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Na segunda metade do século XIX, o crescimento demográfico e a aglomeração urbana foram as primeiras causas de problemas sanitários do país, que viria a reconhecer a relação entre as doenças infeciosas, alta taxa de mortalidade, nomeadamente infantil, e a falta de higiene citadina. Assim, perante tal cenário e observando os resultados significativos que as intervenções sanitárias tinham vindo a alcançar nos Estados Unidos da América, surge, no final do século, em Portugal, a necessidade de se reforçar o abastecimento de água potável em fontanários e os primeiros esforços no sentido de se proceder a uma distribuição domiciliária de água (Pato, 2011).

A “Companhia de Águas de Lisboa” foi concessionada em 1868 e em 1880 foram construídas obras de reforço do abastecimento de água, que teve, desde logo, impacte significativo na redução da mortalidade relacionada com a febre Tifoide e Cólera (Geada, 2013).

Em 1855 aparecem diversas companhias candidatas ao projeto de execução de obras de captação, elevação, transporte e distribuição ao domicílio. No entanto, apenas, em 1882 foi assinado o contrato com a “Compagnie Général des Eaux pour l’Étranger”, tendo o abastecimento ficado regularizado a partir de 1887. Ainda, em 1882 é celebrado o contrato de concessão para a construção e exploração do sistema de abastecimento de água da cidade de Coimbra (Geada, 2013). Após esta concessão seguem-se várias outras nos principais centros urbanos do país: Figueira de Foz e Viseu em 1887, Setúbal em 1889, Faro em 1899, Matosinhos em 1901, Santarém e Chaves em 1903, Abrantes em 1907 e Cascais em 1908 (Pato, 2011).

Em 1901 é publicado o regulamento geral dos serviços de saúde e beneficência público, seguido pela publicação do regulamento para a fiscalização das águas potáveis destinadas ao consumo público, em 1904. Estes documentos marcaram o início de um processo de regulação das condições sanitárias do país, levado a cabo pelo Governo, que tinha por objetivo orientar a atividade autárquica, no que concerne aos serviços de abastecimento público de água e de saneamento de águas residuais (ERSAR, 2011).

Mais tarde, no ano de 1932, o Estado consente a contratação de técnicos projetistas externos à Administração Geral dos Serviços Hidráulicos e Elétricos, comparticipando as obras até 50%,

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desde que previamente autorizadas. Entre esse mesmo ano e o seguinte procedeu-se à criação da Secção de Melhoramento de Águas e Saneamento e da Junta Sanitária de Água sob tutela do Ministério das Obras Públicas e do Ministério do Interior, respetivamente. Contudo, apesar de todas as ações levadas a cabo pelo Estado desde 1932, constatou-se, em 1941, que, somente, 26% da população nacional tinha acesso a sistemas de distribuição domiciliária de água (Poças- Martins, 2012).

No ano de 1944 procedeu-se à apresentação do “Plano de Abastecimento de Água às Sedes dos Concelhos” que tinha por intuito, em dez anos, munir todas as sedes de concelho com abastecimento de água, plano que vigorou até 1960.

Em 1960 realizou-se a apresentação do “Plano de Abastecimento de Água às Populações Rurais”. Esta medida assegurou o primeiro abastecimento público de água a várias aldeias do país. Já em 1970 observou-se a exploração dos sistemas pelos municípios de forma industrial, o que contribuiu para o aparecimento de serviços municipalizados e de federações de municípios.

Por fim, em 1972 dá-se o lançamento de estudos de âmbito nacional com vista a uma política integrada de saneamento básico e perspetivação das Regiões de Saneamento Básico (Poças- Martins, 2012).

Os dados referentes ao abastecimento e saneamento básico em Portugal, para esse ano, eram os abaixo discriminados (Tabela 2.1):

Tabela 2.1 - Dados da população servida com sistema de abastecimento de água em 1972 (Poças- Martins, 2012)

População servida (%)

Distribuição domiciliária de água 40

Distribuição por fontanários 26

Sem acesso a sistemas de distribuição de água 34

No ano de 1977 é concedida aos municípios a responsabilidade de gestão dos sistemas de saneamento básico, sendo que no ano seguinte assistimos ao abandono do modelo das Regiões de Saneamento Básico até aí adotado para se apostar na municipalização.

Na Argentina, em 1977, realizou-se a primeira conferência mundial, com intuito de promover a sensibilização das populações para os problemas com a água (OCDE, 2009).

Entre 1989 e 1991 procedeu-se ao aproveitamento de parte do montante de fundos estruturais destinados a Portugal através do QCA I, para investir no abastecimento de água e saneamento (Poças-Martins, 2014).

No ano seguinte, no Rio de Janeiro decorre a UN Conference on Water and Environment, em que um dos objetivos foi discutir o sistema de abastecimento de água e saneamento (OCDE, 2009).

Pelo Decreto-Lei nº 372/93, de 29 de outubro procedeu-se à alteração da Lei da Delimitação dos Setores, com a sua abertura à iniciativa privada, reunindo-se, assim, as condições para se consagrar o regime legal da gestão e exploração de sistemas de abastecimento de água e saneamento. Nesse mesmo ano, o Decreto-Lei 379/93, de 5 de novembro permitiu a criação dos

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primeiros sistemas multimunicipais de captação, tratamento e distribuição de água, e delineou as condições do regime de exploração e gestão das concessões, sendo que, no caso dos sistemas multimunicipais, o concedente é o Estado, e nos demais é a administração local.

Ainda, em 1993, é constituída a Águas de Portugal, incorporada no IPE – Investimentos e Participações do Estado, que se comprometia a assegurar o desenvolvimento dos sistemas multimunicipais de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais (AdP, 2016).

Já em 1995 foi decretado o regime jurídico da concessão dos sistemas municipais, pelo Decreto-Lei nº147/95, de 21 de junho. Foi, ainda, fundado o Observatório Nacional dos Sistemas Municipais e Multimunicipais de Captação, Tratamento e Distribuição de Água para Consumo Público, de Recolha, Tratamento e Rejeição de Efluentes e de Recolha e Tratamento de Resíduos Sólidos, o qual foi, em 1997, substituído pelo Instituto Regulador de Águas e Resíduos, IRAR, atualmente, designada de ERSAR (Martins, 2007).

Entre 2000 e 2003 a entidade reguladora nacional do setor de água e resíduos executou funções para um número crescente de entidades concessionárias. Nos cinco anos seguintes (entre 2004 e 2009) para além dos encargos já assumidos, esta entidade passou a ser a autoridade competente responsável pela qualidade da água para consumo humano de mais de quatrocentas entidades gestoras. A partir de 2009 a ERSAR continuou a exercer as funções de autoridade competente pela qualidade da água, mas, também reforçou os seus poderes e expandiu as atribuições de regulação dos serviços de água e resíduos a um conjunto de cerca de quinhentas entidades gestoras. Ainda, em 2009 tendo por base a recomendação tarifária IRAR/ERSAR nº 1/2009 realizou-se a aprovação de legislação sobre os tarifários. No ano seguinte devido à recomendação ERSAR nº 2/2010 efetuou-se um alargamento a todas as entidades gestoras municipais. Em 2014 a ERSAR é reconhecida como uma entidade de administração independente aumentando, deste modo, a sua autonomia e os poderes de autoridade, regulamentares e sancionatórios (ERSAR, 2015a).

Importa ainda referir que em abril de 2000 foi aprovado o Plano Estratégico de Abastecimento de Água e de Saneamento de Águas Residuais (PEAASAR). Este teve a duração de seis anos e executou um papel essencial, uma vez que definiu as linhas de orientação estratégica, os pressupostos de base, os objetivos e as prioridades operacionais, de forma a garantir a apropriada utilização dos fundos comunitários disponíveis no QCA III (Ministério do Ambiente, 2007).

Ainda em 2000 foi desenvolvido o Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água (PNUEA), cujo principal objetivo consistia em avaliar a eficiência da utilização da água em Portugal nos sectores agrícolas, industriais e urbanos. Para tal apresenta um conjunto de medidas que conduzissem a uma melhor utilização da água. Em 2012 foram criados novos objetivos ao PNUEA para serem cumpridos até 2020:

 Melhorar as condições ambientais nos meios hídricos, sem colocar em risco as necessidades básicas e a qualidade de vida das populações, assim como, o desenvolvimento socioeconómico do país;

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 Reduzir os volumes de águas residuais depostos nos meios hídricos e reduzir os consumos de energia;

 Reduzir as perdas de água nos sistemas para níveis aceitáveis;

 Consolidar uma nova cultura da água em Portugal, que valorize de modo crescente este recurso;

 Promover iniciativas assentes em parcerias entre entidades públicas e/ou privadas. É de salientar que, existem ainda outros objetivos estratégicos e objetivos específicos estabelecidos para cada setor.

As estimativas para 2000 relativamente ao desperdício na utilização da água em cada um dos setores abrangidos pelo PNUEA era de: 40% no setor agrícola, 30% no industrial e 40% no urbano. Com base nesses dados, a Resolução do Conselho de Ministros nº 113/2005 de 30 de junho, estabeleceu metas a serem atingidas pelo PNUEA até 2020 (Figura 2.1) (APA, 2012).

Figura 2.1 - Metas PNUEA para 2020 (APA, 2012)

Em 2005 é transposta para direito interno a DQA através da Lei da Água (Lei nº 58/2005, de 29 de dezembro), definindo as bases e o quadro institucional para a gestão sustentável das águas. (Ministério do Ambiente, 2005)

O PEAASAR II é publicado em 2007 e define objetivos a serem cumpridos até 2013. Este Plano é visto como uma “estratégia social, sustentável e segura”, uma vez que tem por intuito apostar na universalidade, continuidade e qualidade dos SAASAR, garantir a sustentabilidade do setor, assim como a proteção dos valores da saúde pública e ambientais (Ministério do Ambiente, 2007).

Em 2010 as Nações Unidas qualificam o acesso aos serviços de abastecimento de água como um direito humano e, portanto, os países pertencentes a este organismo detêm o dever de promover todas as medidas que assegurem esse direito.

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No despacho 4385/2015, de 30 de Abril emitido pelo Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia - Gabinete do Secretário de Estado do Ambiente, foi definida uma nova estratégia para o setor de abastecimento de água e saneamento, PENSAAR 2020, que tem por base os seguintes pressupostos (APA, 2014):

 Apoiar a nova estratégia para o setor nas bases em que estabeleceram os anteriores planos estratégicos, nomeadamente o PEAASAR I e o PEAASAR II;

 Identificar e elucidar de forma consciente e com dados consistentes as origens dos problemas que afetam o setor;

 Definir a estratégia com base em objetivos de sustentabilidade da vertente técnica, ambiental, económica, financeira e social, de forma a gerar um contexto de aceitação global a médio (2014 a 2020) e a longo prazo (após 2020);

 Criar uma estratégia dinâmica, em que a sua implementação possa ser garantida por um Grupo de Apoio à Gestão (GAG), que assegure o apoio à boa governança do setor de uma forma contínua, através de uma plataforma nacional de informação setorial;

 Contribuir para um setor com um desempenho elevado num contexto que exige também solidariedade e equidade, permitindo conciliar forças potencialmente desviantes internas ao setor.

Como é evidente um longo percurso ainda tem de ser percorrido, no que diz respeito, à reforma do setor de água. Assim a ERSAR recomenda um conjunto de medidas para este setor, entre as quais (ERSAR, 2012):

 A conclusão da racionalização dos serviços de titularidade estatal, isto é, que ocorra uma integração espacial das entidades gestoras por área espacial e que estas procedam a uma gestão conjunta do abastecimento de água e de saneamento;

 A revisão dos atuais contratos dos sistemas multimunicipais, bem como, dos modelos de gestão das entidades gestoras;

 A racionalização dos serviços de titularidade municipal, que passa por promover a verticalização dos sistemas em baixa com os sistemas em alta ou, em alternativa, a agregação das entidades gestoras em baixa. Estas, também, devem proceder a uma gestão conjunta do abastecimento e do saneamento e adotar modelos de gestão mais adequados;

 A introdução de mecanismos que assegurem a acessibilidade económica dos consumidores;

 O aumento da eficiência e da eficácia no setor de abastecimento de água, promovendo a concorrência pelo mercado e incentivando à inovação e progresso tecnológico.

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