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28 3 DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, DESIGUALDADE E JUSTIÇA AMBIENTAL

3.4 Crítica e denúncia das desigualdades ambientais: o olhar da “Justiça Ambiental”

Parece que o tema da desigualdade ambiental, na forma como se expôs, tem uma relação direta com a desigualdade social. Nesse sentido, Acselrad et al. (2009, p. 76 – 77) entendem que

(...). A desigualdade social e de poder está na raiz da degradação ambiental: quando os benefícios de uso do meio ambiente estão concentrados em poucas mãos, assim como a capacidade de transferir ―custos ambientais‖ para os mais fracos, o nível geral de ―pressão‖ sobre ele não se reduz. Donde, a proteção do meio ambiente depende do combate à desigualdade ambiental.

Pensar a superação da desigualdade ambiental, seja na sua esfera que diz respeito à apropriação dos bens ambientais, seja na que se refere à transferência das consequências negativas (riscos e danos ambientais), passa pela junção de ―justiça social‖ e ―proteção ambiental‖: de tal articulação, tem-se que a proteção dos mais fracos viabilizaria um cessar na pressão destrutiva sobre o ambiente de todos. O conteúdo dessa argumentação leva à noção de ―justiça ambiental‖.

Na dinâmica dos Estados Unidos, o ―Movimento por Justiça Ambiental‖ surgiu nos idos dos anos 1980, tomando por base estudos que evidenciaram que a distribuição dos riscos ambientais, notadamente vinculados à disposição do lixo tóxico e perigoso, no referido país, não ocorria de modo aleatório, mas acompanhava a distribuição territorial das populações de baixa renda e dos grupos étnicos12 (ACSELRAD et al., 2009, p. 15, 18 e 19). Por isso que, no contexto estadunidense, ―injustiça ambiental‖ foi a terminologia consagrada para denominar o

industrialista de progresso; (ii) privatização do uso do meio ambiente comum, notadamente o ar e a água, haja vista os efeitos adversos em tais bens ambientais, decorrentes da procura por lucros crescentes ("acumulação intensiva"), baseados na intensificação do trabalho, e na aceleração da produção, o que muitas vezes chocou-se com o ritmo da regeneração dos referidos bens. (ACSELRAD et al., 2009, p. 121 – 123).

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Nesse sentido, está Liu (1997), que reflete sobre a referida temática da distribuição desproporcional dos riscos ambientais em bairros americanos de minorias e de pobres.

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fenômeno que ocasiona a imposição desproporcional dos riscos ambientais às referidas populações menos favorecidas. (ACSELRAD et al., 2009, p. 9).

No âmbito da sociedade civil norte-americana, a emergência do Movimento por Justiça Ambiental realizou um duplo deslocamento: por um lado, promoveu uma aproximação do movimento pelos direitos civis com as questões ambientais a partir da explicitação de que também nesse campo não-brancos eram penalizados; por outro, despertou as entidades ambientalistas tradicionais para as lutas contra a desigualdade. (ACSELRAD et al., 2009, p. 24).

Ainda no cenário norte americano, certas condições, como saneamento inadequado, contaminação química de locais de moradia e trabalho, utilização do solo para instalação de depósitos de lixo tóxico e perigoso, de incineradores, sobremaneira porque vinculadas à distribuição espacial de populações negra e de minorias, como mencionado, constituíram-se como temáticas de lutas de base que objetivavam que tais ―iniquidades ambientais‖ fossem superadas, fazendo com que na busca pelos direitos civis das referidas populações, a justiça ambiental fosse colocada como questão central.

Pela afinidade em apontar que a utilização dos bens ambientais, bem como a exposição desigual ao risco ambiental, atingem negativamente os mais despossuídos, à concepção cultural da questão ambiental pode-se vincular a estratégia da justiça ambiental.

Contra o pensamento dominante, que considera ―democrática‖ a distribuição dos riscos ambientais e que se atém ao tema da escassez e do desperdício, consagrando o mercado como mecanismo por excelência para regular as questões do meio ambiente, insurgiram-se os movimentos por justiça ambiental. (ACSELRAD et al., 2009, p. 14) (grifado).

Conforme Acselrad (2010, p. 111), no Brasil, o surgimento da noção de ―justiça ambiental‖ atrela-se à criatividade estratégica dos movimentos sociais, que modificaram a configuração de forças sociais vinculadas às lutas ambientais e, em determinadas circunstâncias, acarretaram mudanças no aparelho estatal e regulatório responsável pela proteção ambiental.

Ainda de acordo com o mesmo autor13, as entidades que, no Brasil, a partir dos anos 2000 passaram a associar suas práticas à noção de justiça ambiental,

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Considera-se oportuno enfatizar que as reiteradas menções a esse autor (Acselrad) se dão porque o mesmo se constitui em uma liderança intelectual no campo da desigualdade e justiça ambiental.

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certamente estariam no grupo do ecologismo contestatário. Por isso que, no país, a noção de ―justiça ambiental‖ vinculou-se fortemente a uma busca de ressignificação da questão ambiental, para a construção de futuros possíveis, por atores que lutavam por justiça social, e pretendiam fugir da exclusão ou integração subordinada imposta pelos agentes fortes no mercado mundial, e fazer dos seus ambientes um ―espaço de construção de justiça e não apenas da razão utilitária do mercado‖ (ACSELRAD 2010, p. 115), tentando, pois, resistir à chantagem locacional14 dos empreendimentos, e dispondo-se a verificar as condições em que se pretendia fossem as populações locais15 integradas às grandes corporações.

No Brasil, houve, então, uma ampliação do conceito de justiça ambiental, ―de modo a ultrapassar meramente as questões raciais e de localização de riscos provenientes de origem química presentes no debate norte-americano‖ (CARTIER et al., 2009, p. 2695). Acselrad et al. (2009, p. 146) enfatizam:

Assim, as lutas por justiça ambiental, tal como caracterizadas no caso brasileiro, combinam: 1 A defesa dos direitos a ambientes culturalmente específicos – comunidades tradicionais situadas na fronteira de expansão das atividades capitalistas e de mercado. 2 A defesa dos direitos a uma proteção ambiental equânime contra a segregação socioterritorial e a desigualdade ambiental promovidas pelo mercado. 3 A defesa dos direitos de acesso equânime aos recursos ambientais contra a concentração das terras férteis, das águas e do solo seguro nas mãos dos fortes interesses econômicos de mercado. (...).