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Critérios para selecção de um biomonitor

3. MUSGOS AQUÁTICOS: BIOMONITORES DA CONTAMINAÇÃO POR METAIS

3.3 Indicadores biológicos/biomonitores e biomonitorização de ecossistemas aquáticos

3.3.2 Monitorização de ecossistemas aquáticos

3.3.2.1 Critérios para selecção de um biomonitor

Um organismo aquático deve satisfazer um conjunto de critérios antes de ser usado directamente para monitorizar contaminantes. A mais simples e importante premissa subjacente ao uso de biomonitores é que o conteúdo de metal nos seus tecidos reflicta o nível médio do contaminante no espaço e no tempo do ecossistema em análise (Phillips, 1977a). Os critérios básicos para a selecção preliminar de um organismo como biomonitor têm sido descritos por vários autores (Butler et al., 1972; Wiegolaski, 1975; Pollitt, 1976; Bryan et al.,

1980; Phillips, 1980; Ireland, 1991; Phillips e Rainbow, 1993) e são apresentados em seguida. Assim, o organismo seleccionado deverá:

Ser capaz de acumular o poluente pretendido nas concentrações presentes no ambiente, sem que ocorram efeitos tóxicos letais.

Preferencialmente, bioacumular o contaminante até concentrações suficientemente elevadas para permitir uma análise directa dos tecidos.

Ser relativamente sedentário de forma a ser representativo da área em estudo.

Ocorrer em abundância, ser relativamente fácil a sua colheita e identificação, e sobreviver por tempo suficiente no laboratório, de modo a possibilitar a realização de estudos de acumulação.

Estar disponível ao longo de todo o ano proporcionando uma monitorização durante períodos alargados, e existir em quantidade e com uma distribuição que torne a

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amostragem fiável.

Responder a variações de concentração dos poluentes.

Exibir uma correlação simples entre a concentração média do poluente no meio aquático e a concentração do poluente na totalidade ou parte do organismo (planta ou animal).

Garantir que todos os organismos da espécie seleccionada deverão exibir a mesma correlação entre o seu conteúdo em poluente e a concentração média de poluente no meio aquático circundante, para todos os locais estudados, sob todas as condições. Adicionalmente a estes requisitos básicos, a selecção preliminar de um biomonitor deve tomar em conta as diferenças na resposta de espécies distintas a percursos particulares da acumulação de contaminantes. Portanto, diferentes espécies acumulam porções diferentes da carga poluente total de um ecossistema. Alguns metais-traço que existem principalmente em solução podem ser monitorizados correctamente por organismos como algas e musgos, pois estes respondem principalmente a metais em solução. Pelo contrário, a monitorização de organoclorados, que surgem normalmente agregados a partículas, será realizada adequadamente por organismos que ingerem grandes quantidades de água para se alimentarem e, por consequência, quantidades consideráveis de matéria particulada.

Outro critério adicional neste processo de selecção é a capacidade de uma dada espécie responder a um poluente que se encontra predominantemente numa dada fase em solução, ou agregado às partículas. Trata-se pois da maior relevância determinar a cinética de acumulação do poluente no organismo candidato a monitor. As taxas de acumulação e de eliminação de um poluente por um organismo determinam, em grande medida, o grau de integração no tempo dos níveis de poluição ambiente exibidos por este organismo (Philips, 1980).

Plantas e animais têm-se mostrado adequados em muitos estudos de poluição por metais, químicos orgânicos e radioisótopos (Philips, 1980; Burton, 1986; Whitton, 1988; Samiullah, 1990). Os peixes são largamente usados pela sua posição de topo na cadeia alimentar (assim podem acumular concentrações elevadas por via da sua alimentação). Como os peixes são usados pelo homem como fonte de alimento os resultados são directamente relevantes para a

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saúde humana. Com algumas plantas aquáticas, particularmente musgos, têm-se obtido boas correlações entre a concentração de alguns metais nos seus tecidos e as concentrações no meio aquático envolvente.

No caso dos animais, os contaminantes podem ser ingeridos juntamente com a alimentação, como é o caso dos organismos que se alimentam por filtragem da água, que têm uma capacidade limitada para seleccionar o material particulado. Como muitos contaminantes estão ligados a pequenas partículas, estes organismos são particularmente vulneráveis a esta fonte de poluição. Outros contaminantes podem ser absorvidos passivamente através da superfície corporal, como acontece com o fluxo contínuo de água através das guelras dos peixes. Quando um organismo que acumulou um contaminante é ingerido por outro, este acumula por sua vez o contaminante existente nos tecidos da fonte de alimentação, processo conhecido como transferência do contaminante na cadeia alimentar. Os organismos no topo da cadeia alimentar podem, desta forma, acumular contaminantes até concentrações muito elevadas relativamente às que ocorrem na água ou na matéria particulada, o que usualmente toma a designação de bioampliação.

Se a correlação entre a concentração de um contaminante nos tecidos de uma dada espécie e a concentração na água e/ou material particulado é boa, a espécie pode ser usada directamente na monitorização da qualidade da água. Quando ocorre bioampliação, o organismo oferece a vantagem adicional de ser mais fácil a detecção do contaminante e por conseguinte a necessidade de meios de análise menos sofisticados e menos dispendiosos. Alternativamente, os tecidos biológicos podem ser juntos permitindo uma maior concentração total em medições efectuadas por técnicas menos sensíveis. Actualmente há algumas espécies dispersas por grande parte do planeta que são conhecidas por permitirem a avaliação da qualidade da água de forma satisfatória, embora muitas espécies sejam usadas a nível local (ou possivelmente nacional, em países pequenos).

Para que a utilização de organismos monitores seja levada a cabo com sucesso em estudos de campo, torna-se indispensável o conhecimento da sua capacidade de acumulação dos poluentes e respectiva cinética, única forma para uma correcta interpretação dos resultados obtidos. O modo de adquirir estes conhecimentos básicos é pela execução de experiências

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laboratoriais, em que as condições de exposição podem ser monitorizadas adequadamente (Rainbow et al., 1990).