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Convênios Impositivos, Autorizativos e a Delegação de Competência

CAPÍTULO 2 – CONVÊNIOS CONFAZ E A DELEGAÇÃO DE COMPETÊNCIA

2.3. Convênios Impositivos, Autorizativos e a Delegação de Competência

Também como forma de libertarem-se dos limites impostos pela Constituição, os Estados passaram a questionar a natureza impositiva dos convênios, pretendendo restringi-los a mero fundamento de validade dos benefícios locais, devolvendo para si a competência que lhes foi retirada pela própria Constituição.

A título de esclarecimento, Roque Antônio Carrazza140 explica o que se entende por convênios impositivos e convênios autorizativos:

...convênios impositivos são aqueles pelos quais os Estados e o Distrito Federal são obrigados a adotar, em seus territórios, o benefício fiscal neles previsto. Distinguem-se dos autorizativos, que, como o próprio nome revela, limitam-se a facultar a unidade federativa a instituir o benefício fiscal neles previsto.

Assim, os Estados inconformados com a perda de autonomia imposta pela Constituição iniciaram uma tentativa para reavê-la, enfraquecendo o mecanismo que os prejudicou: os convênios. Sabendo que invalidá-los não seria possível, passaram a defender que a sua natureza seria apenas autorizativa, pois assim poderiam instituir o benefício previsto nos convênios apenas quando

73 desejassem, alcançando a liberdade que almejavam. É possível observar esta movimentação dos Estados nas decisões proferidas pelo STF.

O Recurso Extraordinário nº 96.545 de 1982141 discute a possibilidade de revogação de isenção por meio de Decreto estadual, pretendendo a empresa recorrente a declaração de inconstitucionalidade deste decreto, por entender que houve desrespeito a preceito constitucional, bem como à lei complementar, que determina a necessidade de convênio para revogar benefício fiscal.

Sustenta, o Estado recorrido, que a redação do art. 1º da LC 24/75 permite que os convênios se auto intitulem autorizativos, uma vez que dispõe que as isenções serão “concedidas ou revogadas nos termos de convênios”.

O Min. Moreira Alves, ao proferir seu voto, considerou não ser admitida a distinção entre convênios autorizativos e impositivos, entendendo que o art. 1º da LC 24/75 não autoriza os Estados a disporem como quiserem ou o que quiserem sobre benefícios fiscais. Ademais, verificou que a impossibilidade de existência de convênios autorizativos decorre da constituição, que, ao prever a necessidade de convênios, pretendeu reduzir a competência dos Estados. Assim, julgou inconstitucional o decreto que revogou unilateralmente a isenção, por considerar obrigatória a elaboração de convênios, tanto para conceder quanto para revogar benefícios fiscais.

Dois trechos da excelente fundamentação do voto resumem-no de forma satisfatória:

Observo, finalmente, que a inadmissibilidade da distinção entre convênio autorizativo e convênio impositivo, em matéria de concessão ou de revogação de isenção, decorre do próprio texto constitucional (o § 6º do artigo 23 da Constituição Federal), uma vez que a inovação que ele introduziu em nosso direito

141 -ICM. ISENÇÃO CONCEDIDA POR CONVENIO. REVOGAÇÃO PELO DECRETO ESTADUAL N. 1473/80. 1. A LEI COMPLEMENTAR N. 24/75 NÃO ADMITE A DISTINÇÃO ENTRE CONVENIOS

AUTORIZATIVOS E CONVENIOS IMPOSITIVOS. ASSIM, A REVOGAÇÃO DE ISENÇÃO

DECORRENTE DE CONVENIO NÃO PODE FAZER-SE POR MEIO DE DECRETO ESTADUAL, MAS TEM DE OBSERVAR O DISPOSTO NO PARAGRAFO 2. DO ARTIGO 2. DA REFERIDA LEI COMPLEMENTAR. 2. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO, DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE DA EXPRESSAO "BACALHAU" CONSTANTE DO PARAGRAFO 21 QUE O DECRETO 14737, DE 15 DE FEVEREIRO DE 1980, DO ESTADO DE SÃO PAULO ACRESCENTOU AO ARTIGO 5. DO REGULAMENTO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS, APROVADO PELO DECRETO 5.410, DE 30 DE DEZEMBRO DE 1974, DO MESMO ESTADO. (RE 96545, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Tribunal Pleno, julgado em 01/09/1982, DJ 04-03-1983)

74 constitucional, e que reduz a competência tributária dos Estados individualizadamente, visa - como acentua FERNANDO BROCKSTEDT [...] - a “que os Estados adotem uma política uniforme e harmônica de isenções, evitando as chamadas ‘guerras fiscais’ [...]”.

A esse fim perseguido pelo texto constitucional não se chegaria com a admissão, em matéria de concessão ou de revogação de isenção, de convênios autorizativos, e, portanto, de convênios que deixariam a critério dos Estados conceder, ou não, a isenção, podendo, também, na hipótese de haverem concedido, a revogarem unilateralmente. (RE 96545, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Tribunal Pleno, julgado em 01/09/1982, DJ 04-03-1983)

Observa-se que, com muita precisão, o STF garantiu e preservou a vontade da Constituição de dar tratamento uniforme e harmônico aos benefícios fiscais de ICMS, restringindo a competência dos Estados para agir individualmente nesse tema. Outros julgados também foram proferidos nesse sentido142.

Com a vigência da Constituição de 1988 este posicionamento permaneceu perfeitamente aplicável, isto porque houve a manutenção da restrição à autonomia dos Estados, tendo apenas sido alterada esta competência para a Lei Complementar, e não mais a outorgada diretamente aos convênios.

Isto é, independentemente de qual Constituição Federal se esteja referindo, seja de 1967 (EC nº1/69) seja de 1988, o poder para conceder benefícios fiscais de ICMS não pertence aos Estados. A delegação de competência foi feita de forma expressa pela EC nº 1/69 aos convênios (art. 23), e pela CF de 1988, à lei complementar (art. 155, §2º, XII, “g”).

Assim, não merece nenhum reparo o acórdão relatado pelo Min. Moreira Alves (RE nº 96.545) que pode perfeitamente servir de base para a solução de casos sob a égide da CF de 1988, preservando o regramento uniforme da concessão de benefícios fiscais por meio da garantia da delegação de competência prevista no art. 155, §2º, XII, “g”.

Frise-se, por fim, que a fundamentação do referido acórdão se baseou em disposições constitucionais, restando constatado que a impositividade dos convênios deriva da própria Constituição. Observe-se, então, que esta natureza impositiva foi

75 reconhecida independentemente de qualquer relação com a necessidade de implementação por meio de lei dos benefícios concedidos em convênio, o que implica dizer que esta implementação pelos Estados membros em nada alteraria o resultado do julgamento.

No entanto, apesar da histórica defesa da natureza impositiva dos convênios pelo Supremo Tribunal Federal, evitando que os Estados contornassem de maneiras escusas as prescrições constitucionais, essa garantia tem sofrido perdas consideráveis. Após a introdução do §6º do art. 150 pela EC nº 3 de 1993, ganhou força a necessidade de lei específica para implementação dos convênios na esfera de cada Estado e decisões do STF passaram a dar aos convênios natureza autorizativa.

A relação entre a necessidade de lei específica e a natureza autorizativa dos convênios foi argumento estratégico utilizado pelos Estados na tentativa de reaver a competência que lhes foi retirada.

Importa neste momento desvincular essas duas situações, demonstrando que a necessidade de lei específica não implica o reconhecimento da natureza autorizativa dos convênios, e para isso, analisaremos decisões do STF posteriores a esta alteração legislativa, demonstrando que não há nelas nenhum fundamento lógico que justifique essa relação de implicação.

2.3.1. A dissociação entre a natureza autorizativa dos convênios e a necessidade de sua implementação pelos Estados

No julgamento do RE nº 96.545 constatou-se que o caráter impositivo dos convênios decorre da Constituição Federal, sendo irrelevante a análise da necessidade de implementação dos convênios pelos Estados para chegar a esta conclusão.

No entanto, ao ser chamado a decidir sobre os meios aptos para se realizar essa implementação, o Supremo Tribunal Federal alterou seu posicionamento sobre a natureza dos convênios. E o fez, porém, sem aprofundar-se neste debate, gerando insegurança jurídica em torno do assunto.

76 Em 2009, no julgamento do RE nº 539.130/RS143 analisou-se a viabilidade de manutenção de autuação fiscal realizada em virtude da desconsideração de isenção. Isenção que, por sua vez, fora aprovada em Convênio, mas não instituída pelo Estado.

No acórdão restou comprovada a existência de Decreto legislativo implementando o convênio, e em decorrência disso o Min. Joaquim Barbosa reconheceu a validade da isenção, autorizando que ratificações de convênios sejam feitas pelo poder legislativo, seja por lei, seja por decreto, e impedindo as realizadas pelo poder executivo. O posicionamento do STF sobre a forma de implementação dos convênios será tratado no capítulo 4, item 4.2.7.1.

No entanto, no que diz respeito à natureza dos convênios, a única menção feita neste acórdão, ocorreu no penúltimo parágrafo do voto:

Ratificado o convênio, cabe à legislação tributária de cada ente efetivamente conceder o benefício que foi autorizado nos termos de convênio. Preservada a palavra do Legislativo é dado o longo caminho necessário à aprovação do incentivo, descabe impor forma mais rigorosa.

Assim, apesar de a fundamentação do acórdão limitar-se à discussão sobre a forma de implementação dos convênios, existe uma passagem isolada outorgando a eles natureza autorizativa.

É nítido que não houve discussões a respeito deste tema, não sendo possível considerar este julgado como uma alteração do posicionamento do STF sobre a natureza impositiva dos convênios, tão bem fundamentada pelo Min. Moreira Alves no RE nº 96.545.

Com o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000) alguns autores passaram a defender com maior entusiasmo a natureza

143 DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONVÊNIO ICMS 91/91. ISENÇÃO DE ICMS. REGIME ADUANEIRO ESPECIAL DE LOJA FRANCA. "FREE SHOPS" NOS AEROPORTOS. PROMULGAÇÃO DE DECRETO LEGISLATIVO. ATENDIMENTO AO

PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ESTRITA EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA. 1. Legitimidade, na hipótese,

da concessão de isenção de ICMS, cuja autorização foi prevista em convênio, uma vez presentes os elementos legais determinantes para vigência e eficácia do benefício fiscal. 2. Recurso extraordinário conhecido, mas desprovido. (RE 539130, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 04/12/2009, DJe-022 DIVULG 04-02-2010 PUBLIC 05-02-2010 EMENT VOL-02388-05 PP-00900 RTJ VOL-00213- PP-00682 RDDT n. 175, 2010, p. 179-185 RT v. 99, n. 895, 2010, p. 177-185 LEXSTF v. 32, n. 374, 2010, p. 227-241)

77 autorizativa dos convênios, sob o argumento de que necessidade de previsão orçamentária de qualquer renúncia fiscal impossibilita a obrigatoriedade de implementação de convênios pelos Estados. Assim entende Tiago Severini144:

(...) o STF posicionou-se, ainda na década de 80, no sentido da incompatibilidade entre a distinção dos convênios em autorizativos e impositivos e o teor da LC 24/75. Não obstante, o advento da LC 101/2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal, ensejou uma necessária relativização desse posicionamento. Isso porque, de acordo com o art. 14 da LC 101/2000, a concessão de qualquer incentivo fiscal de que decorra renúncia de receita pelos Estados torna necessária a previsão orçamentária do impacto financeiro correspondente, a ser acompanhado de demonstração de que as metas de resultados fiscais não serão afetadas ou de medidas de compensação que proporcionem aumento de receita. (...) Desse modo, a fim de evitar que as restrições orçamentárias eventualmente aplicáveis a certo Estado inviabilizem a celebração de certo convênio, com o qual este concorda, torna-se salutar a atribuição de natureza autorizativa aos convênios. O STF, em decisão monocrática (RE nº 630.705/MT), negou seguimento à Recurso Extraordinário que pretendia ver reconhecido benefício fiscal previsto em convênio, mas não implementado pelo Estado, citando Tiago Severini para justificar a natureza autorizativa dos convênios. Utilizou ainda como precedente, para justificar o indeferimento do RE, decisões do Superior Tribunal de Justiça145 (STJ), que também não discutem o tema com profundidade.

No entanto, não é possível concordar com esse posicionamento, uma vez que o referido art. 14 da LC 101/2000 não pode ser aplicado aos convênios de ICMS. Isto porque, em decorrência do princípio Federativo, a União não pode estipular a forma pela qual os Estados exercitarão suas competências tributárias, uma vez que eles são livres para deliberarem sobre elas, sujeitando-se apenas aos limites impostos pela Constituição.

Roque Antonio Carrazza146 vai além ao afirmar que:

Acima da Lei de Responsabilidade Fiscal está o art. 155, §2º, XII, “g” da Carta Magna, que, no intuito de evitar atritos entre as unidades

144 SEVERINI, Tiago. O convênio ICMS 130/2007 e a transferência interestadual de bens importados sob o Repetro. Revista Tributária de Finanças Públicas, São Paulo, vol. 97, p. 185, mar/2011.

145 RMS 13.543/RJ e RMS 26.328/RO.

146 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 9ª ed revista e ampliada. São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 387.

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federativas (com prejuízo da harmonia da Federação), estabelece que os Estados e o Distrito Federal deliberarão entre si para conceder “isenções, incentivos e benefícios fiscais” em matéria de ICMS. Os eventuais impactos orçamentários financeiros destas medidas nas unidades federativas individualmente consideradas não têm o condão de sobrepujar o interesse nacional que leva à celebração dos convênios-ICMS.

Assim, considerando a incompetência da União para intervir nas matérias de competência dos Estados, bem como a preponderância do interesse nacional sobre o individual, é inaceitável a utilização desta Lei para justificar a natureza autorizativa dos convênios.

A questão sobre a natureza dos convênios voltou a ser tratada pelo STF no recente julgamento do caso Santa Lucia147, novamente sem ter sido dada a importância devida ao tema. Ele foi abordado não para justificar a necessidade de lei específica para a concessão de redução de base de cálculo, pois no caso havia, mas para justificar a necessidade de lei que preveja a manutenção integral dos créditos nos casos de operações com base de cálculo reduzida.

E a justificativa pela opção da natureza autorizativa dos convênios neste caso foi feita pelo Min. Gilmar Mendes com base na jurisprudência da corte, citando a decisão monocrática proferida no RE nº 630.705/MT, supracitado. No entanto, tanto esta como as demais decisões do STF apenas tratam o tema de forma superficial.

Dessa forma, certos de que a impositividade é necessária para assegurar valores constitucionais, tais como o princípio da indelegabilidade das competências, resta-nos ressaltar que a impositividade dos convênios independe de considerações a respeito da efetiva instituição dos benefícios por lei, uma vez que ela deriva da própria constituição, que limitou autonomia dos Estados no que diz respeito à concessão de benefícios fiscais.

Qualquer decisão que entenda de maneira diversa estará descumprindo a cláusula de delegação de competência prevista no art. 155, §2º, XII, “g” da CF, uma vez que, ao tornarem os convênios autorizativos, os Estados pretendem devolver para si próprios a competência que a Constituição delegou à lei complementar.

79 Já ressaltava Rui Barbosa Nogueira148 que:

“Reservando à lei complementar, que é de caráter nacional, dispor sobre todos esses itens do ICMS, vê-se que a Constituição Federal previu a maior concentração e unificação da disciplina deste imposto que, embora pertença aos Estados e ao Distrito Federal, é prioritariamente regido por legislação nacional, por deliberação conjunta dos Estados e do Distrito Federal, pouco restando à criatividade legislativa dos Estados, de per si”.

Soma-se a isso a interpretação do art. 150, §6º da CF feita por Tércio Sampaio Ferraz Junior149, na qual observou que o dispositivo elenca algumas garantias do contribuinte – vide item 4.2.7.1. Configurando uma garantia, não é possível que venha a prejudica-lo, retirando-se a força da unificação da disciplina de benefícios fiscais dada pela Constituição.

Sendo assim, é preciso conciliar ambas as interpretações: a delegação de competência aos convênios e a necessidade de lei específica. É sobre isso que o Supremo precisa se pronunciar para acabar com a insegurança que paira sobre os contribuintes que sofrem com a briga dos gigantes da federação.

Não se pretende, ao defender a impositividade dos convênios, preterir a necessidade lei para a efetiva instituição do benefício fiscal pelos Estados, mas apenas desvincular a ideia da imprescindibilidade de lei específica e da natureza autorizativa dos convênios, uma vez que a sua vinculação implica em dar ampla liberdade aos Estados para conceder tais benefícios, anulando-se assim os preceitos constitucionais que existem justamente para impor limites a tais atos.

Acredita-se que a melhor interpretação (que valoriza as normas constitucionais) seria a que mantém a função dos convênios como verdadeiros limitadores da competência dos Estados, na medida em que os obriga a instituir os benefícios acordados por eles próprios, e não como mero fundamento de validade dos benefícios concedidos individualmente pelos Estados, sem os acarretar nenhuma obrigação.

148 Curso de Direito Tributário. 9ª edição. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 140.

149 Remissão e Anistia fiscais: Sentido dos Conceitos e Forma Constitucional de Concessão. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo, nº 92.

80 Sendo assim, é possível que os convênios sejam impositivos e que os Estados sejam obrigados a elaborarem leis específicas para concessão dos benefícios, sujeitando-se aqueles que não a fizerem às consequências decorrentes de sua omissão, tais como, perda de competitividade, impossibilidade de restrição de créditos concedidos em outros Estados com apoio em convênios, entre outras.

A obrigação dos Estados em sujeitarem-se ao ônus decorrente da não elaboração da lei para implementar o convênio foi defendida no STJ pela Min. Denise Arruda, que citou trecho da obra de Sérgio Pyrrho150:

Revista a razão de ser da exigência constitucional de prévia deliberação dos Estados e do DF para a concessão de benefícios fiscais relacionados com o ICMS, percebe-se que a obrigação que os convênios devidamente aprovados trazem para cada um dos Estados-Membros ('obrigação' essa que deflui da literalidade do já citado art. 7º da LC nº 24/75) é uma só: cada Estado, porque previamente anuiu à possibilidade de que os demais viessem a instituir benefícios fiscais, fica obrigado a tolerar o emprego que outros Estados façam da prerrogativa que foi a todos conferida. Deste modo, a concessão de uma isenção por um dos Estados- Membros, que sem a prévia aprovação de convênio poderia ensejar a propositura de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade pelos Estados que se considerassem prejudicados pela fuga de empresas, passa, graças ao convênio existente (e implementado pelo Estado que venha a instituir o benefício tributário), a ser de obrigatória tolerância pelas demais unidades federativas, ainda que estas venham a experimentar efeitos não previstos quando da celebração do convênio.

... a despeito da literalidade do art. 7º da Lei Complementar nº 24/75, os convênios firmados pelos Estados não os obrigam a implementar, em suas respectivas porções territoriais, os benefícios previstos nos convênios celebrados, impondo-lhes apenas a tolerância ao emprego que outras Unidades da Federação façam do instrumento, com base neles (convênios) outorgando o favor fiscal que todos os Estados se dispuseram a aceitar - o que afasta a nocividade da 'guerra fiscal’.

Observa-se, que a posição adotada pelo autor e acolhida pelo STJ é no sentido de afirmar que os convênios obrigam os Estados a “tolerar o emprego que outros Estados façam da prerrogativa que foi a todos conferida”.

150.PYRRHO, Sérgio. Soberania, ICMS e Isenções. Os convênios e os Tratados internacionais. Rio de janeiro: Editora Lumen Juris, 2008, pp. 39/24 apud RMS 26.328/RO, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/09/2008, DJe 01/10/2008.

81 Porém, é necessário fazer uma ressalva, uma vez que tanto o autor quanto o acórdão do STJ consideram os convênios mecanismos meramente autorizativos151. A nosso ver, tais afirmações são contraditórias, pois os Estados apenas poderiam sujeitar-se a essa obrigação se os convênios os obrigassem a instituir os benefícios. Se restasse caracterizada a liberdade dos Estados em instituí- los, não haveria justificativa para sujeitarem-se ao referido ônus.

É por este motivo que mantemos nossa posição na defesa da impositividade dos convênios, independentemente da obrigação de lei específica para concessão dos benefícios, sujeitando-se os Estados que não elaborarem a lei às consequências decorrentes de sua omissão.

151 RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. ISENÇÃO DE ICMS PREVISTA EM CONVÊNIO DO CONFAZ. NÃO-CONCESSÃO POR ESTADO-MEMBRO. POSSIBILIDADE. NATUREZA AUTORIZATIVA DO CONVÊNIO. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO À FRUIÇÃO DO BENEFÍCIO. EXIGIBILIDADE DO TRIBUTO. RECURSO DESPROVIDO. (...)3. O convênio celebrado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária - CONFAZ é um pressuposto para a concessão da isenção do ICMS. Por si só, não cria direito ao contribuinte. Trata-se de uma autorização para a implementação do benefício

fiscal pelos Estados e o Distrito Federal, e não de uma imposição. 4. "É só este o alcance da

'obrigação' que o convênio regularmente aprovado impõe a todos os Estados-Membros: o respeito à implementação do benefício fiscal que, no limite do convênio, cada um deles venha a promover em seu território. Não poderia mesmo ser de outra forma, porque o objetivo de atribuir a cada um dos Estados a mera faculdade (e não a obrigação) de conceder benefício fiscal é, acima de tudo, um corolário da autonomia político-administrativa dos Estados em relação à União, autonomia essa consagrada pelo art. 18, caput, da Constituição da República, e que restaria malferida se o art. 7º da LC nº 24/75 fosse interpretado em sentido diverso ao ora sustentado" (PYRRHO Sérgio. "Soberania, ICMS e Isenções. Os Convênios e os Tratados Internacionais", Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2008, p. 40). 5. Esta Corte Superior já se manifestou acerca da natureza meramente autorizativa

dos convênios celebrados pelo CONFAZ, quando do julgamento do REsp 709.216/MG (2ª Turma,

Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 9.5.2005).(...) 7. Recurso ordinário desprovido. (RMS 26.328/RO, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/09/2008, DJe 01/10/2008)

82 CAPÍTULO 3 – EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO USO DA EXPRESSÃO

“REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO” NA CONSTITUIÇÃO E NA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA

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