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A doutrina da transformação das circunstâncias e da educação esquece que as circunstâncias têm de ser transformadas pelos homens, e que o próprio educador tem que ser educado (MARX; ENGELS, 1984, p. 108).

Este estudo teve como objetivo analisar se o processo de formação continuada de professores para o uso das tecnologias de informação e comunicação – TIC, em especial, os cursos oferecidos pelo programa ProInfo, tem alterado qualitativamente a organização do trabalho pedagógico dos professores envolvidos nestes cursos.

Partiu do entendimento de que o processo de estruturação do capital se explica no movimento histórico da sociedade. Sociedade, que é produto das múltiplas relações de ações dos homens consigo mesmo e com a natureza, no complexo processo de reprodução social da vida. São múltiplas as mediações que constituem o tecido de relações sociais que envolvem esse processo de produção e reprodução social da vida em suas expressões materiais.

Portanto, a educação corresponde ao nível de desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção de cada sociedade, em cada época, Assim, a educação se transforma ou é transformada à medida em que também se transforma a sociedade ( MARX, 1981) [11].

Essas relações, que constituem a sociabilidade humana, implicam âmbitos diferenciados, ou seja, antagônicos e uma trama que envolve o social, o político, o econômico, o cultural, o religioso etc. Mediações com as quais se defronta cotidianamente a educação e em relação às quais se posiciona, quer do ponto de vista explicativo, quer do interventivo e interpretativo considerados como dimensões de uma mesma totalidade. Na visão de Lacks (2004), a educação concretiza-se no ensino construído em condições objetivas e contraditórias, segundo as possibilidades históricas em que estão em jogo interesses de classes antagônicas. Essas possibilidades é que determinam os rumos do processo educativo, consolidando-se em projetos político – _______________

pedagógicos que se revelam, sem dúvida, numa construção contraditória, porque envolvem ou a humanização ou a alienação do indivíduo.

Levando em consideração o processo de humanização, pode-se dizer que o compromisso social da educação é imensurável, sendo assim, é necessário que o professor se assuma como elemento fundamental e essencial na busca da mudança e da transformação social. Para tanto, se faz necessário uma formação docente de caráter amplo, com pleno domínio e compreensão da realidade de seu tempo, com desenvolvimento da consciência crítica que lhe permite interferir e transformar as condições da escola, da educação e da sociedade (FREITAS, 2002).

Nesse sentido, a escola deve ser compreendida com base no desenvolvimento histórico da sociedade, porque, assim compreendida, torna-se possível a sua articulação com a superação da sociedade vigente em direção a uma sociedade sem classes, a uma sociedade socialista (SAVIANI, 2008).

Nesse pressuposto, a prática pedagógica assume papel relevante, pois, intencionalmente ou não, essa prática pode está a serviço da sociedade capitalista ou na busca da transformação desta sociedade para a sociedade socialista. Portanto, para a prática pedagógica não coadunar com os interesses da sociedade capitalista, Freitas (1987) alerta que a tarefa do educador consiste em realizar a alternativa de construir coletivamente novas bases para a organização do trabalho pedagógico que supere a divisão do trabalho e que elimine a gestão e a avaliação autoritária ultrapassando os métodos tradicionais.

É importante considerar, ainda, que as diferentes formas assumidas pela formação continuada, têm contribuído para a fragmentação da profissão docente, pois não possibilita a construção de marcos identitários. É preciso adotar políticas de formação que contribuam para a construção de um projeto político de formação, cuja centralidade resida em uma concepção de um profissional engajado com questões atuais e não, apenas, como profissional eficiente, cujas ações moldam-se em função de uma perspectiva tecnocrática de educação.

O estudo partiu da constatação de que atualmente são evidentes as alterações sociais, culturais e econômicas que estão ocorrendo em todos os cantos do mundo. Não há como negar que a revolução tecnológica chegou às casas e está modificando profundamente as rotinas diárias das pessoas. Indubitavelmente, não se pode negligenciar o potencial de expansão do dinâmico sistema que envolve uma imensa

malha de meios de comunicação e equipamentos de altíssima performance. Essas constatações foram questões relevantes que motivaram a realização de análises relativas a pontos essenciais das políticas educacionais, com relação ao uso das TIC.

Neste estudo, as categorias formam bastantes recorrentes na exposição e análise dos dados empíricos. A definição pelas categorias totalidade e contradição deu-se porque elas permitem abordar o desenvolvimento de elementos internos que entram em conflito, a superação dos enfrentamentos e a construção do que ainda não existe. Elas estão vinculadas à relação entre pensamento e ser e à revelação do conteúdo real do objeto. Sob a forma de categorias, refletem-se as leis gerais e importantes do movimento dos fenômenos no mundo.

Partindo desse entendimento, as categorias de conteúdo foram selecionadas a partir de três focos de análise estabelecidos para orientar a investigação: Metodologia dos cursos de formação, Infra estrutura dos LTE e Prática pedagógica. A partir delas, podem-se evidenciar algumas conclusões.

Observou-se que são muitos os programas que se propõem a levar para as escolas as tecnologias da Informação e Comunicação – TIC. Neste trabalho, em especial, nos propomos em analisar apenas um desses programas o PROINFO. O resultado da pesquisa aponta que os cursos oferecidos pelo programa PROINFO cujo intuito é capacitar os professores para que esses possam incorporar as tecnologias em suas práticas pedagógicas que nem sempre foram acompanhadas de uma política definida e clara e muito menos de um conhecimento dos processos educacionais e das possíveis relações e transformações provocadas por essas tecnologias no espaço escolar. As políticas de formação para o uso das TIC na educação ainda não conseguiram incluir totalmente as escolas e os professores no mundo digital. Apesar de os professores perceberem as TIC como ferramentas importantes na educação e de terem participado dos cursos de formação continuada, eles não se sentem preparados para utilizá-las em suas práticas pedagógicas articulando-as aos conteúdos trabalhados em sala. Os cursos de formação continuada ainda não conseguiram capacitar os professores para que esses se sintam aptos a inserirem as TIC em suas práticas pedagógicas.

Talvez essa situação se faça presente pelo fato de as metodologias dos cursos oferecidos pelo PROINFO se materializarem dentro de uma lógica reprodutivista, conteudista e imediatista, que ocorre de forma aligeirada, acrítica, fragmentada, descontextualizada e desarticulada da realidade dos professores. Cabe destacar que essa

situação contribui na e para a redução do conhecimento científico, político e pedagógico dos professores envolvidos nesse processo de formação.

A ênfase desses projetos de formação está na regulação custo x benefício, quando deveria ser sobre a qualidade do ensino. Esses modelos de formação advêm da necessidade de se estabelecerem novos padrões de ação docente que irão coadunar-se com as políticas de cunho neoliberal.

Nesse sentido, acredita-se que a formação de professores deve ser pensada e efetivada dentro da lógica da melhoria da qualidade educacional. Assim, a formação docente para o uso pedagógico das TIC deve ser pensada na ênfase da qualidade das políticas públicas em detrimento do quantitativo e da certificação.

Outro ponto relevante demonstrado na pesquisa refere-se à precária infra- estrutura dos Laboratórios de Tecnologias Educacionais – LTEs. Diante desse aspecto, acredita-se que a falta de infra-estrutura pode ser considerada como um dos fatores que limita o uso das TIC nas práticas pedagógicas dos professores.

Ressalta-se que a frágil utilização das TIC na educação pode contribuir para aprofundar ainda mais o alargamento da exclusão digital e social, ao tempo em que também impede que alunos e professores se apropriem das possibilidades proporcionadas pelos ambientes tecnológicos de aprendizagem e seus recursos.

Com relação à pratica pedagógica, o estudo identificou que não ocorreram mudanças significativas nas práticas dos professores envolvidos no processo de formação, visto que, quando fazem uso das TIC no processo de ensino-aprendizagem, elas são materializadas dentro de uma lógica tradicional/acrítica.

Nesse sentido, o resultado desta pesquisa vem afirmar a hipótese levantada no inicio, qual seja, que os cursos de formação continuada, cuja propositura é capacitar os professores para que estes possam adotar as tecnologias da informação e da comunicação – TIC - na organização do trabalho pedagógico, não têm conseguido alcançar seu objetivo proposto. A prática pedagógica não apresenta alterações qualitativas esperadas, porque as tecnologias da informação e comunicação – TIC - praticamente não têm sido utilizadas pelos professores.

A situação descrita vem confirmar estudos já existentes, como os de Cox (2000); Carvalho (2002); Malheiros (2005) e Conceição (2008), todos desenvolvidos no Núcleo de Pós-Graduação em Educação - NPGED/UFS-SE -, sobre o uso da informática na Educação. Esses estudos já sinalizavam deficiência no programa

PROINFO, desde a formação dos professores multiplicadores, infra-estrutura dos laboratórios de informática, acompanhamento da manutenção dos computadores à formação continuada de professores através dos cursos oferecidos pelo programa.

Apesar do discurso da centralidade da formação continuada dos professores, as políticas implementadas se encaminham na contramão do discurso e, no lugar de procurarem formar um professor com consistência teórica capaz de refletir sobre sua prática e o seu contexto social, desenvolvem uma formação em serviço e a distância descontextualizada, aligeirada, fragmentada e centrada nas questões técnicas do computador/internet. Na visão de Kuenzer (1999), as novas políticas, não obstante a cansativa repetição do compromisso com a universalização, na prática, conduzem à polarização das competências, por meio de uma concepção de educação que articula formação e mercado. Em contraposição, deveria se desenvolver dentro de uma sólida formação, que pudesse relacionar de forma equilibrada a teoria e a prática, exigindo uma atualização permanente, em termos profissionais e culturais, pois sabe-se que a formação continuada no contexto da sociedade do conhecimento e das inovações tecnológicas deve ser efetiva e abrangente, deve ser universal, não podendo negar reflexões acerca das condições de trabalho desse profissional, em um cenário de “modernização do espaço escolar,” da inserção das tecnologias digitais que podem trazer contribuições para o exercício da docência.

Tomando como referência as políticas educacionais de formação de professores, pode-se dizer que suas ações voltadas para maior eficiência e eficácia do processo de aprendizagem são insuficientes para caracterizar uma alteração no processo de incorporação das TIC, pois, enquanto não se ampliar efetivamente a participação dos envolvidos nas esferas de decisão, de planejamento e de execução da política educacional, pode-se até alcançar índices positivos quanto os dados quantitativos de participação dos professores envolvidos nos programas de formação para o uso das TIC da política educacional, mas talvez não tanto positivo à questão de resultados qualitativos.

A administração pública deve estabelecer como prioritários programas de ação universalizantes, que possibilitem a incorporação de conquistas sociais pelos grupos e setores desfavorecidos, visando à reversão do desequilíbrio social.

A educação precisa atuar como força de transformação social. Chama-se ao entendimento de que a educação sendo um dos direitos garantidos pelo Estado, tem na

implementação das políticas públicas, para o uso das TIC, espaço para a superação de uma exclusão digital e conseqüentemente social, pois a utilização das TIC, não como meras ferramentas de “inclusão digital”, mas de inclusão qualitativa aos meios tecnológicos, pode significar resultados positivos para uma melhoria da qualidade do ensino nas escolas públicas.

Nesse sentido, as políticas de formação de professores para o uso das TIC devem ser pensadas enquanto uma formação que promova a inclusão e o reconhecimento destes como sujeitos históricos, reconquistando um direito humano negado ao longo da história. O processo de formação de professores, para o uso das TIC na organização do trabalho pedagógico, deve possibilitar uma formação continuada respaldada na sistematização de saberes que venha proporcionar melhoria e a inserção das TIC na organização do trabalho pedagógico. Esta formação deve estar vinculada às concepções de sociedade e de educação que se tenha, e deve ir em direção do fortalecimento da pluralidade e da socialização dos conhecimentos universalmente produzidos, contribuindo diretamente para a formação, profissionalização do professor e para o conhecimento da realidade. A sólida formação que se contraponha aos processos de desqualificação e degradação da profissão presentes no aligeiramento da formação.

Outro ponto relevante que foi identificado nesta pesquisa e que também merece destaque refere-se à questão do financiamento da educação aqui no Brasil. Ficou evidenciado, segundo estudo feito pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico - OCDE - que o Brasil gasta 4% do Produto Interno Bruto (PIB) em educação pública. Esta porcentagem está abaixo da média verificada nos países que pertencem à Organização, que é de 4,9%. No ranking, a França é a líder, com 5,61%, seguida do México (5,12%), Estados Unidos da América (5,02%), Coreia do Sul (4,79%), Grã-Bretanha (4,66%) e Espanha (4,33%).

Nesse sentido, é importante ressaltar que, no Brasil, os baixos investimentos em educação contribuem para que sua inserção na economia capitalista mundial se dê na condição de consumidor de ciência e tecnologia, justamente no momento em que o conhecimento científico e tecnológico passou a se constituir no maior instrumento político de promoção da soberania na atual configuração da divisão internacional do trabalho.

Algumas das medidas tomadas pelo governo, a exemplo do Programa de Aceleração e Crescimento – PAC – prevê-se a aplicação de recursos em obras de infra – estrutura para o desenvolvimento econômico do país sem destinar nenhuma ação para as questões educacionais.

No mês de abril de 2007, o governo lança o Programa de Desenvolvimento da Educação – PDE. Este programa prevê um aporte maior de recursos para a manutenção e desenvolvimento da educação nos próximos dez anos. Para Saviani (2007), o PDE trata na verdade, de um amontoado de Decretos e Portarias, correndo o risco de se constituir em mais um mecanismo de protelatório do governo federal, como foi o caso do PNE – Plano Nacional de Educação, na medida em que, cada Plano vai sucedendo outro anterior e protelando as metas estabelecidas e, assim, postergando a resolução do problema da educação brasileira, pois, segundo o mesmo autor, provavelmente sem prestar contas à sociedade sobre o cumprimento de tais metas, será lançado outro Plano protelatório e a educação brasileira continuará atingindo os piores índices mundiais.

O trabalho mostra a grande distorção existente no Brasil quanto ao uso dos recursos governamentais. Esse pouco investimento em educação afeta as políticas de formação de professores, que ocorrem de forma aligeirada, fragmentada, trazendo reflexos diretos à produção do conhecimento.

Diante desse quadro, acredita-se que o sistema educacional brasileiro precisa ser consideravelmente expandido com qualidade na formação de professores, e essa possibilidade não haverá se não tiver um importante aporte adicional de verbas públicas, elevando o montante para os níveis mais próximos aos internacionais, em particular, de países que estão apontando como desenvolvidos, o que significa, no mínimo, dobrá-los, para atingir entre 7% e 8% do PIB.

Não basta crescer economicamente se esse crescimento não for acompanhado de políticas educacionais e de combate às desigualdades sociais e a garantia de direitos. Somente com a aplicação significativa de recursos públicos no desenvolvimento da educação no Brasil é que poderemos reverter o atual quadro de dependência econômica do mercado externo, cuja consequência tem sido o agravamento da exclusão social da maioria da população.

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