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Com os conceitos explicitados no decorrer deste trabalho monográfico, verifica-se a ideia de um “lance de escadas” epistemológico, subindo cada “degrau” a partir dos Atos aqui dispostos, com suas linhas de pensamento que realçaram a proposta de análise das potencialidades que os jogos eletrônicos têm, pelos diversos campos do saber. Desta maneira, o leitor pôde ser conduzido às narrativas “anti-mecânicas” que elucidavam os conceitos teóricos abordados, sem perder de vista o teor científico necessário para lidar com dificuldade do tema.

Iniciando o Ato I, apresentando o videogame como objeto de leitura, percebe-se um primeiro contato do sujeito com os jogos virtuais pelo meio da decodificação dos símbolos assinalados, tanto nos aparelhos que suportam os jogos, quanto na interface desses games.

Após essa noção, no Ato II, fora apontado a construção da identidade do jogador na relação com os jogos eletrônicos com e toda a cultura que envolve o ciberespaço.

Desta forma, compreendemos até dado momento que o indivíduo lê o mundo, e por consequência, lê o jogo eletrônico, que é um objeto contido no mundo; e nessa relação mútua, constrói parte de quem ele é.

O Ato III apresenta os conceitos de cibercultura e ciberespaço em prol de tornar significativas as escritas anteriores e completar os assuntos que se seguem. Este, que está no meio, é justamente o cerne da questão envolvendo a relação do sujeito com os jogos eletrônicos. Esse Ato é encarado como intermédio, pois explana a essência do

“jogar”, que é a virtualização.

O Ato IV aborda um breve resumo das noções territoriais e problematiza esses conceitos, ao mesmo tempo que visa conectar a discussão de ciberespaço nas concepções territoriais. Sendo assim, a virtualização do homem no jogo passa a ser entendida como a ocupação de um território não material, ou uma territorialização virtual.

O Ato V, concluindo o “lance de escadas”, busca responder uma inquietação provocada pelo Ato anterior, para esclarecer como se territorializa, afinal, o etéreo espaço digital dos jogos. A experiência estética, nessa perspectiva, vem traçar uma ligação entre os sentidos que o sujeito direciona para o jogo e o acesso ao ciberespaço;

permitindo a compreensão de que o ato de jogar videogame é uma territorialização pela

estética. O jogador lê o console ou a máquina, dialoga com o sistema operacional que lhe conduz pelo espaço virtual, territorializa-se no ciberespaço através das ligações técnicas e sensíveis estabelecidas; e nessa troca de fluxos constantes, molda a própria identidade.

Sendo assim, o presente trabalho permite a inquietação de constatar os jogos dependentes desse extenso caminho de virtualização como complexos. Relações entre sujeito e máquina que instauram incômodos no processo educativo e estrutura conservadora da escola, repensando uma outra forma de correlacionar saberes, deixando de enxergar esses videogames como “apenas” brinquedos. Percebendo que há tanta potencialidade no contato do educando com esses jogos virtuais quanto no volume ou qualidade de informação contida numa aula.

No espaço do saber, a identidade do indivíduo organiza-se em torno de imagens dinâmicas, imagens que ele produz por intermédio de exploração e transformação das realidades virtuais das quais participa.

Devemos representar esse “corpo virtual” do indivíduo como a imagem animada do herói ou de seu veículo (nave espacial, carro de corrida...) em um videogame. A imagem animada que representa o jogador desloca-se no mundo virtual, combate inimigos, ganha ou perde

“vidas”, atinge certos objetivos, transforma eventualmente seu tamanho ou seu aspecto, altera seus poderes. Mas a analogia possui limites. Um videogame é regido por regras fixas, ao ponto que um intelectual coletivo questiona as leis de seu cosmo imanente. Um videogame foi imaginado por um criador; já os membros de um intelectual coletivo são ao mesmo tempo autores de seu cosmo e os heróis das aventuras que nele se desenrolam: não existe mais separação entre a exploração e a construção do mundo virtual. Enfim, o videogame simula um universo físico, enquanto o intelectual coletivo projeta um espaço de significações e de conhecimentos. Um videogame mergulha o jogador em um território imaginário, enquanto o mundo virtual de um intelectual coletivo é um mapa, um instrumento de observação e de orientação que remete a um espaço real, o espaço mais real hoje, o do saber vivo. O intelectual coletivo constrói de maneira recursiva e alternativas para abranger, com olhares atentos, as potencialidades intrínsecas ao uso de aparelhos eletrônicos e de jogos virtuais na efetivação de um trabalho educativo. Bem

como Moacir Gadotti observa a falta de um tempo e um lugar próprio da educação, rompendo as barreiras dos espaços educativos dados como únicos (escolas, salas de aula, grupos escolarizadores...) através do ciberespaço:

No ciberespaço a informação está sempre e permanentemente presente e em renovação constante. O ciberespaço rompeu com a idéia de tempo próprio para a aprendizagem. Não há tempo e espaços próprios para a aprendizagem. Como ele está todo o tempo em todo lugar, o espaço da aprendizagem é aqui - em qualquer lugar - e o tempo de aprender é sempre. A sociedade do conhecimento se traduz por redes “teias”

(Illich), árvores do conhecimento, sem hierarquias, em unidades dinâmicas e criativas, conectividade, intercâmbio, consultas entre instituições e pessoas, articulação, contatos e vínculos (GADOTTI, 2000, p. 250).

É tempo de renovar nossas concepções de educação, de aceitar e compreender o movimento contemporâneo de encadeamento e fluidez das ações de aprendizagem, que realocam as perspectivas dos lugares tradicionalistas da educação, e transformam qualquer espaço, num ambiente impulsionado ao aprender.

É hora de complexificar nossa existência no mundo e de mudar os olhares sobre nós mesmos enquanto humanos; para a possibilidade do que “viremos a ser”, do que nos tornarmos o tempo inteiro, e de como esta identidade que nos move e nos constitui, simultaneamente, se desprende cada vez mais do universo terreno e se dilui nos fluxos dos dados. Há muito não somos estruturas rígidas e acabadas, só nos basta compreender isso...

Como em outra enunciação, que não conclui, mas gera o incômodo necessário para provocar uma reflexão consistente sobre o bicho ser humano e seu envolvimento com a liquidez imanente (dos outros homens, lugares, objetos, instituições...), Lévy, outra vez poético, demonstra a incerteza de caminhar sem uma plataforma fixa sob os pés:

Eis o humano, atravessando e toda a sua estatura os quatro espaços;

marchando, os pés calcando a grande Terra dos mitos, os cabelos levantados para o cosmo e os deuses; sentado, fixo, inscrito no Território; os braços trabalhando no espaço das mercadorias os olhos e os ouvidos devorando os signos do espetáculo; a cabeça, enfim, no Espaço do saber, o cérebro conectado a outros cérebros, errante, navegando, recriando mil outras Terras na múltipla esfera dos artifícios.

(LÉVY, 2003, p. 136)

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