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4 Metodologia e resultados

4.1 Critérios de análise e classificação

Os textos sobre literatura encontrados durante a pesquisa foram classificados de acordo com a definição de gêneros jornalísticos de José Marques de Melo. O teórico considera que o jornalismo pode ser dividido em dois grandes grupos: o informativo e o opinativo. No jornalismo informativo encontram-se a nota, a notícia, a reportagem e a entrevista. No opinativo, definido como o jornalismo que

“reage diante das notícias, difundindo opiniões, seja as opiniões próprias, seja as que lê, ouve e vê. Nesse sentido assemelha-se à instituição do Fórum na Grécia antiga, atuando como conselheiro, como formadora de opinião” (MELO, 2003, p.29), são encontrados o editorial, o comentário, o artigo, a resenha, a coluna, a crônica, a caricatura e a carta. Melo utiliza dois termos, que considera próprios do gênero para descrevê-lo: a autoria, que está relacionada com quem emite opinião, e a angulagem, a perspectiva temporal ou espacial que dá sentido à opinião (MELO, 2003, p.65). Por este motivo os textos encontrados durante o levantamento foram classificados como crítica somente se estivessem assinados.

Quanto ao jornalismo informativo, a nota corresponde “ao relato de acontecimentos que estão em processo de configuração” . A notícia, por sua vez, é o “relato integral de um fato que já eclodiu no organismo social”. A reportagem é “o relato ampliado de um acontecimento que já repercutiu no organismo social e produziu alterações que são percebidas pela instituição jornalística”. A entrevista é definida como sendo “um relato que privilegia um ou mais protagonistas do acontecer, possibilitando-lhes um contato direto com a coletividade” (MELO, 2003, p.65 e 66).

Em relação ao jornalismo opinativo, explica:

O comentário, o artigo e a resenha pressupõem autoria definida e explicitada, pois este é o indicador que orienta a sintonização do receptor; já o editorial não tem autoria, divulgando-se como espaço da opinião institucional (ou seja, a autoria corresponde à instituição jornalística) (MELO, 2003, p.66).

Nesse contexto é possível incluir a crítica, pois tanto o comentário quanto o artigo e a resenha possuem autoria e são os gêneros designados pelas redações para se referir à crítica, quando presente no jornal. Na pesquisa, se observou que o comentário e o artigo eram geralmente escritos por especialistas convidados, enquanto a resenha, principalmente na década de 1990, era feita por jornalistas.

O gênero jornalístico comentário também foi utilizado neste trabalho para analisar as críticas encontradas permitindo uma abordagem mais ligeira e ao mesmo tempo ampla do texto analisado.

Melo continua a descrição em relação aos gêneros do jornalismo opinativo:

Em relação à coluna, crônica, caricatura e carta um traço comum é a identificação da autoria. Já as angulagens são distintas. A coluna e a caricatura emitem opiniões temporalmente contínuas, sincronizadas com o emergir e o repercutir dos acontecimentos. A crônica e a carta estruturam-se de modo temporalmente mais defasado; vinculam-se diretamente aos fatos que estão acontecendo, mas seguram-lhe o rastro, ou melhor, não coincidem com o seu momento eclosivo.

(MELO, 2003, p.66 e 67).

Estas definições de Melo foram utilizadas para guiar as classificações dos diferentes tipos de textos encontrados durante a pesquisa. Já quanto às críticas, essas foram classificadas utilizando dois autores: André Richard e Daniel Piza.

Antes de passarmos para a classificação, cabe aqui acrescentar uma definição de crítica publicada em jornal, que é nosso foco neste trabalho. Segundo o Dicionário de Comunicação de Carlos Alberto Rabaça e Gustavo Barbosa, crítica é:

Discussão fundamentada e sistemática a respeito de determinada manifestação artística, publicada geralmente em veículos de massa (jornal, revista, livro, rádio tv) e emitida por um jornalista, professor, escritor ou por outros especialistas, em geral vinculados profissionalmente ao veículo como colaboradores regulares.

Apreciação estética e ideológica, desenvolvida a partir de um ponto de vista individual, em que entra a experiência prática e/ou teórica do crítico, a respeito de um trabalho literário, teatral, cinematográfico, de artes plásticas etc. O exercício da crítica implica na compreensão de tudo o que entra no processo de criação de uma obra artística, suas técnicas, seus significados, suas propostas e sua importância dentro de um contexto cultural. “A crítica visa ao conhecimento e valoração da obra, tendo em mira orientar o gosto e a curiosidade do leitor”

(Massaud Moisés). Elaborada a partir de um padrão moderno ou

acadêmico – de proposta artística e pela comparação dos valores e informações da obra com o ideal estético daquele que analisa e opina, a crítica é também uma atividade criativa, na medida em que reinterpreta intelectualmente o objeto examinado, e propicia ao leitor um conjunto de impressões, idéias e sugestões que inclusive enriquecem a informação original. (...) (RABAÇA; BARBOSA, 1978, p. 138 e 139).

Tendo em vista a definição de crítica acima, podemos partir para as classificações de André Richard e Daniel Piza. De acordo com André Richard (1958, publicado no Brasil em 1988), existem seis tipos de crítica:

a) a crítica descritiva, surgida na Grécia antiga e que parte do principio da mimese, tanto da arte, quanto da própria crítica, ou seja, esta deve descrever o objeto artístico que deve assemelhar-se a um objeto da natureza;

b) a crítica canônica, que impõe critérios rigorosos para a avaliação da obra de arte e faz da própria crítica uma criação que deve seguir uma metodologia bastante rígida. É dessa forma de crítica que avaliações sobre a ordem, proporção, simetria das obras e modelos surge, porém a grande vantagem é que, com essa crítica, se derruba a questão da mimese, trazendo toda a atenção para a obra de arte em si, encerrando-a em si mesma;

c) a crítica ideológica, que lê a obra de arte a partir de seu discurso para com o público e os ideais que esta pretende passar em detrimento de seu conteúdo plástico;

d) a crítica subjetiva, que está relacionada ao gosto do crítico, às suas preferências pessoais, constituindo o início da crítica moderna defendida por Baudelaire;

e) a critica formal, que analisa as obras de arte a partir e unicamente pela sua forma.

f) a crítica histórica, que busca na biografia do artista elementos para analise da obra.

Piza, (2003) qualifica a crítica em jornal como resenha, classificando-a segundo quatro tipos:

a) a resenha “impressionista”, na qual o autor descreve suas reações mais imediatas diante da obra, utilizando-se de adjetivos para qualificá-la;

b) a resenha “estruturalista”, que e objetiva nos critérios de análise da obra, utilizando-se geralmente de características de linguagem e de acordo com as transformações sofridas por aquela arte ao longo do tempo;

c) a resenha centrada na vida do autor, que busca explicar a obra a partir de uma justificativa biográfica;

d) a resenha baseada no tema, no assunto, no conteúdo da obra ignorando os aspectos plásticos, estilísticos, etc. da obra prendendo-se em questões sociológicas.

O diálogo entre a obra de Richard e a de Piza é evidente, apesar de estarem separadas por mais de 50 anos. A partir desse diálogo é possível perceber a simplificação (não necessariamente no sentido depreciativo) da crítica ao longo dos anos, bem como a sua fusão, cada vez mais intensa, com a linguagem e o fazer jornalístico.

Na pesquisa realizada, por exemplo, a maior parte das críticas encontradas era denominada como resenha, ou seja, a resenha crítica foi o gênero que mais teve retorno no levantamento das críticas, evidenciando a importância desta classificação e diálogo do jornalismo com a crítica.

Para entendermos um pouco mais sobre a crítica jornalística e como essa se diferencia das outras modalidades de crítica, vale a pena transcrever parte de um artigo de Nelson Ascher para a Folha, publicado no Almanaque em 30 de novembro de 1991:

Para que serve um artigo de, digamos, 60 linhas sobre um livro ou outro assunto literário, quando um comentário especializado de um único verso difícil pode ocupar páginas e páginas? A síntese cada vez mais requerida pelo jornal não seria uma maneira sintética de perder tempo? A reivindicação maximalista dos críticos fiéis a seus princípios não deveria ser a de que, se não há espaço para dizer tudo, o melhor é não dizer nada? Acatar normas jornalísticas para uma atividade paralela mas distinta não é, em última instância, um compromisso espúrio e condenável?

Não. A crítica veiculada pelo jornal é uma atividade com suas próprias regras e objetivos. É um gênero, quase uma forma à parte.

Pelo seu próprio tamanho, ela deve ser mais opinativa do que explicativa - o que não quer dizer que as opiniões que expressa não precisem ser, caso necessário, prontamente explicáveis. Por não ser veiculada a sós, mas embalsamada numa pilha de informações de toda ordem, ela não pode se dar ao luxo de "speak softly and carry a big stick"; não pode falar mansamente carregada de autoridade; ela é obrigada a gritar para chamar a atenção do leitor que se aproxima

anestesiado de tanta informação. Não se trata de ser polêmica a toda hora: atacar é a maneira mais fácil e barata de chamar sobre si a atenção - qualquer principiante pode fazê-lo. (CRÍTICA JORNALÍSTICA... 1991)

O texto entusiasmado de Ascher traz algumas informações interessantes, principalmente para entendermos a diferença entre crítica jornalística e crítica não jornalística (acadêmica, especializada, etc.). A principal diferença, como pode ser observada no texto, é o ritmo e o espaço, e, claro, a boa utilização destes para não deixar de transmitir a mensagem ao leitor e ao mesmo tempo não ocupar muito espaço no caderno, que como o autor mesmo disse, vem recheado de outras informações, como vimos no caso do filme O Advogado do Diabo, descrito por Marcelo Coelho. Seguindo esse mesmo raciocínio chegamos a outro ponto abordado por Ascher e que merece uma última atenção:

Num país como o Brasil, essa crítica, infelizmente, tem que ser didática. Mas não para levar alguém pela mão até um livro ou afastar de um outro, dizendo-lhe: cuidado, filhinho, isso não vai lhe fazer bem. Não há tempo nem espaço para tais delicadezas. Sua propedêutica é a terapia de choque. Seus inimigos principais são a letargia, a sonolência, a inércia intelectual e o bom-mocismo. Para esse tipo de crítica, nenhuma obra ganha respeitabilidade por antiguidade ou decurso de prazo, nem por qualquer tipo de autoridade de que esteja investido seu autor. Nenhuma obra, aliás, é respeitável ou merecedora de considerações atenuantes. As obras são boas ou ruins. E mesmo quando ruins, elas o são de modos e em graus diferentes. Um crítico que se preze, por obrigação de ofício, deve saber distinguir entre o ruim e o pior. Nivelar por baixo ou por cima não passa de preguiça e irresponsabilidade. (CRÍTICA JORNALÍSTICA... 1991)

Este trecho consta aqui principalmente para apontar que tal posicionamento crítico de combate não faz jus à realidade da crítica jornalística. É claro que existem críticas mais diretas, mas durante o trabalho de pesquisa, quando foi realizado o levantamento das críticas de 1981 a 2010 percebeu-se que a crítica em jornal diário tende muito mais a amenizar certos aspetos negativos da obra e, quando estes são muito gritantes, geralmente veem acompanhados de pontos positivos, como se o jornalista tentasse criar uma balança na análise da obra.

Outro ponto a ser pensado, considerando o artigo de Ascher e os resultados encontrados na pesquisa, é talvez a fusão deste aspecto fortemente opinativo da

crítica jornalística ideal de Ascher com a crítica não jornalística, já que na pesquisa os textos que se destacaram por serem mais enfáticos em condenar ou elevar à categoria de obra prima determinado livro do levantamento, foram justamente as críticas mais especializadas publicadas em cadernos ou revistas igualmente especializados. É importante lembrar, todavia, que a crítica é um gênero autoral e não comporta uma fórmula ou padronização, sendo tão diversa quanto aqueles que a produzem.

Considerando, portanto todas essas variáveis teóricas e de classificação pode-se passar para a metodologia relativa ao processo de coleta e análise dos dados, ou seja, críticas, textos informativos, acadêmicos, anúncios publicitários, entre tantos outros, encontrados durante as três décadas pesquisadas.

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