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Coronariopatia Crônica

No documento Artigos Volume - ABC Cardiol (páginas 190-192)

William Antonio de Magalhães Esteves 42,43,

2. Coronariopatia Crônica

2.1. Peculiaridades do Diagnóstico da Doença Arterial Coronariana Crônica no Idoso

História clínica e exame físico detalhados são essenciais na avaliação do idoso com suspeita de DAC crônica; todavia, na prática cotidiana isto constitui um desafio, face à ocorrência de comorbidades, sintomas atípicos e alterações cognitivas e de locomoção. A apresentação de isquemia frequentemente acontece sob forma de equivalentes anginosos: fadiga, dispneia, desconforto epigástrico, sendo incomum a presença de angina típica.135 O exame físico, geralmente inespecífico,

pode fornecer algumas pistas, tais como: HAS, anormalidades de ritmo (fibrilação atrial – FA) e doença arterial periférica.

O ECG de repouso pode ser inespecífico em 50% dos casos, mesmo na vigência de coronariopatia grave;136 no

idoso são frequentes alterações como ondas Q patológicas, inversões da onda T, hipertrofia ventricular esquerda (HVE), bloqueios de ramo do feixe de His, FA. Tais alterações dificultam o diagnóstico. O ECG é particularmente útil, durante episódios de angina, quando pode ser constatada depressão do segmento ST ou pseudonormalização do mesmo, em até 50% dos casos.

A radiografia de tórax deve ser realizada quando coexistir suspeita de IC congestiva, valvopatia ou doença pulmonar.

O ecocardiograma transtorácico fornece informações relevantes para o diagnóstico e manuseio da DAC crônica: (a) estado do VE – funções sistólica e diastólica, mobilidade parietal e hipertrofia; (b) presença de valvopatias; (c) situação da raiz da aorta.

A utilização de testes funcionais para isquemia [TE, ecocardiografia sob estresse e cintilografia miocárdica de perfusão (CMP)] ou de testes anatômicos [angiotomografia de coronárias (ATC) e cineangiocoronariografia (CATE)] depende da estimativa pré-teste da probabilidade de DAC obstrutiva.137 Quando a probabilidade for baixa (< 20%),

é desnecessário prosseguir na investigação. Por outro lado, quando a probabilidade for alta (> 80%), resultados negativos de exames não invasivos podem não excluir DAC obstrutiva e, portanto, a estratégia invasiva pode ser considerada. Para aqueles com probabilidade pré-teste intermediária estaria indicado um exame de estresse.

No idoso, a sensibilidade e a especificidade diagnóstica do TE têm sido questionadas,138 em decorrência da baixa

capacidade de exercício (redução de massa muscular, descondicionamento, comorbidades) e da presença de alterações no ECG de base; todavia, esta metodologia pode ser útil no manuseio clínico, oferecendo informações relevantes sobre sintomas, capacidade de exercício, resposta cronotrópica, arritmias etc.

Tanto a estresse como a CMP podem ser utilizadas associadas ao TE para incrementar a sensibilidade e a especificidade para isquemia.139,140 A utilidade diagnóstica

e prognóstica de ambas as modalidades é similar e a preferência por uma determinada metodologia depende de experiência e/ou equipamentos disponíveis em cada centro de investigação. Para os gerontes incapazes de realizar exercício, podem ser utilizados estresse farmacológico tanto na estresse (dobutamina) como na CMP (agentes vasodilatadores).

O ECC, obtido conjuntamente com a ATC, é útil na estratificação de risco de idosos assintomáticos, pelo seu alto valor preditivo negativo;141 todavia, naqueles sintomáticos,

com suspeita de DAC, seu valor é limitado. Devido à alta prevalência de calcificação de coronárias em gerontes, a ATC tem se mostrado com acurácia reduzida na demonstração de DAC obstrutiva.142

O CATE continua sendo o “padrão-ouro” para a avaliação definitiva de DAC epicárdica; geralmente é recomendado para pacientes cujas características clínicas e/ou resultados de testes não invasivos indiquem uma alta probabilidade de coronariopatia grave, com alto risco de eventos coronarianos ou morte. Apesar de bem tolerado, merece atenção pelo risco de sangramento, AVE, nefropatia por contraste.

Atualização

Atualização das Diretrizes em Cardiogeriatria da Sociedade Brasileira de Cardiologia - 2019

Arq Bras Cardiol. 2019; 112(5):649-705

2.2. Peculiaridades do Tratamento da Doença Arterial Coronariana Crônica no Idoso

Nas últimas décadas o tratamento da doença coronariana tem sido bem fundamentado em torno de medidas clínicas gerais relacionadas ao desenvolvimento de hábitos saudáveis, tais como: alimentação balanceada, controle do peso, prática regular de atividade física, cumprimento de programação vacinal, abolição do tabagismo, controle rigoroso da PA e uso apropriado de medicamentos antiateroscleróticos como estatina, antiplaquetário e atenuadores do sistema renina-angiotensina, além de antianginosos.143-145 Adicionalmente, em casos

bem selecionados, com procedimentos de revascularização miocárdica, por meio de intervenção coronariana percutânea ou por cirurgia. Nos pacientes idosos esses princípios gerais são aplicáveis em boa parte com evidências possíveis de serem extraídas de estudos randomizados, que passaram a incluir em suas observações indivíduos idosos “jovens” – 60 a 75 anos de idade –, sendo que estas são menos avaliadas nos “idosos propriamente ditos” – 75 a 85 anos de idade –, e escassas nos “muito idosos” – mais de 85 anos.143-145

Em relação à dieta, os estudos Lyon, Dietary Approaches to

Stop Hypertension (DASH) e, mais recentemente, o Prevención con Dieta Mediterránea (PREDIMED) validam o conceito da

dieta saudável e este último incluiu pacientes de até 80 anos de idade. O controle do peso oferece uma consideração particular no idoso pela aparente constatação do paradoxo do IMC com a idade.146 Em uma análise mais conclusiva

do assunto em DAC, a redução da obesidade se associa a melhores resultados.

A prática regular de atividades apropriadas para as condições físicas do idoso trazem incontáveis benefícios de ordem psicológica que impactam na melhoria dos cuidados gerais de saúde, e que justificam sua implementação.

Inflamação determinada por infecções desempenha um reconhecido papel no surgimento de complicações em doença coronariana, e vacinação contra influenza e pneumococos é medida recomendável no idoso coronariopata.147

A análise do registro Coronary Artery Study (CASS) foi definitivo em demonstrar o benefício de abolir o tabagismo no coronariopata idoso.148

No idoso tem-se estabelecida meta de controle de pressão arterial sistólica (PAS) < 140 mmHg. Recente estudo (Systolic

Blood Pressure Intervention Trial – SPRINT) recomenda que

mesmo no idoso com doença coronariana esta meta seja mais rigorosa (se tolerada, < 130 mmHg), não tendo sido verificada a curva J nem eventos indesejáveis relacionados à redução da PA diastólica. Cautela especial deverá ser tida nesta população com comorbidades.149

As medicações antiateroscleróticas como as estatinas têm demonstração confirmada, em ensaios, até os 79 anos de idade. Se toleradas devem ser estimuladas a atingir metas de LDL-c de < 70 mg/dL. O ácido acetilsalicílico (AAS) é recomendado, assim como o emprego de inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA) ou bloqueadores dos receptores de angiotensina (BRA), mesmo na ausência de HAS ou IC, embora ambas estas condições frequentemente estejam associadas a DAC no idoso.

As medicações anti-isquêmicas como betabloqueadores (e antagonistas de cálcio na sua impossibilidade ou em associação) para controle e nitrato para as crises, assim como novos medicamentos anti-isquêmicos, como trimetazidina, devem ser usados, com a devida cautela de doses progressivas, por conta da maior incidência de efeitos colaterais. Ivabradina pode ser considerada para controle da FC na impossibilidade de uso do betabloqueador.150

Em relação à revascularização, tanto por intervenção percutânea como cirúrgica, no idoso sem fragilidade, deve ser considerada com vistas a controlar sintomas refratários ou em condições de grande carga isquêmica. Quanto à decisão de qual procedimento a ser realizado, intervenção percutânea ou cirurgia, tudo depende da factibilidade de emprego das duas técnicas, tendo a se considerar que a idade acrescenta um peso considerável ao risco de ambos os procedimentos e os escores que incluem comorbidades associadas tendem a afetar ainda mais o procedimento cirúrgico.151

Por fim, as recomendações terapêuticas devem levar em conta, além dos fatos mencionados anteriormente, outros tantos relevantes como aspectos biológicos de fragilidade, competência psicológica, suporte econômico, social, entre outros, que tornam a sua escolha um exemplo máximo de terapêutica personalizada voltada para o indivíduo idoso afetado por DAC.

2.3. Recomendações Gerais – Doença Arterial Coronariana Crônica no Idoso

Tratamento da doença coronariana crônica no idoso

Medidas gerais

● Alimentação balanceada ● Controle do peso

Prática regular de atividade física ● Cumprimento de programação vacinal ● Abolição do tabagismo

Controle rigoroso da pressão arterial Medicamentos

antiateroscleróticos

● Estatina ● Antiplaquetário

● Atenuadores do sistema renina- angiotensina (IECA/BRA) Medicamentos antianginosos ● Betabloqueadores ● Antagonistas do cálcio ● Nitratos ● Trimetazidina

Revascularização miocárdica ● Intervenção coronariana percutânea● Cirurgia de revascularização miocárdica

BRA: bloqueador do receptor de angiotensina; IECA: inibidor da enzima conversora da angiotensina.

Indicação de revascularização nos idosos assintomáticos

Acentuada carga isquêmica RecomendaçãoGrau de EvidênciaNível de Intervenção percutânea IIa C

Cirurgia IIa C

Avaliação diagnóstica de coronariopatia crônica no idoso

Método Aspectos positivos Possíveis limitações Grau de recomendação Nível de evidência ECG Detecção de zonas inativas, Fácil obtenção.

distúrbios de condução Pouca acurácia I B Teste ergométrico Acurácia moderada na detecção de Disponibilidade.

isquemia

Dificuldades locomotoras Alterações electrocardiográficas no

ECG de repouso I B

Eco de estresse (dobutamina, esforço ou dipiridamol)

Detecção e avaliação da extensão da isquemia. Avaliação de função de VE

Janela ecocardiográfica.

Custo I B

Cintilografia

Detecção e avaliação da extensão da isquemia. Independe de alterações eletrocardiográficas preexistentes. Avaliação de função de VE Menor disponibilidade. Custo I B

Angiotomografia de coronárias Detecção de obstruções Calcificação no idoso diminui acurácia do diagnóstico IIa B Angiorressonância magnética

de coronárias Detecção de obstruções Menor Acurácia. Dificuldades de obtenção IIb C Ressonância magnética

cardíaca Áreas de fibroseFunção de VE Dificuldades de obtenção IIb C

ECG: eletrocardiograma; VE: ventrículo esquerdo.

Recomendações para medidas gerais e uso de antiateroscleróticos Procedimento/medicamento recomendaçãoGrau de Nível de evidência Alimentação balanceada I A

Controle de peso I B

Atividade física I B

Vacinação contra influenza I B Abolição do tabagismo I A Controle da PA < 140 mmHg I A Controle da PA < 120 mmHg IIa B Estatinas I A Antiplaquetário I A IECA/BRA I A

BRA: bloqueador do receptor de angiotensina; IECA: inibidor da enzima conversora da angiotensina; PA: pressão arterial.

Indicação de revascularização nos idosos anginosos refratários ao tratamento clínico

IPC - Pacientes com angina recomendaçãoGrau de evidênciaNível de IPC factível de fácil aplicação I C

Escore Syntax baixo I B

Escore Syntax elevado IIb B Cirurgia – Pacientes com angina recomendaçãoGrau de evidênciaNível de Multivascular de baixo risco cirúrgico I B Escore Syntax baixo a moderado e alto risco

cirúrgico IIb B

IPC: intervenção percutânea; Syntax: Synergy Between Percutaneous Coronary Intervention with Taxus and Cardiac Surgery.

Recomendações para antianginosos

Medicamento recomendaçãoGrau de Nível de evidência

Betabloqueador I A

Antagonista de cálcio IIa B Nitrato para crises anginosas I A Nitrato para uso crônico IIb B

Trimetazidina IIa B

Ivabradina IIa B

No documento Artigos Volume - ABC Cardiol (páginas 190-192)