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Consumidor equiparado: artigo 17, do Código de Defesa do Consumidor

CAPÍTULO III CONCEITO JURÍDICO DE CONSUMIDOR

3.2. O Consumidor e o Código de Defesa do Consumidor

3.2.3. Consumidor equiparado: artigo 17, do Código de Defesa do Consumidor

O Código de Defesa do Consumidor não pretende com sua regulamentação acabar com os riscos da sociedade. Não há sistema de segurança absoluta para produtos e serviços.

Os riscos continuarão: abertos, dependentes dos processos sociais que se desenvolverão; extensível a todos, sem distinção; sendo o reflexo da atividade econômica, que deles se aproveita em benefício do capital; exigindo da sociologia divulgação para consciência ampla sobre a existência deles. Essas teses reafirmam a sociedade atual, imersa na ameaça já aceita como normal213.

Conforme aponta Herman Benjamin:

O que se quer é uma segurança dentro dos padrões da expectativa legítima dos consumidores. E esta não é aquela do consumidor-vítima. O padrão não é estabelecido tendo por base a concepção individual do consumidor, mas, muito ao contrário, a concepção coletiva da sociedade de consumo214.

E, concluindo pelo mesmo objetivo, a posição de Parra Lucan, apresentado por Zelmo Denari:

Trata-se de impor, de alguma forma, ao fornecedor a obrigação de fabricar produtos seguros, que satisfaçam os requisitos de segurança a que tem direito o grande público. Toda a regulamentação da responsabilidade pelo fato do produto, no âmbito da CEE, passa pelo conceito de segurança, a que todos têm direito215

Justamente por esta razão, ao tratar da responsabilidade pelo fato216 do serviço ou do produto, no artigo 17, o Código de Defesa do Consumidor prescreve que: “(...) equipararam-se aos consumidores todas as vítimas do evento”.

212 FILOMENO, José Geraldo Brito. In: Ada Pellegrini Grinover... [et al]. Código brasileiro de defesa do

consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 39. 213 BECK, Ulrich. La sociedad Del riesgo. Buenos Aires: Paidós, 1998, p. 199 et. seq.

214 BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 60.

215 DENARI, Zelmo. In: Ada Pellegrini Grinover... [et al]. Código brasileiro de defesa do consumidor

comentado pelos autores do anteprojeto. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 39.p. 176. 216 “Fato” é expressão comumente utilizada como sinônima de “acidente de consumo”. Todavia, há posição no sentido diferenciar as expressões, ligando a expressão “fato” a todo e qualquer acontecimento e “acidente de

O conceito é limitado pela seção em que está inserido: responsabilidade pelo fato do serviço ou do produto, motivo pelo qual é importante diferenciar vício de defeito, poistêm conteúdos diversos.

Vício é característica, de qualidade ou quantidade, que torna o produto ou serviço impróprio, inadequado ou, ainda, diminua-lhe o valor. Por sua vez, defeito é vício, mas acrescido de:

um problema extra, alguma coisa extrínseca ao produto ou serviço, que causa um dano maior que simplesmente o mau funcionamento, o não-funcionamento, a quantidade errada, a perda do valor pago - já que o produto ou serviço cumpriram o fim ao qual se destinavam. O defeito causa, além desse dano do vício, outro ou outros danos ao patrimônio jurídico material e/ou moral e/ou estético e/ou à imagem do consumidor217

Em suma, a prescrição do artigo 17, do Código de Defesa do Consumidor confere maior amplitude à responsabilização, abrangendo todos aqueles que sejam atingidos por fato ou outro acontecimento qualquer, desde que gere dano para além do mau funcionamento, inadequação qualitativa ou perda do valor pago, ou seja, dano extrínseco ao produto ou serviço, mesmo que nada tenham adquirido. É inspiração da figura do bystander, do direito anglo-saxão218.

Zelmo Denari lembra como exemplos as “hipóteses de acidente de trânsito, do uso de agrotóxicos ou fertilizantes, com a conseqüente contaminação dos rios, ou da construção civil, quando há comprometimento dos prédios vizinhos”.

É objetivo do artigo 17, do Código de Defesa do Consumidor, solucionar com rapidez a solução dos conflitos advindos do defeito ou acidente de consumo, com adequada pacificação social219.

A disciplina atenta para a desconsideração da identificação da natureza jurídica da responsabilidade para a proteção do sujeito vítima do evento. Uma vez aplicada a disciplina prescrita pelo artigo 17, do Código de Defesa do Consumidor, não se questionará se a responsabilidade é contratual ou extracontratual.

consumo” às situações em que, por questões involuntárias, para além do vício há risco à saúde e à segurança do consumidor. De qualquer maneira, a disciplina jurídica é a mesma, a extensão prevista pelo artigo 17, do Código de Defesa do Consumidor. Sobre o tema: Nunes, Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Editora Saraiva, 2004, p. 167-169 e 258. Ver também: Zanellato, Marco Antonio. Considerações sobre o conceito jurídico de consumidor. In: Revista do Consumidor nº 45. São Paulo: Revista dos Tribunais, janeiro-março de 2003, p. 174.

217 NUNES, Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Editora Saraiva, 2004, p. 167-169.

218 ZENALLATO, Marco Antonio. Considerações sobre o conceito jurídico de consumidor. In: Revista do

Consumidor, n. 45, jan./mar. 2003, p. 174.

219 EBERLIN, Fernando Büscher Von Teschenhausen. Concorrente como consumidor equiparado. In: Revista de

Luiz Gastão Paes de Barros entende que, em verdade, a equiparação não é feita para todos os efeitos legais. A rigor, não há consumidor ou usuário. O efeito exclusivo será a aplicação do regime jurídico próprio da responsabilidade civil objetiva220.

A disciplina do artigo 17, do Código de Defesa do Consumidor, atenta para a desvinculação de relação contratual antecedente para responsabilização. A simples exposição ao fato, com reflexos negativos, é suficiente. Justamente essa a explicação de se dispensar a análise da qualificação do sujeito como destinatário final para que seja consumidor.

Leonardo Roscoe Bessa registra ser justamente essa a interpretação que se tem dado ao dispositivo221. Patrícia Caldeira questiona a interpretação, apontando que, “se assim não for, só poderemos considerar consumidor equiparado do artigo 17, que envolve a responsabilidade extracontratual, quando existir anterior relação de consumo, e presente o consumidor stricto sensu222”.

Discorre Sérgio Cavalieri Filho sobre o fundamento da responsabilidade para o caso de aplicação da norma de extensão ao acidente, ou fato, de consumo:

A clássica dicotomia entre responsabilidade contratual e extracontratual foi aqui superada, ficando o assunto submetido a um tratamento unitário, tendo em vista que o fundamento da responsabilidade do fornecedor é a violação do dever de segurança - o defeito do produto ou serviço lançado no mercado e que, numa relação de consumo, contratual ou não, dá causa a um acidente de consumo223 Não obstante a extensão, considerada a vinculação dela à seção da responsabilidade pelo fato do produto e do serviço, importante notar que a responsabilização, mesmo que objetiva, não é ilimitada. É preciso prova de que o dano foi causado por infração “ao dever de segurança que previsivelmente se espera (reasonable foressebility) de um produtor, em circunstâncias normais, em relação ao produto colocado no mercado224”.

220 LEÃES, Luiz Gastão Paes de Barros. Inexistência de relação de consumo entre o ‘shopping center’ e seus frequentadores’. In: Revista de direito mercantil, industrial, econômico e financeiro. São Paulo: Malheiros Editores, abr./jun. 2001, p. 216.

221 BESSA, Leonardo Roscoe. Relação de consumo e aplicação do código de defesa do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 72.

222 CALDEIRA, Patrícia. Caracterização da relação de consumo. In: SODRÉ, Marcelo Gomes; Meira, Fabíola; Caldeira, Patrícia. (Coordenadores). Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Editora Verbatim. 2009, p. 25.

223 CAVALIERI FILHO, Sergio, Programa de responsabilidade civil. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 479. 224 Ibidem, p. 217.