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2 REFORMA DO SISTEMA DE DISPUTAS DA OMC: ACESSO E IMPLEMENTAÇÃO

2.3 Implementação das decisões do Órgão de Solução de Controvérsias

2.3.1 Considerações sobre a natureza bilateral das negociações

A fase de implementação das decisões está além do controle e da regulamentação de um regime internacional. “Nenhum sistema de solução de controvérsia é neutro. No caso da OMC, esta realidade é expressamente reconhecida, asseverando-se que um acordo entre as partes poderá

Robert E. Enforcing International Trade Law: the evolution of the modern GATT legal system. Salem: Butterworth, 1993.

89 ser mais vantajoso do que o litígio [...]” (BARRAL, 2004, p. 22). Em outras palavras, as regras dificultam, mas não impedem a ação autônoma dos países.

Os Membros em litígio são livres para estabelecer acordos contrários às regras do regime internacional do comércio, mesmo quando a confluência de vontades não estiver em consonância às recomendações do OSC. Embora seja função da OMC dirimir os conflitos entre os Estados; na prática, a adequação de uma política é acertada pelos próprios países envolvidos na disputa (GARRETT; SMITH, 2002). Nesses casos, as disputas são retiradas da agenda do regime e negociadas em âmbito bilateral.

É importante notar que as assimetrias políticas existentes entre os Estados são facilmente perceptíveis à luz das barganhas bilaterais, uma vez que as negociações em arranjos multilaterais devem atender às regras e às pressões do regime internacional (SMITH, 2000). Dessa forma, o estabelecimento de acordos bilaterais, mesmo contrários às regras da OMC, possibilita que os interesses dos países poderosos possam prevalecer sobre os dos Estados fracos.

Both the complainant and the Appellate Body have ample opportunities to avoid a crisis in cases where a losing defendant is unlikely to comply with an adverse decision. Ex ante, the complainant can exercise self-restraint by not pressing the case; ex post, it can settle by accepting partial compliance or compensation. We expect these options to be particularly attractive to the US and the EU given their extensive stakes in the overall success of the WTO (GARRETT; SMITH, 2002, p.12).

Horn e Mavroidis (1999) argumentam que os Membros melhor posicionados no sistema são aqueles considerados fortes no sentido de serem capazes de impor perdas significativas aos parceiros comerciais em contrapartida a baixos custos para si mesmos.

Algumas disputas podem ser resolvidas por meio de acordos bilaterais devido à ameaça de sanções por parte dos países ricos. “The large industrial countries are comfortable with tariff sanctions because they can threaten them against each other and against developing countries” (CHARNOVITZ, 2001, p. 832). Nesse sentido, os resultados econômicos das negociações podem estar diretamente relacionados à ameaça de retaliação.

Economists often note that there are asymmetric incentives for countries to deviate from the WTO, as the ultimate threaten that can be made against a member that does not comply with a panel recommendation is retaliation. Small countries cannot credibly threaten this because raising import barriers will have little impact on the target market while being costly in welfare terms (HORN; MAVROIDIS, 1999, p.5).

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A retaliação comercial não é limitada à imposição de tarifas; pode haver outros instrumentos econômicos disponíveis nas relações bilaterais que estão além do controle da OMC. A dependência econômica existente entre duas partes pode, por exemplo, influenciar a natureza, a quantia e o impacto dos custos de retaliação.

“Developing countries are at a disadvantage, when considering the trade arena. These countries are often dependent on the countries to which they export for foreign aid, and are also politically and sometimes military dependent on them” (HORN; MAVROIDIS, 1999, p. 26).

Para Besson e Mehdi (2004), quando um país que recebe assistência bilateral pratica uma medida inconsistente aos anseios do Estado doador, a tendência é o fim da relação de interdependência econômica. Isso, segundo os autores, é um dos motivos da ausência na jurisprudência do OSC de disputas envolvendo os “last development countries”, já que os países menos desenvolvidos não arriscam seus auxílios em uma guerra comercial contra seus doadores. A ameaça de retaliação e o conseqüente fim da ajuda econômica bilateral exercem grande pressão para que os Estados débeis não contrariem os interesses das grandes potências.

Outro fator que interfere na conformidade dos Estados são as preferências comerciais bilaterais; seja pela pré-existência de acordos entre os países, seja pela participação conjunta em uma arena comercial. O comportamento das partes durante um litígio pode ser influenciado pela ameaça de deterioração das relações econômicas, já que a imposição de barreiras poderia anular as vantagens obtidas com as preferências comerciais (BESSON; MEHDI, 2004). Dessa forma, os instrumentos econômicos bilaterais podem influenciar os termos da conformidade entre os Estados.

A principal fragilidade do sistema de solução de controvérsias é que nem sempre quem ganha leva o troféu. Em geral, acabam com um direito de retaliação nas mãos – que jamais ousarão aplicar pelo temor de sofrer revide – observando a preservação das mesmas práticas condenadas pela OMC. [...] O Estado sofre pressões políticas de submeter uma demanda à OMC contra um país desenvolvido, o que o leva, na maioria dos casos, a não fazer. A pouca efetividade da implementação da decisão por um país dependente, leva-o a assumir os danos sofridos (MING, 2005, p. 2).

Assim, a possibilidade de solução de uma disputa por meio de acordos bilaterais faz com que a fase pós-Dispute Settlement esteja além do controle e da regulamentação de um regime

91 internacional. Nesse contexto, os interesses dos países poderosos podem prevalecer sobre os dos Estados débeis.

2.3.2 Dilatação dos prazos de conformidade por meio de válvulas de escape: