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2. ENCRUZILHADA: Arte – Vida – Corpo – Criação

2.2. CORPO (EM) PROCESSO (EM) CRIAÇÃO

A proposta de um registro do processo de criação em dança foi algo que sempre me instigou durante o curso de graduação, além disso as experiências corporais vivenciadas paralelamente ao longo desse trajeto provocaram a necessidade da ênfase no registro do processo criativo, prevendo que este percurso é um caminho de conhecimento sensível.

O registro processual faz-se necessário, uma vez que, na grande maioria das vezes, a elaboração estética final é vista como único objetivo a ser alçando no processo de criação, e assim, o percurso se liquefaz, sobre isso Louppe (2012) discute a ideia da obra coreográfica e processo, destacando a riqueza e diversidade dos processos de composição do trabalho coreográfico, em detrimento apenas de seu resultado apresentado, o espetáculo.

Os entrelugares ou encruzilhadas de um processo criativo mostram-se como um lugar exponencial de produção de conhecimento. Nesse percurso, a ideia do corpo (em) processo (em) criação é observado e refletido sobre a experiência sensível como produção de conhecimento, em consonância com a reflexão da pesquisadora de dança Mônica Medeiros Ribeiro:

Tomando a perspectiva da primeira pessoa, do sujeito que experiencia a dança que dança, ou a do observador que dança neuralmente junto com o observado, porém de maneira invisível aos olhos de quem vê, pesquisar o movimento na dança, ou a dança como manifestação política, como ato performativo, cinestésico, empático, fenomenológico, antropológico, de comunicação, é promover percepções-ações compartilhadas. E no entre, no encontro entre o fazer, pensar e o sentir, entre o olhar e o fazer, que se dá a possibilidade de interceptar o gesto do conhecimento (RIBEIRO, 2012, p. 81).

O trabalho coreográfico constitui um observatório ideal da flutuação indentitária da obra de arte em nossa época, m que esta “é determinada não tanto pela sua concepção, mas pelos seus contornos, características, local onde se encontra (o que remete também a uma origem)” (LOUPPE, 2012, p.331). No desejo de compreender o processo criativo, a partir de

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registros desse percurso trilhado, lanço mão das ideias de Salles (2011; 2008; 2006), principalmente as que demonstram existir um meio de escavação de documentos que revela preciosidades do método, mostrando o forma de criação, fruto de muito esforço e trabalho num sistema de organização muito relacionado ao que é o processo e obra.

As fontes autobiográficas estão constituídas pela história de vida, relatos das disciplinas, cursos, oficinas, anotações gerais, cadernos de criação, fotografias, videografia, bibliografia produzidos pelo autor e o próprio texto, pois solidifica-se, nessa construção, o pensamento em primeira pessoa de modo relacional, em diálogo com o mundo, bem como o que nos diz Salles (2008):

O acompanhamento do processo permite-nos falar de um autor (ou autoria) que se constitui na relação com os outros. De dentro das redes da criação retiramos, portanto, essa visão de autoria em uma perspectiva relacional, não centrada em um indivíduo isolado (SALLES, 2008, p.111).

Prevendo, dessa maneira, o registro processual de uma metodologia de criação autoral e relacional, a presente dissertação expõe as etapas percorridas no levantamento de experiências e reflexões artísticas sobre o corpo, no caminho de um aprendizado sensível, mas também “estudar como o artista/criador constrói e representa seu corpo” considerando-se que esta “é uma forma de apreender o pensamento deste, que cria sentidos através de movimentos e que, em sua prática, reconceitua o corpo” (SIQUEIRA, 2006. p. 93).

É através do corpo que busco produzir conhecimento, corpo íntegro, em sua unidade, longe do primado da razão, sobre a percepção e ação e da segmentação psicofísica, uma vez que, através da percepção, integramo-nos ao mundo por meio de nossos corpos e sentidos. A percepção é um universo exploratório infindável porque o mundo sensível é um pólo inesgotável de experiência.

Seguindo essa perspectiva, afirmo, com convicção, que o conhecimento não está essencialmente contido numa folha de papel A4, mas, sobretudo no corpo, na complexidade das experiências vivenciadas. De acordo com Ramos (2010), o corpo seria uma existência única, com suas dificuldades e virtudes próprias. É o corpo próprio, isto é, uma organização

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vivente que expressa alguém em cada um de seus movimentos, não apenas como atividade mental, uma vez que se evidencia que o pensamento também é corpo.

Com isso, o processo criativo estará mais à frente exposto, em suas tessituras, norteando um caminho de dissolução de fronteiras (MOURA, 2011), entre saberes corporais, linguagens artísticas, histórias de vida e experiências; saberes informais, que propõem um caminho de conhecimento sensível marcado por características que imperam na contemporaneidade e colocam o artista/pesquisador em zonas instáveis, em entrelugares, e o provocam constantemente para novas experiências, nas quais afeta e é afetado em suas relações com o mundo.

A seguir, apresento uma perspectiva do corpo como produção de conhecimento. Na sequência, analiso o espaço de formação do corpo (em) processo (em) criação a partir de uma perspectiva de processos já vivenciados, possibilitando assim uma autorreflexão como ponto desestabilizador das questões epistemológicas sobre as artes da cena.

Corpo e produção de conhecimento

Os estudos contemporâneos sobre o corpo vêm suprir uma lacuna que, com efeito, o racionalismo moderno inviabilizou e a sociedade contemporânea, muitas vezes, segue para um mesmo caminho. Em nossos dias, e, no ocidente, foi a fenomenologia que, retomando o tema do corpo, restabeleceu importância deste na compreensão da realidade do eu. “Invocar o corpo fenomenológico representa um deslocamento dos elementos estruturais para as maneiras como ele é vivido e experienciado, e para um engajamento prático com o mundo” (ORTEGA, 2008, p. 210).

O século XX assistiu ao florescimento de um enorme interesse pelo estudo do corpo, sendo o filósofo Merleau-Ponty (2011), sem dúvida, quem elegeu o corpo próprio como uma questão filosófica. Com base em tal perspectiva, a presente pesquisa apropriou-se desse conceito, que propõe um lugar onde “ser corpo [...] é estar atado a um certo mundo, e nosso

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corpo não está primeiramente no espaço: ele é no espaço” (MERLEAU-PONTY, 2011, p. 205).

Orientando-se nessas ideias, de que o corpo não está primeiramente no espaço, ocupando-o, ou seja, ele é o próprio espaço no sentido de que funda as referências para a percepção deste mesmo espaço, enxergo-o como produção de conhecimento, em que a ideia de “inteireza”, apresentada por Klauss Vianna (2005), sintoniza-se com o ser no mundo de Merleau-Ponty (2011) e esses conceitos produzem em mim, artista da cena, corpo-sujeito da encruzilhada, uma noção de corpo íntegro, como aquele que está inteiro no espaço como os corpos inseridos nas manifestações populares brasileiras ou em ambientes de não mecanização (ou docilização) corporal. O corpo íntegro, dessa maneira, expressar-se-á com maior disponibilidade, pois “[...] não estou diante de meu corpo, estou em meu corpo, ou antes, sou meu corpo” (MERLEAU-PONTY, 2011, p.205). Sendo um “corpo próprio” reconheço a natureza enigmática desse conceito, pois, para ele ser mais assertivo este não é reunião de fragmentos rígidos, universais, a qual permanecesse sempre igual, mas é em movimento, (em) processo e consigo ter uma dimensão do “de dentro para fora”.

Em acordo com Merleau-Ponty (2011, p. 143) “meu corpo pode ser considerado como meu ponto de vista sobre o mundo e também um dos objetos desse mundo” e, diante disso, o tomo a partir dessa perspectiva de um sujeito como “ser no mundo”, que é dissociado da ideia de corpo físico, fragmentado, que carrega dicotomias como corpo-mente, corpo- objeto. Essa dimensão do “corpo próprio” se mostra mais uma vez relacional ao que Klauss Vianna (2005) chamava de inteireza, sendo o conceito realizado no ato contínuo da existência, no fazer, na experiência e que se realiza em processo, que é vivo e dinâmico.

Um “corpo íntegro e expressivo” é, então, aquele que está conscientemente no espaço, percebendo-se continuamente, distante de uma ideia de corpo-objeto. Percebo, ao longo desse trajeto de pesquisa e de vida, que o corpo inserido na sociedade contemporânea, muitas vezes, tratado de maneira mecanicista opõe-se a esse “ser no mundo” que é aqui demonstrada. Percebo que a estrutura corporal está cada vez mais privada das experiências corpóreo-sensíveis do movimento, de sua propriocepção, que seria “o conjunto dos comportamentos perceptivos que concorrem para este sexto sentido que hoje recebe o nome

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de sentido do movimento ou cinestesia” (SUQUET, 2009, p. 515-516) e ainda preconiza a ideia de um corpo sensível e pensante, que vai ao encontro à minha ideia de integridade e expressividade como demonstra a autora:

Através da exploração do corpo sensível e pensante, a dança do século XX não cessou de deslocar e confundir as fronteiras entre o consciente e o inconsciente, o “eu” e o outro, o interior e o exterior. E também participa plenamente na redefinição do sujeito contemporâneo (SUQUET, 2009, p.537).

Desde este período, o início do século XX, a dança vem experimentando uma ideia de propriocepção de uma maneira mais engajada, principalmente a partir dos precursores da dança moderna13. No Brasil, destaco o percurso de Klauss Vianna, que de um modo mais

profundo, integra-se às ideias de Merleau-Ponty, considerando a relação mundo-eu (eu- mundo) e dessa dinâmica a reverberação da singularidade que fará de cada pessoa ser único e diferenciado.

Num destacado movimento nas artes cênicas brasileiras, nas décadas de 1980-90, Vianna (2005) demonstrou aptidão e engajamento para discussão de uma visão integrada do corpo, longe de seus dualismos. Assim, seria necessário conhecer o próprio corpo, saber que ele está conosco e perceber suas funções e configurações, nas quais o sujeito é seu próprio movimento.

O atual cenário da dança vem apresentando diversas estratégias para manutenção e desenvolvimento desta proposta. Novos processos, novas tecnologias, coletivos, produção e políticas culturais fomentam o crescimento dessa área. Uma das estratégias de sobrevivência em tal universo tem sido o artista solo com seus métodos de sobrevida artística, o que pode ser resultado da experimentação de singularidades poéticas do corpo, em que este pode ser visto como campo de produção conhecimento sensível.

Louppe (2012) vem afirmando que, desde a década de 1980, há uma perda das linhagens que se definiam por ligarem a elaboração de um estado de corpo com o conjunto de princípios estéticos e filosóficos de um grande criador, não só de espetáculos, mas também de

13 Loïe Fuller, Isadora Duncan, Ted Shaw, Ruth Saint Denis, Martha Graham, Mary Wigman, Doris Humprhrey,

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corpos. A perda dessas linhagens encontra-se no surgimento dos fenômenos de mestiçagem e hibridação, distintos, porém relacionados. Na mestiçagem, há a mistura de fontes culturais, interpenetração das formas e dos gêneros artísticos, a mistura de sangue ou de raças criando sujeitos mistos, não modificados em sua estrutura, mas enriquecidos pela acumulação de diferentes heranças genéticas ou culturais.

Quando as condições favoráveis ao ecletismo encontram-se presentes, tais como poder escolher entre opções diferentes, e perambular de uma a outra, surge então um corpo eclético. Sua relação com o mundo ocorre por meio de uma sucessão extremamente complexa de mediações. A aquisição consciente de suas ferramentas simbólicas se faz através de uma lenta infiltração corporal, em um processo de longa aprendizagem, no qual o trabalho investigativo em dança pode e deve tornar clara a articulação dessas mediações, abrindo caminho para o livre funcionamento e aperfeiçoando potencial filosófico e poético deste.

Na dança contemporânea, situada na pós-modernidade, surge a necessidade de adaptação às configurações do fragmentado mercado da dança que faz com que estejamos engajados em diversas frentes de trabalho, não construindo, de modo tradicional, um repertório, mas de modo fragmentado, assim como a ideia de cultura de mosaico apresentada por Hall (2011) e explicitada por (SANTOS, 2008, p. 85 apud SANTANA, 2011, p. 31):

No paradigma emergente, o carácter autobiográfico e autoreferenciável da ciência é plenamente assumido... Para isso é necessária uma outra forma de conhecimento compreensivo e íntimo que não nos separe e antes nos una pessoalmente ao que estudamos... [afinal] nossas trajectórias de vida pessoais e coletivas (enquanto comunidades científicas) e os valores, crenças e os prejuízos que transportam são a prova íntima do nosso conhecimento. Falar de mim, então, não é uma ideia ensimesmada já que estou no mundo. É o meu ponto de vista sobre o mundo, é uma visão do mundo e o próprio mundo. Falo de um corpo próprio, vivido e pensado, como sujeito no mundo, corpo-sujeito. Procuro, dessa maneira, me reconhecer no e pelo corpo, trançando um desprendimento disciplinar que o domestica – uma armadilha comum na dança. É, então, partir da minha voz marginal, das experiências de vida deslocadas, das pesquisas e dos contatos com espetacularidades das culturas populares, à margem social e geográfica, que venho elaborando meu discurso coreográfico. Ciente do papel

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e da história do corpo, principalmente afastado de uma visão cartesiana e positivista, alinhavo esse caminho integrando identidade e autobiografia num corpo ficcional.

O texto que vem em sequência trata da formação desse corpo (em) processo, deixando evidente a formação desse sujeito, bem como elucidando a potente possibilidade de pensar o corpo em constante curso de contaminação e também desestabilização.

(em) processo (em) criação: um espaço formativo

Perceber o corpo como produção de conhecimento, necessariamente, implica numa busca complexa e que exige estudos indisciplinares, segundo Greiner (2005), uma vez que corpo é interface entre universo individual e o social. Esta busca no presente projeto deu-se no tom da ancestralidade, pois esse movimento, no período da graduação, levou-me a estabelecer uma relação muito próxima com a manifestação de Folias de Reis, na qual pude escavar resquícios da memória pessoal e coletiva.

A busca pela identidade foi a tônica no ingresso no curso de graduação em dança (2006 – 2010). Em meu caso, oriundo de outras experiências corporais não legitimadas na área, como as danças populares e único homem ingressante na turma, o que me levou a contatar mais fundo minhas origens, rever e organizar procedimentos que trouxesse legitimidade ao meu corpo, numa caminhada que integra técnica e estética, ou seja, como os procedimentos técnicos-criativos mencionados e elaborados por Mundim (2013).

Nesse sentido, ancoro também relação com o pensamento do Professor Boaventura de Souza Santos, da Universidade de Coimbra – Portugal, sobre as Epistemologias do Sul e do Norte. Há saberes hegemônicos dominantes e precisamos atentar para epistemologias alternativas que desestabilizem paradigmas e privilegiem o singular, novos modos de fazer. Santos (2010) critica, então, a epistemologia positivista enquanto paradigma dominante nas Ciências, propondo a existência de uma crise nessa perspectiva epistemológica, entretanto, acompanhada da emergência de um novo paradigma.

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As Epistemologias do Sul, defendidas por Santos (2010), não são necessariamente geográficas, e sim, no sentido de perceber o discurso dominante e o dominado – pelo capitalismo, pela sociedade patriarcal e colonialismo. Assim sendo, o pesquisador defende a ideia da interdisciplinaridade. Ou seja, uma ruptura para o conceito de disciplina, como compartimento fechado e isolado, torna-se necessária. A sociedade apresenta uma multiplicidade complexa de vozes que chegam ao sujeito ditando ordens, regras, modelos, padrões, conceitos e ideias, e que, a partir do caminho da interligação e inter e/ou transdisciplinaridade, é possível viabilizar uma reorganização deste. Assim, temos a interdisciplinaridade criando novas realidades, já estas que nascem da proposição de novos objetivos, de novos métodos, cuja tônica primeira é a supressão do monólogo vazio e a instauração de dialogias, traço evidente do processo sobre o qual lançarei o olhar na segunda parte, as tessituras da criação e produção do espetáculo Ô de Casa? Ô de Fora! ou a história do

homem que pediu uma Folia à Pombagira Cigana, de minha autoria e direção de Grácia Navarro.

Greiner (2005) nos traz uma trama de referências sobre o corpo e aproxima alguns pensamentos ao aqui exposto. A autora retoma, depois de apresentar alguns estudos sobre a evolução da teoria do corpo, a importância de Merleau-Ponty para as pesquisas acerca deste e a não dicotomização corpo/mente. Na obra são trazidas referências de como se pensa o corpo no oriente e, ancorando discussão para pensar o corpo, propondo aproximações, tensões, entrecruzamentos e diálogos, além da problematização da questão do treinamento e formação do artista.

Tessituras diversas de caminhos para criação põem em questão práticas cristalizadas, o que exige revisões críticas e criativas dessas mesmas práticas estabelecidas. A perspectiva pós-colonial, que surge mais recentemente, parte da ideia de que a partir das margens ou das periferias, as estruturas de poder e de saber começam a se tornar mais visíveis. É desse modo que Greiner (2011) comenta que surge interesse por epistemologias deslocadas do eixo dominante e determinista e apresenta o trabalho do indiano Homi Bhabha (2013) e outros autores periféricos, que vislumbram uma nova perspectiva de geopolítica do conhecimento capaz de questionar quem o produz, em que contexto e para quem.

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Bhabha (2013) explicita a existência de um entrelugar do rompimento da noção de disciplina para aparecimento de novas formas de se pensar o mundo e nossas relações. Os valores modernos de liberdade, igualdade e solidariedade continuam fundamentais até hoje, mas foi preciso inventar uma emancipação social que contemplasse o que Santos (2010) identifica como “uma epistemologia do sul”, entendendo o sul como uma metáfora para o sofrimento humano causado pelo capitalismo, cuja urgência maior seria ir além da teoria crítica produzida pelo Norte e sua respectiva práxis social e política.

A partir do que já observei, dimensiono que a construção de conhecimento pode ser produzida em processo, em que, coloco-me em cheque a partir da própria experiência. “Não se trata mais de comparar o que acontece na cena como um modelo dado anteriormente, mas de analisar e identificar as trocas singulares que são testadas durante o processo de criação coreográfica, entre os dançarinos e o ambiente onde se expõe” (GREINER, 2009, p. 01). Nesse trajeto, há evidencias de construção de identidade nos rastros, nas escolhas, nos direcionamentos, no posicionamento e no discurso que se tornam cena.

Uma multiplicidade de topologias pode ser abordada para o estudo do processo de criação e, neste caso, recuso a padronização, pois vale lançar mão das singularidades e das experiências como ponto desestabilizador das questões epistemológicas sobre as artes da cena. Aqui, a experiência é abraçada como posição metodológica e o sentido de originalidade abandona noções de bases rígidas. Segundo Ribeiro “... o processo e o estar na experiência do estudar se sobrepõem à necessidade de resultados, sem excluí-los” (2013, p. 76).

Nesse caminho, de construção de conhecimento através da experimentação artística, e, para compreender esse espaço formativo, a partir do corpo (em) processo (em) criação, as ideias de Salles (2011; 2008; 2006) parecem reforçar a legitimação do processo de produção de conhecimento presente no percurso criativo, pois este “[...] processo criador revela diferentes procedimentos cognitivos, envolvendo gestos os mais diversos para se alcançar esse conhecimento” (SALLES, 2011, p.127).

O saber aqui não é mercadoria de troca da sociedade capitalista, ou seja, ligado essencialmente à ciência e a tecnologia, é conhecimento sensível como diz Duarte Jr. (2001) e “remete à nossa percepção do mundo, numa referência aos ‘órgãos dos sentidos’ e também

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àquela faculdade que, supõe-se, possuímos e os transcenda: nosso ‘sexto sentido’, que aponta uma intuitiva capacidade de conhecer” (DUARTE JR, 2001 apud SANCHÉS, 2010, p. 47).

No caso desta pesquisa, o corpo, lugar de entrecruzamentos, na encruzilhada, pode-se notar como propenso sempre ao diálogo, à emancipação e à elucidação de um dialogo autoral, híbrido, que promove ações de comunicações, gera um fluxo contínuo e inter-relacionado entre a ação e reflexão e numa postura clara de onde se fala. Nesse lugar, o corpo, (em) processo (em) criação é um espaço inter ou transdisciplinar de formação, longe dos dualismos, que entende as especificidades de quem está nesse processo. Assim, será viável gerar uma possibilidade autêntica de pensar nas vicissitudes de um corpo brasileiro em estado de criação que gera conhecimento nas encruzilhadas dos processos instaurados.

Este é o caso da minha formação artística, (em) processo. Nos espaços dessas encruzilhadas criativas, no encontro com diversos artistas, no diálogo com linguagens, na inquietude do estado de criação, no desejo de me posicionar diante do mundo artisticamente enxergo esse lugar como um mecanismo para desestabilizar dispositivos cristalizados e repensar uma proposta autoral, autêntica, que advenha das especificardes e conflitos individuais e no exercício da alteridade. Assim aconteceu com os processos instaurados entre, 2006 a 201414, longe da ideia ensimesmada, mas de um corpo-sujeito dialógico que foi

construído nesse caminhar.

A seguir, revejo um singular trajeto de formação em dança através do ingresso um universo formal da academia, por meio do curso de graduação em dança e das experiências dialógicas e processos instaurados, reforçando a premissa do corpo como produção de

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