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3. Necessidade de disciplinas internacionais sobre ajustes de carbono na

3.3 Foros para negociação das disciplinas internacionais

3.3.3 Cooperação conjunta entre Nações Unidas e OMC

O cotejo realizado acima entre a OMC e a ONU permite asseverar que a moldura estabelecida pela Convenção-Quadro oferece os recursos mais adequados ao esforço normativo sobre os ajustes de carbono. Além de contar com a prévia anuência de seus integrantes e a previsão de um arcabouço institucional para examinar os reflexos das medidas de resposta, a Convenção-Quadro abriga a integralidade das negociações climáticas e aparenta ser destinatária de maior simpatia por parte da comunidade internacional. Embora venha enfrentando dificuldades colossais para entregar resultados palpáveis e consentâneos com a urgência imposta pelo aquecimento global, seu processo decisório parece menos desgastado que o do sistema multilateral de comércio, que se encontra paralisado pelas indefinições da Rodada Doha.

A predileção pelo eixo das Nações Unidas, todavia, não é sinônimo de exclusividade. Em outras palavras, não significa que a Convenção-Quadro deva conduzir de maneira isolada todas as ações e que a OMC, por seu turno, deva ficar alheia ao processo de análise, discussão e concepção das regras sobre ajustes de carbono. Ao contrário, recomenda-se a construção de uma relação inclusiva, transparente, respeitosa e cooperativa entre ambas as entidades. Cada uma delas possui escopo próprio de atuação e pode contribuir de maneira específica para o diálogo positivo entre comércio e clima605.

Enquanto o regime de proteção climática deve abraçar o comando e fornecer a estrutura necessária para o progresso das negociações, entende-se que a OMC deva ter assegurada a oportunidade de influenciar o sucesso dessa empreitada. Até porque, como anteriormente comentado, os ajustes de carbono revestem-se, em sua essência, de caráter eminentemente comercial.

Economic Affairs, op. cit., p. i. Disponível em:

<http://www.rprogress.org/publications/1996/swiss_1996.pdf>. Acesso em: 30 dez. 2012.

604 BRACK, Duncan; GRUBB, Michael; WINDRAM, Craig. International Trade and Climate Change Policies, op. cit., p. 89.

605 INTERNATIONAL CENTRE FOR TRADE AND SUSTAINABLE DEVELOPMENT. A response to

response measures: solving conflicts between trade and climate change policy. Bridges Trade BioRes Review, v. 5, n. 4, 2011. Disponível em: <http://ictsd.org/i/news/bioresreview/119732/>. Acesso em: 19 set. 2012.

Diversas são as formas mediante as quais essa parceria poderia ser colocada em prática. O seminal estudo realizado pela OMC e pelo PNUMA sobre comércio e mudança do clima ilustra uma instância concreta606. Em 1971, o relatório elaborado pelo GATT com vistas a municiar a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano com uma perspectiva especializada a respeito da relação entre controle da poluição industrial e comércio internacional também aponta nessa direção607. Há quem recomende até mesmo a inclusão de um capítulo no Quinto Relatório de Avaliação do IPCC608, dedicado especificamente a aprofundar o conhecimento técnico acerca das implicações econômicas e ambientais dos ajustes de carbono e da viabilidade de sua regulação multilateral609. Um projeto dessa natureza poderia ser feito com a assistência da OMC.

Como exercício exploratório, seria possível imaginar, ainda, a colaboração da OMC por meio de imputs técnicos, da participação do seu Secretariado nas negociações climáticas, de discussões no âmbito do seu Comitê de Comércio e Meio Ambiente ou até mesmo da criação de um Grupo de Trabalho com mandato específico para explorar os ajustes de carbono. A propósito, iniciativa análoga pode ser colhida em 1968, quando o GATT decidiu estabelecer o Grupo de Trabalho sobre Ajustes de Tributos na Fronteira para melhor compreender o fundamento e extensão dessas medidas610.

Outro exemplo de ação coordenada seria combinar a eventual conclusão de um acordo referente aos ajustes de carbono na esfera da Convenção-Quadro com a proposição simultânea de um waiver na OMC a respeito de alguns de seus deveres611. Dessa maneira, seria possível conciliar, por período transitório, potenciais discrepâncias entre o novo diploma climático e o feixe normativo da OMC. Essa estratégia poderia servir para reduzir ou mesmo afastar temporariamente a interposição de recursos ao sistema de solução de controvérsias da entidade sob a alegação de que as medidas na fronteira violam os fundamentos do comércio internacional.

606 TAMIOTTI, Luduvini et al. Trade and climate change: a report by the United Nations Environment

Programme and the World Trade Organization, op. cit.

607 ACORDO GERAL SOBRE TARIFAS E COMÉRCIO. Industrial pollution control and international

trade: note by the GATT Secretariat. L/3538 9 June 1971, p. 8-11.

608 O AR5 está previsto para ser publicado entre 2013 e 2014. Disponível em: <http://www.ipcc.ch>. Acesso

em: 15 jan. 2013.

609 ZELLI, Fariborz; ASSELT, Harro van. The overlap between the UN Climate Regime and the World

Trade Organization: lessons for climate governance beyond 2012. In: BIERMANN, Frank; PATTBERG, Philipp; ZELLI, Fariborz (Ed.). Global climate governance beyond 2012: architecture, agency and adaptation, op. cit., p. 88-93.

610 ACORDO GERAL SOBRE TARIFAS E COMÉRCIO. Border tax adjustments: proposed terms of

reference for Working Party. C/W/123, 27 mar. 1968.

611 HUFBAUER, Gary Clyde. CHARNOVITZ, Steve; KIM, Jisun. Global warming and the world trading system, op. cit., p. 97.

Uma valiosa e derradeira reflexão a respeito da relação simbiótica entre a ONU e a OMC pode ser extraída da nota introdutória ao estudo do PNUMA acerca do futuro das políticas sobre comércio e clima. Conforme descrito por tal ensaio, a complexa interação entre o sistema multilateral de comércio e o regime de proteção do clima caracteriza-se atualmente mais pela indiferença do que pelo apoio mútuo. Os estatutos climáticos evitam fazer uso de medidas comerciais para perfazer seus objetivos. A OMC, por sua vez, procura não se imiscuir em assuntos sobre o aquecimento global. Essa postura de abnegação, contudo, não se mostra sustentável, notadamente devido à inevitável convergência entre os universos do clima e do comércio. Uma saída para conciliá-los, portanto, seria desenvolver, sob o signo da Convenção, um quadro multilateral harmônico e coerente acerca dos ajustes de carbono e, por intervenção auxiliar da OMC, adotar providências para tornar tais medidas transparentes, justas e previsíveis612.