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3. COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

3.4 Convênio ICMS n.º 66/1989

Com o advento da Constituição de 1988, houve uma profunda mudança relativa à competência tributária dos entes federados, especialmente no que tange aos Estados com a ampliação do campo de incidência do ICMS que, nos termos destacados, passou a abranger os serviços de comunicação e de transporte intermunicipais e interestaduais.

Dessa forma, o ICM, sucessor do antigo Imposto sobre Venda e Consignação, é aperfeiçoado, uma vez mais, culminando com a inserção do “S” à sigla da exação. Mais do que a simples nomenclatura, a inclusão de serviços no campo de incidência da exação estadual contribuiu, em muito, para o surgimento de conflitos de competência entre os entes federados, especialmente entre as municipalidades e Estados, como se apresenta no estudo.

Novamente é necessário entender o período em que a promulgação da Constituição Federal de 1988 ocorreu, qual seja após o regime militar centralizador, que inclusive (de maneira jocosa ou não), criou uma nova espécie de federalismo, nos termos destacados anteriormente, chamado de federalismo de integração, no qual existia a concentração do poder político e econômico na figura da União Federal.

Com efeito, a Carta Maior de 1988, bem como as discussões da Assembleia Constituinte que a precederam, apresentou uma clara tendência de descentralização do poder central em favor dos entes federados locais, fato comprovado pelo aumento do campo de incidência do ICMS em detrimento da União Federal.

De fato, a competência original da União Federal de instituir tributos sobre serviços de comunicação e transporte foi dividida entre os Estados e Municípios, e, no tocante a esse último, os serviços intramunicipais, foi atribuída competência às municipalidades, e os serviços de transporte intermunicipais e interestaduais foram destinados aos Estados.

Além dos serviços de transportes acima destacados, aos Estados foi dada a competência para instituir tributos, especialmente o ICMS, sobre os serviços de comunicação, incluindo, portanto, os serviços de telecomunicações.

Essa transferência de competência pode ser atribuída, em grande parte, aos interesses dos entes federados em obter maior independência em relação ao governo federal, especialmente após mais de duas décadas do regime militar centralizador.

Nesse cenário, conforme anteriormente exposto, a Constituição Federal de 1988 inovou em diversos aspectos ao trazer, por exemplo, o modelo cooperativo entre os entes federados, mas mantendo características do sistema clássico, o que, em um primeiro momento, pode ser classificado como uma evolução do sistema.

Não é difícil depreender que esse novo modelo tem um potencial para gerar conflitos de competência ativa entre Estados e Municípios, não obstante o Texto Constitucional tentar delimitar ao máximo, muitas vezes de maneira até exagerada, o campo de incidência de cada tributo.

Assim, volta-se uma das premissas-conclusões do presente estudo de que as relações humanas se desenvolvem de maneira muito mais dinâmica do que as normas jurídicas podem prever, razão pela qual são inevitáveis os conflitos.

No tocante aos aspectos legais, até a promulgação da Constituição Federal de 1988, não existia qualquer legislação que dispunha sobre a incidência do ICMS, ou melhor, do ICM, sobre os serviços de comunicação e transporte, sendo o primeiro importante para o presente trabalho.

Logo, o primeiro diploma legal a tratar sobre o ICMS e a nova competência tributária dos Estados foi o Convênio ICMS n.º 66/1989, que fez as vezes de lei complementar até a edição do devido diploma legal em 1996 (Lei Complementar n.º 87/1996).

Apesar de não configurar em lei em sentido estrito, o artigo 38, § 8.º, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias permitiu aos Estados, dentro do

âmbito do Confaz, editar o Convênio ICMS n.º 66/1989 como base para cobrança do ICMS, especialmente no que tange aos serviços de comunicação e transporte.

Não cabe no presente estudo discutir o estabelecimento das questões inerentes ao fato gerador de um tributo por meio de um convênio, ainda que previsto no texto nos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias.

Entretanto, é importante destacar que o mencionado convênio foi o primeiro diploma infraconstitucional a estabelecer e delimitar o fato gerador do ICMS sobre os serviços de comunicação e, consequentemente, os serviços de telecomunicação.

Com efeito, dispõe o Convênio n.º 66/1989, artigo 2.º: Art. 2.º Ocorre o fato gerador do imposto: [...]

X – na geração, emissão, transmissão, retransmissão, repetição, ampliação ou recepção de comunicação de qualquer natureza, por qualquer processo, ainda que iniciada ou prestada no exterior. Percebe-se que o diploma celebrado no âmbito do Confaz, no que tange aos serviços de comunicação objeto do presente trabalho, amplia a competência dos Estados para além do serviço de comunicação propriamente dito.

Ademais, ao acrescentar a expressão “qualquer natureza”, o mencionado convênio deixa aberta a interpretação do tipo tributário para que a exação possa incidir sobre qualquer serviço de comunicação, conforme se explorará na segunda metade da presente dissertação.

Em uma primeira análise, o diploma em questão, associado com o ainda vigente Decreto-lei n.º 406/1968 já comentado, especialmente quanto à lista anexa a esse decreto, seriam instrumentos suficientes para dirimir qualquer conflito de competência.

No entanto, o potencial para fins de conflitos potenciais é muito grande, uma vez que ambos os tributos, após a Constituição de 1988, preveem a possibilidade de tributação sobre serviços.

Instaurados, portanto, os critérios para o surgimento de conflitos de competências entre os entes federados, pois ambos possuem o direito de tributar serviços. Alguém poderia dizer que a tipificação das respectivas hipóteses de incidência já teria o condão de dirimir qualquer eventual conflito, e essa afirmação, em tese, seria verdadeira nos anos 1980, mas não é adequada para o século XXI.

Conforme já destacado no presente trabalho, as evoluções das relações interpessoais foram modificadas e outras foram criadas na mesma velocidade das inovações digitais, em especial no tocante ao acesso à informação baseado nos meios de comunicação.

Nesse cenário, muitos serviços anteriormente prestados de uma maneira (muitas vezes listados na legislação tributária como sujeitos ao ISSQN), passaram por profundas mudanças com a utilização extensiva de serviços de comunicação ou mesmo telecomunicação.

Lança-se assim o questionamento intermediário em relação à tese principal já antecipada na introdução da estudo, mas que será respondido ao final do trabalho em conjunto para a solução da controvérsia acerca do conflito de competência tributária: “a utilização de tecnologias ou novos meios tem o condão de desnaturar um serviço?”.

Vê-se claramente que a resposta a essa premissa está intimamente ligada ao tema proposto sobre o conflito de competência, pois as novas modalidades de serviços baseados em novas tecnologias são os grandes desafios para fins de tributação.

Contudo, tais serviços e tecnologias devem ser analisados sob a ótica de uma legislação originada na segunda metade do século XX.

Portanto, uma vez mais exsurge a relevância do tema proposto. Nesse sentido, devem-se interpretar as conclusões aqui expostas dentro do lapso temporal em que foi concebido, pois, como destacado, as inovações tecnológicas ocorrem em velocidade que a legislação e os estudos não podem acompanhar.

Para se ater ao roteiro proposto, restringe-se, por ora, à análise dos fatos geradores dos tributos para uma melhor compreensão do conflito de competência entre o ICMS e ISSQN, passando-se ao exame da Lei Complementar n.º 87/1996.