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2.2.4 As contestações às acusações envolvendo o coronel Audir Santos Maciel no comando do DOI/CODI/II Exército

Segundo a contestação realizada pelo coronel Audir Santos Maciel à Ação Civil Pública proposta, em 14 de maio de 2008, para enfrentar a impunidade das violações de direitos humanos praticadas nas dependências do DOI/CODI/II Exército, no período já mencionado, o MPF não teria conseguido comprovar a prática dos crimes que lhe foram atribuídos.339 Ademais, sobre o período de comando do DOI/CODI/II Exército, afirmado na contestação à Ação Civil Pública, por parte de Audir Santos Maciel, há de se destacar a contradição nas

338 GASPARI, Elio. A Ditadura encurralada. São Paulo: Companhia das Letras, 2004, p. 376-377, interpolações

do autor. Os reflexos da mudança no comando do II Exército, após janeiro de 1976, e assunção do general Ednardo D’ Ávila Mello e podem ser conhecidos através do trabalho de POMAR, Pedro Estevam da Rocha. Massacre na

Lapa: como o Exército liquidou o Comitê Central do PCdoB. São Paulo: Busca Vida, 1987, 36.

339 MACIEL, Audir Santos. Contestação na Ação Civil Pública nº 2008.61.00.011414-5. Rio de Janeiro, 11 ago.

2008, fls. 492. Caso DOI/CODI/SP. Disponível em: <http://www.prr3.mpf.gov.br/content/view/145/217/>. Acesso em: 15 set. 2013.

148 informações relativas ao seu término, posto que conforme o documento: “Em 24 de janeiro de 1974, o então réu MACIEL foi designado comandante do DOI do II Exército onde permaneceu até 31 de dezembro de 1975. A área de atuação do DOI abrangia todo o Estado de São Paulo e Matogrosso, e apenas está”.340 No entanto, no Inquérito Policial Militar (IPM) instaurado para investigar as circunstâncias da morte do operário Manoel Fiel Filho, foram ouvidos, todos na condição de testemunhas, os membros da equipe de trabalho do DOI/CODI/II Exército, civis e militares, bem como os presos políticos, vinculados ao PCB, os quais se encontravam naquele organismo repressivo entre 16 e 17 de janeiro de 1976.

Deste modo, naquele Inquérito Policial-Militar foram ouvidos na condição de testemunhas, relacionadas ao Exército Brasileiro, o próprio tenente coronel Audir Santos Maciel, o major Dalmo Luiz Muniz Cyrillo, o 2º sargento Luiz Shinji Akaboschi e o 2º sargento Moacir Piffer, entre outros. No Termo de Inquirição de Testemunha do tenente-coronel Audir Santos Maciel consta o seguinte “(...) que estava passando o fim de semana na cidade do Rio de Janeiro e retornou a São Paulo na noite do dia 18 [de janeiro de 1976], indo no DOI/CODI na manhã do dia 19 (segunda-feira) [de janeiro de 1976] (...) que durante a sua ausência respondeu pelo comando daquele órgão o major Dalmo Lúcio Muniz Cyrillo”.341 Pois bem, do exposto tem-se que o período de comando do tenente coronel Audir Santos Maciel junto ao DOI/CODI/II Exército não finalizou em dezembro de 1975, estendendo-se até o episódio da morte do operário metalúrgico Manoel Fiel Filho, ocorrido nas dependências daquele organismo repressivo.

Na versão do tenente coronel Audir Santos Maciel para o encaminhamento dos detidos pelo DOI/CODI, não se percebe a indicação das condições em que se executavam os procedimentos necessários à realização dos interrogatórios preliminares. De todo modo, a versão militar para o itinerário de violações de direitos humanos, praticadas nas dependências do DOI/CODI/II Exército, merece ser referida, muito por aquilo que deixa de mencionar:

Todas as pessoas que cometeram crimes contra a Segurança Nacional ou suspeitos de tais atos e que foram detidas pelo DOI/CODI/II Ex eram, inicialmente, submetidas no DOI a um interrogatório preliminar que culminava com uma Declaração de Próprio Punho, feita pelo preso. A seguir eram encaminhadas, mediante ofício do General Chefe do Estado–Maior do II Exército, ao DOPS/SP. Junto com o preso seguia, além da sua Declaração de Próprio Punho, uma síntese do seu envolvimento com as

340 MACIEL, Audir Santos. Contestação na Ação Civil Pública nº 2008.61.00.011414-5. Rio de Janeiro, 11 ago.

2008, fls. 495. Caso DOI/CODI/SP. Disponível em: <http://www.prr3.mpf.gov.br/content/view/145/217/>. Acesso em: 15 set. 2013.

341 BRASIL. Ministério do Exército. Termo de Inquirição de Testemunha. São Paulo, 22 jan. 1976. Testemunha

Audir Santos Maciel. Inquérito Policial-Militar, integrante da Ação Ordinária nº 1298666, da 5ª Vara Federal de São Paulo, fls. 49, interpolações nossas.

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organizações terroristas que atuavam no país. No DOPS, era aberto um Inquérito Policial e, normalmente, o delegado de polícia encarregado desse Inquérito, pedia a prisão preventiva dos acusados à 1ª ou a 2ª Auditoria da 2ª Circunscrição Judiciária Militar, ambas sediadas em São Paulo. De acordo com a Lei então vigente, os crimes contra a Segurança Nacional eram julgados pela Justiça Militar. Decretada, pelo Juiz Auditor, a prisão preventiva, os réus eram encaminhados ao Presídio Tiradentes, onde aguardavam o julgamento. Posteriormente, eram levados a julgamento em uma das duas Auditorias Militares. O julgamento era feito por um Conselho Permanente de Justiça, que tinha como um de seus membros o Juiz Auditor, um Juiz civil togado. Os réus, além de serem julgados publicamente, contavam para a sua defesa com a presença de advogados, por eles próprios contratados, e apresentavam as suas testemunhas de defesa que, também, eram ouvidas. Proferida a sentença, se absolvidos eram colocados em liberdade. Se condenados continuavam no Presídio Tiradentes, cumprindo a pena recebida. Normalmente, os advogados apelavam ao Superior Tribunal Militar que, em última instância, julgava o processo.342

Sobre as atividades de Audir Santos Maciel, no DOI do II Exército, ainda em sua contestação à Ação Civil Pública relativa à responsabilização e à reparação das violações de direitos humanos, perpetradas nas dependências daquele organismo repressivo, o militar asseverou que “(...) cumpriu, rigorosamente, as ordens emanadas de seus superiores. Nunca recebeu uma ordem absurda, nem emitiu nenhuma determinação desse tipo. Jamais fez prisões ilegais, permitiu torturas, abusos sexuais, homicídios, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres”.343

Mesmo assim, em tom de apelo, Audir Maciel destacou a importância da participação do Exército Brasileiro em sua defesa diante das acusações de violações de direitos humanos, nas dependências do DOI/CODI de São Paulo: “O Exército Brasileiro é uma Instituição Nacional Permanente e o contestante crê ser ele quem deve dar a devida resposta a esses detratores, dentro da lei e no interesse da Justiça. Omissão nunca foi característica das suas tradições em nenhuma época. Não fez parte de sua História perder os anéis para salvar os dedos”.344 Afora a busca de amparo, junto ao Exército Brasileiro, para promover sua defesa frente às acusações formalizadas pelo MPF, importa notar que há por parte de Audir Santos Maciel a sustentação da hipótese da prática de tortura, em local desconhecido, isentando-se assim sobre as acusações de realização de tortura nas dependências do DOI/CODI/II Exército: “(...) o réu jamais permitiria semelhante ato em um local que comandasse, não descartando,

342 MACIEL, Audir Santos. Contestação na Ação Civil Pública nº 2008.61.00.011414-5. Rio de Janeiro, 11 ago.

2008, fls. 496-497. Caso DOI/CODI/SP. Disponível em: <http://www.prr3.mpf.gov.br/content/view/145/217/>. Acesso em: 15 set. 2013.

343 MACIEL, Audir Santos. Contestação na Ação Civil Pública nº 2008.61.00.011414-5. Rio de Janeiro, 11 ago.

2008, fls. 499. Caso DOI/CODI/SP. Disponível em: <http://www.prr3.mpf.gov.br/content/view/145/217/>. Acesso em: 15 set. 2013.

344 MACIEL, Audir Santos. Contestação na Ação Civil Pública nº 2008.61.00.011414-5. Rio de Janeiro, 11 ago.

2008, fls. 500. Caso DOI/CODI/SP. Disponível em: <http://www.prr3.mpf.gov.br/content/view/145/217/>. Acesso em: 15 set. 2013.

150 entretanto, a hipótese da existência de um outro local desconhecido dele até então, mas que teria existido segundo a versão constante da inicial”.345

Por conseguinte, realizada a contestação às acusações referentes à segunda fase da atuação repressiva do DOI de São Paulo, é pertinente que se tente buscar a compreensão dos mecanismos sociais e políticos capazes de permitir a contínua prática de violações de direitos humanos, por aquele organismo repressivo. Nesse sentido, o próximo item, deste capítulo, apresenta panorama geral dos resultados alcançados pelo DOI/CODI/II Exército, entre 1970- 1977.

2.2.5 Balanço explicativo dos resultados alcançados pela atuação repressiva do DOI/CODI/II