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Através da incursão empírica, observou-se que as instituições situadas na amostra têm como principal provedor o Estado. De acordo com as ideias de Boaventura de Souza Santos (2002), o papel democrático dessas organizações estaria maculado, visto que o Poder Público exerceria grande influência no funcionamento dessas instituições, dificultando, desse modo, o exercício do controle social e da democracia participativa.

Entretanto, a Abong se contrapõe àquilo que acredita o autor, visto que sua estrutura de tomada de decisões, segundo a representante estadual da associação, Alessandra Nilo, é horizontal e prima pela participação de todas as associadas ou, pelo menos, da maioria delas, sem a influência dos financiadores. Ademais, a postura crítica e incisiva da associação em relação ao Estado não se altera em função deste participar do seu fomento. Dessa forma, verifica-se que não se encontra na Abong o paternalismo filantrópico trazido por Lester.

Contudo, no que toca à insuficiência filantrópica, foram encontradas algumas nuances. Lester Salamon (1987) afirmou que as instituições não recolhem recursos suficientes para a realização de suas atividades. E, de fato, sem a participação do Poder Público no financiamento das organizações, foi possível averiguar que tal tese se aplica à realidade da amostra, visto que muitas afirmam não haver sustentabilidade financeira sem o fomento do Estado.

Dessa forma, percebe-se que algumas associadas da Abong do estado de Pernambuco se encontram ligadas ao Poder Público no que tange à sua sustentabilidade. O problema desse cenário não está no financiamento do

Estado, afinal, é seu papel participar desse processo. Contudo, a existência de um vínculo de dependência com a Potestade Pública dificulta o processo de fortalecimento e desenvolvimento institucional, visto que o Terceiro Setor deve ser autônomo o bastante para defender os interesses da sociedade civil organizada.

Destaque-se, outrossim, que tal relação com o Poder Público é reflexo da situação tanto cultural quanto legislativa do Brasil, sem descartar aspectos socioeconômicos do país. No primeiro ponto, observou-se que muitos desconhecem uma importante ferramenta de financiamento das entidades sem fins lucrativos: a possibilidade da destinação do imposto de renda aos fundos sociais. Tal fato diminui a arrecadação de recursos fora do âmbito estatal, o que torna necessária a elaboração de uma estratégia de divulgação para dar ampla publicidade a esse mecanismo, incentivando tal costume na sociedade brasileira. No que tange ao segundo ponto, uma mudança na redação da Lei 9.249/95, a fim de se permitir às pessoas jurídicas que se utilizam do lucro presumido para a base de cálculo do imposto de renda a destinação do tal tributo, promoveria um aumento significativo no financiamento privado do Terceiro Setor, aumentando sua autonomia frente ao Poder Público e promovendo um fortalecimento institucional. E, por fim, os dados trazidos de PIB e renda per capita mostram que foge do campo da possibilidade de grande parte da população, que possui uma renda restrita à sua subsistência, realizar doações a entidades filantrópicas.

Ademais, é mister salientar que deve ser fomentada também a geração de recursos próprios por parte do Terceiro Setor. A ausência de vinculação entre fontes de financiamento diversas e as entidades desse segmento é o patamar máximo de desenvolvimento institucional no que toca à sustentabilidade financeira. A independência das instituições decorrentes da sua capacidade de autofinanciamento promove uma liberdade de atuação significativa e facilita o cumprimento dos seus objetivos.

Esta pesquisa, portanto, mostrou que o campo do Terceiro Setor é complexo e traz muitas vicissitudes, principalmente no que tange ao seu financiamento. A relação de dependência com uma única fonte provedora de

recursos prejudica sua atividade e sua própria manutenção, principalmente no que toca ao fomento do Estado, tendo em vista a função de controle social que as entidades pertencentes a essa categoria possui. É urgente, portanto, a disseminação de medidas voltadas à captação de recursos diversos, de modo a priorizar e, de preferência, profissionalizar esse segmento, assim como conscientizar a população da importância das entidades sem fins lucrativos, fomentando a participação da iniciativa privada na sustentabilidade desse setor. Por derradeiro, vale salientar que vai de encontro ao bom senso fazer qualquer afirmação generalizada que abarque o Terceiro Setor como um todo. Trata-se de um ramo extremamente diversificado e os dados colhidos tanto da amostra quanto de pesquisas disponíveis são limitados e não alcançam todo o universo das entidades sem fins lucrativos. Através dessa investigação, foi possível ter conhecimento de realidades locais e particulares acerca de uma amostra delimitada, que podem ou não refletir o cenário da sociedade civil como um todo.

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