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Criação, funcionamento e eficácia dos bancos de dados de perfis genéticos para fins de investigação criminal no Brasil

2 OS BANCOS DE DADOS DE PERFIS GENÉTICOS PARA FINS DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL NO BRASIL

2.1 Criação, funcionamento e eficácia dos bancos de dados de perfis genéticos para fins de investigação criminal no Brasil

Na sociedade atual, é evidente o surgimento de novas tecnologias a todo instante, e a necessidade constante de os cidadãos se adaptarem a elas. Afinal, quem não acompanha as novas tecnologias, tampouco delas conseguirá usufruir. Acontece que essas tecnologias se atrelam também ao Direito Penal. Ou seja, se o Direito Penal delas também não tomar partido, os criminosos continuarão cada vez mais criativos, e sem se importar com câmeras de vídeo monitoramento, por exemplo, e tampouco com a presença de autoridades policiais nas cidades brasileiras.

Desse modo, resta evidente que o Direito Penal brasileiro deve seguir no caminho de propiciar às autoridades policiais os meios necessários para combater a criminalidade, a qual assombra a sociedade atualmente.

Exatamente o exposto acima é que busca a Lei 12.654, de 28 de maio de 2012, ao alterar as Leis n.ºs 12.037, de 14 de outubro de 2009, e 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), para fim de prever a coleta de perfil genético como forma de identificação criminal.

Nesse sentido leciona Avena (2013, p. 173, grifo do autor),

a Lei 12.037, de 1.º de outubro de 2009, revogando expressamente a normatização ditada pela Lei 10.054/2000, disciplina, na atualidade, o procedimento da identificação criminal. A exemplo do que já previa a legislação anterior, o seu art. 5.º consagrou a identificação criminal como um gênero, da qual são espécies a identificação datiloscópica e a identificação fotográfica. Além disso, por força de alteração imposta pela Lei 12.654, publicada em 29.05.2012, com vacatio legis de 180 dias, o mesmo art. 5.º, agora em seu parágrafo único, passou a determinar que a identificação criminal, quando fundada na essencialidade às investigações policiais, assim reconhecido por decisão judicial (art. 3.º, IV, da Lei 12.037/2009), inclua, também, a coleta de material biológico para a obtenção do perfil genético do indivíduo.

Os anos de 2011 e 2012 foram decisivos para a aprovação da Lei n.° 12.654, de 28 de maio de 2012, que autoriza a coleta compulsória de material genético para fins de persecução criminal e regulamenta o banco de perfis genéticos para esse mesmo fim (SCHIOCCHET, 2012, p. 15). A razão de ser da norma pauta-se no alto índice de impunidade e crescente criminalidade no país, atuando a identificação por perfil genético como um novo instrumento para combater esse preocupante quadro nacional (PEREIRA, 2014).

A Lei dá as seguintes diretrizes:

Art. 1º O art. 5º da Lei 12.037, de 1º de outubro de 2009, passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo único:

“Art. 5º

Parágrafo único. Na hipótese do inciso IV do art. 3º, a identificação criminal poderá incluir a coleta de material biológico para a obtenção do perfil genético.”

Art. 2º A Lei 12.037, de 1º de outubro de 2009, passa a vigorar acrescida dos seguintes artigos:

“Art. 5º-A. Os dados relacionados à coleta do perfil genético deverão ser armazenados em banco de dados de perfis genéticos, gerenciado por unidade oficial de perícia criminal.

§1º As informações genéticas contidas nos bancos de dados de perfis genéticos não poderão revelar traços somáticos ou comportamentais das pessoas, exceto determinação genética de gênero, consoante as normas constitucionais e internacionais sobre direitos humanos, genoma humano e dados genéticos.

§2º Os dados constantes dos bancos de dados de perfis genéticos terão caráter sigiloso, respondendo civil, penal e administrativamente aquele que

permitir ou promover sua utilização para fins diversos dos previstos nesta Lei ou em decisão judicial.

§3º As informações obtidas a partir da coincidência de perfis genéticos deverão ser consignadas em laudo pericial firmado por perito oficial devidamente habilitado.”

“Art. 7º-A. A exclusão dos perfis genéticos dos bancos de dados ocorrerá no término do prazo estabelecido em lei para a prescrição do delito.”

“Art. 7º-B. A identificação do perfil genético será armazenada em banco de dados sigiloso, conforme regulamento a ser expedido pelo Poder Executivo.” Art. 3º A Lei 7.210, de 11 de julho de 1984 - Lei de Execução Penal, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 9º-A:

“Art. 9º-A. Os condenados por crime praticado, dolosamente, com violência de natureza grave contra pessoa, ou por qualquer dos crimes previstos no art. 1º da Lei 8.072, de 25 de julho de 1990, serão submetidos, obrigatoriamente, à identificação do perfil genético, mediante extração de DNA - ácido desoxirribonucleico, por técnica adequada e indolor.

§1º A identificação do perfil genético será armazenada em banco de dados sigiloso, conforme regulamento a ser expedido pelo Poder Executivo. §2º A autoridade policial, federal ou estadual, poderá requerer ao juiz competente, no caso de inquérito instaurado, o acesso ao banco de dados de identificação de perfil genético.”

Art. 4º Esta Lei entra em vigor após decorridos 180 (cento e oitenta) dias da data de sua publicação.

Através da Lei pode-se observar que os bancos de dados deverão ser criados no âmbito policial e gerenciados por unidade oficial de perícia criminal. Ademais, a Lei é clara ao afirmar que as informações genéticas não poderão revelar traços somáticos ou comportamentais das pessoas, observando-se as normas constitucionais e internacionais sobre os direitos humanos.

A obtenção e utilização dos dados a partir do DNA apresentam dificuldades importantes. Os dados que podem ser obtidos mediante essa prática acabam tornando o indivíduo transparente em âmbitos extremamente sensíveis, como a sua realidade física, por exemplo. O conselho é tratar com extrema prudência e as máximas garantias dos dados dessa natureza, e adotar medidas necessárias para tutelar os direitos fundamentais das pessoas que puderem ser comprometidas com essa prática (SÁNCHEZ, 2007).

Assim, verifica-se que o seu funcionamento também é regido por determinadas regras, as quais não podem ser burladas, conforme se verifica do art. 5º-A, parágrafo 2º, do qual se extrai que as informações terão caráter sigiloso, respondendo civil, penal e administrativamente aquele que permitir ou promover sua utilização para fins diversos dos previstos na Lei ou em decisão judicial.

Com base no disposto no artigo 2º, parágrafo 2º da Lei 12.654/2012 e, conforme se verifica no artigo produzido por Yolanda Gómez Sánchez (2007, p. 164), onde é abordado o tema através do Convênio de Prüm, realizado entre Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha,

França, Holanda e Luxemburgo, o mesmo visa à cooperação entre fronteiras, em especial na luta contra o terrorismo, a criminalidade e a migração ilegal. Ela aduz que

el artículo 40 del Tratado, en el marco de los derechos reconocidos a las personas concernidas por el tratamiento de sus datos personales, habilita al sujeto para presentar una queja efectiva en caso de lesión de su derecho a la protección de datos ante un <<tribunal independiente e imparcial, establecido por la ley, en el sentido del artículo 6.1 del Convenio Europeo de Derechos Humanos, así como ante una autoridad de control independiente en el sentido del artículo 28 de la Directiva 95/46/CE y a obtener, en su caso, una indemnización de daños o una compensación de outro tipo>>.

Assim, verifica-se que também na legislação penal brasileira deve haver uma sanção ou possibilidade de o investigado ingressar com a ação respectiva em caso de disposição irregular de seus dados. Como é de conhecimento geral, o Brasil é um país com fraudes dos mais diversos tipos, e assim como existem pessoas tentando por em prática os bancos de dados, há aquelas que cogitam fraudá-los, de modo a praticar atividades ilícitas com os perfis genéticos lá cadastrados.

Deve ser assegurada a segurança e vigilância desses dados, e o direito a indenização em caso de uso indevido de ditas informações. Afinal, uma série de coisas pode ser feita com o perfil genético de uma pessoa, inclusive colocando seus dados em cenas de crimes que não tenha cometido, simplesmente para incriminá-la.

Para que um sistema penal seja eficaz e sobretudo justo, necessariamente deve estar permeado pelo garantismo, princípio que agora se incorpora a Constituição ao estabelecer o sistema acusatório e sobre ele que, paradoxalmente, tem havido muitas críticas sobre a efetividade e sobre o poder punitivo do Estado, principalmente atinente aos delitos de alto impacto (CIANI, 2012).

Caso ocorrida a comparação entre perfis genéticos, ou seja, quando se alcança a comparação pretendida, aqui, no Brasil, deverá ser consignada em laudo pericial firmado por perito oficial devidamente habilitado. Se evidencia então que não basta a coincidência de perfis, deve ser atestada por perito oficial para ter validade.

O Tratado de Prüm preocupa-se também com a proteção dos dados no âmbito de cooperação policial em matéria de Direito Penal, a qual é questão urgente, para políticas de segurança de todos os projetos envolvidos, e melhoramento da cooperação policial, em andamento na Europa (FÉLEZ, 2007).

Além de todo o exposto, a Lei também aponta que haverá a exclusão dos perfis genéticos dos bancos de dados ao término do prazo estabelecido em lei para a prescrição do

delito. Ou seja, o perfil genético não fica infinitamente no banco de dados, ele tem prazo de permanência definido.

Por fim, o art. 7º-B incluído na Lei 12.037 afirma que a identificação do perfil genético será armazenada em banco de dados sigiloso, consoante regulamento expedido pelo Poder Executivo. No tocante às modificações da Lei de Execução Penal decorre a principal questão a respeito de quem esses dados podem ser coletados, e o art. 9º - A define que apenas os condenados (sentença penal condenatória com trânsito em julgado), por crime praticado, dolosamente, ou qualquer dos crimes previstos como hediondos serão submetidos à identificação do perfil genético.

A alteração da LEP também inclui que a identificação do perfil genético será armazenada em banco de dados sigiloso, conforme regulamento a ser expedido pelo Poder Executivo. Inclui também que a autoridade policial, federal ou estadual, poderá requerer ao juiz competente, no caso de haver inquérito instaurado, o acesso ao banco de dados.

No Decreto sob n.º 7.950, o qual instituiu o Banco Nacional de Perfis Genéticos e a Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos, consta em seu art. 1º e parágrafos, o objetivo pelo qual os bancos serão criados3.

O objetivo da criação dos bancos está estampado no parágrafo 2º, qual seja, o de armazenar dados de perfis genéticos coletados para subsidiar ações destinadas à apuração de crimes.

A criação e o funcionamento desses bancos são muito valiosas para o Estado, averiguando delitos, identificando delinquentes, e melhorando a segurança na sociedade em que habitamos. Diversos países já adotaram essa prática, conforme exposto no item 1.1, e a prática tem imensa efetividade no combate ao crime.

As experiências em investigação criminal até o momento e a colaboração entre Estados da União Europeia, vem dando resultados extremamente positivos, tanto com pessoas

3

Art. 1º. Ficam instituídos, no âmbito do Ministério da Justiça, o Banco Nacional de Perfis Genéticos e a Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos.

§1º. O Banco Nacional de Perfis Genéticos tem como objetivo armazenar dados de perfis genéticos coletados para subsidiar ações destinadas à apuração de crimes.

§2º. A Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos tem como objetivo permitir o compartilhamento e a comparação de perfis genéticos constantes dos bancos de perfis genéticos da União, dos Estados e do Distrito Federal.

§3º. A adesão dos Estados e do Distrito Federal à Rede Integrada ocorrerá por meio de acordo de cooperação técnica celebrado entre a unidade federada e o Ministério da Justiça.

§4º. O Banco Nacional de Perfis Genéticos será instituído na unidade de perícia oficial do Ministério da Justiça, e administrado por perito criminal federal habilitado e com experiência comprovada em genética, designado pelo Ministro de Estado da Justiça.

desaparecidas quanto com delinquentes e vítimas; a informação genética é de grande valor para a administração da justiça quando da investigação criminal, de paternidade, de cadáveres e de pessoas desaparecidas (MORENO, 2008).

Ainda, insta fomentar que muito embora haja a noção de que os bancos de dados venham a diminuir a criminalidade no Estado brasileiro, deve-se atentar para até que ponto eles podem ferir os preceitos assegurados na Constituição Federal brasileira. Apenas a sede de acabar com a criminalidade não basta. Uma série de outras coisas devem vir acompanhando esse processo de criação dos bancos, desde a educação das pessoas, até a questão prisional brasileira, por exemplo.

Num país de terceiro mundo como o Brasil, não basta que se mude uma coisa, mas várias delas devem mudar, para que efetivamente haja resultados. Essa lógica se aplica aos bancos de dados de perfis genéticos para fins de investigação criminal.

É preciso reconhecer os benefícios que um banco de perfis genéticos pode trazer no âmbito da persecução criminal, mas também é preciso levar em consideração a variabilidade da normativa jurídica de cada país, assim como os direitos fundamentais assegurados no âmbito do Direito Constitucional (SCHIOCCHET, 2012, p. 49).

Por fim, a criação e o funcionamento estão muito bem delineados na legislação hoje em vigor, conforme se verificou acima. Ocorre que quando se trata de eficácia, a questão se torna um tanto mais complexa. Todas as diretrizes estão apontadas, ocorre que o Brasil ainda não conseguiu sair do papel.

Todos os elementos utilizados no seriado CSI (Crime Scene Investigation), muito popular entre os brasileiros, existem aqui. No entanto, até o momento, laboratórios forenses de 18 estados contribuem para a Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos (RIBPG), gerida pela Polícia Federal; enquanto nos EUA cada estado define suas diretrizes, aqui o CODIS é uma lei federal, que obriga condenados por crimes hediondos a fornecerem material para o banco (OLIVEIRA, 2014).

A adesão dos Estados brasileiros ainda é baixa, bem como há a disponibilidade de todo o material necessário; todavia, não há ainda profissionais suficientes para a coleta e armazenagem desses dados, afora a questão constitucional envolvida ao tema.

Assim, temos a criação, funcionamento e eficácia dos bancos. Ocorre que muitas questões ainda pendem de legislação, como é o caso da coleta. Ela será feita por quem, desde a coleta dos vestígios das cenas dos crimes, bem como a coleta do material genético dos indivíduos? No mesmo sentido é quanto ao armazenamento, qual será o local e quem armazenará o material?

Não obstante haver ainda vários pontos em aberto acerca da temática, não há como negar que a prática efetivamente diminui a criminalidade e auxilia a polícia como nova tecnologia para solução de crimes.

2.2 Os princípios da dignidade humana, da presunção de inocência e da vedação à