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3. PERCURSO METODOLÓGICO 1 Natureza da pesquisa

4.1 Considerações sobre as interações grupais

O primeiro encontro foi marcado por grandes expectativas. A psicóloga que auxiliaria na observação da dinâmica do grupo ajudou na organização da sala e na recepção dos participantes. Não sabíamos quantos professores efetivamente compareceriam, e por isso, o encontro iniciou vinte minutos mais tarde quando entendemos que já tínhamos número suficiente de participantes (8) para iniciar o grupo focal. Alguns imprevistos pessoais, comentados pelos participantes presentes, impediram a vinda dos demais Segundos Professores13 selecionados.

Quando chegaram até a sala de reuniões, os professores que se conheciam foram sentando-se perto uns dos outros, enquanto os professores que vinham de outras cidades sentaram-se dispersamente nas cadeiras de auditório.

Compreendemos inicialmente que havia um esforço dos professores em estarem ali já que a maioria deles teria vindo diretamente de seus locais de trabalho. Visivelmente as professoras, todas mulheres, chegaram até o encontro cansadas. Algumas delas mal haviam chegado e já perguntavam pelo horário de término do encontro. Isso nos sinalizava sobre a notável condição de fadiga dos participantes e especialmente, do desafio em vencer as situações de cansaço pelo engajamento dos participantes nas discussões em grupo com foco nas interações grupais.

O primeiro espanto dos participantes ocorreu quando a pesquisadora pediu para que todos se sentassem ao redor da mesa. Segundo os participantes, as informações que chegaram até as escolas foram diversas, sendo que a expectativa da maioria era que estavam ali para participarem de um curso/palestra.

Após os professores terem se acomodado ao redor da mesa de reuniões, prosseguimos com a apresentação da pesquisadora, da psicóloga auxiliar e da pesquisa efetivamente. Prosseguiu-se com a leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido com explicação das informações contidas no mesmo, ressaltando os objetivos da pesquisa, sua relevância social e a dinâmica de funcionamento da técnica com grupo

13 Um dos imprevistos ocorreu devido o portão de entrada da ADR ter sido

fechado as dezenove horas, horário de saída dos funcionários que ali trabalham, o que impediu a entrada de dois Segundo Professores. Tivemos conhecimento sobre esse fato posteriormente, no último encontro.

focal. No momento seguinte deixou-se os participantes a vontade para que expusessem suas dúvidas ou mesmo desistissem de participar a qualquer momento sem prejuízo para os mesmos. Conforme mencionamos, tivemos a desistência de um participante que não pôde comparecer no segundo e terceiro encontro sendo que o restante dos participantes demonstrou desejo em participar da pesquisa.

Antes de iniciar as discussões no grupo, foram posicionados os dois gravadores, cada um de um lado da mesa. Também foram distribuídos crachás de identificação com os respectivos pseudônimos. Como as interações de grupo foram gravadas apenas em áudio, pediu-se para que os participantes antes de falarem se identificassem pelo pseudônimo. Essa estratégia servia estritamente ao reconhecimento dos participantes pela pesquisadora para transcrição das falas. Notavelmente, esse detalhe não interferiu na dinâmica das interações grupais.

Conforme as recomendações da técnica com grupo focal, pediu-se aos participantes para que se dirigissem ao grupo sempre que fossem falar, assinalando que o pesquisador conduziria mas não interferiria nas discussões, sendo que eles próprios deveriam sustentar suas discussões no grupo. Ressaltou-se que não existia certo ou errado, e que todas as opiniões, percepções e experiências eram legitimas naquele espaço.

Para facilitar a dinâmica de grupo, foi organizado uma caixa com papelotes que continham as questões disparadoras: a) como avaliam a política de educação especial na perspectiva da educação inclusiva no Estado de SC? b) o que é deficiência para vocês? c) o que é o estudante com deficiência, como o percebem? d) como vocês sentem/percebem seu trabalho junto às turmas que possuem estudantes com deficiência? e) como desenvolvem seu trabalho na sala de aula? f) quais facilitadores de seu trabalho? g) Quais barreiras?

Para facilitar as interações de grupo, os participantes eram convidados a tirar da caixa um papelote de cada vez. Deixou-se os participantes a vontade, sem uma ordem prévia, para tirarem os papelotes e/ou começarem a falar. O receio inicial foi logo superado na medida em que os participantes compreenderam que não se tratava de perguntas e respostas, ou mesmo de perguntas que previam certas respostas a priori, mas de questões disparadoras em que cada um poderia responde-las e confrontá-las com base nas suas experiências de trabalho, nas percepções e vivências de seu cotidiano.

Apesar da expectativa da maior parte dos professores em estarem ali para assistirem a uma palestra conforme as informações que chegaram até o seu local de trabalho, os professores concordaram prontamente em participar da pesquisa e receberam com entusiasmo a proposta do grupo

focal. As interações grupais fluíram com grande intensidade de tal modo que a intervenção da pesquisadora se fazia necessária para que o grupo pudesse explorar outros temas. Os professores mostraram-se constantemente envolvidos com os temas propostos e/ou que foram surgindo espontaneamente na interações grupais.

Os relatos de experiências foram mobilizadoras de uma diversidade de emoções. Os temas relacionados às políticas de educação especial na perspectiva da educação inclusiva e sobre a experiência de trabalho mobilizaram diferentes tons de resignação, tristeza e risos. Já os temas relacionados a concepção sobre a deficiência e a experiência junto ao estudante com deficiência foram tratadas em tons as vezes muito sérios e outras vezes carregados de emoção. Falar desse último tema parecia tocá-los com profundidade emocional, num território em que o peso de suas autoridades profissionais não lhes permitia “brincar”.

A coesão entre os membros foi facilitada pela proximidade com o tema e pela vivência de inúmeras experiências semelhantes. O relato de um, suscitava no outro a recordação de outras experiências e assim, com grande facilidade os participantes deslocavam-se de uma questão a outra. Na medida em que uma questão havia se esgotado, deixava-se o grupo a vontade para explorar outras questões que iam surgindo de modo que algumas vezes ao tirar o papelote da caixa, os participantes achavam que já tinham falado sobre aquela questão. Entretanto, nunca passamos de uma questão a outra sem o encorajamento de que outras associações, outras vivências e percepções fossem expressadas no grupo.

Nesse caminho, o compartilhamento das vivências de sofrimento, isolamento, segregação e desamparo social foi elemento central que culminou no coro de vozes entre os participantes no tenso embate dialógico que compõe o cenário atual da educação especial na perspectiva da educação inclusiva. O modo como os professores sentiam e davam sentido às suas experiências de trabalho, mobilizava a formação de alianças de consensos em oposição à atual política de participação do Segundo Professor no ensino comum, ao mesmo tempo em que essas alianças proporcionavam a aproximação entre os participantes.

Apesar das tentativas de encorajamento pela pesquisadora/moderadora para que o grupo pudesse expressar as diferenças, as divergências e os desacordos, houve um predomínio no grupo de trocas de experiências complementares e consensualidade. Sobre isso, compreendemos que o movimento de aceitação incondicional de um enunciado e sua respectiva voz social como nos diz Faraco (2009, p. 69) “[...] é também implicitamente (ou mesmo explicitamente) recusar outros enunciados (outras vozes sociais) que podem se opor

dialogicamente a ela”. Assim, estávamos atentos as alianças de consensos e no seu limite, à que outras vozes provindas do campo das relações políticas, sociais, escolares e ideológicas elas se opunham.

Mesmo entre os poucos participantes que consideravam inicialmente sua experiência de trabalho “boa”, aos poucos, o contato com as diferentes formas de interpretar a experiência de trabalho de outros participantes levantavam as contradições e as dúvidas, sendo que o que era “bom” tornava-se confuso e ambíguo na interação com outras vozes no grupo.

Conforme mencionamos, aquele espaço havia se tornado num espaço privilegiado de apoio incondicional entre os participantes. Mergulhados nas discussões, os participantes foram assumindo cada vez mais a função de investigadores, explorando os sentidos das experiências uns dos outros e ao interrogarem sobre fatos, histórias e situações, permitiam ao pesquisador ter as pistas de como estavam mobilizados e apoiados em um dado contexto social e sistema representacional.

É importante destacar que a previsão para a realização da pesquisa era de apenas dois encontros, contudo, pelo envolvimento ativo dos professores nas discussões e a notável vontade que cada um trazia em compartilhar as inúmeras experiências, tivemos que realizar, de comum acordo, um terceiro encontro. Foi necessário no terceiro encontro maior interferência da pesquisadora/moderadora no controle do tempo para que pudéssemos fechar as temáticas propostas.

Nesse pequeno percurso de três encontros, foi possível acompanhar as angústias, os questionamentos e as significações sobre a experiência de trabalho que atravessam o cotidiano do Segundo Professor e esperamos assim, ter apreendido o movimento da fala/palavra viva no grupo como construções de sujeitos históricos que dialogam diretamente com os valores sociais, determinado pelas múltiplas relações sociais/políticas e ideológicas que lhe são constitutivas.