• Nenhum resultado encontrado

5. REGULAÇÃO E AUTONOMIA NO CURRÍCULO

5.3 CONTROLE PEDAGÓGICO: O QUE, QUANDO E COMO

A estrutura do Currículo Mínimo e de sua Matriz de Referência é semelhante, razão pela qual foi possível agrupá-los em quadros32 para melhor observação e análise. A análise em conjunto dessas estruturas nos revela também como essas políticas podem diminuir o grau de autonomia de professores principalmente através de três estratégias de controle. A primeira é o controle do que vai ser ensinado. Como já apresentado anteriormente, enquanto os assuntos trabalhados nos currículos são organizados em “focos”, nas Matrizes de Referência eles são organizados em “domínios”, e enquanto em cada bimestre o currículo possui um foco diferente, a Matriz de Referência apresenta vários domínios com diversas habilidades que serão avaliadas em cada bimestre no teste do Saerjinho. Ou seja, enquanto um assunto é listado como integrador das competências do currículo, a matriz indica vários assuntos que podem ser avaliados no mesmo bimestre. Essa disposição semelhante nos faz suspeitar que o Currículo Mínimo e Matriz de Referência parecem estar organizados de uma forma em que não reste ao professor senão ensinar o conteúdo listado no currículo.

Juntos currículo e avaliação parecem tentar regular não apenas as habilidades que serão ensinadas, mas quando, em que período do ano o professor vai ensiná-las aos seus alunos. Controlando o conteúdo que será e ensinado e o momento do ano letivo em que o professor e o aluno serão avaliados, caso esteja “realmente” seguindo as orientações do currículo e preparando os seus alunos para as provas de avaliação externa, o professor perde seu espaço de planejamento, que fortalece o intuito dessas políticas da SEEDUC. Sendo assim, a Matriz de Referência da avaliação no contexto da rede estadual do Rio de Janeiro, parece funcionar não só como meio de verificação da aprendizagem das habilidades, mas ao detalhá-las, funciona como uma forma de complementação do currículo e uma “garantia” de que essas habilidades serão trabalhadas em sala de aula.

Além disso, a forma como essas habilidades estão estruturadas na Matriz de Referência parece indicar também o como os professores devem ensiná-las durante o ano letivo. Por exemplo, no 9º ano do Ensino Fundamental (Quadro 5) o foco do 1º bimestre é

32

“Energia do dia-a-dia: Análises, predições, construções de modelos e explicações”. Ao mesmo tempo, ao longo de todo o ano, os mesmos domínios “Matéria e Energia, Vida e Ambiente, Ser Humano e Saúde e Tecnologia e Sociedade” são avaliados. Essa forma estrutural em que os domínios são verificados durante todo o ano parece estabelecer não só que esses domínios serão cobrados pela avaliação por todo o ano, mas também que esses assuntos devem ser trabalhados transversalmente em todos os bimestres, uma vez que estão sendo constantemente avaliados ao longo do período letivo. Consequentemente, isso parece contradizer o que é anunciado no documento, ou seja, que o Currículo Mínimo “não significa homogeneização cultural; ao contrário, por ser mínimo, possibilita ao professor fazer escolhas mais adequadas à diversidade cultural dos alunos e à realidade de cada escola”. A organização do currículo por competências já cerceia as escolhas ao induzir a formação do aluno através de habilidades práticas como é possível perceber em todos os quadros destacados (Quadros 2, 3, 4 e 5) onde as habilidades e competências se iniciam através de verbos como “Pesquisar, Selecionar, Interpretar, Avaliar”. Ao combinar um foco do Currículo Mínimo e os mesmos domínios das Matrizes de Referência que se repetem em todos os bimestres, a transversalidade parece ser a única possibilidade de ensinar as diversas habilidades. Assim, o planejamento do professor é cerceado tanto na escolha do que ensinar, de quando ensinar e até mesmo de como ensinar esses conteúdos.

Neste contexto, e a partir dessas análises nos perguntamos de que maneira seria possível um movimento contrário a essa nova lógica do mercado que invade o espaço educacional. Na seção seguinte, discutimos a valorização de uma outra cultura, em contrapartida à cultura da performatividade, a cultura de valorização docente.

Quadro 5. Habilidades e Competências do Currículo Mínimo e das Matrizes de Referência do 1º Bimestre do 3º ano do Ensino Médio.

9º Ano do Ensino Fundamental Currículo

Mínimo Foco Habilidades e Competências

1º Bimestre Energia do dia-a- dia: Análises, predições, construções de modelos e explicações

Pesquisar evidências sobre processos de conservação, transformação e dissipação de energia em situações cotidianas

Selecionar e utilizar instrumentos de medição e de cálculo (utilizando escalas) para coleta de dados acerca de duas situações cotidianas distintas, que envolvam de alguma forma

os três processos

Representar dados (utilizando gráficos e tabelas), fazer estimativas e interpretar resultados.

Elaborar modelos explicativos para a ocorrência dos três processos nas situações cotidianas pesquisadas. Matriz de

Referência Domínio Habilidades

1º Bimestre

Matéria e Energia

Reconhecer o princípio da conservação de energia. Reconhecer processos de transformação e dissipação de

energia em situações cotidianas.

Analisar, por meio de dados expostos em gráficos ou tabelas, situações que envolvam processos de conservação,

transformação e dissipação de energia.

Vida e Ambiente Identificar fluxos de energia entre os organismos e o ambiente.

Ser Humano e Saúde

Relacionar os órgãos de sentido ao sistema nervoso. Relacionar o funcionamento dos sistemas circulatório,

digestório e respiratório.

Reconhecer os processos de nutrição como fonte de transformação e obtenção de energia para o corpo humano Tecnologia e

5.4 CULTURA DE PERFORMATIVIDADE E SEU AVESSO (OU DIREITO?): A