• Nenhum resultado encontrado

A pesquisa qualitativa é ideal para descrever fenômenos complexos do mundo real, não desvelados pelos dados quantitativos; busca a compreensão do significado dado pelo indivíduo às suas ações na prática cotidiana. O que se quer apreender é a experiência, a vivência, o senso comum e a ação que, ao se interligarem, completam-se, e esta completude leva ao movimento da compreensão, interpretação (Martínez-Salgado, 2012; Minayo, 2017;).

Essa abordagem metodológica permite o aprofundamento e a compreensão necessária para a descrição detalhada dos fenômenos estudados, pois, com base na desconstrução e reconstrução dos dados obtidos, torna-se possível a mobilização e a transferibilidade do conhecimento, permitindo assim a generalização analítica. Trata-se de rever a particularização contextualizada que permite almejar maiores níveis de compreensão dos significados, à medida que os fenômenos, as manifestações, as ocorrências, os fatos, os eventos, as ideias, os sentimentos e os assuntos moldam as vivências humanas (Ribeiro, Souza, Costa, 2016).

Os significados que sobrevêm da pesquisa qualitativa passam a ser partilhados culturalmente e assumem-se como estruturadores de um determinado grupo social. Esse método abrange as vivências das pessoas no processo saúde-doença, foca nas vivências pessoais e naquilo que as faz recorrer aos cuidados profissionais (Contreras-de-la-Fuente, Castillo-Arcos, 2016; Ribeiro, Souza, Costa, 2016).

Entre as várias vertentes da pesquisa qualitativa, neste estudo, optou-se pela fenomenologia, pois esta abordagem trata da essência humana, que dá sentido à intencionalidade da ação à qual atribui significado comum em uma dada experiência (Cairns, 2015).

Edmund Husserl, matemático e filósofo alemão, em 1880, rompeu com a orientação positivista da ciência e da filosofia da época e estabeleceu a escola da fenomenologia, com ensinamentos que não se limitavam ao empirismo. Estes se baseavam na crença de que a experiência é a fonte de todo o conhecimento pelo qual um fenômeno pode vir a ser conhecido na sua essência, quando se busca conhecer a existência do “ser” na sua realidade (Lobo, Bastos, Vargas, 2015).

Husserl, ao descrever a fenomenologia, pretende voltar “às coisas mesmas” que têm como finalidade buscar a essência das coisas. Para esse filósofo, o método fenomenológico permite interrogar determinada coisa no sentido de realizar a crítica do ato de conhecer. As pressuposições da investigação fenomenológica não são conceitos presumíveis, arbitrários ou plausíveis, mas sim dados teóricos e atos espontâneos que o pesquisador observa e somente aceita quando os vivencia da maneira como são ofertados e podem ser direcionados para o objeto estudado (Rodrigues, 2014; Cairns, 2015).

A fenomenologia restabelece a ideia de humanidade, ou melhor, restaura as certezas e as verdades que a compreensão humana não conseguira elaborar, por meio do positivismo, pois procura na experiência humana e na reflexão filosófica e científica a compreensão do fenômeno vivido. Assim sendo, a experiência fenomenológica é, precisamente, o que o indivíduo vivencia no mundo compartilhado, na qual o fenômeno aparece como uma estrutura, isto é, como uma multiplicidade significativamente percebida por meio das relações estabelecidas uns com os outros (Universidade Federal de Goiás - NEPEFE, 2016).

Gil e Yamauchi (2012) acrescentaram que a fenomenologia trata de uma abordagem reflexiva do mundo vivido, da influência do mundo social na existência e da realidade do indivíduo. Os temas são estudados a partir da vivência no contexto em que está inserido, seja no social, no psicológico ou no antropológico.

O ser humano fundamenta sua vivência e seu conhecimento quando reflete sobre suas experiências pessoais, compreende-as e por elas é compreendido no mundo social, experiências estas que são únicas e dependentes da sua personalidade, do contexto e da sua atuação social na sua história. Desse modo, os conhecimentos adquiridos são denominados de senso comum e irão orientar o ser humano nas ações e situações de sua vida, e a ação humana é a prática das escolhas feitas para construir suas próprias vidas, valores, crenças e cultura, a partir do meio social e das condições que lhe são dadas (Minayo, 2012).

O indivíduo tem a capacidade de pensar e se organizar diante das várias informações que recebe ao longo de sua vida e com estes saberes constrói uma nova estrutura de ser em outros níveis de conhecimento e, dessa forma, vai se firmando na sociedade. Sendo assim, a reflexão crítica dos pressupostos vivenciados no cotidiano conduz a uma redefinição objetiva e subjetiva para solução dos problemas e transformações mais significativas no que diz respeito a si próprio e às suas crenças e valores (Loureiro, Miranda, 2010).

Por conseguinte, para subsidiar este estudo, dentre os referenciais da fenomenologia, optou-se pelo referencial da fenomenologia social. Tal escolha se deu por aceitar que o caminho percorrido pela pessoa, com obesidade em busca da cirurgia, não se limita a intencionalidade e a motivação individual, foi construído intersubjetivamente e orientado por um acervo de experiências culturalmente produzido por um grupo social, no mundo vida no qual está inserido.

A Fenomenologia Social tem Alfred Schütz como seu representante mais significativo; sociólogo, criador da teoria da ação social e do método para a abordagem da realidade social sob a perspectiva da sociologia fenomenológica.

A fenomenologia sociológica não visa estudar o comportamento individual, mas sim apreender os pontos comuns desse comportamento, ou seja, aquilo que se constitui como uma característica típica de um grupo que vivencia determinada situação. Os pressupostos da fenomenologia social: mundo social, bagagem de conhecimentos, situação biográfica, intersubjetividade, intencionalidade recíproca, atitude natural, motivação humana para a ação (motivos para e motivos porque) e tipificação subsidiaram os resultados e discussão deste estudo (Schütz, 2012a, 2015).

Compreender a complexidade que envolve todo o sistema de atendimento da pessoa com obesidade, especialmente a partir da percepção de quem a vivencia, contribuirá para que as estratégias, os programas, os planos de cuidado, as intervenções, o preparo e a integração da equipe multidisciplinar sejam voltados para as necessidades e expectativas dessas pessoas. As ações devem ser pautadas no cenário em que as pessoas estão inseridas, na bagagem de experiências que trazem ao longo da vida, na intenção que têm de mudar a realidade e na expectativa de construir e consolidar a busca pela cirurgia.

Será apresentado a seguir de forma esquematizada o Referencial Teórico de Alfred Schütz.

Figura 2 - Referencial Teórico de Alfred Schütz

Objeto do Estudo

“Itinerário terapêutico vivido por pessoas com obesidade na busca pela Cirurgia Bariátrica no Serviço Público de Saúde”

DEPOIMENTOS DOS PARTICIPANTES

MOTIVOS PARA Projetos que se pretende realizar MOTIVOS PORQUE

Realidade vivenciada (passado e presente) no contexto motivacional

TIPO VIVIDO DO GRUPO SOCIAL

CATEGORIAS MOTIVACIONAIS DO VIVIDO

3.2 REFERENCIAL TEÓRICO E A INTERFACE COM A TEMÁTICA DO