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Contexto econômico internacional e mudanças tecnológicas afetando os portos

Capítulo 2 A Competitividade dos Portos

2.1 A reforma portuária

2.1.1 Contexto econômico internacional e mudanças tecnológicas afetando os portos

O Banco Mundial, no primeiro módulo do relatório intitulado Port Reform Toolkit (World Bank, 2001a), cita três forças principais, responsáveis pela reforma nos portos de países em desenvolvimento e industrializados: (1) forças externas de competição e

inovações tecnológicas provenientes da indústria de navegação; (2) os benefícios financeiros e operacionais decorrentes da entrada da iniciativa privada no desenvolvimento da infra-estrutura e na provisão de serviços portuários e; (3) a diversificação e globalização dos investidores e operadores da indústria portuária.

No que diz respeitos à primeira das três forças, os portos precisam responder a uma crescente necessidade de competição nacional por mercados globais, bem como adaptarem-se às mudanças na tecnologia dos transportes. Lakshaman et al (2001), afirmam estarem sendo oferecidas oportunidades únicas aos países em desenvolvimento em termos de acesso aos mercados globais, para as quais, porém, há que serem atendidos padrões internacionais de qualidade e entrega just-in-time. O conceito de globalização que parece mais adequado para o contexto, é o contido no documento da CEPAL (1998:6):

"globalización del comercio [es] la interdependencia entre los factores de producción de diferentes países resultante de los esfuerzos colectivos por obtener materias primas, producir componentes y proporcionar servicios de montaje y distribución de productos que se venderán en todo el mundo".

No segundo grupo de forças citado no módulo um do Toolkit, portos nacionais e regionais reconhecem que não são capazes de competir sem a ajuda da eficiência do setor privado e também sem o acesso ao seu capital. Em conseqüência disto, tem havido um contínuo crescimento da participação privada nas operações portuárias nestes últimos anos. Dentre os países com recente privatização nos portos, tem-se Polônia, Alemanha, Lituânia, Estônia, Rússia, Japão, Malásia, China, Tailândia, Filipinas, Indonésia, Argentina, Chile, Brasil, México, Colômbia, Panamá, Moçambique, Tanzânia, Reino Unido e Canadá. Os investimentos privados nessas infra-estruturas saltaram de valores em torno dos dez milhões de dólares, em 1991, para cerca de 4,3 bilhões de dólares em 1997.

A terceira força influenciando a reforma portuária é formada pelo crescente mercado de provisão de serviços portuários oferecido por empresas internacionais especializadas. Esse mercado movimenta investimentos da ordem de 45 a 60 bilhões de dólares, dos quais aproximadamente 30 a 40 bilhões são relativos a operações de terminais de contêineres. Os serviços incluem o acesso e proteção de navios, praticagem, serviço de rebocadores, gerenciamento de tráfego de navios, abastecimento de gêneros alimentícios e necessidades afins, manuseio de carga conteinirizada e não conteinirizada, ovação e desova de contêineres, unitização de cargas, armazenagem, serviços de dragagem e manutenção de canais e bacias de evolução, manutenção de equipamentos de manuseio de cargas,

Nessa mesma linha, Barat (1993) cita as profundas transformações ocorridas nos transportes desde a década de 1970, em especial no transporte hidroviário de longo-curso, em decorrência da intensificação no comércio internacional. O autor cita as modificações pelas quais passaram os portos, destacando as mudanças de layout para privilegiar áreas de apoio às operações, a substituição de instalações voltadas para o manuseio de carga geral fracionada em benefício de área e instalações para contêineres, a compatibilização do layout e instalações à evolução tecnológica dos navios e a reestruturação organizacional dos portos, que passaram a ser vistos não mais como um serviço público e sim como um "empreendimento comercial, auto-sustentado, no qual prevalecem parcerias público- privadas (...)" (BARAT, 1993:30).

Trujillo e Nombela (1999) reconhecem que não há um modelo único de parceria público-privada que seja aplicável a todos os portos. Assim, consideram que o grande desafio que os portos enfrentam é o desenvolvimento de mecanismos regulatórios adequados, no sentido de garantir resultados eficientes dentro de um contexto de orçamentos públicos apertados - sobretudo nos países em desenvolvimento. Os autores adotam a definição da UNCTAD (United Nations Conference on Trade and Development) quanto ao papel dos modernos portos marítimos:

Os portos marítimos são conexões entre vários modos de transporte e assim eles são centros de transportes combinados. Além disso, eles são mercados multifuncionais e áreas industriais em que os bens não estão apenas em trânsito, mas são classificados, produzidos e distribuídos. Com efeito, os portos marítimos são sistemas multidimensionais que devem ser integrados em cadeias logísticas para preencher adequadamente suas funções. Um porto marítimo eficiente necessita, além de infra-estrutura, superestrutura e equipamentos, de adequadas conexões com outros modos de transporte, de uma gerência motivada e de trabalhadores suficientemente qualificados (TRUJILLO e NOMBELA, 1999:4, trad. livre).

Pelo exposto percebe-se que, à parte uma discussão dos aspectos políticos da prevalência da doutrina neoliberal nas últimas décadas do século XX, cristalizada na queda do muro de Berlim e nas profundas críticas aos resultados obtidos pelos modelos econômicos de ênfase estatal do bloco socialista europeu, há um certo consenso quanto a considerar o contexto econômico da competição internacional, as mudanças tecnológicas nos transportes e um cenário de orçamentos públicos limitados, como os principais condutores da necessidade de reformas nos sistemas portuários, conduzidas através de um processo de privatizações e parcerias com o setor público.

Embora este trabalho não se proponha a discutir a validade social do modelo econômico do qual resultam as reformas e a intensificação da competição, é preciso

considerar também outras visões das mudanças. Numa outra interpretação do mesmo fenômeno, o Consenso de Washington seria o documento balizador das reformas que se intensificaram na última década do século XX e cujo fundamento é a manutenção das taxas históricas de exploração do capital. Os responsáveis por operacionalizar a manutenção dos altos retornos ao capital seriam os organismos internacionais vinculados aos mecanismos de mercado, tais como o Banco Mundial, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e suas ramificações - como a CEPAL, na América Latina - através da eliminação sistemática dos direitos conquistados pelas políticas do Estado de bem-estar social (FRIGOTTO e CIAVATTA, 2003).