• Nenhum resultado encontrado

2.3 A consoante lateral pós-vocálica

2.3.1 Consoante lateral pós-vocálica: aspectos acústicos

As consoantes líquidas laterais, conforme já descrito neste capítulo, apresentam semelhanças ao grupo de vogais. Algumas dessas semelhanças entre os grupos são identificadas por meio da observação acústica dos segmentos, que apresentará, para ambas as classes, uma regularidade de onda e formantes bem definidos (KENT; READ, 1992), como pode ser observado na Figura 01.

Figura 01: Espectrograma e forma de onda da produção do segmento líquido lateral [l] (primeira imagem) e da produção da vogal baixa [a] (segunda imagem) do Português Brasileiro.

Fonte: adaptado de Barbosa e Madureira (2015)

Para a distinção entre os segmentos vocálicos e laterais, assim, a amplitude de onda pode ser observada. Tendo uma produção vocalizada, [l] pós-vocálico pode distinguir-se da vogal pela altura da onda, que sempre será maior para os sons vocálicos (BROD, 2014).

Figura 02: Diferenças de amplitude de onda para segmento lateral e vocálico Fonte: Rosinski (2017)

Para a caracterização acústica da consoante lateral ocorrendo em posição pós-vocálica, são considerados os valores do primeiro e do segundo formantes. Os valores de F1 serão alterados em função do contato estabelecido entre palato e dorso da língua. Já F2 se modificará em acordo com o movimento horizontal de corpo de língua e, por isso, terá valores diferentes para uma produção mais anterior ou mais posterior do segmento (RECASENS, 2004).

Observando a relação entre os valores do primeiro e do segundo formantes e a forma como o segmento é produzido, identificam-se os valores dos formantes ligados à zona de articulação do segmento (NARAYANAN et. al. 1997). Assim, ressonâncias da parte anterior do trato articulatório estarão ligadas aos valores de F2 e F1 apresentará valores ligados às frequências da cavidade posterior do trato. Uma produção de /l/ caracterizada pelo recuo da língua, constituindo-se como posterior, apresentará valores mais baixos para F2, como identificado na Figura 03.

Figura 03: Queda do segundo formante em produção de [l] pós-vocálico mais posterior Fonte: Rosinski (2017)

Na Figura 03, é possível observar a queda do segundo formante à medida que acontece a transição da vogal antecedente para o segmento lateral. Há, nesta produção, o recuo significativo do articulador, caracterizando-a com um movimento de dorso menos anteriorizado. Logo, F2 terá um valor menor e, como consequência, haverá menor diferença entre o valor do primeiro e do segundo formante, que pode ser observada no espectrograma, especialmente na porção estável do segmento, quando a queda dos formantes já foi completa. Na Figura 04, no entanto, observa-se o contrário.

Figura 04: Maior diferença entre F2 e F1 em produção de [l] pós-vocálico mais anterior.

Fonte: Rosinski (2017)

Na produção mais anterior de /l/, haverá maior distanciamento entre o primeiro e o segundo formante em relação à produção mais posterior, indicada na Figura 04, apontando um F2 mais alto. É possível, no entanto, notar a queda do segundo formante em relação à vogal antecedente, mas tal diferença é justificada por um dos aspectos que distingue as vogais dos segmentos laterais: o valor de F2, sempre mais alto para os sons vocálicos.

Produções mais anteriorizadas de /l/ serão classificadas como alveolares e mais posteriores como velares ou vocalizadas, apesar de alguns autores (RECASENS, 2004; RECASENS; ESPINOSA, 2005; BROD, 2014) indicarem a impossibilidade de uma classificação dúbia do segmento, devendo ser considerados níveis de velarização com base na posição do articulador. Dessa maneira, o segmento lateral poderá assumir características graduais, determinadas pelo recuo ou avanço da língua em sua produção. Assim, como método de classificar o segmento como uma produção mais velarizada (velar ou vocalizada) ou menos velarizada (alveolar), com base no indicado na literatura quanto aos valores de F1 e F2, pode ser observada a diferença entre os valores do primeiro e do segundo formantes. Quanto maiores os valores da diferença entre F2 e F1, menos velarizado será o segmento; quanto menor for a diferença, mais velarizado será /l/, estando mais próximo de uma produção velar ou vocalizada.

Embora haja uma caracterização gradual, quanto ao nível de velarização, para a lateral em posição pós-vocálica, Sproat e Fujimura (1993) determinam valores de diferença F2-F1 para uma produção dark e uma realização light de /l/ no Inglês, observando as produções de cinco falantes de Inglês Americano, dentro os quais dois deles são do sexo feminino e três do sexo masculino. Os autores, assim, indicam médias de valores para produções light representados por 1046,74Hz e 1315,71Hz para as mulheres e 975,82Hz, 904,23Hz e 1143,43Hz para os homens. Nas produções dark, as médias de valores identificadas, para as mulheres foram 614,27Hz e 908,96Hz e, para os sujeitos do sexo masculino, 654,06Hz, 515,34Hz e 591,59Hz na diferença F2-F1. Vê-se, dessa forma, clara distinção entre os valores da diferença F2-F1 entre produções mais e menos velarizadas.

Para caracterizar, portanto, o segmento lateral pós-vocálico, no que se refere ao maior ou menor nível de velarização, deve-se observar o distanciamento de F1 e F2. Nos casos de caracterização de uma produção como mais velarizada a partir dos valores de diferença entre o primeiro e o segundo formantes, é possível distingui-la, acusticamente, de uma produção vocalizada, indicando-a como uma consoante lateral, pela amplitude de onda.

2.3.2 Consoante lateral pós-vocálica: aspectos articulatórios

A consoante líquida lateral constitui-se como um segmento complexo, dadas as suas características articulatórias. O segmento /l/ caracteriza-se por uma produção envolvendo um gesto vocálico e um gesto consonantal, os quais são identificados, respectivamente, pelo movimento de dorso de língua (abaixamento e retração) e pelo movimento de ponta de língua (extensão apical) (SPROAT e FUJIMURA, 1993). Os dois gestos são de tal forma identificados – vocálico e consonantal –, pois o primeiro não envolve a obstrução, parcial ou total, do trato articulatório, permitindo a passagem do ar. De forma contrária, o segundo pode impedir que o ar passe com total liberdade no momento em que o som é produzido, pois, ao ser realizado com o contato da ponta da língua com os dentes ou alvéolos, há um movimento de obstrução.