influenciam a qualidade de ensino ganha relevância quando se verifica a importância do letramento na formação dos leitores. Além de considerar as práticas de letramento, considerar que os sujeitos possuem identidades flutuantes pode contribuir para tornar a prática docente uma atividade que ultrapasse o entorno da sala de aula e promova impacto tanto no desenvolvimento escolar como no pessoal. A autonomia leitora e o desenvolvimento do raciocínio crítico são fatores de transformação e permitem a independência do sujeito e o empoderamento, garantindo liberdade e conquistas.

Conforme apresentaram os quadros, os sujeitos da pesquisa geraram dados que contribuíram para a compreensão de como ocorre a prática de leitura dos alunos do Ensino Médio e como as aulas voltadas para essa prática podem ser direcionadas a partir delas. Trata-se de criar estratégias que

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desenvolvam tais habilidades e elevem o nível de leitura dos alunos de forma a contribuir para sua formação e autonomia leitora.

Quando o sujeito é levado em consideração, aspectos identitários entrelaçados constituem a sua formação, como sua história, suas conquistas, suas práticas, seus medos e seus anseios, marcados por muitas dimensões, (SOUZA; CORTI; MENDONÇA, 2012). Há, nesses aspectos, traços que promovem aproximação de sujeitos que compartilham de semelhanças em determinadas características ou promovem distanciamento por apresentarem traços identitários que se opõem. A discussão sobre as marcas identitárias é uma prática que contribui para o diálogo e para a avaliação de situações reais e que fazem sentido para o aluno, pois o define como sujeito ativo na sociedade.

Quando os alunos têm um momento para falar de si, de suas ações e suas práticas, como aconteceu nas rodas de conversa, descobre-se que a escola tem um acervo significativo de recursos a ser explorado e que os próprios alunos podem ser construtores do próprio aprendizado. O professor, na sala de aula, deve ser mais próximo dos alunos. A experiência de construir significado e aprender com os estudante, por exemplo, é uma ideia que permite a construção de uma aula dialógica e interativa em que é possível haver uma troca de ideias em que o professor ensina ao mesmo tempo em que aprende, e o aluno aprende ao mesmo tempo em que ensina. Esse processo dialógico é um experimento para o professor pesquisador, permitindo que ele reveja e redirecione sua prática.

Em relação à interface professor-pesquisador, posso dizer que há um conflito de vozes determinado pelas práticas enraizadas no ensino que se viram diversas vezes questionadas diante das observações a partir da pesquisa. Essa relação, embora conflituosa, proporcionou muito aprendizado e muitas indagações sobre o fazer do professor e sobre as condições de trabalho no contexto da escola pública.

Foi significativa a mudança ocorrida do início da pesquisa até o momento das análises e é possível afirmar que houve mudanças relevantes no modo de analisar a própria prática e as devolutivas dos alunos. O fazer em sala

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de aula passa a ser o objeto de observação e não apenas o aluno. Nesse sentido, Moita Lopes (2003, p.84) diz

Este conhecimento, por envolver o professor na produção de conhecimento sobre sua prática social, tem, inclusive, um caráter emancipatório que o liberta de rezar pelas cartilhas de outros e que o faz produzir conhecimento que lhe interessa mais propriamente [...].

Moita Lopes defende que o professor pesquisador deve se apropriar de sua formação e de suas indagações para realizar pesquisa, já que o espaço onde ele atua é privilegiado por oportunizar uma reflexão crítica acerca de questões que ainda precisam ser resolvidas.

Para finalizar, a descrição sobre as práticas de leitura dos alunos do Ensino Médio da Escola Estadual Dom Silvério mostrou que os alunos têm uma prática de leitura que ainda é pouco explorada pela escola. Em relação aos dados apresentados pelas professoras, notamos que há preocupação em trabalhar leitura de textos que fazem parte do dia a dia dos alunos, tentando fazer com que a atividade tenha sentido e seja aceita pelos estudantes. A formação continuada dos professores é de fundamental importância para promover reflexões sobre a prática de ensino, mas os professores não recebem incentivo para realizá-la.

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