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Jörn Rüsen (Duisburgo, 19 de outubro de 1938) estudou História, Filosofia, Pedagogia e Literatura alemã na Universidade de Colônia (Universität zu Köln), localizada no estado de Renânia do Norte-Vestfália, Alemanha.

Nesta Universidade, sob orientação do influente historiador Theodor

Schieder58, Rüsen concluiu sua tese de doutoramento intitulada História

58 Gostaríamos de deixar em aberto as dimensões da influência do historiador Theodor Schieder sobre o pensamento de Jörn Rüsen. Curiosamente, questões como nazismo, holocausto e trauma são muito presentes no pensamento de Rüsen, sendo ele um crítico do regime nazista e defensor público do humanismo e da democracia, e é de conhecimento comum que Theodor Schieder foi um intelectual militante do Partido Nazista, desde 1937, sendo um dos autores, inclusive, do documento intitulado “Liquidação e questões étnicas nas áreas ocupadas da Polônia”, que compôs o “Memorando de 07 de outubro de 1939”. Este documento haveria solicitado a expuls ão de milhares de judeus poloneses, russos e de outras nacionalidades do Leste da Europa, a fim de criar um

compreendida. Gênese e justificação da teoria da história de J. G. Droysen (Begriffene Geschichte. Genesis und Begründung der Geschichtstheorie J.G. Droysens), em 1966 (WIKLUND, 2008, p. 21). Esta aproximação com o historicismo alemão59, a partir do

estudo e recuperação do pensamento e teoria do historiador Johann Gustav Droysen, foi de grande importância na valorização que Rüsen atribui em sua teoria às questões de método, razão e ciência60.

Nos anos seguintes ao seu doutoramento, de acordo com o historiador Martin Wiklund (2008, p. 21), Rüsen lecionou Filosofia e Teoria da história em diversas universidades alemãs, com destaque à Universidade de Ruhr (Ruhr-Universität

Bochum – RUB), localizada nas colinas ao sul de Bochum, onde assumiu a cátedra

de História em 1974 e à Universidade de Bielefeld (Universität Bielefeld), onde sucedeu Reinhart Koselleck em 1989, assumindo posteriormente a diretoria do Centro para Pesquisa Interdisciplinar de Bielefeld (Zentrum für interdisziplinäre Forschung – ZIF), de 1994 a 1997.

No mesmo ano de 1997, tornou-se presidente do Instituto de Ciências Culturais (Kulturwissenschaftliches Institut – KWI) em Essen, onde continuou seus estudos iniciados em Ruhr sobre consciência histórica e pensamento histórico, ampliando suas pesquisas em direção ao estudo da história da cultura histórica, do holocausto e traumas em geral, da teoria da ciência das culturas e ao estudo comparativo internacional de consciência histórica e historiografia (WIKLUND, 2008, p. 21).

espaço para “colonos alemães”. Sobre Theodor Schieder ver: <http://christophschieder.blogspot.com.br/2013/10/theodor-schieder-part-ii.html>. Acesso em: 28/01/2016.

59 Reconhecendo que o conceito “historicismo” é um conceito polissêmico, de variadas interpretações e apropriações, escolhemos deixar aqui duas possibilidades de definição: historicismo alemão como o movimento intelectual encampado pela Escola Histórica Alemã no século XIX, que abriu novas perspectivas para a definição do método histórico e para a autonomia da História ao lado das demais ciências humanas (ver apresentação de Julio Bentivoglio em DROYSEN, 2009, p.07); e um modo de pensar que considera a História como um conhecimento específico dos tempos passados, distintos do conhecimento do tempo presente, mas que coloca aqueles em perspectiva com este e com o tempo futuro, regulado metodicamente (vale dizer cientificamente) mediante a operação mental da compreensão (MARTINS, 2008, p. 17/18).

60 Sobre a influência de Droysen na teoria da história de Rüsen, além do texto A teoria da história de

Jörn Rüsen, Arthur Assis também possui um outro texto significativo na coletânea de Estevão de

Rezende Martins, intitulada A história pensada: teoria e método na historiografia europeia do século

XIX. Ao apresentar o texto de Droysen, sobre a ambiguidade da história de ser arte e ciência, e de

seu fundamento enquanto ciência a partir do trato com as “fontes”, Arthur Assis nos aponta como originalidade do pensamento de Droysen sua síntese de filosofia da história, teoria do conhecimento, metodologia e teoria da historiografia. Além disso, pode-se destacar sua compreensão da historiografia como resultado de uma cognição empírica, e não especulativa, e sua metodologia representada na fórmula “compreensão mediante pesquisa”. Ver em Estevão Martins (2010, p. 31- 37).

Aposentou-se em 2007, como presidente do Instituto, permanecendo até os dias atuais como pesquisador sênior, coordenando projetos de pesquisas sobre o humanismo e interculturalidade na era da globalização (RÜSEN, 2015, p. 93)61.

Como forma de demarcação instrumental de seu ambiente intelectual, torna-se conveniente relacionar Rüsen a uma geração de intelectuais que cresceu depois da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e que adotou a democracia e o iluminismo como “estrelas-guias” (WIKLUND, 2008, p. 22).

Da mesma geração de Jürgen Habermas e dos fundadores da História Social praticada em Bielefeld, Jürgen Kocka e Hans-Ulrich Wehler62, Rüsen buscou na

modernidade, no iluminismo e no historicismo, questões que dessem conta de traçar rumos ou explicações às instabilidades dos novos horizontes que a segunda metade do século XX apresentava.

Um contraponto a esta disposição da geração de Rüsen pode ser apresentado pela geração anterior, com importantes intelectuais como Reinhart Koselleck, Hermann Lübbe e Odo Marquard, ligados a um conservadorismo cultural e de herança clássica greco-romana. Esta geração teria percebido de maneira mais intensa a “americanização” da Alemanha Ocidental após sua divisão em 1949, sendo esta uma característica, se não definidora, no mínimo representativa de seu sentimento “cético”, de desilusão, despolitização e realismo (WIKLUND, 2008, p. 22).

Deste modo, não é apenas uma questão de diferenças geracionais, mas de tradições intelectuais que estão começando a divergir politicamente e filosoficamente nos contextos acadêmicos da Alemanha. Apresentando significativas semelhanças,

61 Sobre este projeto, conferir em: <http://www.kwi-humanismus.de>. Acesso em:18/03/2016.

62 Sobre a História Social Alemã, vale a citação de Peter Lambert: “Por um breve período durante os anos de 1970, anunciou-se amplamente o progresso triunfal de uma nova abordagem social- científica à escrita de história na República Federal da Alemanha, a Al emanha Ocidental. À frente da marcha, dois jovens historiadores – Hans-Ulrich Wehler e Jürgen Kocka – que trabalhavam na nova Universidade de Bielefeld estavam fazendo incursões confiantes em territórios inexplorados por historiadores alemães. Para se referir a eles, seus colegas próximos e seus alunos, foi rapidamente adotado a expressão “escola de Bielefeld”, como uma abreviação conveniente para um corpo de trabalho crescente, informado por convicções e aspirações compartilhadas. Aí estava, finalmente, uma historiografia progressista e informada teoricamente e, ao mesmo tempo, firmemente ancorada dentro do sistema universitário da Alemanha Ocidental – um novo paradigma que tinha superado a inércia decadente, mas até então, ubíqua, da história política esta tista e nacionalista. Os pedidos de desculpas pelo passado alemão deram lugar a uma crítica rigorosa. Supostamente estagnada e isolada até a década de 1960, a historiografia alemã parecia agora estar vívida e haver “retornado ao Ocidente”. Onde tinha sido hostil à teoria, os Bielefelder a assumiram prontamente. Onde a agência histórica tinha sido atribuída a indivíduos, ela agora era ligada a forças e estruturas impessoais. O antimodernismo nostálgico e pessimista dava lugar a uma identificação segura da modernidade com o progresso. E essa historiografia parecia ter refletido fielmente viradas abruptas na política, na sociedade e na cultura alemã” (LAMBERT; SCHOFIELD, 2011, p. 117).

dois dos professores de Koselleck e Lübbe – Hans-Georg Gadamer e Joachim Ritter –, foram referências na linha Ritter-Schule, de característica hermenêutica, de análise histórica de conceitos, embasada em Aristóteles e Hegel, com tendências ao conservadorismo cético. Um paralelo a esta tendência começa a se manifestar a partir da teoria crítica da escola de Frankfurt, que se inspirou em Kant, Marx, Freud e Nietzsche, com inclinações socialistas, e feita de análises sociológicas como parte de emancipação e transformação social.

Grosso modo, a linha divisória separava análises sociológicas como parte do projeto ilustrado de emancipação, antitradicionalismo e utopismo (a Escola de Frankfurt), oposta à hermenêutica, Begriffsgeschichte [História dos Conceitos], ceticismo, integração da tradição e do significado das instituições existentes (a Escola de Ritter). Tais divisões tenderam a ocultar fontes comuns e conexões entre opostos; neste caso, por exemplo, o significado geral de Hegel para ambas as tradições, e a crítica à racionalidade instrumental, ao cientificismo e à alienação na sociedade moderna. (WIKLUND, 2008, p. 22).

Para Martin Wiklund (2008, p. 42), como também para os historiadores Luiz Sérgio Duarte da Silva (2000, p. 158) e Luís Fernando Cerri (2011, p. 63), o pensamento e a teoria de Rüsen não se enquadram satisfatoriamente nem na História Social de Bielefeld, nem na sociologia crítica de Frankfurt, compartilhando alguns insights, mas não tendo sua organização sobre estas perspectivas. Os autores concordam que o pensamento de Rüsen apresenta significativas proximidades com as ideias de racionalidade e ação comunicativa de Habermas63: uma proposição de

racionalidade pautada na comunicação, no diálogo com as diferenças, em que prevaleceria a “força do melhor argumento”, definido intersubjetivamente (RÜSEN, 2001, p. 21).

Essa racionalidade argumentativa se configuraria como alternativa à razão instrumental apontada por Max Horkheimer (2002, p. 26) e ao contexto de aproximações culturais que se enunciam no pós-guerra. Tanto Rüsen quanto Habermas buscam defender o pensamento científico e a ação racional diante da possibilidade crescente de sua subordinação aos interesses práticos e utilitaristas da sociedade. Este seria um esforço no sentido de deslocar a ciência da esteira do pragmatismo, que intimamente vinha se relacionando a processos de dominação e exploração, para recuperar sua origem iluminista de emancipação e esclarecimento

63 De acordo com a prof. Maria Kátia R. Salomão, as discussões sobre o pertencimento de Jürgen Habermas à escola de Frankfurt são controversas e sem uma resposta definitiva. É mais comum assinalar Habermas como “herdeiro da teoria crítica” (ROCHA SALOMÃO, 2008, p. 12). Sobre a teoria crítica da escola de Frankfurt, ver Mogendorff (2012, p. 152-159).

da humanidade64, uma recuperação filtrada pelas contribuições do historicismo e suas

críticas aos princípios abstratos, externos e dogmáticos da razão (WIKLUND, 2008, p. 23). Ter-se-ia, especialmente no pensamento e na teoria de Rüsen, uma intenção de aproximar ciência e vida, a partir de uma racionalidade argumentativa e situada historicamente, na busca por uma melhor integração entre as pessoas e suas culturas.

Rüsen foi inspirado pela ideia de Habermas de racionalidade comunicativa e tem consistentemente tentado desenvolver uma teoria que não instrumentalize a identidade dos outros, mas que os inclua em termos equivalentes, em perspectivas mais amplas de argumentação e recíproco reconhecimento de diferenças, tanto dentro de sociedades específicas como dentro do horizonte global da humanidade. (WIKLUND, 2008, p. 42).

Para Wiklund (2008, p. 23), muito embora a influência do historicismo (que o autor denominou “nova forma de Historismus”) na geração de Rüsen tenha sido positiva, a mera recuperação desta tradição não seria suficiente para a compreensão das complexidades dos novos tempos. Num conjunto de indagações, o autor aponta esta situação:

Nos anos 1960 e 70, o Historismus foi desafiado, de um lado, por novas questões teóricas e perspectivas históricas no escopo da ciência histórica, e, por outro, pelas mudanças culturais e sociais. Terá sido o Historismus capaz de interpretar o desenvolvimento da sociedade moderna capitalista e industrial, e, além disso, terá sido capaz de lidar com alterações estruturais e processos sociais que mudaram de maneira não-intencional? Outro tema importante era como confrontar a experiência do nacional-socialismo e seu legado. Que tipo de autocompreensão o Historismus criou? Não teria ele meramente legitimado tradições existentes, ao invés de examiná-las criticamente? Não era sua historiografia uma legitimação da sociedade burguesa, determinada e distorcida por interesses sociais e políticos externos? Até que ponto o Historismus consolidado poderia permanecer relevante para o presente? (WIKLUND, 2008, p. 23).

Em certa medida, estas questões nos auxiliam no entendimento do tom eclético da teoria rüseniana, que não se limita ao historicismo, tal como postulado por Droysen.

64 Em certa medida, Rüsen pode ser aproximado a Kant, como um herdeiro da ideia de esclarecimento. Este conceito se refere à “coragem” que o homem precisa ter para usar seu próprio pensamento, sem a tutela de outros, libertando-se de sua “imaturidade culposa”, de sua menoridade (KANT, 2005. p. 63-64). Segundo Estevão Chaves de Rezende Martins, na recepção contemporânea desse programa das Luzes, a abordagem da cultura histórica seguiu sempre um duplo caminho crítico: a) saber que o legado da tradição, que preenche a cultura histórica é uma realidade, independentemente de ser julgado bom ou mal, justo ou injusto, certo ou errado, verdadeiro ou falso; b) formar a consciência histórica crítica de si e de todos os demais para os habilitar a posi cionar-se por si mesmos quanto a esse legado e quanto ao que dele se apropria, e de que forma. Trata-se dos processos típicos da análise cultural: lidar com a tradição e com a crítica da tradição. (MARTINS, 2012, p. 70). Podemos ainda deixar indicadas outras possíveis aproximações entre Rüsen e Kant: a ênfase no indivíduo, a não-distinção entre exterioridade e interioridade, a consciência histórica como uma consciência constituinte da realidade e a particular ênfase na dimensão estética, a forma, como componente vivo capaz de despertar não apenas os sentimentos e as emoções, mas também representações intelectuais (BAROM, 2012a, p. 26).

Quanto às “novas questões” e “perspectivas no escopo da ciência da história”, o historiador Arthur Assis (2010) indica a necessidade de uma reformulação da Teoria Geral da História, aos moldes das desenvolvidas no século XIX, em virtude das transformações ocorridas internamente na área da ciência da história ao longo da primeira metade do século XX.

Sendo assim, com a multiplicação das estratégias de pesquisa histórica e a pluralização das teorias e métodos empregados na ciência da História, ocorre a aproximação da ciência da história às Ciências Sociais, conduzida primeiramente pela escola francesa dos Annales e seus representantes Marc Bloch e Lucien Febvre (ASSIS, 2010, p. 10). Nesse grupo, os estudos históricos renovaram os objetos de pesquisa, deixando de lado temas tradicionais, como Estado e eventos políticos, priorizando novos temas como transformações econômicas, práticas culturais e estruturas sociais65. Esta mudança de objetos, que consigo trouxe uma nova

metodologia e concepções de documentos históricos e de tempo histórico, tornou insuficiente qualquer teoria da história que se fundamentasse no pressuposto de uma unidade do “método histórico”. De acordo com Assis, a teoria da história de Rüsen surge em resposta a este estado de desconforto causado à ciência da História.

Na medida em que aumentaram, no desenvolvimento da especialidade, a diferenciação interna, o alcance e a especialização das técnicas de pesquisa, perdeu-se a consciência de sua unidade, somente dentro da qual faz sent ido falar-se de “método histórico” em termo especializados. Quase já não existem investigações e apresentações dos contextos sistemáticos das inúmeras e múltiplas técnicas da pesquisa histórica, em contraste com as variadas exposições dessas técnicas pelos profissionais de cada campo especializado. Tais exposições se somam para fornecer um panorama da prática atual de pesquisa. Não forma, contudo, um conhecimento de princípios transversais e abrangentes, que definam a pesquisa histórica como uma prática cognitiva própria. (RÜSEN, 2007a, p. 102).

Com o fim da característica típica tradicional da unidade a priori de método e objetos, a história do século XX se desmembrou em perspectivas e estratégias diversas que, na concepção de Rüsen (2001, p. 27), precisavam ser compreendidas e teorizadas a partir de uma visão de conjunto da disciplina histórica. A

multiperspectividade (diferentes fontes), a controversidade (diferentes

representações) e a pluralidade (diferentes mensagens) que a história ganhou no

65 Sobre a emancipação da História, da Filosofia e Literatura, e sua aproximação o estatuto de científico ver REIS (2006). Nesta obra Reis busca identificar elementos da filosofia que permaneceram nas tentativas da História enquanto ciência. De acordo com o autor, a História efetivamente se separa da Filosofia com a escola dos Annales.

início do século necessitavam ser levadas em consideração pelo método histórico, como critérios de cientificidade. Ou nas palavras de Assis,

Com sua matriz disciplinar, Rüsen propõe um conceito que pretende permitir a assimilação das diferenças entre as correntes historiográficas contemporâneas e favorecer a percepção da identidade que lhes é comum. (ASSIS, 2010, p. 11).

Neste sentido, a teoria da história de Rüsen não se apresenta como um novo paradigma – da escola de Bielefeld –, mas sim como uma teoria geral e estruturante que busca lidar abarcar e lidar com diferentes paradigmas da ciência da História, como o historicismo, o positivismo, o marxismo, a hermenêutica e a história social. Disso deriva sua preocupação com os princípios formais que são comuns aos estudos históricos em todas as suas variantes. Assim, próximo a Habermas, o trabalho de Rüsen cumpre uma função comunicativa, sendo que a razão possível na história deriva dessa base de possibilidade de comunicação entre escolas historiográficas e vertentes metodológicas do trabalho com os documentos.

Além desta transformação interna da história que ocorreu no início do século, a teoria da história de Rüsen pode ser ainda apresentada como uma possível defesa da racionalidade e da ciência diante dos ataques da pós-modernidade. É importante enfatizar que para Rüsen a pós-modernidade traz questões notórias à modernidade, não havendo uma negação a priori de seus postulados. Em diálogo com estas contribuições e críticas, Rüsen busca refletir sobre a história enquanto ciência, na defesa de seus pilares fundamentais: verdade, ciência, método e razão. É uma teoria da história localizada, portanto, entre a modernidade e a pós-modernidade (BAROM, 2012b, p. 995)66.

De modo breve, Rüsen conceitua a pós-modernidade como o atual contexto cultural e político que vem se apresentando como uma oposição à idealização oitocentista de “modernidade”.

Para o autor, no plano econômico, a modernidade teria sido entendida como sinônimo de crescimento constante do bem-estar por meio do avanço da

66 Demarcamos limites à conceituação de modernidade e pós-modernidade segundo o exposto por Rüsen. No âmbito das relações econômicas, papel do Estado e descrição do capitalismo globalizado, julgamos ser bastante problemática e controversa a sua conceituação de “pós - moderno” ao período, já que não detalha sua compreensão acerca das relações econômicas, sendo esta uma questão bastante controversa na literatura. Mas, por outro lado, mantivemos a descrição dimensional de Rüsen em nossa tese por concordarmos com sua descrição “pós -moderna” ao âmbito do conhecimento, razão e método na área da ciência da história, na segunda metade do século XX – especificamente o que expôs acerca da guinada linguística, papel da narrativa, micro- história, história hermenêutica e construtivismo (RÜSEN, 1997).

industrialização. No tocante à vida social, uma sociedade “moderna” seria uma

sociedade caracterizada por princípios de igualdade, enquanto “modernização”

significaria um desenvolvimento histórico que conduziria a uma igualação progressiva das relações entre as pessoas. No plano político, modernização significaria “democratização”, uma forma democrática de organização política (Rüsen, 1997, p. 81). Por fim, no tocante à dimensão do conhecimento e sua produção, modernização significaria “racionalização”. Sobre esta dimensão do conhecimento, especialmente,

Modernidade quer dizer que o homem desenvolveu a capacidade de organizar a vida humana conforme conhecimentos e descobertas devidas à racionalidade e à pesquisa científica. Essa capacidade foi combinada com a promessa de erigir por via da racionalização o império do homem (regnum

hominis). Corre que entrementes estamos vivenciando um fenômeno oposto.

Temos a sensação de estar perdendo progressivamente as fontes do sentido e da significância de nossa própria vida. As fontes do sentido e do significado na vida cultural estão secando (RÜSEN, 1997, p.82).

Conceituando “modernidade” a partir destas idealizações, estaríamos tendendo para a “pós-modernidade”, diante do oposto de suas realizações (Rüsen, 1997, p. 81). Assim, em vez da esperança moderna na industrialização e seu crescimento, viveríamos hoje uma possível catástrofe ambiental; em vez da esperança na “igualdade social” entre as pessoas, estaríamos construindo verdadeiros abismos entre grupos, classes sociais, países e continentes; em vez da esperança na “democratização” como projeto de paz, estaríamos produzindo inúmeras guerras, que na prática revelariam ondas de desrespeito aos direitos do homem e do cidadão, à suas culturas, histórias e sistemas políticos. E, finalmente, em vez da esperança na razão e no conhecimento científico, estaríamos vivendo um período de duras críticas, entre as quais podemos elencar, além da já mencionada de Horkheimer: as críticas de Friedrich Nietzsche sobre a consideração do componente dionisíaco instintivo nas

ações humanas (1992, p. 27) – as quais se somam à consideração acerca do

inconsciente de Freud (1996, p. 95) –, e a crítica de Habermas sobre a razão ter-se tornado procedural (1990, p. 45), ou seja, sofrido uma redução a fins e procedimentos,