Considerações para a oferta de uma formação sobre o TEA: os conhecimentos a serem contemplados

Embora não se trate de um estudo tão atual quanto os demais, as contribuições da pesquisa de Scheuermann et al. (2003) são de grande valia para a visualização do problema histórico que constitui a formação de professores para o trabalho com alunos com TEA. Essa historicidade é ilustrada pelo fato de que há muitos conhecimentos construídos sobre o transtorno, além de modelos de intervenção desenvolvidos há várias décadas e baseados em

evidências, como o TEACCH (SCHEUERMANN et al., 2003). Apesar de existirem fontes de conhecimento que certamente qualificariam o serviço prestado a estudantes com TEA, há entraves que dificultam a apropriação de tais conhecimentos pelos professores, entre eles o custo de formação que não é assumido pelo estado, apesar da demanda de atendimento ao público com TEA incitada pela prevalência do transtorno e da garantia de atendimento adequado apontada na legislação educacional. Nesse sentido, o desconhecimento sobre o TEA não pode ser justificativa para a carência de formação na área e a necessidade que fica clara a partir do apresentado, requer ser suprida.

Scheuermann et al. (2003), analisaram problemas relacionados a preparação de profissionais da escola para o atendimento a crianças com TEA a partir do que conhecem dessa realidade nos Estados Unidos. Além de preocuparem-se em responder o objetivo citado, os autores fazem recomendações para a melhoria do preparo desses profissionais. Eles citam como problemas a falta de padrão de certificação para professores que têm cursos de variada abrangência de conteúdos e a carência de preparação para esses profissionais, o que obriga a contratação de professores sem qualificação para o trabalho com o TEA. Ambas as situações apontam para a mesma questão: Esses profissionais têm o domínio das habilidades necessárias à atuação com os alunos em questão?

A partir disso, os autores constatam que programas de formação podem favorecer o desenvolvimento de um trabalho de qualidade por parte dos professores, resultando em benefícios para os alunos por eles atendidos. Resumidamente, Scheuermann et al. (2003) fazem duas considerações a respeito dos programas de formação como um todo. Primeiro que a escolha de conteúdos deve ser baseada em pesquisas que tenham demonstrado eficácia e, segundo, que, apesar dos currículos basearem-se firmemente na abordagem comportamental, também devem privilegiar informações sobre a prática e múltiplas abordagens. Assim, os professores estariam munidos de múltiplas escolhas. Com base nisso os autores apresentam uma lista de conteúdos preferenciais para um programa de formação de professores relacionado ao TEA, focalizando professores e pára-professores/monitores, já que ambos devem dominar determinadas habilidades em um nível que lhes permita ensiná-las aos seus alunos. A lista construída por Scheuermann et al. (2003) é composta por 13 tópicos (Anexo A) que abordam os seguintes conteúdos: Conhecimento do transtorno; Teorias explicativas; Estratégias instrucionais (comunicação, competências sociais e comportamentos); Envolvimento familiar e Inclusão e acessibilidade.

Com base no comparativo entre essa lista e naquela construída a partir do referencial teórico pesquisado na literatura nacional e internacional são elencados os conteúdos a serem privilegiados no curso de formação que se pretende desenvolver.

Quadro 2 – Matriz empírica de conteúdos para Curso de Formação Profissional para o Atendimento Educacional de Alunos com Transtorno do Espectro do autismo

CONHECIMENTO DO

TEA

Sensibilização Educabilidade de pessoas com TEA

Caracterização e compreensão do TEA

Características na área da comunicação social no desenvolvimento típico e no TEA

Características na área comportamental no desenvolvimento típico e no TEA

Teorias explicativas

Teoria Pscicanalítica

Teorias cognitivas: Teoria da mente; Teoria da Coerência Central; Funções executivas Teorias Afetivas

Teoria organicista

POSSIBILIDADES DE

INTERVENÇÃO

Play (DIR Floortime); Son-Rise3,

ABA 4, TEACCH

Comunicação Alternativa (PECS); Tecnologias de

Comunicação e Informação (TIC‘s), SCALA Abordagem de mediação por pares

Relação família-escola

3 _{O Programa Son-Rise, também conhecido como Option Method, o programa desenvolvido na década de 1970} nos Estados Unidos por um casal cujo filho apresentava autismo. O programa foi desenvolvido no lar da família de forma intensiva e individualizada, perfazendo 12h de intervenção diária, todos os dias da semana e, a partir dos resultados com a criança, passou a ser divulgado como possibilidade de ―cura‖ para o autismo (KAUFMAN, 1976). Após ampla divulgação através da publicação de 12 livros a seu respeito, o Son-Rise é, atualmente, oferecido como curso para os pais pelo Option Institute em Massachussets/EUA, na forma de treinamento para que seja implementado nas suas casas (JORDAN; POWELL, 1993).

4 _{A Análise Aplicada do Comportamento, do Inglês, Applied Behavior Analysis, ABA, pode ser compreendida} como um sistema teórico destinado a explicação e modificação do comportamento humano (HEFLIN; ALAIMO, 2007) que tem sido amplamente pesquisado e adotado, em especial nos Estados Unidos, tendo como intuito a promoção da qualidade de vida de pessoas com TEA (GILLIS; BUTLER, 2007; VIRUÉS- ORTEGA, 2010; LANDA, 2007).

A recorrência de conhecimentos nas duas matrizes corrobora para sua validade e credibilidade. Além disso, a matriz construída atende aos aconselhamentos de Scheuermann et al. (2003) no que diz respeito a escolha de conteúdos baseados em pesquisas que comprovem sua eficácia, assim como da consideração de múltiplas abordagens de intervenção para pessoas com TEA nos cursos de formação. Considera-se, ainda, que os conhecimentos elencados, embora advindos da literatura sobre formação de professores, podem ser aplicados no ensino a diversas áreas, especialmente em se tratando daquelas envolvidas no processo educativo da pessoa com TEA, já que abordarão aspectos referentes ao transtorno e ao processo de ensino e aprendizagem desses sujeitos. Dessa forma, considerando-se o perfil da amostra participante dessa pesquisa e o objetivo em comum que têm esses profissionais, sendo a colaboração para o bom desenvolvimento educacional dos alunos a quem atendem, considera-se que a matriz de conteúdos estruturada é adequada ao propósito a que se destina.