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Observações sobre as Práticas dos Professores

CAPÍTULO 2 – O PROFESSOR DE CIÊNCIAS

5. Práticas dos Professores

5.1. Observações sobre as Práticas dos Professores

Tendo em conta estes trabalhos de investigação sobre a problemática das relações entre as concepções e as práticas de ensino dos professores, há algumas

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vertentes que importa salientar.

Uma primeira vertente prende-se com a constatação de que, para muitos professores, há uma forte relação entre as suas concepções sobre a natureza da Ciência e as suas práticas de ensino, nomeadamente ao nível do modo como concebem e implementam as actividades de ensino e de aprendizagem nas aulas de Ciência.

Uma segunda vertente relaciona-se com a constatação de que existe também uma forte inter-relação entre as concepções de Ciência e as concepções de Ensino e de aprendizagem. Esta articulação entre estes dois sistemas conceptuais evidencia-se nomeadamente nos professores com uma determinada experiência profissional.

A terceira vertente a salientar prende-se com a natureza das relações entre as concepções dos professores e entre estas e as suas práticas não são relações directas, nem lineares, do tipo causa-efeito.

A esta ligação e os processos de feedback recíprocos que ocorrem entre as crenças e as práticas relacionam-se com a noção de “prática reflexiva”, tal como é definida por Schon (1992). Assim, nos profissionais reflexivos a “conversação” entre a prática e as crenças conduz à testagem, reavaliação e, se necessário, à reconceptualização em ambos os domínios.

Hodson (1993) refere que, mesmo quando os professores possuem uma perspectiva clara e coerente sobre a Ciência e a actividade científica, nem sempre planeiam as aulas experimentais de modo consistente com essa perspectiva, atribuindo maior importância a aspectos organizacionais ou de gestão e a outras actividades designadas para assistir à aquisição e desenvolvimento de conceitos. A existência de facilidades institucionais e estruturais não garantem, como sublinha Hodson (1993), boas práticas e bons resultados de aprendizagem, mas a sua ausência - como sejam os casos de deficiente material laboratorial, falta de suporte técnico, insuficiente tempo curricular, bem como constrangimentos do tipo de manuais de laboratório super-estruturados ou exigências prescritivas de exames práticos - pode condicioná-los fortemente.

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Outro problema que se levanta a nível da análise das relações entre as concepções e as práticas de ensino e, em particular, as práticas de Trabalho Experimental, está relacionada com as discrepâncias que se verificam entre o discurso e a prática. Relativamente a este problema, Hodson (1993) considera que estas incoerências são frequentes, nomeadamente ao nível das concepções que os professores têm de Trabalho Experimental e das práticas que estes realmente realizam na sala de aula. Refere, por exemplo, que os professores podem professar a crença da importância de Actividades Experimentais abertas centradas nos alunos e falharem redondamente na sua aplicação prática.

Além disso, as práticas dos professores em sala de aula são normalmente muito mais centradas em si mesmos do que aquilo que verbalizam, que dizem acreditar ou que os planos curriculares sugerem. Estas práticas traduzem-se na maioria das vezes, segundo Hodson (1993):

o em actividades que colocam os alunos na posição de ler, compreender e seguir as directivas experimentais do professor; manipular o material; o recolher os dados; reconhecer as diferenças entre os resultados obtidos

e os resultados que deveriam obter;

o interpretar esses resultados e fazer um relatório (muitas vezes numa linguagem obscura e impessoal).

Portanto, actividades em que não há uma exploração das ideias envolvidas, nem uma análise dos seus propósitos fundamentais e que conduzem a uma execução quase mecânica, passo por passo, das instruções fornecidas pelo professor com vista à obtenção da resposta certa, que se supõe emergir naturalmente se as instruções experimentais forem correctamente executadas.

Outra disparidade entre o discurso e prática, referida por vários autores, como por exemplo Hodson (1992b, 1993), observa-se ao nível da relação entre a perspectiva epistemológica professada e as experiências curriculares (como o trabalho experimental) que se privilegiam em sala de aula. Por exemplo, como refere Hodson (1993), um professor pode reconhecer que o conhecimento científico é socialmente construído e nas Actividades Experimentais que realiza

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ignorar esta dimensão de construção social do conhecimento científico. Assim, as Actividades Experimentais são concebidas pelo professor como um meio de conduzir os alunos a adoptar uma determinada perspectiva sobre um determinado conteúdo teórico, ou seja, como um meio de revelar significados de forma convincente e não como um elemento a ter em conta na negociação ou construção de significados. Em consequência, veicula-se implicitamente a ideia de que a teoria científica é um corpo de conhecimentos inquestionáveis, revelados e autenticados por observações infalíveis e experiências conclusivas e, portanto, a ideia de que o conhecimento científico é um conhecimento certo e acabado, gerado através de métodos infalíveis.

Uma ideia que se evidencia é a de que existe uma forte inter-relação entre as representações e as práticas. Assim, ao reconhecer-se a existência desta inter- relação é provável que o sentido que um professor atribui a trabalho experimental e o papel que lhe reconhece no processo de ensino e aprendizagem da Ciência se relacione com as suas perspectivas epistemológicas sobre a natureza da Ciência.

Outra ideia insere-se com a natureza destas relações e com o reconhecimento de que existem outros factores, ligados, nomeadamente, ao contexto escolar em que a acção do professor se desenvolve que interagem com estas relações.

Deste modo, parece plausível considerar que a forma como cada professor concebe e implementa o trabalho experimental seja determinada não apenas pelas suas teorias implícitas acerca da Ciência e do seu modo de produção, mas também pelas suas experiências, a sua interpretação do currículo, a forma como concebe a Educação e o modo como lida com os diversos constrangimentos institucionais.

Neste contexto, é também provável que nas relações entre as suas concepções de Ciência e de Trabalho Experimental e nas relações entre estas e as suas práticas de trabalho experimental em sala de aula ocorram conflitos e inconsistências.

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