4.1 Justificativa do Estudo 1
Desalinhamentos da articulação subtalar comprometem a habilidade do pé de se adaptar a superfície de apoio, absorver impactos e propulsionar o corpo durante a marcha (23), podendo causar prejuízos de mobilidade, do input somatosensorial ou das estratégias musculares (24) necessárias para manutenção da postura e do equilíbrio (25).
Particularmente o rebaixamento do arco longitudinal medial está associado ao aumento da incidência de lesões dos membros inferiores (26, 27), sobretudo em mulheres (1), tais como: entorses de tornozelo (28) osteoartrose de joelho (29), síndrome patelofemoral (30) lesões de tornozelo, joelho e troco em dançarinas profissionais (31), desgaste da cartilagem tibiofibular em idosos (32), fraturas por stress em trainees da marinha (33) e fasciíte plantar em corredoras (34). Uma explicação mecânica para essa associação foi apresentada por Tibério (23), que relaciona o desalinhamento da articulação subtalar ao mau funcionamento do pé e a subseqüentes desequilíbrios mecânicos gerados por compensações na cadeia cinética do membro inferior, como estresse em valgo
ou rotações inadequadas no joelho ou no quadril, que favoreceriam o aparecimento das lesões mencionadas.
No entanto, apesar da alta correlação entre o rebaixamento do arco e a incidência de lesões nos membros inferiores, poucos estudos investigaram as implicações do desalinhamento do arco plantar no controle postural. Hertel et al (2002) (35) não relataram diferenças na área ou velocidade da trajetória do centro de pressão de sujeitos com pés normais e planos durante a manutenção do apoio unipodálico (10s), e Cote et al (2005) (36) não encontraram alterações no deslocamento do centro de pressão entre sujeitos com e sem rebaixamento do arco, também durante avaliação do apoio unipodálico (15s), o que pode indicar, talvez, que as condições estudadas não tenham gerado demanda suficiente para detectar os possíveis prejuízos decorrentes desse desalinhamento.
Considerando a importância da integridade do complexo tornozelo‐pé para a manutenção da postura, nossa hipótese é a de que sujeitos com rebaixamento do arco longitudinal medial apresentariam um comportamento do controle postural diferente dos sujeitos com arco normal, que seriam evidenciados em condições de desafio do controle postural, tais como em situações de perturbação sensorial. Como o controle postural é influenciado por parâmetros antropométricos como a massa corporal, estatura e o comprimento do pé (37), assim como pela idade e sexo (38), optamos pela análise dos ajustes de equilíbrio de mulheres com rebaixamento do arco longitudinal medial, já que
é sabido que mulheres apresentam maior índice de lesões mesmo em casos de menor grau de desalinhamento (1). 4.2 Resultados do Estudo 1 De modo geral, as mulheres com arcos rebaixados apresentaram valores significativamente maiores da velocidade média e do RMS na condição de maior perturbação sensorial (Figura 11).
As ANOVAs indicaram significância nos efeitos da perturbação sensorial, do tipo de arco, e da interação destes dois fatores para a maioria das variáveis estudadas. O efeito da perturbação sensorial foi significativo para o RMS e para a VM nas direções ântero‐posterior e médio‐lateral (RMSap: F=130,47; p<0,001; RMSml: F=127,33; p<0,001; VMap: F=241,21; p<0,001; VMml: F=141,46; p<0,001), assim como o efeito do tipo de arco (RMSap: F= 5,67; p=0,02; RMSml: F=7,95; p=0,01; VMap: F=20,21; p<0,001; VMml: F=36,57; p<0,001). O efeito de interação entre as condições de perturbação e tipo de arco só não foi significativo para o RMS ântero‐posterior (RMSap: F=1,26; p=0,29; RMSml: F=9,13; p<0,001; VMap: F=8,68; p<0,001; VMml: F=9,33; p<0,001).
A comparação post‐hoc confirmou que os sujeitos com arco normal apresentaram maior velocidade médio‐lateral da oscilação do centro de pressão que os sujeitos com arco rebaixado, nas quatro condições de perturbação. Para as demais variáveis (velocidade média ântero‐posterior e RMS ântero‐posterior e
do controle postural: plataforma móvel e olhos fechados, em que os sujeitos com pé normal também apresentaram oscilações maiores e mais rápidas que os sujeitos com arco rebaixado (Figura 10).
A diferença entre as condições de equilíbrio foram significativas para todas as variáveis (p<0,01), excluindo as condições (1) olhos abertos e plataforma fixa e (2) olhos fechados e plataforma fixa, que não foram diferentes entre si para nenhuma variável em ambos os grupos (Tabela 1).
Figura 10 – Diferenças do tipo de arco: Velocidade média (VM) e root mean
square (RMS) nas direções ântero‐posterior e médio‐lateral, nos
grupos arco normal e arco rebaixado. Médias e erro padrão nas 4 condições de perturbação sensorial: (1) plataforma fixa e olhos abertos, (2) plataforma fixa e olhos fechados, (3) plataforma móvel e olhos abertos, e (4) plataforma móvel e olhos fechados. ANOVAs para medidas repetidas com tipo de arco, condições e interação tipo de arco X condições como efeitos, teste post‐hoc de Newman‐Keuls. *p<0,05; **p<0,01;***p<0,001; n.s. não significante.
Tabela 1 – Diferenças entre as condições de perturbação para cada grupo, Arco normal e Arco rebaixado. Velocidade média e root mean square
(RMS) da trajetória do COP nas direções ântero‐posterior e médio‐
lateral, nas 4 condições de perturbação sensorial: (1) plataforma fixa e olhos abertos, (2) plataforma fixa e olhos fechados, (3) plataforma móvel e olhos abertos, e (4) plataforma móvel e olhos fechados. Trajetória ântero‐posterior do COP Velocidade média (cm/s) RMS (cm) Condição Arco normal (n=24) Arco rebaixado (n=13) Arco normal (n=24) Arco rebaixado (n=13) 1 0,54 (0,08)† 0,35 (0,08)† 0,25 (0,05)† 0,20 (0,08)† 2 0,77 (0,14)† 0,56 (0,17)† 0,35 (0,07)† 0,29 (0,12)† 3 1,35 (0,29)# 1,16 (0,31)# 0,88 (0,20)# 0,77 (0,56)# 4 3,72 (0,54) 2,74 (0,85) 1,43 (0,28) 1,20 (0,40) Trajetória médio‐lateral do COP Velocidade média (cm/s) RMS (cm) Condição Arco normal (n=24) Arco rebaixado (n=13) Arco normal (n=24) Arco rebaixado (n=13) 1 0,33 (0,07)† 0,18 (0,05)† 0,10 (0,03)† 0,08 (0,03)† 2 0,33 (0,07)† 0,21 (0,06)† 0,09 (0,03)† 0,09 (0,05)† 3 0,43 (0,08)# 0,33 (0,09)# 0,14 (0,03)# 0,15 (0,06)# 4 0,84 (0,19) 0,57 (0,20) 0,26 (0,07) 0,21 (0,10) ANOVA medidas repetidas, teste post‐hoc de Newman‐Keuls (p<0,01). † diferente das condições 3 e 4 para cada grupo; # diferente de todas as condições para cada grupo. 4.3 Discussão do Estudo 1
De maneira geral, os resultados mostraram que em condição de maior perturbação do controle postural (olhos fechados e plataforma móvel), as mulheres com arco rebaixado oscilaram menos e mais lentamente que as mulheres com arco normal.
Sabe‐se que a oscilação postural é essencial para a manutenção da postura bípede, garantindo que receptores musculares, articulares e cutâneos, mantenham o sistema nervoso central informado sobre a posição do corpo no
espaço (39). A trajetória do centro de pressão representa os ajustes posturais necessários para compensar essas oscilações (6). A redução da velocidade e da amplitude destes ajustes, portanto, pode representar uma resposta pior, ou mais lenta, de um sistema com alterações mecânicas, musculares e/ou sensoriais (40)
Pode‐se dizer que todas as desordens neuromusculares resultam em algum grau de alteração do controle postural, no entanto, como o sistema nervoso central lida com uma redundância de informações sensoriais, um determinado prejuízo pode não ser aparente até que haja privação do sistema de compensação (6). Portanto, nas condições em que a plataforma é móvel combinada com a restrição da informação visual, os prejuízos causados pelo desalinhamento plantar passou a ser determinante para a escolha das estratégias de ajuste adotadas, resultando em mudanças nas variáveis relacionadas a trajetória do COP.
Os limites de estabilidade expressam a base de suporte funcional do indivíduo. Por exemplo, com o envelhecimento os limites de estabilidade diminuem sensivelmente (41), assim como a oscilação do centro de pressão durante a análise da postura irrestrita (42). É possível, portanto, que os sujeitos com rebaixamento do arco tenham limites de estabilidade menores, ou confiem um pouco menos nos ajustes posturais, o que foi mais evidente para direção médio‐lateral. Nesse caso, o grupo arco rebaixado apresentou velocidades menores de ajustes para todas as condições de perturbação.
Com o rebaixamento do arco, a cabeça do talus se desloca medialmente, alongando o ligamento calcâneonavicular, o colateral medial e o tendão do
músculo tibial posterior (27). Com isso, a função dos estabilizadores do tornozelo fica prejudicada (24, 43), principalmente no eixo transverso do arco, o que justificaria os piores ajustes na direção médio‐lateral
4.4 Conclusão do Estudo 1
Mulheres com alterações mecânicas de alinhamento do arco longitudinal plantar (arcos rebaixados) apresentam uma lentificação e inapropriação das respostas de ajustes posturais em condição de privação de informação visual perturbação da propriocepção.
5. ESTUDO 2 ‐ “Efeitos a curto prazo da bandagem plantar no controle