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3.1 Controle judicial de constitucionalidade no modelo brasileiro

3.1.2 Sistemas de controle judicial de constitucionalidade

3.1.2.2 Controle concentrado

O controle concentrado de constitucionalidade foi positivado nas Constituições Austríacas de 1920 e de 1929, rendendo-se à doutrina de Hans Kelsen, precursor da teorização do controle judicial de constitucionalidade. O controle concentrado surgiu no Brasil por intermédio da Emenda Constitucional nº 16/65, que atribuiu ao STF, órgão de cúpula do Poder Judiciário e o guardião da Constituição Federal, a competência para processar e julgar originariamente as representações de inconstitucionalidade.

As ações diretas, no sistema concentrado, têm por mérito a introdução da questão da inconstitucionalidade das leis ou atos normativos federais e estaduais, ou seja, a questão constitucional passa a ser apreciada como objeto principal do processo. Diz-se concentrado porque a questão constitucional só pode ser decidida pela Corte ou Tribunal, como função constitucional autônoma. Assim como o controle difuso, o controle concentrado tem por finalidade a defesa da Constituição contra leis e atos normativos com ela incompatíveis.

Atualmente, existem as seguintes vias de controle concentrado de constitucionalidade no Brasil:

a) Ação direta de inconstitucionalidade genérica (art.102, I, a , CFB); b) Ação declaratória de constitucionalidade (art. 102, I, a, in fine, CFB); c) Ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, §2º, CFB); d) Ação direta de inconstitucionalidade interventiva (art. 36, III, CFB); e e) Arguição de descumprimento de preceito fundamental (art. 102, §1º,

CFB).

Neste tópico do estudo serão feitos comentários aos institutos da ação direta de inconstitucionalidade genérica (ADI) e ação declaratória de constitucionalidade (ADC), por serem considerados indispensáveis para o entendimento quanto à processualística da

ADPF, convergindo, no deslinde do trabalho, para o alcance de conclusões lógicas.

A Emenda Constitucional nº 16/65 introduziu a ADI na Constituição Federal de 1946 como forma de controle de constitucionalidade por via principal e concentrada, que tem por objetivo retirar do ordenamento jurídico a lei estadual ou federal incompatível com a Constituição Federal. Isso para que se obtenha a declaração de invalidade dessa lei, pois relações jurídicas legítimas não podem estar fundamentadas em normas inconstitucionais.

Desde a supramencionada emenda constitucional até a promulgação da Constituição Federal de 1988, a legitimidade para propor a ADI era privativa do Procurador-Geral da República. A Constituição Federal vigente ampliou o rol de legitimados ativos com o intuito de garantir ainda maior efetividade às normas constitucionais, cabendo a competência geral ou universal da ação ao Presidente da República, às Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, ao Procurador Geral da República, ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e ao partido político com representação no Congresso Nacional, pelas suas próprias atribuições. A legitimação específica ou especial se atribui ao Governador de Estado, à Mesa da Assembleia Legislativa, à confederação sindical e entidade de classe de âmbito nacional.

O STF tem a função de processar e julgar a ADI de lei ou ato normativo federal ou estadual. O exercício do direito de ação não está sujeito a nenhum prazo de natureza prescricional ou decadencial, pois os atos inconstitucionais não se convalidam com o calar dos anos. Tendo a ação por objeto o pronunciamento sobre a constitucionalidade de lei ou ato normativo, a decisão limitar-se-á a declarar a sua legitimidade constitucional ou a sua inconstitucionalidade, afirmando a existência ou não de vício desde o seu surgimento, quanto à formação ou ao conteúdo da lei ou ato normativo.

Os vícios de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo podem referir-se à inobservância das regras constitucionais concernentes ao processo legislativo ou ao seu conteúdo, por incompatibilidade material com o texto constitucional vigente. De qualquer forma, trata-se do exame da existência ou não de vício desde que ingressaram

no mundo jurídico, tendo a decisão natureza declaratória.

Uma vez declarada a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo, emergem os efeitos: ex tunc, pelo qual a decisão retroage para eivar de nulidade todos os atos constituídos sob a sua égide, que em razão disto perdem seus eventuais efeitos jurídicos;

erga omnes, cingindo-se ao dispositivo da decisão e alcançando todos indistintamente;

vinculante, abrangendo tanto o dispositivo como os motivos determinantes (ratio

decidendi) da decisão, de modo que, uma vez julgada procedente a ação, sua vinculação

será obrigatória em relação a todos os órgãos do Poder Executivo e do Judiciário, com exceção do STF que detém o poder de intérprete final da Constituição e, neste sentido, pode livremente alterar seu posicionamento em decisões posteriores.

A Emenda Constitucional nº 3/93, dando nova redação ao artigo 102, I, alínea ‘a’ da CFB, instituiu a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal atribuindo a competência originária para seu processamento ao STF. A ADC é uma modalidade de controle por via principal, concentrada e abstrata, cuja finalidade é o reconhecimento da compatibilidade de uma norma com a Constituição Federal, diante de decisões judiciais conflitantes e discussões doutrinárias em torno de sua constitucionalidade.

Seu objetivo é afastar a incerteza jurídica e evitar interpretações contraditórias, estabelecendo uma orientação uniforme quanto à validade ou invalidade constitucional da norma questionada. Caracteriza-se como processo objetivo por não possuir partes no sentido processual comum e por não ser decorrente de conflito de interesses. Em relação à legitimidade para a propositura dessa ação, a Constituição atribui, em seu art. 103,

caput, competência aos mesmos legitimados para a ADI.

Existem diferenças e semelhanças entre ADC e ADI. A principal diferença refere-se ao objeto, vez que na primeira o pedido é dirigido à declaração de constitucionalidade, enquanto na segunda o legitimado pede a declaração de inconstitucionalidade da norma. Por esse motivo, a decisão final pela constitucionalidade ou inconstitucionalidade, tem eficácia geral em ambas as ações. A improcedência da ADI decorre do reconhecimento da constitucionalidade da norma, o

que produz o mesmo efeito da procedência da ADC, ensejando o caráter ambivalente das duas ações.

Dentre os aspectos processuais da ADC, relevante dizer que o pedido deve ser feito com fins à declaração de constitucionalidade da norma questionada, diferentemente da ADI em que se pede a declaração de inconstitucionalidade da norma. Nos fundamentos jurídicos e na causa de pedir, o proponente da ação tem que demonstrar a existência de controvérsia relevante quanto à constitucionalidade da norma. Além disso, a decisão definitiva em sede de ADC tem natureza declaratória, eficácia erga omnes e efeito vinculante.

O efeito vinculante significa que todos os demais órgãos do Poder Judiciário e os órgãos do Poder Executivo estão compelidos à observância da decisão do STF. Em caso de inobservância da decisão, cabe reclamação diretamente à Suprema Corte, por afronta à autoridade de sua decisão, com fundamento no art. 102, I, alínea l, da CFB.

Em regra, a decisão tem eficácia ex tunc, porque se limita a afirmar a existência ou inexistência de vício de inconstitucionalidade desde que a norma foi editada, não atingindo as relações jurídicas consumadas no passado pela coisa julgada, pela prescrição ou pela decadência. Entrementes, em situações raras, pode-se conceder efeitos ex nunc ou pro futuro para atender ao princípio da segurança jurídica e excepcional interesse social, conforme permissivo legal do art. 27 da Lei nº 9.868/9950, dispositivo que tem aplicação também para a ADPF.

A ADC constitui instrumento de grande alcance e importância, especialmente para colocar fim a conflitos de entendimentos e interpretações sobre a mesma norma, além de evitar graves lesões à ordem jurídica constitucional e à tranquilidade geral.

50 Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.