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Capítulo 4. Uma proposta poética como exercício das possibilidades que o Museu

5. Considerações finais

O museu faz parte, a seu modo, da casa de sonhos da coletividade.

Walter Benjamin

As propostas de leitura para as obras apresentadas no item 4.5 deste capítulo oferecem apenas um pequeno recorte para exemplificar algumas das muitas possibilidades da leitura da obra de arte no museu. A Proposta de Atividade consiste em uma tentativa de abrir espaço para a prática da Arte-Educação e da Comunicação Museológica. Cria, dessa forma, um campo aberto para reflexões, junto com a equipe do museu pesquisado, a orientadora desta pesquisa e os demais membros da academia da Universidade de São Paulo, que colaboraram para sua construção.

O Museu Casa da Xilogravura já possui uma estrutura muito bem montada, que possibilita a educação em museus e aproveita o acervo de forma bastante coerente. Elaboramos uma proposta poética pensando em apenas quatro obras, para criar um espaço de reflexão e avaliação na construção deste trabalho, porém as 22 salas que o museu abriga abrem inúmeras possibilidades para a leitura da obra de arte em um todo significativo.

Um fato importante a ser considerado é a presença da madeira no museu, tanto como objeto de expografia, como meio/material que representa para o Museu Casa da Xilogravura. Entre as várias possibilidades157 de ações educativas que o museu pode oferecer, podemos destacar as relações entre o artesanato em madeira em Campos do Jordão e os xilógrafos, já que o museu abriga um acervo de suas obras.

Há uma forte ligação da obra do professor Antonio Fernando Costella com a variedade de tipos de madeira presente na cidade. Em entrevista com o professor em fevereiro de 2011, notamos que a pesquisa em madeira, feita por ele, tomou rumos diferentes quando se tornou cidadão jordanense. Esse fato ocorreu devido à presença abundante de madeira na Região da Serra da Mantiqueira.

A pesquisa xilográfica do professor Antonio Fernando Costella teve seu principal foco na xilogravura feita em madeira de topo. Esse tipo de corte de madeira quase sempre

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Tivemos a oportunidade de entrevistar a artista e professora da Faculdade Santa M arcelina, Iole Di Natale, em seu ateliê, em São Paulo, no dia 16/03/2011. Ela nos deu depoimentos a respeito de sua xilogravura chamada Opressão, de 1983, que pertence ao acervo expográfico do M useu Casa da Xilogravura de Campos do Jordão. O documento constará como referência para o setor educativo. A entrevista na íntegra consta dos anexos do Capítulo 4.

necessita de um galho de árvore quase inteiro, de tamanho grande ou médio, para que se obtenha uma matriz. Observa o xilógrafo:

A xilogravura de fio, co m qualquer madeira você pode trabalhar. Você vai ter resultados diferentes, por exe mp lo, se você pega u ma cere jeira, por e xe mp lo, ela te m ma is veios, se você quer isso como exe mp lo. Para a xilogravura ao fio pode-se usar quase todo o tipo de madeira e para a xilogravura de topo não. A made ira prec isa ser extre ma mente resistente ao corte, e aí você trabalha com o copo, você trabalha com a made ira cortada transversalmente, você trabalha co m a bolacha. (COSTELLA, 2011)158

Na pesquisa em xilogravura realizada pelo professor com madeira ao fio, encontram-se, na exposição de longa duração do museu, xilogravuras feitas com madeira procedente da árvore do louro, pera, goiaba e peroba. As três madeiras citadas inicialmente foram coletadas, no fundo dos quintais existentes nas casas de Campos do Jordão, sendo o tronco de goiaba colhido no próprio quintal da casa do professor Costella. Essas árvores, das quais é possível obter os galhos para a xilogravura, quase sempre são árvores condenadas parcialmente por pragas da madeira como, por exemplo, a broca, que determinam o corte total ou parcial da planta. Há uma atenção também para as árvores derrubadas por fenômenos naturais, como no caso de fortes ventos e raios.

Em geral, não há custos financeiros para a obtenção da madeira. Caso haja a necessidade de uma madeira específica, ela é providenciada em lojas de São Paulo ou mesmo de Campos do Jordão, mas em casos raros. Entre outras madeiras da região exploradas pelo xilógrafo, encontram-se a araucária159, o ipê, o pinho e o plátano.

Apesar da aparente abundância de madeira na região, destacamos aqui que a araucária, por exemplo, está ameaçada de extinção. Foi interessante notar, em pesquisa de campo160, a responsabilidade pela preservação da espécie Araucária angustifólia, por parte da equipe do Horto Florestal de Campos do Jordão. Essas Unidades de Conservação, como são conhecidos os hortos florestais, possuem a responsabilidade de cuidar das espécies

158 Trecho da entrevista 2, realizada em 17 de fevereiro de 2011. A entrevista na íntegra consta dos anexos do Capítulo

dois.

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A Araucária angustifolia, na Serra da M antiqueira, é uma das espécies de pinheiro nativas do Brasil, mencionada na lista oficial federal de espécies ameaçadas de extinção, na categoria “vulnerável”. Por esses motivos os pouquíssimos remanescentes merecem ser totalmente protegidos. (São Paulo: Terra Virgem: Secretaria do Estado do M eio Ambiente, 1999, p. 42).

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Em busca de informações sobre a produção de madeira em Campos do Jordão, entrevistamos dois monitores do serviço educativo do Horto Florestal de Campos do Jordão. Os funcionários do Horto Florestal da cidade não nos informaram corretamente sobre o procedimento de autorização para a publicação da entrevista, não havendo então tempo hábil para providenciar a documentação de autorização.

ameaçadas de extinção. O Horto de Campos do Jordão, que exibe uma área de 8.385,89 hectares de exuberância natural, consiste em um forte representante da atividade de reflorestamento da araucária, no Estado de São Paulo. Outro encontro muito oportuno ocorreu com os artesãos de Campos do Jordão. Na Casa do Artesão, conversamos com o entalhador Ercílio Cavalli161, que nos informou sobre o seu trabalho em particular. Foi interessante notar como é a relação dele e dos demais entalhadores ali presentes com a madeira, por sinal, muito similar à exploração cuidadosa do professor Antonio F. Costella em termos de aproveitamento de recursos naturais da cidade.

O entalhador Ercílio Cavalli nos contou que exerce o trabalho de escultor desde a época em que era criança. Existe por parte dele e dos demais artesãos a preocupação de obter matéria prima a baixo custo para a confecção de seus trabalhos. O fato de estar em um local à beira do rio Capivari, dá a eles a oportunidade de plantar suas próprias árvores e coletá- las, uma vez crescidas. O entalhador recolhe dormentes em desuso, galhos de todo tipo de árvore dispostos nos campos, sítios e quintais da região. Pudemos notar também a insistência por parte tanto do professor Costella quanto de Ercílio em investigar a grande variedade de madeiras. A busca por diferentes meios de explorar o entalhe em madeira dá ao conjunto da obra desses dois artistas um destacado perfil nesse tipo de trabalho.

O Museu Casa da Xilogravura nos recepciona, logo na entrada do espaço expositivo, (alertado pela monitoria), com a presença de um grande disco de ipê, que tem por finalidade dar este recado específico: “temos que preservar a madeira”. E essa mensagem é endereçada não somente aos visitantes do Museu Casa da Xilogravura de Campos do Jordão, como também a todos os demais visitantes das outras cidades do Brasil que frequentam o museu. Seria importante anotar aqui a ideia inicial de o museu estabelecer relações entre o trabalho dos artesãos de madeira e os xilógrafos, que estão igualmente inseridos no ambiente cultural de Campos do Jordão.

Ao longo da jornada para a construção deste trabalho, muitas questões foram apresentadas na busca das possíveis respostas, mas uma delas mostrou-se essencial: “Como a Arte-Educação pode colaborar com a aprendizagem em um museu de arte?”

Para construir nosso objeto de estudo, foi necessário partir do mais simples até o mais complexo. O mais simples nos pareceu estar relacionado à importância dos museus na contemporaneidade, para discutir a questão: “O que cabe aos museus?” Alguns conceitos importantes sobre a Museologia e a Nova Museologia nos ajudaram nesse percurso. A

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velha museologia, que pensava que os objetos falassem por si só, não opera mais, e a nova

museologia guia as ações dos museus contemporâneos, esclarecendo diversas questões apagadas ou deixadas de lado pela antiga. A nova museologia revela que, nas mediações, está envolvida a apropriação do patrimônio cultural. Assim sendo, a Museologia se abre para um novo entendimento do ternário: Sociedade/Homem; Patrimônio/Objeto e Cenário/Território.

As ciências sociais compreendem que a mediação dentro do contexto dos museus se dá no cotidiano, ou seja, no meio social em que o homem vive. Na modernidade não são mais a escola, as instituições e a família que ditam os valores aos jovens, são as confluências sociais e as ações do cotidiano que movem as mediações culturais.

Outros aspectos conceituais colaboraram para a pesquisa, como a teoria e a prática da comunicação museológica. Esses estudos nos ajudaram a compreender tanto as mudanças nos modelos ao longo dos anos como a sua prática, tendo-se em vista a escolha de um modelo para a elaboração da atividade para o projeto educativo do Museu Casa da Xilogravura de Campos do Jordão. O fato de observar o trabalho de museólogos e arte- educadores de museus nos forneceu alicerces para a construção do projeto educativo. Outros movimentos foram necessários: leituras, discussões, tentativas de exercícios, diálogo com os funcionários do museu e, extremamente importante, visitas ao espaço expositivo, onde deram-se os encontros com as obras originais.

Ao longo das leituras e pesquisas, uma obra revelou-se fundamental e esclarecedora, o livro da museóloga britânica Eilean Hooper-Greenhill chamado The Role

Education in Museum. O contato com as diversas leituras nele presentes contribuiu

grandemente para a finalização deste trabalho. Outra importante obra neste processo foi

Becoming Human Through Art, do arte-educador Edmund Burke Feldman, que nos abriu

caminhos, pois, além dos conceitos da área, o autor mostra sua preocupação com um ensino sensível da arte-educação para jovens e adolescentes.

A construção do texto que relata o Histórico do Museu Casa da Xilogravura de Campos do Jordão ficou registrada como um documento. O texto colaborou também para a compreensão do relato dos sujeitos do museu (os gestores, principalmente), que tiveram a iniciativa de construir esse empreendimento. Ali constam os esclarecimentos de como, por

quê e para quem o museu foi construído, assim como a quem se destina no futuro por meio

de uma doação, tanto do acervo quanto do prédio, para a Universidade de São Paulo.

A organização dos dados quantitativos nos levou a repensar o erro teórico cometido por mim em textos anteriores, ao pensar que o público é o “ator central” do museu

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