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4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1. O verbo em português brasileiro

4.2.3. Contribuições do grupo verbal na construção da oração

Após apresentar uma descrição em nível menos delicado dos sistemas que organizam a estrutura do grupo verbal, é possível examinar como essa estrutura contribui na construção da oração em português brasileiro. Esta última seção dos resultados aborda o grupo verbal “de cima”, observando, a partir da oração, como ele contribui na realização da negociação e da experiência. Por último, são tratados os casos de oração sem grupo verbal.

Como explicado anteriormente, a função de Núcleo carrega a relação primária entre o tempo e a transitoriedade da experiência no grupo verbal, sendo responsável por colocar o Evento no tempo e na modalidade. O Núcleo, portanto, insere o Evento na interação, conferindo a ele sua finitude.

Cabe lembrar que, para um verbo conferir um caráter de temporal à experiência, ele deve ser constituído de um MI finito. Assim, a Verbalidade é a função capaz de estabelecer uma relação entre o tempo e a experiência do verbo.

Já o Finito é a função na ordem da oração realizada pelo grupo verbal que determina o modo desta (FIGUEREDO, 2011). Além disso, é a presença de um elemento que realize a função de Finito na oração que permite que seja negociada.

Observa-se, assim, uma relação direta entre a Verbalidade, o Núcleo e o Finito, na qual essas três funções ancoram a experiência na interação. Essa relação pode ser ilustrada pela Figura 15.

Figura 15 - Relação entre Verbalidade, Núcleo e Finito

Halliday e Matthiessen (2014) definem o Finito como a função que torna a proposição finita, isto é, negociável. Nesse sentido, o Finito estabelece um ponto de referência no “aqui-e- agora” da negociação, criando uma relação entre a proposição e o seu contexto (HALLIDAY; MATTHIESSEN, 2014).

Dessa forma, o que se pode apreender da relação entre Verbalidade, Núcleo e Finito é que a finitude do verbo opera no grupo verbal, possibilitando que este seja finito, e a finitude do grupo verbal opera na oração, possibilitando que esta seja finita. Em uma perspectiva inversa, a finitude da oração é realizada por um grupo verbal finito, que é composto por um verbo finito.

Portanto, há uma relação intrínseca entre essas funções, de modo que a finitude da proposição é definida em toda a escala de ordens do português brasileiro: desde o morfema até a oração.

Uma relação semelhante pode ser observada na realização do quantum de mudança. Na ordem da palavra, a função que realiza o conteúdo da mudança é a Experiência, no grupo verbal, o Evento, e na oração, o Processo.

Assim, o conteúdo da mudança do verbo opera no grupo verbal, e a mudança do grupo verbal opera na oração, tornando possível a representação transitória do mundo. Em uma perspectiva inversa, a transitoriedade da oração é realizada por um grupo verbal, que é composto por um verbo.

Novamente, há uma relação intrínseca entre essas funções, de forma que o quantum de mudança é definido em toda a escala de ordens do português brasileiro. Essa relação é ilustrada pela Figura 16.

Figura 16 - Relação entre Experiência, Evento e Processo

Diante dessas relações intrínsecas na realização do quantum de mudança e da sua negociação nas diferentes ordens da escala, é possível examinar as orações plenas37 em

português brasileiro que não apresentam um grupo verbal em sua estrutura.

37 Minha tradução do termo “major clause” (cf. MATTHIESSEN; TERUYA; LAM, 2010, p. 134).

A discussão começa a partir do exemplo (53), que foi retirado de um texto do Calibra que consiste em uma série de perguntas e respostas a respeito de uma empresa com o objetivo de recomendar seus serviços aos usuários de um site. O exemplo (53) se trata da primeira pergunta do texto.

(53) Qual a experiência do escritório com Obras Públicas?

Observa-se no exemplo (53) que não existe um grupo verbal na oração. Uma vez que é o grupo verbal que realiza a função de Processo na oração, seria possível argumentar que esta oração não apresenta um Processo.

Da mesma forma, o grupo verbal é o responsável por ancorar a proposição na negociação, tornando-a negociável. Porém, como não há um grupo verbal, também seria possível argumentar que a oração do exemplo (53) não é negociável, isto é, não-finita.

No entanto, ainda que não haja um grupo verbal realizando o Processo e o Finito, isto é, o quantum de mudança e a finitude, a proposição apresentada em (53) é respondida, como é possível observar no segmento do texto reproduzido a seguir.

(54) 1. Qual a experiência do escritório com Obras Públicas?

Desde a sua fundação, a empresa tem como missão ser a solução em serviços e intermediação na área de arquitetura e urbanismo, atendendo as expectativas dos clientes, e objetivando ser útil a sociedade. Desta forma, desde o início temos como clientes principais o poder público em todas as suas esferas (municipal, estadual e federal) já tendo feito uma série de projetos de edificações públicas como mais de 30 projetos para órgãos públicos como unidades de ensino e saúde, cultura e projetos de urbanismo.

Diante disso, o que se pode observar é que a negociação foi de fato realizada, ainda que na ausência do grupo verbal. Isso permite concluir que determinadas orações prescindem do grupo verbal para a realização do quantum de mudança e da negociação. O caso ilustrado pelo exemplo (53) trata-se de uma não-realização do Processo.

A não-realização do Processo é um recurso do sistema linguístico do português brasileiro que depende dos seguintes fatores para ocorrer: (i) MODO interrogativo: elemental, (ii) Processo

relacional, (iii) tempo presente, (iv) desdobramento temporal atual.

Nesse ambiente, o Processo realiza a relação entre dois Participantes em um presente “genérico”, de modo que a mudança está difusa no tempo. Assim, o quantum de mudança que estabelece a relação entre os Participantes se destaca do tempo presente, se tornando quase uma permanência. Portanto, o Processo não precisa ser realizado pelo processo verbal, pois a relação entre os Participantes já é estabelecida estruturalmente.