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CONTRIBUIÇÕES DO ESTUDO PARA A PRÁTICA MULTIDISCIPLINAR,

A experiência vivenciada pelas pessoas com obesidade na busca pela Cirurgia Bariátrica deve ser levada em consideração por gestores da saúde, pois fornece informações claras que ajudarão a estabelecer metas passíveis de serem alcançadas. Compreender o fenômeno “itinerário terapêutico vivido pela pessoa com obesidade na busca pela Cirurgia Bariátrica no Serviço Público de Saúde” sinaliza para a necessidade de reorganização da assistência voltada para tal clientela.

Para minimizar as fragilidades encontradas no itinerário terapêutico em busca da cirurgia para redução de peso é essencial que haja interlocução entre os diversos saberes sobre o tema, com propostas de intervenções que integrem a interdisciplinaridade e promovam alternativas de tratamento que enfoquem a pessoa de modo completo, singular e coletivo. A terapêutica recomendada deve ser capaz de vencer os obstáculos e fortalecer as potencialidades existentes no Sistema de Saúde, com o propósito de construir e solidificar a comunicação intersetorial e interdisciplinar com planos de cuidado centrados na pessoa com obesidade.

A dificuldade do Serviço Público de Saúde em proporcionar resolutividade às questões que envolvem o itinerário de quem vivencia a obesidade e busca pela Cirurgia Bariátrica, demonstra que é necessário repensar um novo modo de cuidar. Não basta a conscientização de que a obesidade é um problema mundial e de difícil controle, faz-se necessário mais do que discussões teóricas. É preciso mudar a realidade com olhar direcionado para as ocorrências que fazem parte do cotidiano de quem procura pelo tratamento cirúrgico e esforço conjunto (gestores e profissionais de saúde, indivíduo e sociedade) para minimizar as barreiras enfrentadas pelas pessoas com obesidade nesta procura.

Ficou evidente neste estudo que a obesidade é uma doença crônica não transmissível que exige um cuidado complexo e acompanhamento longitudinal. Ryan e Kahan (2018) salientam que para ser assegurado a continuidade e o seguimento do tratamento proposto é imprescindível que o planejamento das ações seja realizado de modo singular e mais eficaz possível. Glasgow e Estabrooks (2018) complementam que as decisões políticas e os programas públicos de saúde somente alcançarão o resultado esperado com a máxima eficiência e efetividade se forem identificadas as carências da população e, a partir delas, estabelecer os

serviços a serem prestados. Dessa forma, o distanciamento entre o atendimento disponibilizado e o esperado será minimizado.

Há descrito nas linhas de cuidado às pessoas com obesidade diretrizes relacionadas à alimentação saudável e ao fluxo de atendimento a ser seguido no Serviço Público de Saúde (Brasil, 2014b). Entretanto, a análise do itinerário terapêutico da pessoa com obesidade na busca pela cirurgia para redução de peso evidencia para a necessidade de formulação de um guia prático a ser seguido pela equipe multidisciplinar de saúde. Esse guia pode conter o fluxograma de avaliação, direcionamento e encaminhamento, bem como orientações aos profissionais quanto à abordagem ao usuário com excesso de peso, triagem adequada, identificação do grau de obesidade e comorbidades associadas, planos de ação de acordo com as necessidades da pessoa enquanto aguardam o agendamento do procedimento. Essas orientações podem contribuir não apenas para a redução do tempo de espera, mas também para que estejam aptos a operar, com o menor risco possível, quando for marcado o procedimento.

O itinerário percorrido pelos participantes mostrou não existir fortalecimento das ações da Atenção Básica no acompanhamento das pessoas com excesso de peso. Fato que sinaliza para proposta de criação de um Núcleo de Apoio à Pessoa com Obesidade, com acesso a um sistema eletrônico que permita identificar os locais de atendimento especializado para encaminhar os pacientes quando necessário.

Os participantes enfatizaram a importância do Grupo de Apoio ser composto por equipe muldisciplinar com especialidade na temática. Para que essas ações sejam eficazes, é preciso melhorar o investimento em todos os níveis de atendimento, adequar as estruturas físicas das UBS para receber essas pessoas e tornar possível o encaminhamento para a cirurgia de redução de peso, quando a solução para o problema for esta indicação.

O reconhecimento das demandas traduzidas pela trajetória de quem vivencia a busca pela Cirurgia Bariátrica no Serviço Público de Saúde auxiliará na compreensão dos diversos caminhos utilizados. Tal reconhecimento permitirá aos profissionais atuarem tanto nos aspectos prescritos nos fluxos das redes de atenção à saúde, quanto nos aspectos que ultrapassam esta estrutura, mas que também se configuram como itinerários terapêuticos.

Equipes multidisciplinares que tratam de pessoas que se submetem à cirurgia para redução de peso devem estar conscientes da interrelação entre os fatores fisiopatológicos, psicossociais e de suporte que podem afetar tanto negativa quanto positivamente o tempo de

espera do procedimento cirúrgico, assim como o pós-operatório imediato e tardio (Spittal, Frühbeck, 2018).

O desenvolvimento de ações com a finalidade de integrar e empoderar os envolvidos no itinerário terapêutico (usuários e equipe multidisciplinar) deve propiciar a reflexão sobre a melhor forma de cuidar, de modo a desenvolver competências, habilidades e capacitações individuais e coletivas relevantes e partilhadas entre os diversos setores.

A fim de promover uma assistência qualificada às pessoas com obesidade em busca da Cirurgia Bariátrica, o que se propõe é a implementação de programas de educação continuada e permanente em todos os níveis de atenção à saúde, de modo a rever sistematicamente a assistência prestada, o fluxo prescrito nas linhas de cuidado e contrastar com o fluxo realizado na realidade, e a partir de então descrever e preconizar, nos Manuais de Atenção à Saúde, caminhos passíveis de serem seguidos tanto pelos profissionais, quanto pelos usuários e que estejam em consonância com as necessidades dessas pessoas.

A viabilização dessas mudanças somente será possível se houver capacitação dos profissionais que cuidam das pessoas com obesidade em todo o processo de busca pela cirurgia para redução de peso. A equipe multidisciplinar necessita ter conhecimento abrangente sobre o ser humano, as diversas vertentes da obesidade, o Serviço Público de Saúde e a articulação do sistema como um todo, para então atuar com competência teórica, técnica e livre de preconceito, ajudando-as em todas as fases, enquanto aguardam pelo agendamento da cirurgia.

Os participantes mencionaram a relevância do acompanhamento e orientações por parte da equipe multidisciplinar com vistas ao monitoramento do peso, evitando, em alguns casos, a necessidade da cirurgia para a redução de peso. Tendo em vista os depoimentos, recomenda-se a escuta terapêutica qualificada, a implementação de grupos de apoio constituídos por pessoas candidatas à Cirurgia Bariátrica e por aquelas que já foram submetidas ao procedimento cirúrgico. O grupo poderá propiciar a troca de experiência entre os participantes, e impactar significativamente o modo como experienciam o caminho percorrido.

Os profissionais de saúde, líderes desses grupos, poderão intervir de forma simples, por meio de caminhada orientada, gincanas e oficinas de preparo e consumo de alimentos saudáveis, sem maior custo. Tais atitudes possibilitarão o oferecimento de suporte, tanto para a pessoa com obesidade que está aguardando pelo procedimento, quanto para a sua família.

Para o alcance dos objetivos traçados, é necessário atuação conjunta com atitudes que motivem os participantes dos programas de gerenciamento do peso. São fatores motivadores o ambiente estruturado, a adequação da logística dos serviços de obesidade, o compartilhamento de histórias de sucesso entre as pessoas em acampamentos de verão, o envolvimento entre os profissionais nos diversos níveis de atendimento com consultas presenciais e palestras por videoconferência, diminuição no tempo de espera entre a inscrição e o início do tratamento, orientação para a autogestão da saúde nas visitas domiciliares e maior ênfase no estilo de vida saudável e não na obesidade em si (Perez et al., 2018).

O gerenciamento do peso é uma dificuldade para a pessoa com obesidade em busca da Cirurgia Bariátrica, porque, nesse tempo de espera pelo procedimento cirúrgico, ela vivencia situações conflituosas que causam ansiedade, e, consequentemente a impulsiona comer e engordar. Esse fato requer ajuda da equipe multidisciplinar durante o itinerário terapêutico, para que possa se tornar protagonista do próprio cuidado.

A disponibilização de material didático explicativo sobre obesidade, Cirurgia Bariátrica e orientações gerais para o procedimento cirúrgico e controle do peso poderá ajudar a enfrentar as dificuldades imbricadas na espera, especialmente diminuindo a angústia e ansiedade.

A gestão da obesidade que envolve o processo de ganho de peso e as intercorrências enfrentadas na busca pelo emagrecimento, estão frequentemente ausentes na formação de profissionais da saúde. Esse fato limita o conhecimento e a capacitação para intervir quando estes profissionais se deparam com a questão no Serviço de Saúde, independentemente do momento em que as pessoas estão em busca da redução do peso (Kaplan et al., 2018).

Este estudo desperta para a necessidade de investimento na formação dos profissionais de saúde, desde os cursos de graduação, com enfoque no contexto e complexidade do cuidar da pessoa com obesidade que busca pela cirurgia para redução de peso no Serviço Público de Saúde. Isto porque, o modelo biomédico, centrado apenas na obesidade e na Cirurgia Bariátrica, não contempla a subjetividade inscrita no processo dessa doença crônica, nem nos determinantes sociais nela inscritos.

Também não há cursos de pós-graduação lato sensu com enfoque direcionado para essa temática, o que leva ao despreparo dos profissionais para atuarem na área. Sugere-se a implementação de cursos de atualização e especialização com inserção de conteúdos que abordem questões que possibilitem identificar as potencialidades e fragilidades existentes no

Serviço Público de Saúde, no que concerne ao cuidado oferecido às pessoas com obesidade e alternativas de tratamento. Esses cursos devem abordar conteúdos relacionados às ações preventivas e curativas, motivando os profissionais da área de saúde a serem agentes de mudança, com capacidade de proporcionar atendimento integral e singular à pessoa com excesso de peso (Hivert et al., 2017).

Os resultados do presente estudo trazem como contribuição para o conhecimento na área da saúde a abordagem subjetiva/intersubjetiva inscrita no itinerário terapêutico das pessoas com obesidade em busca da Cirurgia Bariátrica. Nesse sentido, este itinerário é destacado, considerando a obesidade não só como uma doença crônica não transmissível, complexa e multifatorial, mas também como uma condição experienciada por pessoas que têm o aumento excessivo de peso por diversos motivos e necessita da cirurgia para redução de peso como alternativa imprescindível para recuperar a saúde e o bem-estar.