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Críticas ao Trabalho Experimental feito nas Escolas

CAPÍTULO 1 ENSINO DAS CIÊNCIAS

8. O Trabalho Experimental e as Ideias Conceptuais dos Alunos e Professores No que se refere à compreensão conceptual dos alunos em Ciência,

8.3. Críticas ao Trabalho Experimental feito nas Escolas

Ao longo do tempo muito se tem debatido sobre a natureza e propósitos do Trabalho Experimental de laboratório. Constata-se que vários autores consideram que muito desse trabalho é estéril (Woolnough, 1994), ineficaz, não traduz a actividade científica real e é inibitório de que muitos alunos sigam uma carreira científica (Woolnough, 1991). As actividades de laboratório nem sempre são realizadas da melhor forma. Muitas críticas se têm feito a este tipo de prática, baseando-se na pouca exigência das actividades propostas aos alunos. Critica-se ainda a abordagem do tipo “receita” para ensinar os processos da Ciência (Woolnough e Allsop, 1985). Com este tipo de trabalho laboratorial, realizado nas aulas de ciências, os alunos perdem oportunidades de aprender Ciência e podem dissipar o seu interesse pelo estudo da Ciência, dada a utilização incorrecta deste método de instrução. A maior parte dessas propostas permite manipulações, mas falta o desenvolvimento de elevados competências de investigação como a formulação de questões e hipóteses, o desenho de experiências, entre outros. Raramente existe uma ligação entre a teoria e a prática. O professor não faz Trabalho laboratorial ou, quando o faz, é parco, de rotina e não produtivo (Hodson, 1990, Woolnough, 1994). Utiliza-o para verificar ou descobrir um princípio, uma teoria, medir uma propriedade, elucidar, verificar (Woolnough, 1994).

Hodson (1992b), explica que o sucesso na aprendizagem da Ciência se deve ao que se faz (ou fazia) através desse tipo de Trabalho Experimental em sala de aula. Assim, aquele autor considera que:

™ Os exercícios práticos são feitos sem qualquer base teórica; ™ Pretende-se que o concreto se torne abstracto;

™ O trabalho laboratorial de manuseamento é muito extenso (ocupa muito tempo da aula), o que leva a um tempo de contacto passageiro com o conteúdo em causa;

™ Muitas vezes, o conteúdo é fornecido pelo professor, deixando pouco espaço para o aluno construir o seu significado pessoal;

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™ O trabalho laboratorial é visto como um meio de obtenção de informação ou dados meramente factuais;

™ Os alunos não são envolvidos no projecto e na planificação das investigações experimentais (é o professor que o faz), o que se traduz num trabalho com pouca utilidade do ponto de vista pedagógico;

™ Os alunos não só não possuem a teoria necessária e apropriada para a compreensão do que executam, como podem possuir outra teoria, diferente. Assim, vão proceder às observações no sítio errado e interpretá- -las de forma incorrecta;

™ Existem experiências que apenas servem para distrair os alunos dos conceitos teóricos importantes envolvidos e para inibir o seu pensamento criativo.

A investigação na área de Ensino das Ciências tem registado como um dado importante que os professores de Ciências do Ensino Secundário, na sua maioria, acreditam nas actividades experimentais como forma de proporcionar um conhecimento sólido aos alunos (Hodson, 1992b). Porém, as suas opiniões são desconcertantes acerca da função mais importante desse mesmo recurso de ensino e aprendizagem de ciências.

Os professores empregam a “experiência”, como algo normal, com a ideia de que servirá de meio para alcançar todos os objectivos de aprendizagem. Esta situação tem levado a um uso indevido dos trabalhos laboratoriais em muitos casos.

Desenvolver a destreza e as técnicas básicas de investigação são consideradas como essenciais para futuros cientistas e técnicos (Hodson, 1992b). Esses argumentos estabelecem que as razões da rejeição das práticas laboratoriais e da sua pouca eficiência, para promover a aprendizagem, devem ser procuradas na "sobrecarga teórica".

As práticas laboratoriais, da maneira como estão concebidas, parecem dificultar mais, quando deveriam ajudar a aprendizagem dos alunos. Por um lado, tem-se procurado alcançar todos os objectivos de aprendizagem por meio de uma

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mesma experiência e por outro, poucas são as ocasiões em que a potencialidade educativa das experiências é explorada. Numa mesma experiência é frequente pedir aos alunos que compreendam a natureza do problema e o processo experimental, que adoptem a perspectiva teórica relacionada com o tema de estudo que manejem o aparato em questão, que interpretem os resultados e escrevam o relatório da experiência, entre outros. Esta série de interferências faz que os estudantes às vezes, sofram uma “sobrecarga de informação” e sejam incapazes de perceber claramente o “sinal de aprendizagem”. Com base nestas observações, Hodson (1992b) sugere uma nova concepção de “trabalho experimental”. Este cientista insiste sobre a necessidade de definir um novo conceito, uma reorientação do Trabalho Experimental e uma melhor adaptação dessa actividade ao objectivo educativo.

Em Portugal os indicadores existentes estão longe de ser optimistas, a começar pela própria falta de percepção de um número substancial de jovens sobre a relevância de aprenderem Ciências. Por exemplo, de acordo com Cachapuz et al (1991), num estudo envolvendo 9089 alunos portugueses, estão naquela situação (no que respeita à Física / Química) 26% dos alunos inquiridos e cerca de 14% dos 3566 alunos no fim da escolaridade básica (9ºAno). Mais preocupantes, ainda, são as justificações por eles dadas, por exemplo: “são assuntos que só interessam a quem segue cursos científicos” ou “[...] é à base de cálculos e de experiências, o que não é importante para o nosso dia-a-dia”, ou, ainda, “não temos conteúdo para aplicar na vida de cada um” (Cachapuz et al 1991). Naturalmente, o que está em jogo não é o princípio de efectuar “os cálculos”, mas sim que faça sentido aos alunos porque os fazem.

Se o que se pretende com o Ensino Básico das Ciências é uma formação para todos (a maioria dos alunos nem sequer segue cursos de Ciências após a escolaridade básica), em que o essencial é entusiasmar (e não afastar os alunos pelo estudo das Ciências), ajudando-os a construir, através dele, novos significados sobre situações e fenómenos que lhes são já familiares, então têm pouco sentido uma boa parte dos objectivos e programas com que os professores

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actualmente são autoritariamente confrontados sem grande margem de manobra. O Ensino das Ciências no Ensino Básico deve partir dos problemas do dia- a-dia para a disciplina e não ao invés, isto é, explorando o conhecimento científico, para dar um novo sentido ao que “já se sabe” (conhecimento comum). E aos professores devem ser dadas formação e condições para implementarem tal inovação nas escolas. Disso depende em boa parte que os jovens portugueses, no final da escolaridade obrigatória, não sejam virtualmente ignorantes sobre questões centrais da sociedade tecnológica actual.

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