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Correntes estéticas que influenciaram este movimento 57 ,

2. O cinema marginal e Rogério Sganzerla

2.3. Correntes estéticas que influenciaram este movimento 57 ,

O Cinema Novo buscava construir um mundo novo através da política, ainda subordinado de certa forma à questão estética. Suas fontes foram principalmente os cineastas Luchino Visconti, Luis Buñuel e Akira Kurosawa (mestres de uma escrita clara e direta, à beira do classicismo). Outros diretores, como Roberto Rosselini e François Truffaut, também foram importantes fontes de inspiração de cineastas específicos e semimarginais.

As origens dos diretores do ciclo Marginal são bem diferentes. Embora a maioria fosse ou se declarasse politicamente progressistas, sua preocupação principal sempre foi à subversão da linguagem cinematográfica. Os marginais surgiram durante o governo militar (diferente dos cinemanovistas, formados no período democrático de Juscelino).

Como a estrutura cinematográfica do Cinema Moderno, a estrutura do Cinema marginal é fragmentária, incompleta, barroca. Os filmes tendem a ser uma sucessão de quadros independentes e momentos privilegiados sobre alguns personagens em um momento importante de sua existência. A integração de estilos diferentes num só filme rompe ao antigo conceito de estilo irreversível e totalitário (SGANZERLA, 2001).

Em entrevista para Alfredo Sternheim, Revista “Filme Cultura” (1967), o cineasta Luiz Sergio Person fala sobre uma característica do cinema paulista, onde cada um tem um cinema desvinculado do outro:

Todo autor, aqui, busca um tipo de cinema que consciente ou inconscientemente leva a uma pesquisa, a uma temática diversa de outro realizador. Não há – eu diria uma unidade – mas, uma certa equivalência de ideias, de aspirações, alguma coisa que pudesse ser o elemento comum de definição do cinema paulista. Todos eles o são na medida que se encontram marginalizados e através dessas individualidades diversas, de objetivos contrários, formam um todo. A Margem, por exemplo, é um filme inesperado, totalmente diverso de tudo o que já se fez aqui em São Paulo, da mesma forma que São Paulo S.A, creio, e alguns outros (MORAES, 2010, p. 468).

Segundo João Carlos Rodrigues, as influências do Cinema Marginal parecem vir de Jean-Luc Godard (“Pierrot Le fou” de 1965, “La chinoise” e “Weekend”, ambos de 1967); dos neo-expressionistas americanos do cinema B; e das Chanchadas

(humor ausente no Cinema Novo anterior a Macunaíma19). E da literatura de Oswald

de Andrade, Jorge Mautner, José Agrippino de Paula; da arte conceitual de Hélio Oiticica; da música popular de Mário Reis à Tropicália, passando por Jimi Hendrix; do teatro de Zé Celso. Tinham também entre si diferenças estéticas, fáceis de confirmar se compararmos o cinema agitado de Sganzerla e Trevisan com os constantes silêncios da obra de Bressane e Candeias (PUPPO, 2001).

Na cena final do filme “O Bandido da Luz Vermelha” a guitarra de Jimi Hendrix une-se ao som do candomblé, usado no filme “Terra em Transe” de Glauber Rocha, e assim Ismail Xavier expõe:

No final, a presença-chave do som de Jimi Hendrix, justaposto ao candomblé, define o reconhecimento de uma parcela da nova geração cujo movimento de globalização da experiência teve como via, não a Universidade mas a cultura eletrônica da mídia, a vertente do rock no momento de sua utopia antiautoritária de final da década (militância política e rock não eram excludentes, mas a parcela da juventude focalizada em

Terra em Transe era ciosa de sua alteridade face à cultura jovem veiculada

pela mídia) (XAVIER, 1993, p.111).

A relação do cinema americano com o Cinema Marginal é nitidamente mais forte em São Paulo do que no Rio de Janeiro. O cinema japonês, o qual os cineastas tinham acesso nos cinemas de colônia no bairro da Liberdade, também são citados como grande inspirador. Os cineastas americanos Samuel Fuller, Orson Welles e Alfred Hitchcock, Nicholas Ray, são louvados e plagiados pelos marginais. O filme “O Pornógrafo” de João Callegaro, é recheado de citações do cinema americano, e pode-se ainda arriscar esta influência, na maneira de vestir de alguns personagens, como mostra a figura 28.

A forma pela qual o Cinema Marginal se apropria da narrativa clássica é a “citação”, a inserção de trechos inteiros característicos de outras obras dentro da estrutura do filme. Ou a assimilação é realizada através do retrato, de forma estilizada, do universo da ficção próprio da narrativa clássica: a fotografia, a trilha musical, cenários, personagens.

No ciclo Marginal ocorre a verticalização da narrativa, a exploração de situações dramáticas sem que haja preocupação em relacioná-las com outros momentos, posteriores ou anteriores, da ação. A narrativa elabora a ficção sem se preocupar com a disposição espacial ou temporal.

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Figura 28 - Cena do filme “O Pornógrafo”, de João Callegaro, 1970.

Fonte: RAMOS, 1987

Rogério Sganzerla no texto “Divisibilidade” de 1980 comenta sobre a narrativa no Cinema moderno:

O Cinema Moderno recusa todo desenvolvimento lógico da narrativa: a organização de elementos combinados, dependentes, integrados pela conclusão final e através da qual desenvolvem-se outras personagens gradualmente reveladas em toda sua complexidade, através de frases narrativas; jogos de ação/reação entre os personagens (SGANZERLA, 2001, p.65).

A atração por cineastas e produções classe “B”, pelo estilo kitsch, se desenvolve no sentido de criticar a linha “esteticista” do Cinema Novo. Rogério Sganzerla diz em entrevista ao jornal “O Pasquim”, que dentre toda a obra de Orson Welles, ele prefere o filme “O Estranho” (figura 29), “que eu não vi mas dizem que é horroroso (...) um filme que em vez de estar baseado no luxo e no equilíbrio do Cidadão Kane, está baseado na miséria, na escrotidão dos atores, na diferença de qualidade, de técnica, de negativo” (RAMOS, 1987, p.76).

Figura 29 - Cena do filme “O Estranho”, de Orson Welles, 1946.

Fonte: http://cinecafe.wordpress.com/2010/10/14/o-estranho-orson-welles-1946/

A Pop Art também tem grande influência nos filmes deste ciclo, principalmente na obra de Rogério Sganzerla. Na década de 60, os artistas defendiam uma arte popular (pop), com comunicação direta com o público através de signos e símbolos retirados do imaginário que cerca a cultura de massa e a vida cotidiana. A Pop Art acrescentava ao seu repertório, cenas das histórias em quadrinhos, da publicidade, das imagens televisivas e do cinema.

Os principais expoentes deste movimento no mundo são Richard Hamilton, Andy Warhol, Roy Lichtenstein, Tom Wesselmann, entre outros. No Brasil, sugestões foram trabalhadas por Antonio Dias, Rubens Gerchman e Cláudio Tozzi.

Na esfera cinematográfica, o impacto da Pop Art dependeu muito da influência de Andy Warhol, ocorrida a partir de 1964, o que elucidava uma atenção maior à vertente Pop do cinema experimental.