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CAPÍTULO III EDUCAÇÃO PARA TRANSFORMAÇÃO

3.1. Crises e problemas estruturais para a educação e para o planeta

No contexto mundial atual, surgem diversos questionamentos sobre as relações sociais, políticas, econômicas, ecológicas e educacionais. Isso porque, essas relações não vêm acontecendo com igualdade, respeito mútuo, solidariedade e cooperação entre a maioria das sociedades e países. Ao contrário, na história da civilização, prevaleceram e ainda prevalecem a dominação, a exploração e a competição, como podemos perceber no histórico da questão agrária brasileira (CORREIA, 2006).

Segundo Boff (2000), existe uma crise mundial que permeia as áreas: social, sistema de trabalho e meio ambiente. A crise social, forjada pela distribuição desigual e injusta dos avanços tecnológicos e das riquezas produzidas, agravando o distanciamento entre ricos e pobres. A crise no sistema de trabalho, consequência dos avanços tecnológicos, eliminando postos de trabalho e jogando trabalhadores na ociosidade, como nota-se que aconteceu com a modernização da agricultura no Brasil. A crise ecológica, produzida pela exploração irresponsável da natureza, ameaçando todos os tipos de vida na Terra, explorando a natureza sem limites. Para este autor, as concepções de mundo e valores necessitam ser revisadas para haver transformação, para haver um desenvolvimento mais sustentável.

Para passar pelas mudanças na humanidade, vê-se a necessidade de uma transformação da sociedade em todos os níveis, político, psicológico, crenças, valores, relações pessoais, relações internacionais, divertimentos, lazer e, principalmente, na criação e educação das crianças e jovens (SAMPLES, 1990).

No século XIX, donos de grandes indústrias e empresas financiaram a escolarização obrigatória com o propósito de formar futuros trabalhadores e com o propósito de que a cultura imposta sempre se repita (LORTHIOIS, 2008).

Em 1913, nos Estados Unidos, surgiu um novo termo na psicologia para designar o estudo comportamental e de padrões comportamentais humanos chamado “behaviorismo”. No início, este método era utilizado mais na psicologia. Alguns anos à frente iniciou-se a sua utilização na educação, estudando-se os

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padrões comportamentais e criando-se regras para “facilitar” o ensino dos conteúdos e repassar a cultura imposta (BOCK et al, 1992).

De acordo com Samples (1990), muitas escolas optaram e optam pelo método behaviorista de ensino, pois este auxilia a estabelecer metas e objetivos fixos no começo do ano e avaliá-los ao final do ano. O método behaviorista atraiu e atrai muitos educadores que veem o processo de aprendizagem como uma linha de montagem. A escola como um lugar onde “se montam” as mentes e corpos dos alunos de acordo com projetos pré-estabelecidos. A escola se tornou um paradigma fragmentado, onde os conteúdos não se misturam e onde os alunos se tornaram como um exército de marionetes, todos tendo que aprender a mesma coisa, no mesmo tempo.

Segundo Samples (1990), o método behaviorista facilita o controle e administração dos professores sobre os alunos. Prioriza principalmente os ensinos que o autor chama de simbólico-abstratos, que seriam os ensinos da leitura, escrita e cálculos, sendo que os alunos que se destaquem nestes seriam merecedores de prêmios. Aprende-se muita coisa na escola que não é útil no dia-a-dia, inutilidades, principalmente para o jovem rural.

O behaviorismo não apresenta nenhum desafio para a complexidade do sistema cérebro-mente. Esta é uma forma de ensino fechada e limitante, exigindo uma resposta correta para cada situação, evitando ao máximo a mudança de algo. As aulas com este método de ensino são como se fossem sombras da realidade, como se fossem uma prisão. “A escola fez da formação de hábitos uma arte. Infelizmente a maioria dos hábitos reprime a mente” (SAMPLES, 1990, p. 45).

Para Samples (1990), o método behaviorista de ensino se finda em uma conformidade e uniformidade especializada e limitante. Este método designa o professor como o administrador de uma técnica em vez de considerá-lo como um ator dinâmico num processo ilimitado de evolução possibilitado pelo sistema cérebro-mente. Nos sistemas da natureza, opções limitadas e especializadas têm como consequência a homogeneidade, que acaba por conduzir à extinção, como podemos verificar que acontece em áreas de grandes extensões de monocultura. A diversidade alimenta a continuidade evolutiva, tanto para a natureza, quanto para o ser humano.

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Segundo Lorthiois (2008), as crianças e jovens correm perigo neste atual sistema socioeconômico e educacional vigentes, onde o ensino não observa o ser humano que está ali aprendendo, e sim, cria robores. Ameaçadas também estão as crianças e jovens pelos pais, que, muitas vezes, sabem ser amorosos e abertos, mas também podem carregar seus filhos de medos e expectativas, quando querem vê-los a salvo numa bem-sucedida trajetória escolar e profissional, insistindo em trazer padrões que a sociedade capitalista exige, inibindo, assim, um desenvolvimento mais sustentável da criança, do jovem e do ambiente onde estes estão inseridos. As crianças e jovens rurais são os que mais sofrem com todas essas exigências, se afastando de seu ambiente de origem.

Para Lorthiois (2008), as cobranças são maléficas para os jovens, tanto vindas dos pais, quanto vinda dos professores, quanto da sociedade em geral, sobretudo se é para a execução de tarefas irrelevantes para eles. O excesso de cobranças desnorteia, faz o jovem assumir tarefas irrelevantes e afasta-o do mais relevante, afasta-o da realidade a que ele pertence. Dentro das cobranças, o jovem adquire sentimentos de culpa por ter se deixado levar por crenças, valores e metas de outros. Surgem dúvidas quanto à própria competência deles para realizar algo e perplexidade em relação ao rumo da própria vida. Estudo e trabalho sem prazer, por obrigação, desvitalizam os seres humanos, os separam da sua essência, da sua missão. Verifica-se isso em jovens rurais que vão para a cidade, se afastando de sua essência.

A educação no campo tem que ser intelectual, mas também não podem faltar a prática, os trabalhos manuais, a arte, pois estes, incentivam a juventude rural a se auto organizar e a ir em frente e a reivindicarem pelos seus direitos, pelos seus sonhos. Ensino tradicional e livros didáticos desconstroem a essência de valores camponeses nos jovens. A escola tradicional ensina os estudantes a serem apáticos, a não lutarem pelos seus direitos. Escolas públicas com educação tradicional ensinam subordinação, não ensinam mobilização e autonomia (SOUZA, 2010).

Conforme Lorthiois (2008), o sistema de ensino atual exige dos alunos o mesmo comportamento, a mesma disciplina, ou a mesma relevante falta de disciplina, a mesma tendência à extroversão – porque é “moda” -, mesma modalidade falante de participar nas aulas, assimilação de conteúdos

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predeterminados numa faixa etária prefixada, mesmas notas, mesmas médias, mesmos ritmos. Mesma aptidão, sobretudo, para ser utilizável numa sociedade de consumo, e para “sobreviver” nesta sociedade. É nesse sentido que existem ameaças aos jovens rurais, ameaças de os deixarem “seres humanos robotizados”, que não agem para atender seus potenciais, e sim, para atender demandas da sociedade capitalista.

A autora acima citada chega a fazer uma analogia da Revolução Verde que entrou em vigor em 1960/1970 com os métodos de ensino dos dias atuais. Na Revolução Verde priorizaram-se as grandes monoculturas, grandes produções de grãos para exportação, seleção genética das melhores sementes e sementes híbridas para aumentar a produção. As sementes híbridas obtinham bons resultados somente com pesticidas, herbicidas e adubos químicos, não se adaptavam às variações climáticas e diversidade de parasitas de regiões diferentes. É fato que a uniformização na agricultura reduziu a biodiversidade e causou degradações ambientais. Sementes de variedades arcaicas foram destruídas e irremediavelmente perdidas ao serem trocadas por sementes prometendo alto rendimento. Conforme a autora, esses mesmos efeitos maléficos da padronização também atingem a educação (LORTHIOIS, 2008).

A padronização e limitação do ensino, bem como a ausência de confiança e esperança nos talentos dos alunos, minam o futuro dos jovens, os desestimulando para lutarem pelos seus sonhos, a acreditarem em si mesmos e em uma realidade melhor onde vivem. Com métodos de ensino na educação que auxiliem os jovens rurais a confiar em si mesmos, respeitando o cérebro total, respeitando a criatividade de cada ser, trabalhando com possibilidades ao invés de certezas, respeitando o ritmo de cada um, tendo liberdade, passando conhecimentos úteis e respeitando o ser humano inteiro, talvez possa haver uma transformação na educação, um fortalecimento e uma construção de crenças e valores em relação a eles mesmos, ao campo e à vida, auxiliando assim, a haver um desenvolvimento sustentável em seres humanos e no ambiente onde habitam (LORTHIOIS, 2008; SAMPLES, 1990; STEINER, 1996).

A revisão aqui apresentada a respeito de crises e problemas estruturais para a educação e para o planeta teve como objetivo mostrar que a transformação para um desenvolvimento sustentável só se dará com uma revisão, uma renovação e

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uma reorientação dos paradigmas, crenças e valores presentes na maioria das relações do mundo dito civilizado. Ressalta-se, ainda, que essa transformação não será única e definitiva, pois exigirão constantes diálogos entre indivíduos, comunidades e países em todos os espaços de relações. Com isso, pretende-se também evidenciar que dificilmente se garantirá algum futuro dignamente humano se a cooperação não for imediatamente estimulada e amplamente vivenciada na sociedade e se os sistemas educacionais, escolas, pais e professores não assumirem o papel de condutores desse processo de transformação e de revisão que se fazem presentes.

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3.2. Educação para fortalecimento de crenças e valores em relação a si