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CAPÍTULO 3 – PERCURSO METODOLÓGICO: a construção de um

3.3 Contextualização e caracterizações do campo de pesquisa

O processo de reabertura política e de reforma do Estado brasileiro instaurado com a promulgação de uma nova Carta Magna, em 1988, visando construir uma sociedade efetivamente democrática permeou vários setores sociais, inclusive a educação escolar. Em Pernambuco, as ações orientadas à democratização da educação são resultantes de uma conjuntura de mudanças na política do país, avanço dos movimentos sociais e sindicais, com o engajamento de educadores nas lutas destes, e

processos de conscientização e politização dos cidadãos. Com isso, o interior das escolas também se constituiu como palco de lutas políticas. (CORREIA, 2003)

Além das tentativas de incorporar os princípios de descentralização e de participação nos Planos Estaduais de Educação, elaborados nos diferentes governos no período de 1980 a 1991, tivemos a reafirmação da perspectiva democrática para a educação instituída pela Constituição Federal (1988) com a definição na Constituição Estadual de Pernambuco (1989) de que “A lei assegurará às escolas públicas, em todos os níveis, a gestão democrática, com a participação de docentes, pais, alunos, funcionários e representantes da comunidade.” (PERNAMBUCO, 1989, Art. 178, VII apud CORREIA, 2003, p. 61) e que “A gestão democrática do ensino público será consolidada através dos Conselhos Escolares.” (Ibidem, Art. 183, Parágrafo único apud Ibidem, p. 61)

Considerando que esse mote da política educacional não se limitou a esfera das instituições estaduais, mas ultrapassou aos espaços municipais, realizamos nosso trabalho de pesquisa no âmbito do Sistema Municipal de Ensino do Recife, por ser uma rede de ensino público que vem desde a década de 1980 discutindo sobre a democracia nos espaços escolares e que, nos últimos anos, especificamente a partir do governo do prefeito João Paulo (2001-2008), vem preocupando-se com a instituição da gestão democrática nas escolas públicas de forma mais concreta, haja vista as ações desenvolvidas para fortalecer e acompanhar as escolas nessa forma de organização, como é o caso da criação da Comissão de Gestão Democrática na Secretaria de Educação da cidade e as capacitações para os representantes de cada segmento do Conselho Escolar.

No entanto, é importante registrar que desde o inicio da década de 1990 essa rede de ensino já trabalhava na instauração de uma gestão democrática através da institucionalização e implementação dos conselhos escolares (MACIEL, 1995) e através de ações formativas acerca do projeto político pedagógico da escola com os dirigentes das unidades de ensino (BIZERRA e AGUIAR, 1999).

Segundo informações da Secretaria de Planejamento do Recife24, a cidade, capital do estado pernambucano, ocupa uma área de 219,493km² e limita-se ao norte com as cidades de Olinda e Paulista, ao sul com o município de Jaboatão dos

24 Informações disponíveis em: <http://www.recife.pe.gov.br/pr/secplanejamento/inforec/>. Acesso em:

Guararapes, a oeste com São Lourenço da Mata e Camaragibe, e a leste com o Oceano Atlântico. Segundo os dados do último Censo Demográfico (2000), a cidade contém uma população de 1.422.905 habitantes, correspondendo a 18% da população do Estado. Esse território está dividido em 06 Regiões Político-Administrativas (RPAs25) onde estão distribuídas cerca de 333 escolas que compõem o sistema de ensino da cidade oferecendo educação infantil no nível da pré-escola (denominados de Grupo IV e V), primeira etapa do ensino fundamental (que corresponde as turmas de 1º ao 5º ano, mas por serem organizados na proposta de ciclos são denominadas de 1º, 2º e 3º ano do 1º ciclo e 1º e 2º ano do 2º ciclo) e educação de jovens e adultos nos módulos I, II e III.

Considerando os interesses de nossa pesquisa, constituímos o campo empírico por duas escolas dessa rede municipal, escolhidas a partir de dois critérios: a) que estas atendessem o nível de ensino fundamental I e a modalidade de educação infantil; e b) que tivessem um histórico de forte atuação do conselho escolar.26 Tais critérios foram considerados porque partimos do pressuposto de que os estudantes do ensino fundamental I e da educação infantil têm seus pais/responsáveis mais presentes na escola por estarem mais preocupados com o que acontece nela, dado o grau de maturidade das crianças, e também porque as escolas com conselhos escolares atuantes poderiam ter uma cultura de participação mais intensa.

As duas escolas pesquisadas, além de atenderem aos critérios pré-definidos, tinham conotações semelhantes quanto à vivência democrática e, apesar de percebermos certas fragilidades nos mecanismos de gestão pertinentes a essa perspectiva, ambas apresentavam-se, de modo geral, como exemplos de que a construção de uma cultura escolar democrática é possível. As atividades desenvolvidas, os conflitos vivenciados,

25 Conforme informações da mesma secretaria, essas RPAs estão configuradas da seguinte maneira: RPA

1 – centro: 11 bairros, RPA 2 – norte: 18 bairros, RPA 3 - noroeste: 29 bairros, RPA 4 – oeste: 12 bairros, RPA 5 – sudoeste: 16 bairros e RPA 6 – sul: 8 bairros. Nesses 94 bairros, o município reconhece a existência de 66 comunidades consideradas como Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS, disseminadas pelo espaço urbano onde estão cerca de 490 favelas.

26 Em relação ao segundo critério, a escolha foi feita a partir de alguns nomes de escolas que

apresentavam esse perfil, de acordo com uma das assessoras do secretário de educação com quem conversamos no período anterior à coleta dos dados. Ela nos informou que a referência para citar aquelas escolas devia-se ao acompanhamento que a Comissão de Gestão Democrática realiza junto às escolas e, analisando três aspectos, julgavam que as mesmas possuíam uma gestão de caráter democrático. Os aspectos analisados eram: 1) o plano de gestão elaborado pelos candidatos a diretores na eleição para o cargo e que era enviado à comissão assim que fossem eleitos; 2) os relatórios de gestão que os diretores enviavam semestralmente durante o mandato; e, 3) as atas de implantação e renovação do conselho escolar. Além disso, a assessora ainda nos falou que outro aspecto está sendo incluindo nessa análise e que, inclusive, as instituições citadas já vivenciam, a saber: a articulação da escola com o orçamento participativo e outros movimentos da comunidade.

as interferências da comunidade escolar como um todo e, em especial, as intervenções das diretoras e vice-diretoras davam um tom vivo, ativo e até mesmo alegre a organização do espaço escolar, inclusive para as famílias dos estudantes que em algumas conversas demonstravam entusiasmo com os acontecimentos na escola. Assim, considerando tais aspectos e para guardar o devido sigilo quanto à identidade das instituições, denominamos uma de Escola Verão e a outra de Escola Primavera, pois vimos em suas ações “luz” e “possíveis frutos” para o alcance de uma sociedade mais justa e solidária.

Os sujeitos investigados foram prioritariamente os pais/responsáveis dos estudantes considerando tanto os que tivemos a oportunidade de conversar, como aqueles que apenas observamos. Entretanto, também consideramos os profissionais da escola (dirigentes, professores, funcionários administrativos e de serviços gerais), tendo em vista que atentamos para as posturas que eles tinham quanto à participação da família na organização escolar. Assim, para resguardar as identidades de todos e, ao mesmo tempo, apresentar os dados de forma clara, utilizaremos algumas siglas referentes às funções de cada um no sistema, a instituição que faz parte, e numeração identificatória, quando necessário, ficando discriminado da seguinte maneira:

Escola Verão Escola Primavera

Sujeito Sigla Sujeito Sigla

Mãe de estudante MV Mãe de estudante MP

Pai de estudante PV Pai de estudante PP

Responsável de estudante RV Responsável de estudante RP Representante dos pais/responsáveis no conselho escolar RPV Representante dos pais/responsáveis no conselho escolar RPP

Docente DoV Docente DoP

Vice-diretora VDiV Vice-diretora VDiP